Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
768/08.6TBAVR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: TELES PEREIRA
Descritores: CLÁUSULA CONTRATUAL GERAL
DECLARAÇÃO
INCUMPRIMENTO
INTERESSE PROTEGIDO
Data do Acordão: 07/14/2010
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DO BAIXO VOUGA – JUÍZO DE GRANDE INSTÂNCIA CÍVEL DE AVEIRO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: DEC.LEI Nº 446/85, DE 25/09;
Sumário: I – A indicação numa factura de que um desconto aí incluído pressupõe o pagamento até ao limite do prazo de vencimento nela indicado, refere-se à fixação do preço do bem vendido, integrando tal elemento o domínio da liberdade de estipulação do vendedor ao qual o comprador dá o seu acordo, com o próprio acto de contratar pelo preço assim facturado.

II – Subtrai-se esta estipulação do preço, expressa na factura, ao domínio de incidência das “Cláusulas Contratuais Gerais” decorrente do regime constante do Dec. Lei nº 446/85, de 25/09.

III – Paralelamente, a circunstância de estarem envolvidas nesse negócio empresas cuja natureza é substancialmente idêntica no quadro de um mercado normalmente concorrencial, afasta a presença da teleologia protectiva da liberdade contratual, que justifica a autonomização do instituto das “Cláusulas Contratuais Gerais”, não fornecendo este, assim, um modelo decisório para a ponderação das cláusulas estabelecidas na contratação entre estas empresas.

IV – De qualquer forma, a inclusão numa factura da indicação referida em I, sempre traduz uma forma adequada de informação e de comunicação ao destinatário do elemento contratual implicado com essa indicação.

V – Uma declaração inequívoca do devedor, próxima da vencimento da sua obrigação e suscitada por uma interpretação do credor, de que “anula a encomenda” efectuada a este, consubstancia uma declaração definitiva de incumprimento e, tratando-se de prazo estabelecido em benefício do devedor, opera esta o vencimento imediato dessa obrigação.

VI – O incumprimento definitivo, não ocorrendo uma relevante resolução do contrato, gera a obrigação de indemnizar por todos os prejuízos decorrentes desse incumprimento, refiram-se eles ao que se qualifica como “interesse contratual negativo” ou ao que se qualifica como “interesse contratual positivo”, expresso este nos chamados “lucros cessantes”.

VII – Mesmo ocorrendo resolução, a lei não exclui a consideração indemnizatória cumulativa de danos expressos num interesse contratual negativo e positivo, desde que estes (e isso vale com ou sem resolução) não traduzam uma duplicação indemnizatória.

Decisão Texto Integral:

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra

I – A Causa


            1. Em Fevereiro de 2008[1], a empresa A..., Lda. (A. e Apelada relativamente ao presente recurso) demandou a sociedade B..., Lda. (R. e aqui Apelante), invocando uma encomenda por esta realizada, em Fevereiro de 2007, de 78 cabines de hidromassagem a fornecer até ao final desse ano. A R. não só não procedeu ao pagamento de uma cabine que efectivamente lhe foi entregue desde logo (em 06/03/2007)[2], destinada a um “andar modelo”, como, contactada em Novembro de 2007 pela A., para indicar a data e o local de entrega das restantes cabines, dirigiu a esta a comunicação de fls. 11, informando-a da “anulação” dessa mesma encomenda [3].

Porque a A. já havia recebido e pago ao fabricante 30 dessas cabines, cuja devolução este não aceitou, ficou a A. prejudicada no valor dessas (30) cabines (que mantém em armazém), sendo que com a frustração do negócio referente às restantes 47 cabines, deixou a A. de auferir a margem de lucro que obteria com essa venda, ou seja, através do exacto cumprimento do contrato[4].

            1.1. A R. contestou negando os termos do acordo caracterizados pela A.: ter-se-ia, segundo diz, limitado a receber uma cabine para exposição e eventual aceitação dos seus clientes (compradores dos andares por ela comercializados), o que não aconteceu, sendo esta a razão do cancelamento da encomenda através do fax de fls. 11. A isto acresce a circunstância da A. ter aceite – defende a R. na contestação –, designadamente ao não proceder à entrega da mercadoria no final de 2007, o cancelamento ou resolução do contrato.

            1.2. Findo o julgamento, fixados que foram os factos provados por referência à base instrutória (fls. 139/140 vº), proferiu o Tribunal a Sentença de fls. 142/152 – esta constitui a decisão objecto do presente recurso –, julgando a acção nos seguintes termos:


“[…]
[C]ondena-se a R. a:
a) pagar à A. a quantia de €2.061,84, acrescida de juros de mora, vencidos e vincendos, calculados às taxas supletivas aplicáveis aos créditos das empresas comerciais sucessivamente em vigor desde as datas de vencimento da factura e nota de débito até integral pagamento;
b) receber as 30 cabines de hidromassagem «New Holliday ASO Thermostatic» encomendadas que a A. ainda tem na sua posse e a pagar-lhe o preço das mesmas, no montante global de €35.875,29;
c) pagar à A. a quantia de €5.606,16, a título de lucros cessantes, relativamente às restantes 47 cabines encomendadas.
[…]”
            [transcrição de fls. 152]

            1.3. Inconformada, interpôs a R. o presente recurso, motivando-o a fls. 155/167, formulando a rematar tal motivação as conclusões que aqui se transcrevem:


“[…………………………………………]
            [transcrição de fls. 163/167]

            A A./Apelada respondeu ao recurso a fls. 173/177, pugnando pela integral confirmação da Sentença.

            Relatada que está a marcha do processo até à presente instância, cumpre apreciar os fundamentos da apelação.


II – Fundamentação


            2. Conhecendo do objecto desta, ter-se-á presente que o respectivo âmbito objectivo foi delimitado pela Apelante através das conclusões que formulou, a cuja transcrição procedemos no antecedente item [vale a tal respeito o teor dos artigos 684º, nº 3 e 685º-A, nº 1, ambos do Código de Processo Civil (CPC)]. Constata-se, assim, apreciando essas conclusões, que os factos provados, os elencados na Sentença como tal, são aceites pela Apelante, dirigindo-se a crítica desta, exclusivamente, às asserções jurídicas que determinaram a respectiva condenação por incumprimento do contrato celebrado com a empresa aqui A.

