Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
338/14.0GBFND.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: INÁCIO MONTEIRO
Descritores: DANO NÃO PATRIMONIAL
DANO PATRIMONIAL REFLEXO
LESÃO
DANOS FUTUROS
Data do Acordão: 07/13/2016
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: CASTELO BRANCO (INSTÂNCIA LOCAL DO FUNDÃO - SECÇÃO CRIMINAL - JUIZ 1)
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: REVOGADA, PARCIALMENTE
Legislação Nacional: ARTS. 70.º, 483.º, N.º 1, 496.º, N.ºS 1 E 4, 494.º E 564.º, N.º 2, DO CC; ART. 609.º, N.º 2, DO CPC
Sumário: I – O dano não patrimonial indirecto ou reflexo sofrido reciprocamente por cada uma das demandantes, na qualidade de mãe e filha, em consequência da lesão que a outra sofreu, ambas vítimas de atropelamento no mesmo acidente de viação, por cuja conduta o arguido foi condenado por dois crimes de ofensa à integridade física simples por negligência do art. 148.º, n.º 1, do CP, não é indemnizável, face aos art. 483.º, n.º 1 e 496.º n.º 1 e 4, do CC, por o dano indirecto ou reflexo que cada uma sofreu não é um dano não patrimonial particularmente grave, já que a lesão de cada uma das demandantes em consequência do acidente não foi de modo a deixar-lhes sequelas que as afectasse de forma particularmente grave na saúde física ou psíquica.

II – Não tendo o tribunal dado como provado que a demandante venha a sofrer um agravamento das lesões, pressuposto para condenar o obrigado à indemnização num dano previsível, não pode condenar este por dano futuro, em quantia a liquidar em execução de sentença, por não verificados os requisitos dos art. 564.º, n.º 2, do CC e 609.º, n.º 2, do CPC.

Decisão Texto Integral:






Acordam, em conferência, os juízes da 4.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra


I- Relatório
No processo supra identificado foi julgado o arguido A... , solteiro, desempregado, nascido a 06-12-1967, natural da freguesia de (...) , concelho da Covilhã, filho de (...) e de (...) , residente na rua (...) , Covilhã, pela prática de dois crimes de ofensa à integridade física por negligência, p. e p. pelo art. 148.º, n.º 1, do C. Penal.
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A fls. 96 a 113 vieram as ofendidas B... e C... deduzir pedido de indemnização cível contra D... SEGUROS, SA, peticionando a sua condenação no pagamento das seguintes quantias:
À ofendida B... a quantia global de 30.280,20 euros, acrescida dos respectivos juros de mora, vencidos e vincendos, contados desde a data da citação até efectivo e integral pagamento.
À ofendida C... a quantia global de 46.111,38 euros, acrescida dos respectivos juros de mora, vencidos e vincendos, contados desde a data da citação até efectivo e integral pagamento.
A quantia que se vier a liquidar em execução de sentença, dependendo do resultado da perícia médico-legal.
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O tribunal decidiu condenar:
a) O arguido A... pela prática, em autoria material, na forma consumada, e em concurso real, de dois crimes de ofensa à integridade física por negligência, p. e p. pelo art. 148.º, n.º 1, do Código Penal, com referência ao art. 15.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 100 (cem) dias de multa, cada um, à taxa diária de 5,00 (cinco) euros.
Na pena única de 150 (cento e cinquenta) dias de multa, à taxa diária de 5,00 (cinco) euros, o que perfaz a multa global de 750,00 (setecentos e cinquenta) euros.
b) A demandada D... SEGUROS, SA a pagar:
- À ofendida C... a quantia global de 28.643,60 (vinte e oito mil seiscentos e quarenta e três euros e sessenta cêntimos), sendo 20.000,00 (vinte mil) euros, a titulo de danos morais, 8.000,00 (oito mil) euros, a titulo de dano biológico, ambas acrescidas dos respectivos juros de mora, contados desde a data da presente decisão, e a quantia de 634,60 (seiscentos e trinta e quatro euros e sessenta cêntimos) euros, a titulo de danos patrimoniais, acrescida dos respectivos juros de mora, vencidos e vincendos, contados desde a data da citação e até efectivo e integral pagamento – cfr. arts. cfr. arts. 566, 805, n. 3, 806 e 559, todos do C. Civil;
- À ofendida B... a quantia global de 20.000,00 (vinte mil) euros, sendo 15.000,00 (quinze mil) euros, a titulo de danos morais, e 5.000,00 (cinco mil) euros, a titulo de dano biológico, ambas acrescidas dos respectivos juros de mora, contados desde a data da presente decisão.
Às ofendidas C... e B... a quantia que vier a liquidar-se em execução de sentença - cfr. arts. 564.º, n.º 2, do C. Civil e 661.º, n.º 2, do CPC -, eventualmente a instaurar, pelos danos patrimoniais, designadamente medicação, exames, terapias, eventuais cirurgias e tratamentos decorrentes das sequelas descritas nos relatórios periciais de fls. 258 a 261 e 266 a 269, e dores, angústias e ansiedades dai decorrentes.
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Inconformada recorreu a demandada D... SEGUROS, SA, formulando as seguintes conclusões:
«1. As indemnizações fixadas pela M.ma Juiz do douto Tribunal a quo têm como intuito ressarcir as Demandantes pelo Dano Moral que cada uma sofreu em consequência do presente sinistro, mas também o chamado Dano Moral Reflexo ou Indirecto.
2. Ao admitir-se que todos os danos reflexos por familiares do lesado são indemnizáveis, estaríamos a esvaziar o conteúdo da norma constante no artigo 496.°, n.º 4, segunda parte do Código Civil.
3. No Boletim do Ministério da Justiça, n.º 101, pág. 138 e segs., o Prof. Vaz Serra que interveio activamente nos trabalhos preparatórios do Cód. Civil de 1966, formulou uma norma que previa clara e directamente a ressarcibilidade daquele tipo de danos, no § 5 da proposta de redacção oferecida para o art. 759.º da parte do Direito das Obrigações daquele código, preceito este que não passou para o texto final por ter essa pretensão sido rejeitada.
4. A norma contida no artigo 496.º, n.º 4, segunda parte do Código Civil é uma norma excepcional, que não comporta aplicação analógica.
5. O julgador é um intérprete e um aplicador da lei, não podendo alterar a mesma por via jurisprudencial.
6. No entendimento da Recorrente, a doutrina que defende que os danos reflexos são indemnizáveis está claramente a alterar a lei.
7. Uma vez que a M.ma Juiz do douto Tribunal a quo para fixar o quantum indemnizatório pelos danos morais das Demandantes considerou também a existência de danos morais reflexos, a indemnização a fixar pelos referidos danos morais tem obrigatoriamente que ser reduzida.
