Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
805/15.8T8PBL.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: CARLOS MOREIRA
Descritores: COMPETÊNCIA MATERIAL
ACÇÃO DE INTERDIÇÃO
ESTADO CIVIL
Data do Acordão: 01/19/2016
Votação: DECISÃO SUMÁRIA
Tribunal Recurso: COMARCA DE LEIRIA - POMBAL - INST. LOCAL - SECÇÃO CÍVEL - J2
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTS. 122 G), 130 DA LEI Nº 62/2013 DE 24/8
Sumário: 1. A acção de interdição não afecta o estado civil, nem implica, determinantemente, para a justa composição dos interesses em causa, a aplicação de regras de direito da família, quid essencial para afectação das causas ao tribunal de família.

2.A competência material para apreciar e decidir em tal acção não é deste tribunal, por apelo ao artº 122º al. g) da Lei 62/2013, de 26 de Agosto, mas antes do tribunal de competência genérica, por subsunção no artº 130º nº1 al. g) da mesma Lei.

3. O conceito de “estado civil”, previsto na alínea g) do art.122 da Lei nº 62/2013 de 24/8 deve apenas ser preenchido pelas condições ou qualidades pessoais e que têm como fonte as relações jurídicas familiares, e que definam a situação ou posicionamento das pessoas relativamente ao casamento (estado de solteiro, casado, viúvo, divorciado, separado…), união de facto ou economia comum.

Decisão Texto Integral:

DECISÃO DO RELATOR NOS TERMOS DO ARTIGO 652º nº1 al. C) do CPC

1.

M (…) instaurou ação especial de interdição por anomalia psíquica relativamente a MF (…).

A Instância Local Cível de Pombal declarou-se territorialmente incompetente para a tramitação dos autos.

 

2.

Remetidos que foram à Instância Local Cível da Comarca de Leiria foi pela SRª Juíza proferida a seguinte decisão:

«Nos termos do disposto nos artigos. 96º, a), 97º, nº1 e 98º todos do CPC, e artigo 122º alínea g) da lei nº 62/2013 de 26 de Agosto, declaro incompetente em razão da matéria a presente Instância Local Cível de Leiria do Tribunal Judicial da Comarca de Leiria, por para a presente acção ser competente a Instância Central de Família e Menores do Tribunal Judicial da Comarca de Leiria (2ª Secção instalada em Pombal) e consequentemente indefiro liminarmente a petição inicial».

3.

Inconformado recorreu o Digno Magistrado do MºPº.

Rematando as suas alegações com as seguintes conclusões:

1. Os presentes autos versam sobre a decisão do Mm. Juiz a quo, de se declarar incompetente, em razão da matéria, para julgar a presente acção de interdição, por entender que a mesma, face ao disposto no art. 122.º da Lei 62/2013, de 26 de Agosto, mais concretamente, da alínea g), é da competência do Tribunal de Família e Menores. 2. Tal asserção deveria determinar o envio da acção ao tribunal considerado competente, ao invés do indeferimento liminar da petição inicial, posto que a mesma respeita os requisitos do art. 552º do C.P.Civil e, a sua instauração na Instância Cível não configura uma evidente excepção dilatória insuprível de incompetência em razão da matéria, nos termos do art. 99º nº1.

3. No sentido social, entende-se estado civil como a existência e condições da existência do indivíduo perante a lei civil (solteiro, casado, viúvo ou divorciado), o que em nada está relacionado com as situações julgadas e decididas nas acções de interdição ou seja, situações de incapacidade para o governo da sua pessoa e dos seus bens.

 4. O facto das acções de interdição serem objecto de registo, nos termos do disposto no art. 1º do Código de Registo Civil, não implica que estas assumam natureza de acção de estado civil, uma vez que no art. 1º do Código de Registo Civil encontram-se elencados vários factos, cujo registo, não obstante ser obrigatório, v.g., declaração de insolvência, em nada estão relacionados com o “estado civil das pessoas”.

 5. As acções de interdição não versam sobre o estado civil das pessoas, propriamente dito, mas sim sobre uma situação pessoal que afecta a capacidade de exercício de direitos do indivíduo.