            Assim, estando definitivamente fixado o acervo fáctico que emerge do julgamento da acção, e constituindo ele a base de trabalho que se oferece a este recurso, aqui transcrevemos esse elenco, nos exactos termos em que a Sentença apelada o enunciou no respectivo texto, combinando as respostas à base instrutória com os factos anteriormente assentes:


“[…………………………………………..]
            [transcrição de fls. 145/146]

            2.1. Estrutura-se o recurso – como dissemos, nos termos delimitados pelas conclusões – em torno de um primeiro argumento (conclusões 1. a 3.) dirigido à questão do incumprimento do contrato, entendendo a Apelante que determinados segmentos dos factos (concretamente os constantes dos pontos 6. e 11. do elenco acima transcrito) expressam um elemento patológico da relação contratual entre a A. e a R. correspondente, tão-só, ao incumprimento pela A. desse contrato, através da falta de entrega por esta, no prazo convencionado, das 77 cabines encomendadas[5]. A questão do incumprimento do contrato (rectius, a questão de quem incumpriu o contrato) posiciona-se, assim, como um dos fundamentos do recurso a tratar na subsequente exposição, importando controlar a asserção da Sentença de que existiu incumprimento por banda da R.

            Noutra vertente argumentativa expressa nas conclusões (conclusões 4. a 9. e 10. a 13.), desta feita aceitando que alguma responsabilidade indemnizatória lhe seja assacável quanto à frustração do contrato, discute a Apelante a compatibilidade dos itens indemnizatórios fixados na Sentença (pagamento pela R. das 30 cabines com a respectiva entrega, mais o pagamento pela R. do lucro que a A. obteria com a venda das restantes 47 cabines). Pressupondo – pressupõe-no a Apelante no recurso – a aceitação pela A./Apelada do cancelamento ou resolução do contrato pela R., haveria lugar – e estamos só a caracterizar os argumentos da R./Apelante, parafraseando afirmações suas no recurso –, haveria lugar, dizíamos, segundo a R., apenas, à satisfação de um “interesse contratual negativo”[6], e não ao pagamento de lucros cessantes (interesse contratual positivo), por incompatibilidade destes com o que a Apelante qualifica como aceitação da “resolução ou cancelamento” do contrato[7]. A questão da natureza e compatibilidade das indemnizações devidas à A. pela frustração do contrato, posiciona-se, assim, como outra das questões a tratar no presente recurso.

            Finalmente, como terceira vertente argumentativa da apelação (conclusões 14. a 17.), discute a Apelante se a cláusula de supressão do desconto inserida na factura de fls. 8, para a hipótese de não pagamento no vencimento da factura, constitui uma “cláusula contratual geral” não regularmente comunicada à R. Esta possível natureza – de “cláusula contratual geral” – dessa previsão de exclusão do desconto na factura que acompanhava a (única) cabine fornecida, constitui, enfim, o derradeiro fundamento do recurso.

            Importa, pois, apreciar estes três fundamentos da apelação, esclarecendo, preliminarmente, aliás secundando o correcto entendimento expresso na Sentença quanto à natureza do contrato celebrado entre a A. e a R., corresponder este a uma compra e venda mercantil bilateral (no sentido de assumir natureza comercial tanto para o vendedor como para o comprador)[8]. Estamos, pois, perante uma venda pela A. à R. (para ulterior comercialização por esta, após incorporação em fracções prediais por ela comercializadas a terceiros) de 78 cabines de hidromassagem, com a entrega imediata de uma delas destinada a um andar modelo e o fornecimento posterior (até ao final de 2007) das restantes 77. Estamos, enfim, e é o dado que aqui interessa reter, perante um contrato de compra e venda [artigo 874º do Código Civil (CC)], no qual a A. foi a vendedora e a R. a compradora, consistindo a obrigação daquela em transmitir para a R. a propriedade de 78 cabines de hidromassagem, com determinadas características, sendo a correspondente obrigação da R. a de receber essas cabines e pagar o respectivo preço[9].

            Pressupondo este enquadramento da situação, importa apreciar os fundamentos do recurso antes enunciados.

            2.1.1. Começando pela questão indicada em último lugar (conclusões 14. a 17.), destacando-a da patologia de fundo da relação contratual adiante focada, abordaremos desde já a questão da supressão pela A. do desconto no preço da única cabine efectivamente entregue (e reconhecidamente não paga) ao abrigo da factura de fls. 8, apreciando concretamente se essa cláusula (a que elimina o desconto verificada determinada condição) contém, desvaliosamente – rectius, como cláusula nula –, alguma “cláusula contratual geral”, isto no quadro da convocação da chamada Lei das Cláusulas Contratuais Gerais (LCCG)[10].

            A afirmação de corresponder a uma “cláusula contratual geral” a referência constante de uma factura, acompanhando a primeira cabine (a única destacada do todo das 78 encomendadas pela R. através da nota de fls. 7) destinada ao andar modelo, de que o preço aí indicado dessa unidade (também aí expressamente determinado por subtracção de um desconto de 21%[11]), só é considerado com esse desconto se a liquidação for efectuada até à data do vencimento indicada nessa mesma factura, tal afirmação, dizíamos, não se sustenta minimamente face à caracterização da realidade correspondente ao conceito de “cláusula contratual geral”, para efeitos de aplicação do regime de exclusão deste tipo de cláusulas previsto no artigo 8º da LCCG que a Apelante pretende aqui convocar.

            Com efeito, concorrem na não aplicação neste caso concreto desse regime, tanto a específica natureza assumida pela inserção na factura desse elemento respeitante à determinação do preço a pagar dentro de determinado prazo, como a natureza empresarial/comercial das entidades (A. e R.) envolvidas no negócio, quando esta natureza corresponde aqui a agentes económicos colocados no mercado numa situação de igualdade substancial que expressa um funcionamento concorrencial normal desse mercado[12].

            Corresponde tal cláusula, desde logo, a uma forma – por sinal usual e lógica na prática comercial (perda do benefício do desconto pela mora) – de determinação antecipada do preço pelo vendedor, enquanto elemento situado no domínio intangível de liberdade de estipulação deste num mercado concorrencial, elemento relativamente ao qual a celebração do contrato já pressupõe um acordo prévio com o comprador ou a aceitação livre, por este, de uma estipulação condicional efectuada pelo vendedor (v. artigo 883º, nº 1 do CC)[13]. Ou, dito de outra forma, se quisermos expressar essa mesma realidade por referência ao sentido teleológico do nº 2 do artigo 5º da LCCG[14], não se trata de algo que pela sua importância ou complexidade dentro da economia daquele contrato celebrado entre aqueles sujeitos, exigisse, para salvaguarda da liberdade do contraente aceitante, uma prova específica da existência de um determinado processo comunicacional e negocial que ultrapassasse a sua simples e clara inserção na factura.