8. O valor de uma indemnização por danos não patrimoniais afere-se através do recurso ao critério da equidade.
9. Através, de uma breve pesquisa da nossa jurisprudência, verificamos que os montantes de € 15.000,00 e de € 20.000,00 atribuídos a título de danos não patrimoniais, respectivamente, às Demandantes B... e C... não são adequados, por serem excessivos, aos princípios de equidade e razoabilidade que devem pautar a aplicação da justiça, não se encontrando em sintonia com outras indemnizações que os tribunais têm aplicado, devendo ser, neste ponto, alterada a decisão, fixando-se as indemnizações a este título num valor mais ajustado com a análise do caso concreto.
10. Conforme refere a M.ma Juiz na sentença, apenas relativamente à Demandante C... é que foi admitida a existência de um dano futuro.
11. Conforme bem refere a M.ma Juiz do douto Tribunal a quo "O dano futuro é previsível quando se pode prognosticar, conjecturar com antecipação ao tempo em que acontecerá, a sua ocorrência. No caso contrário, isto é, quando o homem medianamente prudente e avisado o não prognostica, o dano é imprevisível".
12. Ora, uma vez que não ficou demonstrado que a Demandante B... venha a sofrer um agravamento das suas lesões, não é possível considerar a existência de um dano futuro relativamente a esta, pelo que tal dano não é indemnizável, nos termos do disposto no artigo 564.º, n.º 2 do Código Civil.
13. E, assim sendo, não pode a Recorrente ser condenada a liquidar à Demandante B... a quantia que se vier a liquidar em execução de sentença pelos danos futuros patrimoniais e não patrimoniais que esta venha a sofrer».
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Notificado o Ministério Público, arguido e demandantes nos termos do art. 413.º, n.º 1, do CPP, não houve respostas.
Nesta instância, os autos tiveram vista do Ex.mo Senhor Procurador-geral Adjunto, para os feitos do art. 416.º, n.º 1, do CPP, o qual, incidindo o recurso apenas sobre os pedidos cíveis, limitou-se a apor o visto.
Foi cumprido o art. 418.º, do CPP, e uma vez colhidos os vistos legais, indo os autos à conferência, cumpre decidir.
Vejamos, com relevância para a decisão do recurso, a factualidade apurada pelo tribunal:
Factos provados:
«1. No dia 3 de março de 2014, cerca das 19H30, o arguido conduzia o automóvel ligeiro de passageiros, com a matrícula 34-47-RO, na EN 18, ao Km 54,900, nesta cidade do Fundão, no sentido Fundão/Covilhã.
2. Naquela mesma circunstância de tempo e lugar, atravessam a passadeira para peões existente naquela estrada, a ofendida C... e a ofendida B... .
3. E faziam-no, atento o sentido de marcha do automóvel conduzido pelo arguido, do lado esquerdo para o lado direito.
4. As ofendidas iniciaram a travessia da passadeira e percorreram toda a hemifaixa de rodagem do lado esquerdo, atento o sentido do arguido, e ainda parte da hemifaixa por onde o arguido circulava, num total de 5,10m.
5. Antes da passadeira, atento o sentido de marcha do automóvel conduzido pelo arguido, encontra-se um sinal avisador da passagem de peões.
6. Como o arguido seguia distraído e não adequou a marcha do automóvel ao local, aproximação da passadeira, fez embater a viatura que conduzia nas ofendidas, quando estas atravessavam a passadeira para peões.
7. Só imobilizando o automóvel 5,20m para além do limite da passadeira.
8. Mercê do embate sofrido as ofendidas tiveram que receber tratamento médico no CHCB, Hospital da Covilhã.
9. Onde a ofendida B... ficou internada até ao dia 13 de março de 2014.
10. A ofendida C... , para além das dores sofridas, sofreu fratura do 1/3 distal do cúbito esquerda mais sequela de fratura de hallux pé esquerdo associada a entorse da tibiotársica, edema nasal.
11. Quando foi submetida a exame médico pericial apresentava “Fenómenos dolorosos no punho esquerdo e cotovelo esquerdo” e “ Membro superior esquerdo: limitação ligeira das mobilidades do punho esquerdo”.
12. Tais lesões foram consolidadas em 21-07-2014, e terão determinado 140 dias com afetação da capacidade de trabalho geral e profissional, resultando para a ofendida uma limitação ligeira da mobilidade do punho esquerdo.
13. Quanto à ofendida B... , para além das dores sofridas, apresentava fratura dos ramos púbicos à direita e escoriação do cotovelo.
14. Quando foi submetida a exame médico pericial apresentava “Fenómenos dolorosos: dor ao baixar-se e em sentada em cadeiras baixas.”
15. As lesões descritas pelo CHCB, segundo o relatório pericial, tiveram a sua consolidação em 31-07-2014, e terão determinado 45 dias de afetação da capacidade de trabalho geral e profissional.
16. O arguido agiu com a total falta de cuidado a que era capaz e estava obrigado, pois que conduzia um veículo automóvel na estrada e, por isso, impunha-se-lhe que estivesse com atenção e que adequasse a velocidade a que seguia à estrada, em particular, porque pela frente deparava-se-lhe uma passadeira para travessia de peões, que estava devidamente sinalizada, e por isso, impunha-se que travasse e evitasse o embate.
17. Foi, pois, pela culpa do arguido e pelo desrespeito pelas regras estradais, que o acidente se deu.
18. O arguido sabia que o seu comportamento lhe era proibido e punido por lei penal como crime.
19. O arguido confessou os factos que lhe vinham imputados.
20. O arguido não tem antecedentes criminais.
21. O arguido é solteiro e encontra-se desempregado. Aufere um rendimento de reinserção, no montante líquido mensal de 130,00 euros. Reside em casa própria.
DO PEDIDO DE INDEMNIZAÇÃO CIVEL:
22. Do acidente resultaram para a ofendida B... , fratura da bacia (dos ramos púbicos) e escoriação do cotovelo direito.
23. No dia do acidente, a ofendida B... foi transportada de ambulância para o serviço de urgência do CHCB, onde foi observada, avaliado o seu estado clinico e foram-lhe prestados os primeiros cuidados.
24. A ofendida B... foi aí submetida a exames radiológicos a toda a coluna vertebral, pélvis, cotovelo direito, tomografia computorizada do crânio, colheitas de sangue para análise e ministrada medicação por via oral e intra venosa.
25. A ofendida B... foi sujeita a imobilização, da urgência foi transferida para o serviço de ortopedia do mesmo hospital, onde ficou internada, acamada para repouso e controlo de analgesia, durante 10 dias, tendo saído a 13 de março de 2014, do hospital, direta para sua casa, onde permaneceu em repouso mais 45 dias, impedida de fazer esforços físicos.
26. Durante o período de internamento e nas primeiras semanas em casa, a ofendida B... esteve algaliada, efectuou terapêutica oral, analgésicos, entre outros, nomeadamente uma injecção diária para que o sangue não coagulasse.