6. O instituto da interdição e da inabilitação encontram-se reguladas na lei substantiva no Livro I (parte geral), Título II (das Relações Jurídicas), Subtítulo I (das pessoas), Secção V (incapacidades), subsecção I e II, a par com a maioridade e emancipação (subsecção I e II), releva, uma vez que, a interdição, tal como a menoridade, constituem modalidades de incapacidade para o exercício de direito, colocando-se as questões relacionadas com as mesmas, nomeadamente, a sua declaração, no plano da titularidade de situações jurídicas, relevante para efeitos de capacidade para ser parte em negócio jurídico.

 7. Deste modo, é indubitável, que, por exemplo, no caso de incumprimento de contrato em que uma das partes é menor, legalmente representada, os tribunais chamados para resolver a questão não serão os tribunais de Família e Menores, mas sim, os tribunais de instância central ou local, apesar de se tratar de questão relacionada com menor.

8. Atendendo aos princípios proclamados pela “nova organização judiciária”, nomeadamente o espírito de especialização judiciária, apenas as questões de menores e família devem ser tratadas nos Tribunais de Família e Menores.

9. Por tudo o exposto, não podia o despacho declarar incompetente em razão da matéria a Instância Local Cível de Leiria, devendo, antes, considerar-se competente este tribunal,

10. O despacho sob recurso infringiu o disposto nos arts.99º nº1, 576º nº2 e 590º nº1 do C.P.Civil, bem como o art. 122º alínea g) da Lei nº62/2013 de 26 de Agosto; 11.Consequentemente, deve ser revogado e substituído por outro que, considerando competente a Instância Local Cível de Leiria, ordene o prosseguimento dos ulteriores termos do processo, ou, caso assim se não entenda, a sua remessa à 2ª Secção do Tribunal de Família e Menores da Leiria.

4.

Sendo que, por via de regra: artºs  608º nº2, ex vi do artº 663º n2, 635º nº4 e 639º  do CPC - de que o presente caso não constitui exceção - o teor das conclusões define o objeto do recurso, a questão essencial decidenda é a seguinte:

Tribunal competente, em razão da matéria, para apreciar e decidir a ação de interdição.

5.

Apreciando.

5.1.

A Julgadora decidiu alcandorada no seguinte discurso argumentativo:

«Em 01 de Setembro de 2014 entrou em vigor a lei nº 62/2013 (vide artigo 188º da referida lei conjugado com o artigo 118º do decreto/lei nº 49/2014 de 27 de Março) que procedeu a profundas alterações em toda a orgânica judicial.

Colocando-se-nos, face à nova organização do sistema judiciário, introduzida pela Lei nº62/2013, de 24/8, questão relativa à competência para a presente causa – se esta Instância

Local Cível de Leiria do Tribunal Judicial da Comarca de Leiria ou se a 2ª Secção de Família e Menores da Instância Central do Tribunal Judicial da Comarca de Leiria, foi após recepção dos autos prolatado despacho a ordenar a notificação do Ministério Público e da requerente para querendo se pronunciarem sobre tal questão.

Pronunciou-se o Ministério Público a fls. 41 e seguintes, e a requerente a fls. 43

Apreciando:

Dispõe o artigo 122º da Lei 62/2013, de 26 de Agosto que:

“1 – Compete às secções de família e menores preparar e julgar:

g) Outras ações relativas ao estado civil das pessoas e família.

As referidas secções tem competência especializada – artigo 81º, nº1, a) e nº2 , d) da Lei nº62/2013, de 26/8.

Relativamente às Secções ou Instâncias de Competência Genérica fazem parte da Instância Local (artigo 81º, nº1, b) e nº3 da Lei nº62/2013, de 26/8), competindo-lhes, segundo o artigo 130.º, nº1 da mesma Lei:

g) Exercer as demais competências conferidas por lei.

(…)”

De acordo com os normativos supra citados está, pois, em causa, saber qual a interpretação a dar à alínea g) do nº1 do artigo 122º, ou seja, saber o que é acção relativa ao estado civil das pessoas ou, ainda mais especificamente, o que é estado civil das pessoas, pois que, manifestamente a interdição não tem a ver com questão de família.

A este propósito diga-se que a utilização da conjunção coordenativa aditiva “e” (liga orações ou palavras, expressando ideia de acrescentamento ou adição), não nos permite concluir que as acções relativas ao estado civil previstas na mencionada alínea g) tenham a ver com relações entre a pessoa e a família.