            Da mesma forma, a natureza empresarial substancialmente idêntica dos dois sujeitos envolvidos, actuando estes num mercado concorrencial normal, coloca-nos, quase intuitivamente, fora do âmbito de protecção de contraentes substancialmente desiguais pretendido induzir e pressuposto pelo regime das “Cláusulas Contratuais Gerais”[15], coloca-nos, enfim, fora do domínio da teleologia protectiva que está na base deste instituto jurídico e que justificou a sua autonomização no domínio do Direito das Obrigações.

            Estas considerações – tanto as relativas à natureza da cláusula aqui discutida como à natureza do instituto – têm um claro eco na nossa doutrina a respeito da chamada “dogmática básica” (a expressão é empregue por António Menezes Cordeiro) das “Cláusulas Contratuais Gerais”.

            Com efeito, constitui ponto essencial da definição de uma cláusula deste tipo, enquanto “cláusula contratual geral”, a ideia de generalidade indiferenciadora da situação concreta e de rigidez intrínseca dentro do processo de conclusão do contrato[16], sendo que, “[n]ão havendo generalidade, assistir-se-ia a uma simples proposta feita por alguém decidido a não aceitar contrapropostas, enquanto, na falta de rigidez, se assistiria a um comum exercício de liberdade negocial”[17].

            A isto acresce a ideia de desigualdade entre as partes[18], enquanto elemento de definição do universo subjectivo abrangido, por referência a uma lógica protectiva específica, cuja ausência de manifestação no caso concreto acaba por conduzir a um domínio exterior ao instituto (logo à sua não convocação como modelo decisório[19]). Ora, parece-nos evidente, comparando o estatuto dos dois intervenientes neste contrato (ambos são sociedades comerciais colocadas num mercado concorrencial onde existiam para a R. alternativas de obtenção do mesmo bem de outros agentes, sendo que isto induz um efectivo processo de negociação dos contratos), parece-nos evidente, dizíamos, a ausência de fundamento para a adopção dessa lógica protectiva, no quadro de uma leitura teleologicamente orientada das normas da LCCG pretendidas convocar pela Apelante[20]. Daí que tenha aqui pleno sentido a realização de uma redução teleológica[21], face ao absurdo interpretativo que corresponderia a fazer passar pelo crivo protectivo da LCCG uma relação contratual entre sujeitos substancialmente iguais, cuja posição no mercado lhes permite – concretamente à R. – subtrair-se na aquisição de bens deste tipo a situações de “dictat.

            De qualquer forma, correspondendo o elemento desvalioso decorrente da aposição num contrato de cláusulas contratuais gerais (gerador da exclusão prevista no artigo 8º da LCCG) na afectação através delas de deveres específicos de comunicação e informação impendentes sobre quem as proponha ao aderente (v. a concretização desses deveres nos artigos 5º e 6º da LCCG), correspondendo o desvalor das cláusulas contratuais gerais à violação destes deveres, dizíamos, não vemos como a aposição na factura aqui considerada da referência condicionadora do desconto, pode ser vista como uma comunicação inadequada desse elemento ao destinatário dessa factura ou como um desempenho insuficiente do dever de informação quanto ao sentido e conteúdo desse aspecto envolvido no contrato. Com efeito, qualquer destinatário normal confrontado com uma factura com as características da de fls. 8 percebe inequivocamente o condicionamento a que o benefício do desconto concedido fica sujeito. E se isto vale para qualquer pessoa medianamente informada vale acrescidamente – diríamos mesmo: esmagadoramente – para uma empresa, como a Apelante, habituada a tratar protocolarmente as facturas que recebe dos seus fornecedores e a determinar, através do conteúdo destas, as obrigações a que fica adstrita.  

            Não tem, assim, por todas as razões indicadas, sentido algum a convocação do regime das “Cláusulas Contratuais Gerais” relativamente a estes intervenientes contratuais, no caso concreto da estipulação contratual aqui discutida, nos moldes em que esta foi comunicada à Apelante. Não estamos, seguramente, no domínio em que esta problemática se justifica e é, consequentemente, operante. Aliás, sendo evidente que a Apelante, com ou sem desconto, não pagou nem pretende pagar à Apelada a cabine que lhe foi efectivamente entregue por esta, não deixa de expressar um absurdo que a mesma Apelante pretenda discutir aqui a manutenção desse desconto: um desconto num preço que não pagou.

            Não colhe, pois, este argumento da Apelante em desfavor da Sentença apelada. Esta, muito correctamente, atendeu à não realização do pressuposto (condição) contratual do desconto na determinação do preço da cabine entregue à R. e por esta reconhecidamente não paga.

            2.1.2. Resolvido o problema do preço da cabine destinada ao apartamento modelo facturada a fls. 8 (alínea a) da condenação), importa encarar a questão do incumprimento do contrato pela Apelante (conclusões 1. a 3. do recurso) nos termos em que a Sentença caracterizou tal incidência.

            Também aqui se manifesta a tendência da Apelante para argumentar numa espécie de domínio de fronteira com o absurdo. Com efeito, tendo presente o teor do fax de fls. 11 que dirigiu à A. (ponto 4. dos factos), é difícil compreender (e aceitar) a afirmação de que quem não cumpriu o contrato foi a Apelada, que não entregou as 77 cabines. Acaso ignora a Apelante que recusou, antecipadamente ao prazo estipulado, a recepção dessa mercadoria, quando interpelada para a fixação do momento exacto do cumprimento pela A.? Acaso ignora a Apelante que, após essa recusa, não realizou qualquer interpelação à Apelada para cumprir?

            O elemento fundamental de caracterização da dinâmica de incumprimento da R. – já anteriormente indiciada, aliás, pela não satisfação da factura de fls. 8 – reside neste caso no teor do fax de fls. 11, que aqui rememoramos:


“[…]
Exmos. Senhores:
Com os nossos respeitosos cumprimentos, em virtude de dificuldades de gestão desta encomenda, vimos por este meio informar da nossa anulação da mesma.
Assim queiram, por favor considerar nulo este pedido.
[…]”


            Sendo que esta comunicação apareceu em resposta à carta de fls. 10, na qual a A., face à aproximação do prazo de cumprimento acordado (final do ano de 2007), inquiriu (interpelou) a R. sobre quando poderia proceder à entrega das cabines, anunciando já ter disponíveis trinta delas.