27. Teve consultas de seguimento, no dia 16-04-2014, onde voltou a fazer radiografias de fratura dos ramos púbicos.
28. Teve uma consulta em Coimbra no dia 24-04-2014, a fim do médico a observar.
29. Tendo alta na consulta no serviço de ortopedia do CHCB em 31-07-2014, considerando-se a consolidação médico-legal, após 150 dias com afectação da capacidade de trabalho geral e profissional de 45 dias, apresentando ainda nessa data a ofendida B... dores com o movimento de levantar-se e sentar-se.
30. Quer na altura do sinistro, quer subsequentemente durante o período de internamento e já em casa, teve fortes dores físicas, derivadas das lesões sofridas, dos exames e dos tratamentos a que foi submetida, sentiu inquietação e receio quanto à evolução do seu estado de saúde e às sequelas com que ficaria.
31. Frequentando o ensino superior, também ansiosa e preocupada estava com o seu ano lectivo, pois o faltar às aulas significava «chumbar» o ano e não poder iniciar o estágio.
32. Só quando conseguiu contactar uma das professoras, acalmou, momentaneamente, sugerindo-lhe esta que poderia assistir a algumas aulas via Skype e que iria falar com os colegas nesse sentido.
33. Imobilizada, medicamentada, com dores e angustiada, a ofendida B... ia assistindo às aulas, na tentativa de minimizar os danos quanto ao ano lectivo e ao seu estágio; transtornando a turma, pois quando a net ia abaixo, os professores tinham que interromper a aula, até o problema técnico ser resolvido.
34. Em consequência do acidente, a ofendida B... ficou dependente das pessoas que a ajudavam na sua higiene diária, sendo necessário contratar os serviços de apoio domiciliário.
35. Depois de lhe tirarem a algália, sempre que precisava de deslocar-se à casa de banho, a ofendida B... tinha de o fazer inicialmente de andarilho e, posteriormente, de canadianas.
36. A ofendida B... , em virtude do acidente, viveu dias de angústia e de depressão, quer pelo seu sofrimento, quer pelo sofrimento da sua mãe.
37. A ofendida B... sofreu intensas dores físicas quanto à sua evolução e quanto à sua recuperação, em pânico e em choque pelas lesões, internamento sofrido e dificuldades de locomoção de esforço e movimentação.
38. À data do acidente, a ofendida B... tinha 21 anos de idade, e gozava de boa saúde, não apresentado qualquer defeito físico.
39. À data do acidente, a ofendida B... frequentava o 3 º ano de terapia ocupacional na Escola Superior de Saúde em Leiria.
40. A ofendida B... teve de assistir a algumas aulas via Skype, teve de estudar sozinha, acamada, em sofrimento, fazendo um esforço acrescido; ciente de que tivesse frequentado as aulas, as notas seriam superiores às que tirou nos exames.
41. Em consequência das lesões sofridas em virtude do acidente, e porque não estava pronta para esforços físicos, a ofendida B... fez um estágio na Casa de Saúde Rainha Santa Isabel, em Condeixa, casa de saúde especializada em deficiência mental.
42. A ofendida B... ficou, assim, prejudicada no estágio, pois preferia trabalhar com outro tipo de doentes, permitindo-lhe ganhar com outros doentes mais experiencia na sua área, que não ganhou com este estágio.
43. Em consequência do acidente e lesões sofridas, a ofendida B... , que, actualmente, trabalha com crianças, sente dores, porquanto o seu trabalho implica baixar-se à estatura delas ou sentar-se nas suas cadeiras.
44. Em consequência do acidente e lesões sofridas, a ofendida B... , sente, actualmente, dores, com as mudanças de tempo.
45. Em consequência do acidente, a ofendida C... foi transportada de ambulância para o CHCB, tendo sido sujeita a radiografias da coluna cervical e ossos do nariz, úmero, antebraço e punho esquerdo, coxa joelho, tornozelo, pé esquerdo e pélvis e medicação venosa e intra venosa.
46. A ofendida C... apresentava fratura do 1/3 distal d cúbito esquerdo, fratura da falange proximal do halo esquerdo, sendo imobilizada com tala gessada braquipalmar, ficando com o braço ao peito.
47. A ofendida C... teve alta do SU no próprio dia.
48. Com seguimento na consulta externa de ortopedia, onde realizava sempre controlo radiográfico das fraturas, braço e pé, consultas estas em 04-03-2014, 27-03-2014, 10-04-2014, 22-04-2014 (consulta de fisiatria).
49. Com seguimento a 24-04-2014, 29-05-2014 e 26-06-2014 em Coimbra, a fim de ser avaliada pelo médico da ofendida C... .
50. Mais consultas tiveram lugar no serviço de ortopedia da Covilhã, em 15-05-2014, 09-06-2014 e 10-07-2014.
51. O ferimento do joelho de C... teve uma infecção, com necessidade de vigilância apertada e antibioterapia, tendo de se deslocar no dia 04-03-2014 à consulta aberta no Fundão.
52. E, nos dias 05-03- 2014, 07-03-2014, 10-03-2014, 14-03-2014, no centro de saúde do Fundão, a fim de fazer o tratamento e o penso ao joelho.
53. Teve consultas de ortopedia em 21-03-2014, 10-04-2014, 09-06-2014 e 10-07-2014.
54. Iniciou fisioterapia (terapia ocupacional) no dia 05-05-2014 no CHCB até ao dia 18- 07-2014.
55. Apresentando em todas as consultas dores no braço e dores no tornozelo e renitência da infecção da ferida no joelho.
56. A ofendida C... continuou de baixa médica, com incapacidade geral para qualquer trabalho e para o profissional até ao dia 21-07-2014, onde foi declarada a consolidação médico legal depois de 140 dias com afectação da capacidade de trabalho geral e profissional, pese embora ainda apresentasse dores no punho e cotovelo esquerdo, diminuição da força muscular a nível do punho e mão, assim como na tibiotársica.
57. A ofendida C... retomou a sua actividade laboral em 22 de julho de 2014.
58. Tendo a última consulta no serviço de ortopedia de revalidação no dia 29-01-2015, a ofendida C... queixou-se de dor no cotovelo e antebraço esquerdo e no hallux esquerdo.
59. Em consequência do acidente, a ofendida C... sofreu radiações e medicação, dores, angustia, desanimo, depressão e temeu pela sua cura.
60. A ofendida C... temeu, igualmente, pela cura da ofendida B... , sua filha.
61. Sem que pudesse fazer rigorosamente nada devido ao seu estado, nem a podia tratar, nem podia ir às aulas por ela, nem a podia consolar, a ofendida C... entrou num desanimo e depressão tal, que nem para ela própria encontrava força, não conseguindo esconder esse desanimo da filha e de um outro filho que com estas estava, ainda adolescente.
62. A ofendida C... teve de pedir ajuda a terceiras pessoas para a ajudarem a ela também a realizar as actividades diárias, como a higiene e as actividades domésticas, como passar a ferro, limpar e cozinhar.