Não ignoramos que a Lei nº 52/2008, de 28 de Agostomais concretamente a alínea h) do artigo 114.º, preceito similar à alínea g) do nº1 do artigo 122.º da Lei 62/2013, de 26 de Agosto, tem sido interpretada pela jurisprudência dominante como não incluindo a preparação e julgamento das acções de interdição e inabilitação – vide jurisprudência citada pelo Ministério Público.

No entanto, e salvo o devido respeito por opinião contrária, quer nos parecer que as alíneas em referência não admitem apenas tal leitura.

Segundo Ana Prata, in Dicionário Jurídico, pág. 509/510, estado civil, é “uma situação integrada pelo conjunto das qualidades definidoras do estado pessoal que constam obrigatoriamente de registo civil, sendo o estado pessoal a situação jurídica da pessoa, no que toca, entre outras, à idade (menoridade, maioridade, emancipação), relações familiares (casado, solteiro, divorciado, viúvo), relações com o Estado (nacional, estrangeiro, naturalizado, etc.), à situação jurídica (interdito, inabilitado)”.

Daqui que a situação jurídica relativa ao estado pessoal quando sujeita a inscrição no registo civil seja sinónimo de “estado civil”, segundo Castro Mendes, Direito Civil, Teoria Geral, Vol. I, 1978, FDL, págs. 99-102. Nas sus palavras, “estado pessoal será a qualidade  que condiciona a atribuição de uma massa pré-determinada de direitos e vinculações, cuja titularidade ou não titularidade é aspecto fundamental da situação jurídica (…) da pessoa.

Quais as qualidades jurídicas que merecem a qualificação de fundamentais, isso dá-nos o direito positivo um critério legal de determinar: são aquelas que se encontram inscritas no registo civil, ou que a doutrina repute de relevância jurídica igual à dessas. (…) Aquelas qualidades que constam obrigatoriamente do registo civil são as que a própria lei em rigor chama estados civis.”

O conceito de estado pessoal é, pois, mais, amplo que o de estado civil.

Ainda segundo o mesmo autor na obra citada (p. 102) “o estado de pródigo – melhor de inabilitado- está obrigatoriamente sujeito ao registo civil- é pois um estado civil…”

Dispõe o artigo 138º, nº1 do Código Civil que “Podem ser interditos do seu exercício dos seus direitos todos aqueles que por anomalia psíquica, surdez-mudez ou cegueira se mostrem incapazes de governar suas pessoas e bens.”

O artigo 1º, nº1 do Cód. do Registo Civil dispõe que “O registo civil é obrigatório e tem por objeto os seguintes factos:

(…)

h) A interdição e a inabilitação definitivas (…).”

Assim, porque está sujeita a registo, a situação jurídica de interdição assume a natureza de estado civil.

Diga-se ainda que, segundo o artigo 139º do Código Civil, (…) o interdito é equiparado ao menor, sendo-lhe aplicáveis com as necessárias adaptações, as disposições que regulam a incapacidade por menoridade e fixam os meios de suprir o poder paternal.”, o que nos coloca no âmbito da jurisdição de família e menores – artigo 123º, nº1, alínea. a) e d) da Lei nº62/2013, de 26/8.

Por outro lado, o disposto no artigo. 140º do Cód. Civil não clarifica a situação, dispondo apenas que o tribunal onde corre processo de interdição, que não seja tribunal de família e menores (na actual organização judiciária continua a acontecer tal situação, uma vez que há Tribunais de Comarca em que os Tribunais de Família e menores não abrangem toda a área da Comarca), aplica as disposições que regulam o suprimento do poder paternal.

De todo o exposto resulta então que as acções de interdição se integram na citada alínea g) do nº1 do artigo 122º da Lei nº62/2013, de 26/8, por serem acções relativas ao estado civil das pessoas.

Também no sentido de que os Tribunais de família e menores são os materialmente competentes para as acções de interdição e inabilitação, pese embora por referência à referida Lei nº52/2008, de 28/8 (art. 114º, h) e ao Dec. Lei nº25/2009, de 26/01, se pronuncia o Juiz Desembargador Emídio Santos, in Das Interdições e Inabilitações, Quid, Juris, Sociedade Editora, pág. 35.