            Valeu a mencionada comunicação da Apelante como recusa inequívoca de cumprimento do contrato pela sua parte (incidência esta que o seu posterior comportamento confirmou plenamente), dando, ela sim (através dessa recusa antecipada), o exacto contexto ao comportamento posterior da A. ao não proceder à entrega das cabines. É, pois, absurdo – e a repetição do qualificativo absurdo até traduz a opção por uma expressão de pendor eufemístico –, é absurdo, dizíamos, que se pretenda argumentar com os pontos 6. e 11. dos factos, descontextualizadamente do expressivo restante elenco destes, imputando à A. – pasme-se – incumprimento do contrato, esquecendo o contexto induzido nessa não entrega pela recusa de receber do destinatário, claramente recolhida no ponto 4. dos mesmos factos, por referência ao fax de fls. 11 acima transcrito. 

Tenhamos presente, em sede de aferição do comportamento da A., que esta necessitava de adquirir os bens encomendados pela R. a uma terceira empresa (à C...), que, diligentemente, já havia iniciado esse processo de aquisição (já havia recebido 31 das 78 cabines e até já havia entregue uma delas à R.) e que, enfim, à beira do fim do prazo de entrega, foi confrontada com uma inequívoca recusa da R. em cumprir o contrato. É este o verdadeiro contexto da não entrega das cabines pela A. resultante dos pontos 6. e 11. do elenco fáctico. Dizer o contrário não tem, pois, qualquer sentido.

2.1.2.1. As indemnizações fixadas na sentença, designadamente as correspondentes às alíneas b) e c) acima transcritas, têm na sua génese a qualificação do comportamento da Apelante como incumprimento do contrato, representando o ressarcimento supressor do dano que se considerou corresponder a esse incumprimento.

Adiante apreciaremos a natureza dessas indemnizações, por ora interessa-nos o controlo da asserção presente na Sentença segundo a qual a Apelante incumpriu definitivamente o contrato com o cancelamento não legitimamente motivado da encomenda[22].

Vale a tal respeito, como antes se indicou, o teor do fax de fls. 11 a cancelar a encomenda, significando esta comunicação uma relevante declaração de não cumprimento da obrigação pela A., enquanto devedora da obrigação correspondente a receber as cabines e a pagar o respectivo preço.

As questões suscitadas por declarações deste tipo – declarações antecipadas, relativamente ao vencimento da obrigação, de não cumprimento ou recusa de cumprimento –, têm recebido um tratamento específico na nossa doutrina, no quadro da problemática do não cumprimento das obrigações[23], sendo que a questão colocada pode ser interrogativamente formulada – e seguimos aqui a formulação de António Menezes Cordeiro – nos seguintes termos:

“[…]
Na pendência de uma obrigação, o devedor pode tomar a iniciativa de dirigir, ao credor, uma declaração afirmando não querer cumprir. Quid iuris?
[…]”[24]


            A resposta a esta interrogação não pode prescindir da enunciação prévia dos elementos que no nosso ordenamento caracterizam o iter que conduz à qualificação de um incumprimento como definitivo:

“[…]
Perante uma obrigação cujo incumprimento se avizinhe, o credor deverá, sucessivamente […]:
– interpelar o devedor;
– aguardar a mora;
– proceder à fixação do prazo admonitório;
– aguardar a expiração deste,
para então passar às consequências do incumprimento definitivo.
[…]”[25]


            Ora, sendo a comunicação da Apelante aqui em causa – comunicação decorrente de uma interpelação do credor – evidente na afirmação de uma recusa – próxima do vencimento mas, todavia, ainda anterior a ele – de vir a cumprir a obrigação (anulo a encomenda, disse ela sem mais), sendo que o ulterior comportamento da Apelante[26] consolidou essa recusa, como recusa definitiva, não podemos deixar de ver nessa atitude um comportamento apto a desencadear o vencimento da obrigação e todas as consequências associadas ao incumprimento definitivo desta. Um comportamento que, enfim, para utilizar um quadro argumentativo de afirmação da autonomia estrutural do dever de indemnizar, operou, por vontade do devedor, a sucessão ao dever de prestar do dever de indemnizar, sublinhando-se que a concretização desse direito do credor a ser indemnizado pelos danos decorrentes do incumprimento foi exercido por este, no quadro fáctico que se nos oferece, em Fevereiro de 2008, através da propositura da presente acção.

            Assim, tratando-se de uma declaração inequívoca do devedor de não querer cumprir (o que já era claro para o credor em Fevereiro de 2008), tem total sentido, referindo-a à hipótese vertente, a seguinte observação colhida no tratamento doutrinário da questão da declaração de incumprimento:

“[…]
[E]stando a obrigação não vencida, a declaração de não cumprimento provocará o vencimento imediato apenas se o prazo for estabelecido a favor do devedor: a interpelação é desnecessária, verificando-se a mora […]”[27] (sublinhado acrescentado)


            Sublinhar-se-á neste caso, ponderando os elementos fácticos disponíveis, o funcionamento, quanto ao beneficiário do prazo aqui fixado para o cumprimento (no final de 2007), da regra supletiva emergente do artigo 779º do CC: o prazo deve ter-se por fixado a favor do devedor, rectius, da R./Apelante.

            Paralelamente, tendo presente o significado adquirido pela declaração aqui em causa enquanto vicissitude do contrato, não deixamos de ver nela o sentido liquidador da possibilidade de cumprimento, enquanto elemento accionador das consequências do incumprimento definitivo:

“[…]
[P]ara ser eficaz […] a declaração de não cumprimento deverá ser pura, séria, definitiva, consciente e juridicamente possível. No que toca à «pureza»: a declaração de não cumprimento não deve equivaler à manifestação de dúvidas sobre a exequibilidade do contrato, à decorrência de diversos entendimentos quanto ao mesmo ou à ponderação de dificuldades exteriores.
Ela exprimirá a intenção consciente e definitiva de trocar o contrato pelas consequências da sua inexecução.
[…]”[28]  


            Vale tudo isto, enfim, para afirmar que, como correctamente se observou na Sentença, a comunicação da Apelante aludida no ponto 4. dos factos traduziu uma recusa de cumprimento, sendo que este, desde logo (ou quanto mais não fosse) pelo funcionamento da presunção do artigo 799º do CC, é assacável à Apelante.

            2.1.2.2. Num quadro argumentativo de transição para o derradeiro fundamento do recurso (o correspondente à natureza das indemnizações atribuídas), não deixará de se frisar aqui a falta de suporte fáctico da afirmação da Apelante no recurso, de que teria ocorrido uma aceitação pela A. do cancelamento do contrato e que isso aparentaria a situação a uma “resolução ou cancelamento” desse mesmo contrato.