63. A ofendida C... sempre ficará com uma limitação das mobilidades do punho esquerdo, implicando esforços suplementares para o exercício da sua actividade profissional, uma vez que para o exercício da sua profissão tem de efectuar movimentos repetitivos com ambas as mãos e os pés, o que a frusta e a angustia.
64. O esforço acrescido exercido pela ofendida C... vai-lhe causando dores, incómodo e mal estar, que se agrava ao longo do dia, e que se repete, o que a angustia e frusta.
65. Esforço, dores e incómodo que vão acompanhar a ofendida C... para toda a vida e, inclusive, no âmbito da sua actividade profissional, porque quanto mais dá ao pedal e mexe o braço esquerdo, mais dores sente durante o dia, chegando a ficar com o braço esquerdo dormente ao final do dia.
66. Dores que se exacerbam com as mudanças de tempo e, também, com a osteoporose.
67. A ofendida C... sente-se fragilizada e diminuída nas suas capacidades.
68. A ofendida C... , à data do acidente não padecia de nenhum problema físico.
69. A ofendida C... pagou a taxa moderadora correspondente à consulta de ortopedia no dia 10-07-2014, no montante de 7,75 euros, assim como a taxa moderadora dos meios complementares de diagnóstico, ou seja, radiografias ao antebraço, joelho, tornozelo e dedos do pé, no montante de 4,05 euros, do dia 20-01-2015, que ainda não foram ressarcidos pela demandada D... SEGUROS, SA.
70. A ofendida C... pagou os bilhetes de autocarro e de comboio. Fundão/Covilhã e vice-versa, no montante de 7,65 euros, para se deslocar à consulta de 10-07-2014, que ainda não foram ressarcidos pela demandada D... SEGUROS, SA.
71. A ofendida C... pagou a taxa moderadora da consulta datada de 29-01- 2015, no montante de 7,75 euros, que ainda não foram ressarcidos pela demandada D... SEGUROS, SA.
72. A ofendida C... pagou ao CHCB a nota de débito de 199,40 euros, que ainda não foi ressarcida pela demandada D... SEGUROS, SA.
73. À data do acidente, o proprietário do veículo com a matrícula 34-47-RO tinha transferida a responsabilidade civil por contrato de seguro válido e eficaz para a D... SEGUROS, SA, titulado pela apólice 9001448305.
74. No relatório médico legal realizado foi fixado para a ofendida B... uma incapacidade permanente de 2 pontos, sendo certo que as sequelas são, em termos de repercussão permanente, compatíveis com o exercício da actividade escolar habitual, implicando esforços suplementares.
75. No relatório medico legal realizado foi fixado para a ofendida C... um défice funcional permanente para a integridade físico-psiquica, fixável em 4 pontos, sendo de admitir a existência de um dano futuro.
76. A ofendida C... pagou o transporte para a fisioterapia, num total de 26 kms (ida e volta – Fundão-Covilhã) diários, à Associação Humanitária de Bombeiros Voluntários do Fundão, no montante de 408,00 euros, por um total de 20 viagens».
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II- O Direito
As conclusões formuladas pelo recorrente delimitam o âmbito do recurso.
São apenas as questões suscitadas pelo recorrente e sumariadas nas respectivas conclusões que o tribunal de recurso tem de apreciar, conforme Prof. Germano Marques da Silva, in “Curso de Processo Penal” III, 2.ª Ed., pág. 335 e Ac. do STJ de 19/6/1996, in BMJ n.º 458, pág. 98, sem prejuízo das de conhecimento oficioso, as quais deve conhecer e decidir sempre que os autos reúnam os elementos necessários para tal.

Questões a decidir:
a) Apreciar se deve ser reduzido o quantum indemnizatório atribuído às demandantes C... e B... , respectivamente mãe e filha, a título de dano não patrimonial, por não ser indemnizável o dano indirecto ou reflexo que cada uma delas reciprocamente sofreu em consequência do dano sofrido pela outra demandante.
b) Apreciar se estão verificados os pressupostos para a atribuição de dano futuro relativamente à B... .

Apreciando:
a) Do dano não patrimonial reflexo em consequência do dano da outra demandante.
O tribunal a quo fixou os seguintes danos não patrimoniais:
- À demandante B... , o montante global de 15.000,00€ (quinze mil euros), correspondente aos danos morais sofridos, decorrentes das lesões e transtornos pessoais e profissionais sofridos e “pelos danos sofridos pela sua mãe”.
- À demandante C... , o montante global de 20.000,00€ (vinte mil euros), correspondente aos danos morais sofridos, decorrentes das lesões e transtornos pessoais sofridos e “pelos danos sofridos pela sua filha”.
Justifica a senhora juíza a indemnização deste dano não patrimonial reflexo, que cada uma das demandantes reciprocamente sofreu em consequência do dano da outra demandante, ao abrigo dos art. 471.º, n.º 1 e 496.º, do CC.
Nunca é demais lembrar, quanto ao regime da indemnização por danos não patrimoniais, a redacção do art. 496.º do CC:
«1. Na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.
2 - Por morte da vítima, o direito à indemnização por danos não patrimoniais cabe, em conjunto, ao cônjuge não separado de pessoas e bens e aos filhos ou outros descendentes; na falta destes, aos pais ou outros ascendentes; e, por último, aos irmãos ou sobrinhos que os representem.
3 - Se a vítima vivia em união de facto, o direito de indemnização previsto no número anterior cabe, em primeiro lugar, em conjunto, à pessoa que vivia com ela e aos filhos ou outros descendentes.
4 - O montante da indemnização é fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494.º; no caso de morte, podem ser atendidos não só os danos não patrimoniais sofridos pela vítima, como os sofridos pelas pessoas com direito a indemnização nos termos dos números anteriores». 
A recorrente entende que o montante indemnizatório por danos não patrimoniais de cada uma das demandantes deve ser reduzido, por, em seu entender, não ser indemnizável o dano moral reflexo de cada uma das lesadas, sustentando que tal só poderá ocorrer quando sobrevier a morte ou no caso de ser admissível, os danos que cada uma das demandantes sofreu em consequência das lesões, não são de tal modo graves que justifiquem a sua contemplação no art. 496.º, do CC.
A questão suscitada pela recorrente é pertinente e tem vindo a ser amplamente discutida tanto na doutrina como na jurisprudência, que têm evoluído numa interpretação mais actualista do art. 496.º, do CC.
Porém, não apresenta a questão nos termos em que vem sendo discutida, antes seguindo a interpretação da sua conveniência que melhor serve os interesses da demandada.
Enquanto demandada segue a tese clássica, defendendo que apenas são indemnizáveis os danos não patrimoniais próprios do demandante, por danos não patrimoniais, em caso de lesão, no caso de sobrevir morte da vítima, conforme resulta da leitura literal que esta corrente doutrinal e jurisprudencial fazem do texto do art. 496.º, n.º 2, e 4, do CC.