Assim, importa concluir que competente em razão da matéria para o presente processo é a 2ª Secção de Família e Menores de Pombal, cuja área de competência abrange Leiria.»

(sublinhado nosso).

5.2.

Vemos, pois, que a julgadora opera uma interpretação abrangente/alargada do conceito legal de «estado civil», considerando que o «estado pessoal de interdito», porque está sujeito a registo civil, deve ser abrangido, ou integrar aquele conceito.

A questão tem sido abundantemente apreciada e escalpelizada pela jurisprudência dos tribunais superiores.

E tendo, na sua esmagadora maioria, máxime, nos arestos mais recentes, tal jurisprudência decidido no sentido de que a competência material para este tipo de ações pertence ao tribunal comum, ao tribunal de competência genérica, e não ao tribunal de família.

O argumento nuclear invocado é a interpretação adversa à operada pela julgadora a quo, ou seja, no entendimento de que o «estado civil» aludido no segmento normativo pertinente, deve ser interpretado em sentido restrito.

Isto é, tal conceito legal deverá apenas ser preenchido pelas condições ou qualidades pessoais e que têm como fonte as relações jurídicas familiares, e que definam a situação ou posicionamento das pessoas relativamente ao casamento (estado de solteiro, casado, viúvo, divorciado, separado…), união de facto ou economia comum.

 Neste sentido se tendo pronunciado a seguinte jurisprudência:

I.  Da Relação de Guimarães

  - Decisão do Sr. Presidente de 30.03.2012, p. 29/12.6YRGMR. 

II. Da Relação do Porto:

    - Acordão de 05-02-2015, p.13857/14.9T8PRT.P1.

III. Da Relação de Lisboa:

    - Acordão de 29-05-2012, p. 3928/12.1T2SNT.L1-1;

                - Acordão de 29-05-2012, p. 1188/12.3T2SNT.L1-7;

                - Acordão de12-06-2012, p.  7218/12.1TLSNT.L1-7;

             - Acordão de 12-07-2012, p. 21777/11.2T2SNT.L1-1;

             - Acordão de 18-10-2012, p. 12983/12.3T2SNT.L1-2;

       IV. Da Relação de Coimbra:

               - Acordão de 28-04-2015, p.4816/12.7TBLRA.C1.;

               - Acordão de 05-05-2015, p. 549/14.8TBLRA.C1.;

               - Acordão de 02-06-2015, p. 322/14.3TBLRA.C1;

               - Acordão de 08-09-2015, p. 369/13.7TBLRA.C1;

               -  Acordão de 20-10-2015, p. 989/13.0TBLRA.C1;      

               - Acordão de 10-11-2015, p. 1050/14.5T8LRA.C1.      

        V.  Do STJ:

               - Acordão de 13.11.2012, p. 13466/11.4T2SNT.L1.S1.  

Todos in dgsi.pt.

Neste último aresto são invocados ainda, determinantemente, os elementos sistemático e histórico da hermenêutica jurídica, nos seguintes termos:

«Os Tribunais de Família foram criados pela Lei nº 4/70 de 29/4 e vieram a ser regulamentados pela primeira vez, pelo Decreto-Lei nº 8/72 de 7/1.

Neste e nos diplomas que se seguiram a regular tal competência especializada e até à presente LOFTJ, se previu como competência dos mesmos, o conhecimento de acções que versassem o ramo do Direito Civil: Direito da Família.

E mesmo as acções que versassem o aludido ramo do Direito Civil nem todas foram cometidas àqueles tribunais.

Assim, as acções de investigação de paternidade que aplicam normas de Direito da Família, no ramo da Filiação, continuaram a ser da competência dos tribunais cíveis, até à alteração introduzida na competência daqueles tribunais pela Lei nº 52/2008, como já referimos.

Deste modo, se o legislador pretendesse romper com esta longa tradição já sedimentada, estendendo a competência daquele tribunal de competência especializada a um tipo de acções de verificação frequente nos tribunais, mas em que não há lugar à aplicação de normas de Direito da Família, não teria deixado de o fazer de forma mais clara ou expressa no texto da lei.

E de qualquer modo, no parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos e Liberdades acima apontado teria aquela inovação, que rompia a tradição legislativa, de ser expressa, e, tal como vimos acima, naquele parecer apenas foi salientada a inclusão inovatória da competência para as acções de investigação – ou de impugnação - de paternidade ou de maternidade e a extensão da competência para as acções relativas às situações de união de facto ou de economia comum.