            Correspondendo a ideia de cancelamento e de resolução a realidades distintas na cessação de um contrato[29], não vemos a indução de qualquer delas na presente situação, através da comunicação referida no ponto 4. dos factos: não existiu acordo algum das partes, expresso ou implícito, quanto à revogação do contrato (a afirmação contrária da Apelante carece em absoluto de factos demonstrativos); não foi invocado motivo algum a que a lei ou os termos do contrato conferissem aptidão resolutiva. O ónus argumentativo e probatório era aqui da Apelante e esta, descontadas afirmações gerais sem significado prático, não cumpriu tal ónus.

            Estamos, pois – e é o que importa sublinhar –, perante um incumprimento definitivo do contrato, cuja responsabilidade foi, acertadamente, atribuída à R.

            2.1.3. Assente a existência de incumprimento pela R./Apelante, importa apreciar o conteúdo indemnizatório respeitante a tal incumprimento fixado na Sentença. Constitui este o derradeiro elemento do recurso, correspondendo aos argumentos resumidos nas conclusões 4. a 9. e 10. a 13., acima transcritas.

            Discute a Apelante a tal respeito a possibilidade de cumulação entre uma indemnização que qualifica como correspondente a um “interesse contratual negativo” (a expressa na alínea b) da condenação, respeitante ao pagamento das 30 cabines já na posse da A. e que esta não logrou devolver ao fabricante), enquanto prejuízo decorrente da celebração do contrato não cumprido, e uma indemnização respeitante a um “interesse contratual positivo”, referida ao que a A. obteria através do exacto cumprimento desse contrato (a parte da condenação expressa na respectiva alínea c), respeitante ao lucro – cessante – que seria obtido com a venda à R. das restantes 47 cabines). Isto embora o pagamento das 30 cabines já combine necessariamente elementos correspondentes a um interesse negativo (prejuízos efectivos pela frustração do negócio) e a um interesse positivo, expresso este na inclusão aí, igualmente, do lucro cessante correspondente à margem de lucro da A. (esta não lhe foi seguramente cobrada pela « C...» e é aqui igualmente imputada no valor das 30 cabines). Aceitamos, todavia, que, em termos descritivos dos dois itens indemnizatórios, se atenda à preponderância no primeiro caso do chamado interesse negativo e, em função dessa preponderância, se qualifique nesses termos a indemnização correspondente às tais 30 cabines entregues pelo fabricante à A. e cuja devolução não foi aceite por aquele.

            Tenha-se presente que a questão da cumulação indemnizatória destes dois elementos assenta, na lógica argumentativa da Apelante, no pressuposto da existência de uma relevante resolução do contrato[30], sendo que, como antes se referiu (e decidiu), não existe qualquer suporte fáctico para essa asserção (existência de resolução do contrato). Caindo esse pressuposto, cai igualmente o argumento que dele se pretendia extrair.

Esta questão (a de não ter existido resolução do contrato) apresenta relevância prática dado que, como veremos de seguida, a discussão em torno da possível incompatibilidade da cumulação dos dois tipos de indemnização tem-se travado entre nós muito centrada no plano das consequências indemnizatórias da resolução. É neste sentido que, num amplo trabalho académico recente, versando precisamente sobre o interesse contratual negativo e positivo, Paulo Mota Pinto[31], aborda a questão, distinguindo, no quadro geral da responsabilidade contratual[32], a “indemnização em caso de manutenção do contrato” (pp. 1473/1603), que seria a respeitante ao incumprimento que não gere a cessação do vínculo contratual (como paradigmaticamente sucede com a resolução), da “indemnização em caso de resolução do contrato por incumprimento” (pp. 1604/1697), sendo que no primeiro caso (isto é, fora do quadro da indemnização por resolução):

“[…]
Apesar de não existir uma remissão expressa, entende-se normalmente que a indemnização em caso de responsabilidade do devedor por não cumprimento, prevista no artigo 798º [CC], obedece aos artigos 562º e seguintes, onde se prevê, efectivamente, um regime geral da obrigação de indemnização. A falta culposa ao cumprimento (incluindo o não cumprimento ou cumprimento defeituoso – cfr. artigo 799º, nº 1 [CC]) é aqui o «evento que obriga à reparação» (artigo 562º), resultando assim implicitamente descrito o estado hipotético em que o credor lesado deve ser colocado pela obrigação de indemnização: a situação em que estaria se o devedor tivesse cumprido. Não se trata, assim, apenas de atribuir ao credor, por exemplo, o valor objectivo da prestação, mas de o colocar na situação patrimonial em que ele estaria sem o não cumprimento, incluindo todas as consequências patrimoniais que o não cumprimento teve, desde as despesas com o contrato, os gastos tornados inúteis para a celebração do negócio e preparação do cumprimento, a oneração com deveres de ressarcir terceiros (por exemplo, clientes) o lucro cessante do negócio, bem como outros danos concomitantes ou consequenciais […].
O prejuízo para o credor corresponde, pois, ao interesse contratual positivo, como «aquele que resultaria para o credor do cumprimento curial do contrato» [[33]], tratando-se, como se referiu, do «interesse no cumprimento», a que corresponde o dano que surgiu por causa do não cumprimento ou do cumprimento defeituoso («dano de não cumprimento»). O interesse positivo corresponde, pois, também aqui, a um dano, e a prestação devida pelo inadimplemento a uma indemnização […]” (sublinhado acrescentado aqui)[34]


            Vale isto por dizer, que, in casu, afastada por absoluta inadequação qualquer ideia de resolução do contrato, restando apenas o incumprimento contratual assacável à R. ora Apelante, é consensual que o ressarcimento indemnizatório pode abranger o chamado interesse contratual positivo, aqui presente através da imputação à Apelante da margem de lucro que a Apelada realizaria (relativamente ao custo para ela suportado com a aquisição das cabines ao fabricante) com a venda àquela (Apelante) das 47 cabines, no quadro do cumprimento pontual do contrato por esta última. A indemnização ficciona, por assim dizer, o cumprimento e traduz-se na atribuição através dessa indemnização das vantagens que esse cumprimento proporcionaria ao credor.

            Tanto bastaria (aliás, tanto basta) – a exclusão da resolução e a constatação da efectiva presença do dano positivo considerado (pontos 15. e 16. do elenco fáctico) – para a confirmação das duas indemnizações cumulativamente fixadas na Sentença.