Há quem defenda que são indemnizáveis todos os direitos desde que mereçam a tutela do direito.
A posição que nos parece mais adequada é que, para além dos casos de que sobreveio a morte, só devem ser indemnizáveis os danos reflexos de terceiros em consequências de lesão da vítima, que se revelem graves.
Antes de mais, adiantamos desde já que nos parece ser hoje esta a interpretação mais adequada às realidades da vida, como aliás se tem vindo a evoluir tanto na doutrina como na jurisprudência.
Há danos próprios reflexos na esfera jurídica dos familiares da vítima, cuja indemnização se justifica, em caso de lesão, mesmo que não tenha sobrevindo a morte.
O Conselheiro Joaquim Sousa Dinis, no tema “Dano Corporal em Acidente de Viação”, publicado in CJ – STJ, Ano XIX, T.1, pág. 6 a 12, aborda um caso específico de acidente de viação em que o lesado ficou paraplégico e impotente, defendendo a possibilidade da mulher do lesado ter direito a uma indemnização por danos não patrimoniais pela impotência do marido, não com fundamento no art. 496.º n.º 2, do CC que pressupõe a morte do marido, mas encarando a sexualidade como um direito de personalidade.
Por sua vez o Conselheiro Abrantes Geraldes, in Temas da Responsabilidade Civil, II Vol. – Indemnização dos danos reflexos, pág. 75, 88 e 89 estuda também esta questão e conclui que o direito de indemnização deve assentar directa e prioritariamente na interpretação dos arts. 483.º e 496.º n.º 1, do CC, podendo ser reconhecidas
Há situações que configuram um dano não patrimonial por lesão do relacionamento familiar, designadamente as lesões graves e incapacitantes que, causando a perda total ou grave redução da autonomia de uma pessoa, determinem a necessidade de intervenção supletiva de familiares do círculo mais próximo do lesado, ou as lesões graves de um filho que determinem para os pais não só um encargo acentuado, como um desgosto e sofrimento intensos.
Neste sentido escreve o Conselheiro Abrantes Geraldes, in Temas da Responsabilidade Civil, II Vol. – Indemnização dos danos reflexos, pág. 75, 88 e 89, o qual estuda também esta questão e conclui que o direito de indemnização deve assentar directa e prioritariamente na interpretação dos arts. 483.º e 496.º n.º 1, do CC, podendo justificar-se conforme a gravidade do caso concreto.
Por vezes, existem situações de lesões graves que se repercutem nos familiares da vítima de forma tanto ou mais acentuada quanto as situações de morte.
É concretamente o caso de lesões que geram nos familiares, ligados à vítima por fortes laços afectivos, estados de intranquilidade, de angústia, de desespero e sofrimento ou que provocam grave perturbação no seu modo de vida, para prestarem cuidados ao incapacitado, muitas vezes com necessidade de assistência permanente.
Na doutrina são dados como exemplo de forma recorrente os casos de lesões corporais graves em menores, em que é patente o enorme desgosto e sofrimento dos pais, que para além da dor têm de enfrentar situações de absoluta dependência funcional em que podem ficar as vítimas, com a consequente mudança radical que isso pode implicar na vida dos pais.
Outra situação, que vendo sendo pacífica nos nossos tribunais são os casos frequentes de situações de lesões graves sofridas por um dos cônjuges, que por vezes se reflectem no relacionamento sexual, seja em casos de impotência ou de perda de apetência sexual.
Aparentemente, numa interpretação literal, seríamos levados a concluir que o art. 496.º, do CC, obstaria a tal.
Os danos não patrimoniais sofridos pelos familiares da vítima, como consequência desta sofrer lesões graves podem e devem ser ressarcidos.
A doutrina que segue esta posição uma interpretação mais actualista do art. 496.º, do CC na fundamentação apoia-se na necessidade de dar cobertura a valores que lhe estão subjacentes, ligados à pessoa e à família, com tutela constitucional.
A recorrente sustenta que apenas são indemnizáveis os danos reflexos ou indirectos causados a terceiros em caso de morte da vítima.
Escreve concretamente:
«Da redacção deste artigo é claro que os danos morais indemnizáveis são aqueles que são sofridos pelos lesados, e só em casos excepcionais é que se admite a atribuição de uma indemnização pelos danos morais sofridos em consequência da lesão de um terceiro, sendo esse caso excepcional a morte do lesado».
Indica neste sentido o Ac. do STJ de 17/09/2009, in www.dgsi.pt, do qual transcreve o sumário que é do seguinte teor:
 «I. Em matéria de responsabilidade extracontratual, em princípio, apenas são indemnizáveis os danos sofridos pelo lesado, ou seja, o titular do direito violado ou do interesse protegido pela disposição legal violada. II. Apenas nos casos excepcionais previstos nos arts. 495.° e 496.º, n.º 2 do Cód. Civil, a lei admite o ressarcimento dos danos indirectos provocados a terceiros».
Esta é a interpretação mais clássica do art. 496.º, relativamente aos danos não patrimoniais, já que os danos patrimoniais causados a terceiros do art. 495.º não suscitam controvérsia. 
Os tribunais superiores têm vindo a comtemplar os danos reflexos ou indirectos causados a terceiros, no caso de advirem sequelas graves para a vítima, em consequência da lesão, mesmo que da mesma não tenha sobrevindo a morte.
E na esteira dos valores que têm protecção jurídica na lei geral e consagrados constitucionalmente, no seguimento da posição defendida pelos Ex.mos Conselheiros Joaquim Sousa Dinis e Abrantes Geraldes, nos estudos acima mencionados, se pronunciou o Ac. do STJ de 08/09/2009, in www.dgsi.pt, que deixa uma posição clara quanto á susceptibilidade de serem indemnizáveis os danos morais directos ou reflexos causados a terceiros, que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito, tenha o facto lesivo causado ou não a morte da vítima, cujo sumário é do seguinte teor:
»I. São indemnizáveis os danos morais directos ou reflexos que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito, tenha o facto lesivo causado ou não a morte da vítima (art. 496.º do CC).
II. São concretamente ressarcíveis os danos morais sofridos pelo autor em consequência do acidente de viação que vitimou a autora, sua mulher, e do qual resultaram para esta lesões e sequelas várias que comprometem gravemente os direitos de coabitação (no qual se inclui o débito conjugal), cooperação e assistência de que o autor é titular enquanto membro da sociedade conjugal formada com a autora.
III. Nesta perspectiva, tais danos são directos, e não reflexos ou causados a terceiros, na medida em que atingem concomitantemente ambos os autores, enquanto pessoas casadas entre si».