E é de salientar que estas últimas acções aplicam normas de Direito da Família – nomeadamente, as previstas no art. 2020º do Cód. Civil -, embora no conceito de família alargada pela evolução das condições sócio-familiares.».

(sublinhado nosso).

5.3.

Corroboramos os fundamentos aduzidos nestes arestos,  em cujos textos se pode atentar para uma mais abrangente análise da questão.

Dir-se-á, sinteticamente e brevitatis causa.

Se bem inteligimos, a julgadora entende que para se  interpretar a al. g) do artº 122º se deve deitar mão do conceito «estado pessoal», o qual, sendo mais amplo do que o conceito «estado civil», abarca este e, assim,  sendo a interdição subsumível neste segmento normativo.

Esta interpretação extensiva não colhe, desde logo porque é relativamente incompaginavel com normas de cariz especial, como é o presente segmento normativo, no sentido  em que ele atribui concretas e especializadas competências a um determinado tribunal.

È, pois, apenas e só  considerando  a expressão e conceito legal de «estado civil»,  adrede consignada, que tem de partir-se para a presente atividade exegética.

Ora como diz o recorrente e é jurisprudência pacífica, a interdição não bule com o estado civil das pessoas, mas apenas afeta a sua capacidade de exercício.

Desde logo ela não afeta a personalidade jurídica do interdito, ou o seu status civilístico,  mas antes e apenas  afeta a sua capacidade de exercício, a capacidade de agir, por si e/ou em juízo.

O que é bem diferente e escapa, claramente, à previsão do segmento normativo da atual al. g) do artº 122º.

Nem relevando que tal facto seja levado o registo: este não cria direitos, apenas os publicita, e o que, in casu,  publicita não é uma alteração do estado civil, tout court, mas antes uma alteração, rectius compressão, de tal capacidade de exercício.

 Por outro lado, urge atentar que a regra da especialidade implica uma definição, adrede, clara e inequívoca, das competências do tribunal especializado; na dúvida emerge a competência residual do tribunal de competência genérica.

Finalmente importa ter presente que na ação de interdição, não são chamadas à colação, por via de regra e nuclearmente para a decisão do pleito, regras do direito da família, mas, ao invés, outras regras  gerais, vg. as atinentes às (in)capacidades psíquico-intelectuais e volitivas.

Não se vislumbram, assim, vantagens, em termos da consecução da justiça material e da celeridade para o processo, em ser o tribunal de família a dirimir o pleito.

Antes, quiçá, pelo contrário.

E são, precisamente, aquelas vantagens, que estão na génese na criação de tribunais especializados.

Uma palavra final.

Atenta a quase unanimidade dos tribunais superiores no sentido do presente entendimento, máxime deste Tribunal da Relação de Coimbra, deverão os Srs Juízes da 1ª instância, rectius deste distrito judicial – e isto sem querer por em causa a sua independência e autonomia - tomar em consideração tal uniformidade, antes de despoletarem recursos que, ao menos neste tribunal ad quem, estarão, com toda a probabilidade, votados ao insucesso.

Assim se consecutindo a almejada justiça comparativa – ainda que esta não seja muito afetada, atenta a mencionada tendência -, e, acima de tudo, se contribuindo para a celeridade na composição do litígio, a qual nestes processos tem valor acrescido, como são paradigma os presentes autos, em função dos requerimentos neles produzidos – cfr. o de fls. 58 e 59.

6.

Sumariando.

I - A ação de interdição não afeta o estado civil, nem implica, determinantemente,  para a justa composição  dos interesses em causa, a aplicação de regras de direito da família, quid essencial para afetação das causas ao tribunal de família.

II - Destarte, a competência material para apreciar e decidir em tal ação não é deste tribunal, por apelo ao artº 122º al. g) da Lei 62/2013, de 26 de Agosto, mas antes do tribunal de competência genérica, por subsunção no artº 130º nº1 al. g) da mesma Lei.

7.

Decisão.

Termos em que se decide declarar o tribunal recorrido o competente, em razão da matéria, para tramitar, apreciar e decidir a ação.

Sem custas.

Coimbra, 2016.01.19.

Carlos Moreira ( Relator )