            Todavia, mesmo dentro da linha argumentativa pressuposta pela Apelante, subsistiria, assim o entendemos, como dano indemnizável, paralelamente ao prejuízo resultante da aquisição das 30 cabines (aquisição esta preparatória do cumprimento do contrato pela A.), por impossibilidade desta as devolver ao fabricante (entendido este elemento como expressão de um interesse contratual negativo), subsistiria como dano indemnizável, dizíamos, a frustração do lucro que iria ser realizado através da venda das restantes 47 cabines, subsistiria, pois, a indemnização pelo interesse contratual positivo.     


2.1.3.1. Note-se que, com efeito, as dúvidas habitualmente expressas sobre a compatibilidade entre a cumulação de uma indemnização respeitante ao interesse contratual negativo e ao interesse contratual positivo se referem à actuação do regime da resolução do contrato, designadamente na sua projecção retroactiva (artigo 434º, nº 1 do CC)[35]. Esta – a negação da possibilidade dessa cumulação indemnizatória – constitui a chamada “posição tradicional”, que Antunes Varela caracterizou nos seguintes termos, no que poderíamos qualificar como o texto doutrinário básico expressando essa posição[36]:

“[…]
Mesmo para a hipótese de o credor optar pela resolução do contrato se prevê o direito de indemnização. Trata-se da indemnização do prejuízo que o credor teve com o facto de se celebrar o contrato – ou, por outras palavras, do prejuízo que ele não sofreria, se o contrato não tivesse sido celebrado (cfr. a fórmula do artigo 908º [CC]), que é a indemnização do chamado interesse negativo ou de confiança. Desde que o credor opte pela resolução do contrato, não faria sentido que pudesse exigir do devedor o ressarcimento do benefício que normalmente lhe traria a execução do negócio. O que ele pretende, com a opção feita, é antes a exoneração da obrigação que, por seu lado, assumiu (ou a restituição da prestação que efectuou) e a reposição do seu património no estado em que se encontraria, se o contrato não tivesse sido celebrado (interesse contratual negativo).
Este interesse contratual negativo (tal como o interesse contratual positivo) pode compreender tanto o dano emergente como o lucro cessante (o proveito que o credor teria obtido, se não fora o contrato que efectuou) […]”


            Este entendimento foi objecto de crítica por Vaz Serra, desde os trabalhos preparatórios do Código Civil[37], podendo caracterizar-se o ponto de vista deste Autor através do seguinte excerto de uma anotação na Revista de Legislação e de Jurisprudência[38]:

“[…]
Assim, resolvendo o contrato, libera-se o credor do dever de fazer a sua prestação e pode exigir da outra parte, como indemnização, a diferença de valor: com a resolução do contrato, o credor libera-se da obrigação de fazer a sua prestação, e o devedor da de efectuar a respectiva prestação; mas, como àquele cabe também o direito de indemnização, pode exigir do devedor a reparação do dano e, por conseguinte, o valor que, deduzido o da sua prestação, teria entrado no seu património se o contrato houvesse sido cumprido. Resolvido o contrato, desaparecem as obrigações de ambas as partes, e o dano do credor é, portanto, a diferença de valor entre a prestação por ele não obtida do devedor e a contraprestação de que se liberou.
[…]” (sublinhado acrescentado)


            Reconhece-se o eco que a posição de Antunes Varela tem tido na nossa jurisprudência[39]. Com efeito, mesmo nas situações (mais recentes) em que esse entendimento é ultrapassado, a afirmação da cumulabilidade, tende a ser assumida muito cautelosamente[40]. Existe, todavia, uma crescente e maioritária afirmação na doutrina da aceitação da tesa da cumulabilidade, embora, como refere António Menezes Cordeiro, “[…] tais assuntos não se resolv[a]m por «votação» […]”[41].

            Colhem, com efeito, como determinantes de uma solução efectivamente mais justa, os argumentos que não excluem, à partida, a possibilidade de cumulação, no quadro da resolução do contrato, entre uma indemnização que cubra, se autonomizáveis (no sentido de não induzirem a duplicação de indemnizações pelo mesmo dano), danos negativos e danos positivos, num quadro caracterizável como referido ao princípio da integralidade das indemnizações, assim definido por António Menezes Cordeiro:

“[…]
A ideia de que havendo resolução, não faria sentido optar pelo interesse positivo ou do cumprimento … por se ter desistido do contrato é puramente formal e conceitual.
Com efeito, o incumprimento acarreta danos. Perante eles, há que prever uma indemnização integral. A pessoa que resolva o contrato apenas tenciona libertar-se da prestação principal que lhe incumbe: não pretende, minimamente, desistir da indemnização a que tenha direito.
A regra é, pois, sempre a mesma, simples e justa: o incumprimento obriga a indemnizar por todos os danos causados. Ficarão envolvidos danos negativos ou de confiança e danos positivos ou do cumprimento, cabendo, caso a caso, verificar até onde vão uns e outros.
[…]”[42]


            Aliás, colocando as coisas no plano da actuação do efeito retroactivo da resolução, decorrente do artigo 434º, nº 1 do CC, deparamo-nos que o regime legal dessa retroactividade opera algo mitigadamente, sob reserva da destruição retroactiva do negócio resolvido não “contrariar a vontade das partes ou a finalidade da resolução” (trecho final do nº 1).  


            O problema não é, pois, o da cumulação em abstracto de danos correspondentes a um interesse contratual positivo e a um interesse contratual negativo, por sobrevalorização de um (discutível) elemento conceptual. Com efeito, perante um caso concreto, não é impossível ser-se indemnizado pelo que expresse um dano positivo e um dano negativo, nos termos em que estes elementos são disjuntivamente caracterizados. Não podem é ser indemnizados cumulativamente aspectos do positivo e do negativo que correspondam à mesma perda, ou seja, que expressem valores que a parte nunca poderia auferir cumulativamente no caso de tudo ter corrido bem (quer por o contrato ter sido perfeitamente cumprido, quer por o contrato nunca ter chegado a ser celebrado). Ora, um só incumprimento contratual (fundamentando a resolução) pode dar origem a tipos de perdas bem distintos[43]. Ou seja, quanto a dois aspectos intelectualmente separáveis do contrato, pode perfeitamente o credor ser indemnizado pelo positivo quanto a um deles e pelo negativo quanto a outro. O desvalor não é a cumulação, é, tão-só, a duplicação, quando esta, através da cumulação, ocorra.