Sobre esta questão, a propósito dos danos indirectos ou reflexos de um dos cônjuges se pronunciou o Ac. de Uniformização de Jurisprudência do STJ de 16/01/2014 – Proc. 6430/07.0TBBGG.S1, do qual é relator o Conselheiro João Bernardo, publicado no DR I Série n.º 98 de 22/05/2014, aprovado com vários votos de vencido, o que traduz a controvérsia que tem suscitado a interpretação do art. 496.º, do CC, tendo fixado jurisprudência no sentido de que os artigos 483.º, n.º1 e 496.º, n.º 1 do CC devem ser interpretados no sentido de abrangerem os danos não patrimoniais, particularmente graves, sofridos por cônjuge de vítima sobrevivente, atingida de modo particularmente grave.
Concluímos assim que o art. 496.º, n.º 1, do CC admite a interpretação de que os danos sofridos pelos familiares ou pessoas ligadas afectivamente à vítima, em consequência de grave lesão de que esta foi alvo são indemnizáveis desde que a “sua gravidade, mereçam a tutela do direito”.
Não ignoramos a discussão tanto na jurisprudência, como na doutrina sobre a dogmática da natureza dos danos em discussão, isto é, se são directos ou indirectos, reflexos ou causados a terceiros.
Independentemente da sua classificação, sem termos uma posição firmada, parece-nos que o facto de o dano ser próprio do familiar ou pessoa ligada à vítima por razões de afectividade, e nesta perspectiva é directo, porque surgiu na sua esfera jurídica, tal não obstará, para uma melhor diferenciação na conceitualização que seja classificado como um dano reflexo, no sentido de que resultou em consequência da ofensa ou lesão do direito da vítima, ou como se pode ver na doutrina brasileira de um dano de “ricochete”.
Porém, como é óbvio a ressarcibilidade deste dano não pode ser nos mesmos termos do dano da vítima, pois que se trata de um dado próprio e baseado em pressupostos diferentes.
O grau de exigência, quanto à sua ressarcibilidade tem de ser necessariamente mais exigente, relativamente ao dano causado à vítima, sob pena de, sempre que a vítima sofresse uma lesão, haveria um dano sofrido pelos familiares ou pessoas referidas no art. 496.º, do CC.
Vejamos os factos dados como provados para cada uma das ofendidas (filha e mãe) susceptíveis de contribuírem para a ocorrência de danos de natureza não patrimonial, quer directamente pelas lesões por cada uma sofridas, quer reflexamente em consequência das lesões que a outra sofreu.
Importa saber as lesões que directamente cada uma delas sofreu, para depois podermos saber da susceptibilidade de serem indemnizáveis os danos não patrimoniais que cada uma delas sofreu como reflexo das lesões que a outra reciprocamente sofreu.
No âmbito do recurso apenas estes danos se discutem.
Da matéria de facto constam os seguintes danos não patrimoniais:
B... :
Internada até ao dia 13 de março de 2014.
Para além das dores sofridas, apresentava fratura dos ramos púbicos à direita e escoriação do cotovelo.
Submetida a exame médico pericial apresentava “Fenómenos dolorosos: dor ao baixar-se e em sentada em cadeiras baixas.”
As lesões descritas pelo CHCB, segundo o relatório pericial, tiveram a sua consolidação em 31-07-2014, e terão determinado 45 dias de afetação da capacidade de trabalho geral e profissional.
Sofreu fratura da bacia (dos ramos púbicos) e escoriação do cotovelo direito.
Foi sujeita a imobilização, da urgência foi transferida para o serviço de ortopedia do mesmo hospital, onde ficou internada, acamada para repouso e controlo de analgesia, durante 10 dias, tendo saído a 13 de março de 2014, do hospital, direta para sua casa, onde permaneceu em repouso mais 45 dias, impedida de fazer esforços físicos.
Durante o período de internamento e nas primeiras semanas em casa, a ofendida B... esteve algaliada, efectuou terapêutica oral, analgésicos, entre outros, nomeadamente uma injecção diária para que o sangue não coagulasse.
Teve alta na consulta no serviço de ortopedia do CHCB em 31-07-2014, considerando-se a consolidação médico-legal, após 150 dias com afectação da capacidade de trabalho geral e profissional de 45 dias, apresentando ainda nessa data a ofendida B... dores com o movimento de levantar-se e sentar-se.
Quer na altura do sinistro, quer subsequentemente durante o período de internamento e já em casa, teve fortes dores físicas, derivadas das lesões sofridas, dos exames e dos tratamentos a que foi submetida, sentiu inquietação e receio quanto à evolução do seu estado de saúde e às sequelas com que ficaria.
Ficou dependente das pessoas que a ajudavam na sua higiene diária, sendo necessário contratar os serviços de apoio domiciliário.
Depois de lhe tirarem a algália, sempre que precisava de deslocar-se à casa de banho tinha de o fazer inicialmente de andarilho e, posteriormente, de canadianas.
Viveu dias de angústia e de depressão, quer pelo seu sofrimento, quer pelo sofrimento da sua mãe.
Sofreu intensas dores físicas quanto à sua evolução e quanto à sua recuperação, em pânico e em choque pelas lesões, internamento sofrido e dificuldades de locomoção de esforço e movimentação.
Ficou prejudicada no estágio, pois preferia trabalhar com outro tipo de doentes, permitindo-lhe ganhar com outros doentes mais experiencia na sua área, que não ganhou com este estágio.
Trabalhando actualmente com crianças, sente dores, porquanto o seu trabalho implica baixar-se à estatura delas ou sentar-se nas suas cadeiras.
Sente, actualmente, dores, com as mudanças de tempo.
No relatório medica legal realizado foi fixado para a ofendida B... uma incapacidade permanente de 2 pontos, sendo certo que as sequelas são, em termos de repercussão permanente, compatíveis com o exercício da actividade escolar habitual, implicando esforços suplementares.
C... :
Para além das dores sofridas, sofreu fratura do 1/3 distal do cúbito esquerda mais sequela de fratura de hallux pé esquerdo associada a entorse da tibiotársica Edema nasal.
Submetida a exame médico pericial apresentava “Fenómenos dolorosos no punho esquerdo e cotovelo esquerdo” e “ Membro superior esquerdo: limitação ligeira das mobilidades do punho esquerdo”.
Tais lesões foram consolidadas em 21-07-2014, e terão determinado 140 dias com afetação da capacidade de trabalho geral e profissional, resultando para a ofendida uma limitação ligeira da mobilidade do punho esquerdo.
Foi transportada de ambulância para o CHCB, tendo sido sujeita a radiografias da coluna cervical e ossos do nariz, úmero, antebraço e punho esquerdo, coxa joelho, tornozelo, pé esquerdo e pélvis e medicação venosa e intra venosa.
Apresentava fratura do 1/3 distal do cúbito esquerdo, fratura da falange proximal do halo esquerdo, sendo imobilizada com tala gessada braquipalmar, ficando com o braço ao peito.
Teve alta do SU no próprio dia, com seguimento na consulta externa de ortopedia, onde realizava sempre controlo radiográfico das fraturas, braço e pé, tendo várias consultas em Coimbra e na Covilhã.
O ferimento do joelho teve uma infecção, com necessidade de vigilância apertada e antibioterapia, tendo de se deslocar a consulta aberta e depois mais quatro consultas no centro de saúde do Fundão, a fim de fazer o tratamento e o penso ao joelho.
Teve quatro consultas de ortopedia.
Iniciou fisioterapia no dia 05-05-2014 no CHCB, que se prolongou até ao dia 18- 07-2014.
Nas consultas apresentava dores no braço e dores no tornozelo e renitência da infecção da ferida no joelho.
Continuou de baixa médica, com incapacidade geral para qualquer trabalho e para o profissional até ao dia 21-07-2014, onde foi declarada a consolidação médico legal depois de 140 dias com afectação da capacidade de trabalho geral e profissional, pese embora ainda apresentasse dores no punho e cotovelo esquerdo, diminuição da força muscular a nível do punho e mão, assim como na tibiotársica.
Retomou a sua actividade laboral em 22 de julho de 2014 .
Teve a última consulta de ortopedia de revalidação no dia 29-01-2015, queixando-se de dor no cotovelo e antebraço esquerdo e no hallux esquerdo.
Sofreu radiações e medicação, dores, angustia, desanimo, depressão e temeu pela sua cura.
Temeu pela cura da ofendida B... , sua filha.
Entrou num desânimo e depressão tal, que nem para ela própria encontrava força, não conseguindo esconder esse desânimo da filha e de um outro filho que com estas estava, ainda adolescente.
Teve de pedir ajuda a terceiras pessoas para a ajudarem a ela também a realizar as actividades diárias, como a higiene e as actividades domésticas, como passar a ferro, limpar e cozinhar.
Ficará com uma limitação das mobilidades do punho esquerdo, implicando esforços suplementares para o exercício da sua actividade profissional, uma vez que para o exercício da sua profissão tem de efectuar movimentos repetitivos com ambas as mãos e os pés, o que a frusta e a angustia.
O esforço acrescido vai-lhe causando dores, incómodo e mal estar, que se agrava ao longo do dia, e que se repete, o que a angustia e frusta.
O esforço, dores e incómodo vão acompanhar a ofendida para toda a vida e, inclusive, no âmbito da sua actividade profissional, porque quanto mais dá ao pedal e mexe o braço esquerdo, mais dores sente durante o dia, chegando a ficar com o braço esquerdo dormente ao final do dia.
As dores exacerbam-se com as mudanças de tempo e, também, com a osteoporose.
Sente-se fragilizada e diminuída nas suas capacidades.
À data do acidente não padecia de nenhum problema físico.
 No relatório medico legal realizado foi fixado um défice funcional permanente para a integridade físico-psiquica, fixável em 4 pontos, sendo de admitir a existência de um dano futuro.
*
Relativamente à ofendida B... , o tribunal a quo apenas deu como provado que a mesma ”viveu dias de angustia e de depressão, quer pelo seu sofrimento, quer pelo sofrimento da sua mãe”.
Relativamente à ofendida C... , o tribunal a quo apenas deu como provado o seguinte:
“Temeu pela cura da ofendida B... , sua filha.
Entrou num desanimo e depressão tal, que nem para ela própria encontrava força, não conseguindo esconder esse desanimo da filha e de um outro filho que com estas estava, ainda adolescente”.
As situações são situações normalíssimas da vida, pois os pais e filhos são normalmente afectados, sofrendo as dores e angústias uns dos outros.
Mas para que sejam indemnizáveis os danos morais reflexos, não basta qualquer lesão, pois só são comtemplados, como acima deixámos exposto, em casos excepcionais e esses caos excepcionais são para além da morte, apenas as lesões graves da vítima que afectem o familiar e se traduzam para este um grave sofrimento moral ou prejuízo, como sejam casos em que a vítima ficou sexualmente impotente, o que se traduz para o cônjuge um dano evidente.
O mesmo se diga do caso em que o filho menor que era escorreito e estudante brilhante, com um futuro promissor à sua frente, ter ficado incapacitado, necessitando de terceiros para sobreviver e satisfazer fazer as necessidades do dia a dia, reflectindo-se num dano não patrimonial intenso para os pais, que se traduz no sofrimento permanente que a situação do filho representa para eles.
Não é manifestamente o caso dos autos.
Ora, não sendo de comtemplar tais danos indirectos ou reflexos alegados pelas demandantes, não os podemos quantificar, para que o montante a eles atribuído seja diminuído a cada uma delas.
Porém, podemos lá chegar por outra via que é apreciar se os danos não patronímias indemnizáveis estão fixados de acordo com os critérios apontados nos art. 494.º e 496.º, n.º 1 e 4, do CC.
A responsabilidade civil emergente de crime é regulada pela lei civil (art. 129.º, do CP).
Dispõe do artigo 483º, n.º 1 do Código Civil:
«Aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação».
A indemnização que se pretende ver efectivada nos autos emerge de crime contra a personalidade das ofendidas, isto é, contra a sua integridade física, as quais beneficiam de protecção legal contra qualquer ofensa ilícita ou ameaça de ofensa à sua personalidade física ou moral, fundada na responsabilidade subjectiva do arguido e sobre a demandada, independentemente de culpa, por via do contrato de seguro celebrado, nos termos dos art. 70.º, do CC.
Nos termos do art. 496.º, n.º 1, do Cód. Civil, na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.
“A gravidade do dano há-de medir-se por um padrão objectivo (conquanto a apreciação deva ter em linha de conta as circunstâncias de cada caso), e não à luz de factores subjectivos (de uma sensibilidade particularmente embotada ou especialmente requintada); por outro lado, a gravidade apreciar-se-á em função da tutela do direito: o dano deve ser de tal modo grave que justifique a concessão de uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado” - Prof. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, vol. I, 2.ª Edição, pág. 486 e 489.
Não há fórmulas concretas ou tabelas para de uma forma matemática se determinar o “quantum” indemnizatório.
Aliás a própria natureza dos danos não se quadunam com tais critérios, o que se conclui de uma simples leitura dos art. 496, n.º 4 e 494.º, do Cód. Civil.
No primeiro preceito acabado de citar, consagra-se que o montante da indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias relevantes do caso concreto.
O facto de se tratar de um julgamento de equidade não impede que se deva atender à justa medida da gravidade do dano, devendo ter-se em conta na sua fixação todas as regras que o juiz deve seguir, com motivação adequada, o processo lógico através do qual chegou à liquidação equitativa do dano.
As ofendidas, como resulta da matéria de facto provada, sofreram danos não patrimoniais, em consequência das lesões de que foram vítimas, que se traduziram no sofrimento, dores e angústias quer no momento do acidente, quer com os tratamentos médicos e outros cuidados a que foram submetidas e que acima sinteticamente se descrevem para cada uma delas.