            E aqui – e revertemos assim ao caso concreto –, basta ponderar a origem das duas indemnizações fixadas, referidas a partes absolutamente distintas dentro do conjunto dos bens encomendados pela R./Apelante, para se perceber, quase intuitivamente, a inexistência de qualquer duplicação indemnizatória. As vicissitudes que a patologia do contrato, no cômputo do dano global da A. com o incumprimento pela R., originou elementos completamento distintos: as 30 cabines adquiridas pela A. e que esta não logrou devolver ao fabricante; as 47 cabines que não recebeu mas cuja margem de lucro auferiria se as tivesse vendido à R. A Sentença, ao condenar cumulativamente nos itens indemnizatórios recolhidos nos pontos b) e c) do pronunciamento decisório, limitou-se, pois, a suprir danos absolutamente distintos e efectivamente sofridos pela A., limitou-se, enfim, a ressarcir integralmente a A. dos danos determinados pelo incumprimento do contrato pela R.

            Improcede, pois, este argumento – o argumento culminante – do recurso.

2.2. Percorridos que estão todos os fundamentos do recurso, considerando-se não assistir razão à Apelante em qualquer deles, resta-nos consignar a total improcedência da apelação e confirmar, por absolutamente correcta, a decisão impugnada. Antes, porém, daremos conta, em sumário imposto pelo artigo 713º, nº 7 do CPC, dos elementos fundamentais do antecedente percurso argumentativo:


I – A indicação numa factura de que um desconto aí incluído pressupõe o pagamento até ao limite do prazo de vencimento nela indicado, refere-se à fixação do preço do bem vendido, integrando tal elemento o domínio da liberdade de estipulação do vendedor ao qual o comprador dá o seu acordo, com o próprio acto de contratar pelo preço assim facturado;
II – Subtrai-se esta estipulação do preço, expressa na factura, ao domínio de incidência das “Cláusulas Contratuais Gerais” decorrente do regime constante do Decreto-Lei nº 446/85, de 25 de Setembro;
III – Paralelamente, a circunstância de estarem envolvidas nesse negócio empresas cuja natureza é substancialmente idêntica no quadro de um mercado normalmente concorrencial, afasta a presença da teleologia protectiva da liberdade contratual, que justifica a autonomização do instituto das “Cláusulas Contratuais Gerais”, não fornecendo este, assim, um modelo decisório para a ponderação das cláusulas estabelecidas na contratação entre estas empresas;
IV – De qualquer forma, a inclusão numa factura da indicação referida em I, sempre traduz uma forma adequada de informação e de comunicação ao destinatário do elemento contratual implicado com essa indicação;
V – Uma declaração inequívoca do devedor, próxima do vencimento da sua obrigação e suscitada por uma interpelação do credor, de que “anula a encomenda” efectuada a este, consubstancia uma declaração definitiva de incumprimento e, tratando-se de prazo estabelecido em benefício do devedor, opera esta o vencimento imediato dessa obrigação;
VI – O incumprimento definitivo, não ocorrendo uma relevante resolução do contrato, gera a obrigação de indemnizar por todos os prejuízos decorrentes desse incumprimento, refiram-se eles ao que se qualifica como “interesse contratual negativo” ou ao que se qualifica como “interesse contratual positivo”, expresso este nos chamados “lucros cessantes”;
VII – Mesmo ocorrendo resolução, a lei não exclui a consideração indemnizatória cumulativa de danos expressos num interesse contratual negativo e positivo, desde que estes (e isso vale com ou sem resolução) não traduzam uma duplicação indemnizatória.
[os sublinhados destacam os descritores propostos]    


III – Decisão
            3. Assim, face ao exposto, na improcedência da apelação, decide-se confirmar integralmente a Sentença apelada.

            Custas pela Apelante.


[1] Elemento temporal este (processo iniciado posteriormente a 01/01/2008) que determina a aplicação do regime dos recursos introduzido pelo Decreto-Lei nº 303/2007, de 24 de Agosto (v. os respectivos artigos 11º, nº 1 e 12º, nº 1). Pela mesma razão, qualquer disposição do Código de Processo Civil adiante referida neste Acórdão, cujo texto tenha sido alterado pelo DL 303/2007, sê-lo-á na versão resultante deste Diploma.
[2] Pede a R. o preço desta com a retirada do desconto que pressupunha o pagamento atempado dessa cabine, nos termos constantes da factura de fls. 8.
[3] É o seguinte o teor dessa comunicação remetida pela R. à A. via fax (sublinha-se a importância deste documento na Sentença apelada e no presente Acórdão):
“[…]
Exmos. Senhores:
Com os nossos respeitosos cumprimentos, em virtude de dificuldades de gestão desta encomenda, vimos por este meio informar da nossa anulação da mesma.
Assim queiram, por favor considerar nulo este pedido.
[…]
                [transcrição de fls. 11]
[4] Estas asserções constam da seguinte passagem da p.i.:
“[…]