No caso dos autos deve atender-se em concreto à gravidade da conduta do arguido ao atropelar as ofendidas em plena passadeira; às graves consequências dos danos causados; à condição económica da demanda seguradora; à idade e à condição social e económica das demandantes.
Foram variáveis que teremos em consideração que ponderando a não contemplação dos danos indirectos ou reflexos por cada uma das demandantes, na observância dos critérios apontados pelos art. 496.º, n.º 1 e 4 e 494.º, do CC, justifica-se a redução da indemnização, a título de danos não patrimoniais que se fixam respectivamente para a demandante B... em 14.000,00€ (catorze mil euros) e para a demandante C... em 19.000,00€ (dezanove mil euros).
*
b) Da atribuição de dano futuro à demandante B... .
O tribunal condenou a demandada D... SEGUROS, SA a pagar às ofendidas B... e C... a quantia que vier a liquidar-se em execução de sentença - cfr. arts. 564.º, n.º 2, do C. Civil e 609.º, n.º 2, do CPC -, eventualmente a instaurar, pelos danos patrimoniais, designadamente medicação, exames, terapias, eventuais cirurgias e tratamentos decorrentes das sequelas descritas nos relatórios periciais de fls. 258 a 261 e 266 a 269, e dores, angústias e ansiedades dai decorrentes.
No entender da recorrente não ficou demonstrado que a demandante B... venha a sofrer um agravamento das suas lesões, pelo que não é possível considerar a existência de um dano futuro indemnizável relativamente a esta, disposto no artigo 564.º, n.º 2 do Código Civil.
Neste conformidade sustenta que não pode a demandada ser condenada a liquidar à demandante B... a quantia que se vier a liquidar em execução de sentença pelos danos futuros patrimoniais e não patrimoniais que esta venha a sofrer.
Vejamos o que consta da matéria de facto relativamente a danos futuros das demandantes:
« (…)
74. No relatório medico legal realizado foi fixado para a ofendida B... uma incapacidade permanente de 2 pontos, sendo certo que as sequelas são, em termos de repercussão permanente, compatíveis com o exercício da actividade escolar habitual, implicando esforços suplementares.
75. No relatório medico legal realizado foi fixado para a ofendida C... um défice funcional permanente para a integridade físico-psiquica, fixável em 4 pontos, sendo de admitir a existência de um dano futuro»
informa o art. 564.º, n.º 2, do CC:
«Na fixação da indemnização pode o tribunal atender aos danos futuros, desde que sejam previsíveis; se não forem determináveis, a fixação da indemnização correspondente será remetida para decisão ulterior».
O tribunal não é coerente com o que decidiu, pois apenas se admite o dano futuro relativamente à demandante C... , e, no entanto, condena a demandada nos mesmos termos relativamente aos danos futuros não determináveis relativamente à duas demandantes, quando expressamente diz;
«…a quantia que vier a liquidar-se em execução de sentença - cfr. arts. 564.º, n.º 2, do C. Civil e 661.º, n.º 2, do CPC -, eventualmente a instaurar, pelos danos patrimoniais, designadamente medicação, exames, terapias, eventuais cirurgias e tratamentos decorrentes das sequelas descritas nos relatórios periciais de fls. 258 a 261 e 266 a 269, e dores, angústias e ansiedades dai decorrentes».
Em primeira observação diremos que os relatórios periciais de fls. 258 a 261 e 266 a 269 não confirmam o agravamento das sequelas relativamente às duas demandantes com o decurso das suas vidas e à medida que a idade vai passando.
Admite-se o dano futuro relativamente à demandante C... , muito embora não tenhamos por adequada a fórmula pouco rigorosa usada pela senhora juíza (facto 75 provado) quando diz que no relatório medico legal foi fixado um défice funcional permanente para a integridade físico-psíquica, fixável em 4 pontos para esta ofendida, sendo “sendo de admitir a existência de um dano futuro”.
A matéria de facto devia ser mais rigorosa e precisa quanto à caracterização do dano futuro e não limitar-se praticamente a remeter para o exame médico-legal, sendo que este é um meio de prova e como tal deve extrair deles os elementos que importa fixar na matéria de facto dada como provada.
Porém, relativamente à demandante B... não estão reunidos os pressupostos para relativamente a ela condenar a demanda em dano futuro, a liquidar em execução de sentença.
Relativamente a esta ofendida o tribunal a quo apenas deu como provado (facto 74 provado) que no relatório medico legal realizado foi fixado para esta ofendida uma incapacidade permanente de 2 pontos, sendo as sequelas, em termos de repercussão permanente, compatíveis com o exercício da actividade escolar habitual, implicando esforços suplementares.
O dano futuro é previsível quando se pode prognosticar, conjecturar com antecipação ao tempo em que acontecerá, a sua ocorrência. No caso contrário, isto é, quando o homem medianamente prudente e avisado o não prognostica, o dano é imprevisível.
Ora, não se deu como provado que a demandante B... venha a sofrer um agravamento das suas lesões, pressuposto para se condenar o obrigado na indemnização de um dano previsível, isto é, que se sabe que vai ocorrer, embora não se possa determinar e quantificar à data da sentença.
Por isso, relativamente a esta ofendida não se mostram reunidos os pressupostos para condenar a demandada D... Seguros, SA, ao abrigo dos art. 564.º, n.º 2, do CC e 609.º, n.º 2, do CPC, à demandante B... a quantia que vier a liquidar-se em execução de sentença, eventualmente a instaurar, pelos danos patrimoniais, designadamente medicação, exames, terapias, eventuais cirurgias e tratamentos decorrentes.
*
III- Decisão:
Pelos fundamentos expostos, acordam os juízes da 4.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra, conceder provimento ao recurso interposto pela demandada D... Seguros, SA, e, em consequência revogando parcialmente a sentença recorrida, decidem:
a) Reduzir os danos não patrimoniais  em que foi condenada, por inexistirem danos indirectos ou reflexos e que por via disso se fixam estes danos respectivamente para a demandante B... em 14.000,00€ (catorze mil euros) e para a demandante C... em 19.000,00€ (dezanove mil euros).
b) Absolver a demandada do dano futuro em que foi condenada a pagar à ofendida B... , em quantia a liquidar em execução de sentença, eventualmente a instaurar, pelos danos patrimoniais, designadamente medicação, exames, terapias, eventuais cirurgias e tratamentos decorrentes das sequelas descritas nos relatórios periciais de fls. 258 a 261 e 266 a 269, e dores, angústias e ansiedades dai decorrentes.
*
Sem custas.
                                                               *
NB: Certifica-se que o acórdão foi elaborado pelo relator e revisto pelos seus signatários, nos termos do art. 94.º, n.º 2 do CPP. 
Coimbra, 13 de Julho de 2016
(Inácio Monteiro - Relator)
(Alice Santos - Adjunta)