20.
Atento o contrato celebrado entre A. e R., tem esta o dever de cumprir, pelo menos, parte do referido contrato, no sentido de receber e proceder ao pagamento das referidas 30 cabines, no valor global de €35.875,29, actualmente na posse da A. e que foram somente encomendadas pela A. para cumprir o acordado com a R..
21.
A R. não cumpriu a obrigação que assumiu com a A. e não justificou a falta de cumprimento.
22.
Para além disso, deverá ainda indemnizar a A., relativamente à margem de lucro que esta teria com a concretização do negócio, ou seja, relativamente às restantes 47 cabines, entretanto canceladas pela A. junto da empresa «C....», no montante de €5.606,16.
[…]”
                [transcrição de fls. 5]
[5] Diz a Apelante na conclusão 2., que, “[…] da factualidade assente e dos factos dados como provados, apenas se pode retirar que, a A. não procedeu à entrega das 77 cabines encomendadas pela R., no prazo convencionado pelas partes, no final do ano de 2007” (conclusão 2. a fls. 163/164).
[6] Diz a Apelante na conclusão 9., que “[…] a A. apenas poderia pedir ou exigir a reposição do seu património no estado em que se encontraria, se o contrato não tivesse sido celebrado (interesse contratual negativo)” (conclusão 9. a fls. 165).
[7] Diz a Apelante na conclusão 13., que “[…] a pretensão da A., no que respeita aos lucros cessantes, é incompatível com a operada resolução ou cancelamento, que foi aceite por aquela, e cujo cumprimento não foi peticionado nos autos” (conclusão 13. a fls. 166).
[8] V. artigo 463º do Código Comercial: “[i]nfere-se dos quatro primeiros números do artigo 463º que a pedra de toque da comercialidade da compra ou da venda reside na sua inserção num processo de aquisição para revenda” (António Menezes Cordeiro, Manual de Direito Comercial, 2ª ed., Coimbra 2007, p. 834).
[9] O uso aqui da expressão fornecimento não é particularmente preciso e deve ser evitado, mesmo descritivamente por referência a um uso comum da linguagem não juridicamente preciso. Pode, com efeito, sugerir-se, usando essa expressão, elementos próprios da figura do contrato de fornecimento, que não estão de modo algum presentes no contrato aqui em causa, como seja a existência de uma obrigação de carácter duradouro (continuada no tempo) de entrega de determinados bens móveis. Nada disso existe neste contrato que se reduz e esgota numa só compra e venda, em certo momento, de um conjunto determinado de objectos idênticos, definidos na sua identidade (78 cabines de hidromassagem, modelo « C... New Holliday 80, Thermostatic»).
[10] Decreto-Lei nº 446/85, de 25 de Outubro, alterado pelo Decreto-Lei nº 220/95, de 31 de Agosto e pelo Decreto-Lei nº 249/99, de 7 de Julho.
[11] V. a fls. 8 os campos documentais (lado direito do documento em baixo) referentes à determinação do valor facturado = valor ilíquido – desconto de 21% = a valor líquido + 5% de IVA)
[12] Seguramente que a venda de cabines de hidromassagem não é realizada pela A. em regime de monopólio ou de ausência de fornecedores alternativos. Aliás, mesmo junto dos consumidores (e não é essa a posição da R. neste negócio) a venda de bens com esta natureza, não corresponde a uma massificação contratual que induza as situações cobertas pela problemática das cláusulas contratuais gerais. Não se trata aqui, pois, de uma “cláusula contratual geral”, mas, tão-só, de uma cláusula de fixação do preço naquele caso concreto. Isto, mesmo que por hipótese aquela cláusula corresponda a um elemento comum à generalidade de situações de fixação de preços pela A.
[13] Estamos no domínio da fixação do preço, matéria que há que considerar logicamente subtraída à problemática das “Cláusulas Contratuais Gerais”, sendo que a celebração da compra pressupõe, na sua essência, a aceitação desse elemento (o preço incluindo um desconto, se satisfeito o seu valor em determinado prazo), nos termos em que o vendedor o determina e o comprador o aceita com o acto da compra, sem necessidade de uma complexa prova, adicional à correspondente à celebração do próprio contrato (que sempre implica consenso quanto ao preço), de um processo comunicacional específico dirigido a esse concreto elemento. A não ser assim, todas as estipulações de preços pelo vendedor e condições respeitantes ao seu pagamento, acabariam por corresponder a “cláusulas contratuais gerais” que convocariam complicados mecanismos de enunciação e advertência ao comprador.
[14] “ A comunicação deve ser realizada de modo adequado e com a antecedência necessária para que, tendo em conta a importância do contrato e a extensão e complexidade das cláusulas, se torne possível o seu conhecimento completo e efectivo por quem use de comum diligência”.
[15] Basta ter presente toda a história do instituto das “Cláusulas Contratuais Gerais” (v., em geral, António Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil Português, I, Parte Geral, tomo I, 3ª ed., Coimbra, 2005, pp. 600/611), sendo que o sentido significativo induzido por essa história foi assumido pelo legislador português (v. a expressa justificação do instituto por referência à “transposição da igualdade formal para a material” no preâmbulo do DL 446/85).
[16] “[A] generalidade: as cláusulas contratuais gerais destinam-se a ser propostas a destinatários indeterminados ou a ser subscritas por proponentes indeterminados; no primeiro caso, os utilizadores propõem a uma generalidade de pessoas certos negócios, mediante a simples adesão às cláusulas contratuais gerais; no segundo os utilizadores declaram aceitar apenas propostas que lhes sejam dirigidas nos moldes das cláusulas contratuais pré-elaboradas […];
[A] rigidez: as cláusulas contratuais gerais são acolhidas em bloco por quem as subscreve ou aceita; os intervenientes não têm, no plano dos factos, a possibilidade de modelar o seu conteúdo, introduzindo, nelas, alterações” (António Menezes Cordeiro, Manual de Direito Comercial, cit., p. 500, sublinhado acrescentado).
[17] Ibidem.
[18] “[A] desigualdade entre as partes: o utilizador das cláusulas contratuais gerais – portanto a pessoa que só faça propostas nos seus termos ou que só as aceite quando elas as acompanhem – goza, em regra, de larga superioridade económica e jurídico-científica em relação ao aderente” (ibidem, sublinhado acrescentado).
[19] O conceito de “instituto jurídico” – essa é a natureza das “Cláusulas Contratuais Gerais – pressupõe “[…] um conjunto concatenado de normas e de princípios que permite a formação típica de modelos de decisão” (António Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil Português, I, Parte Geral, tomo I, cit., p. 364).
[20] Seriam aqui os artigos 1º, 4º, 5º, 6º e 8º do DL 446/85.
[21] “Existe uma «lacuna oculta» quando, segundo a teleologia imanente da lei, a regra legal carece de uma restrição que a lei não formula. A «integração» da lacuna faz-se então pelo aditamento da restrição postulada, de harmonia com o sentido da lei. Como, por este processo, a regra demasiado ampla que a lei contém é reduzida ao âmbito de aplicação que lhe cabe segundo o fim ou o contexto significativo da lei, falamos a este propósito de uma «redução teleológica». […]
Se a justificação da analogia reside no imperativo da justiça de tratar igualmente o que é igual, a da redução teleológica consiste no de tratar desigualmente o que é desigual, isto é, de fazer as distinções que sejam necessárias numa perspectiva de valor” (Karl Larenz, Metodologia da Ciência do Direito, tradução da 2ª ed. alemã de 1969, Lisboa, s.d., mas de 1978, p. 450/451).
[22] Diz-se na Sentença, com evidente acerto:
“[…]
No caso em apreço a R. não logrou demonstrar que a falta de cumprimento pontual do contrato não procedeu de culpa sua. Desde logo, desconhece-se o que significa «dificuldades de gestão desta encomenda», motivo invocado para a anulação da mesma, pelo que se mostra o mesmo completamente injustificado.
[…]”
                [transcrição de fls. 149]
[23] A título de exemplo dos tratamentos mais individualizados desta questão, podemos citar os seguintes Estudos: Carlos Ferreira de Almeida, “Recusa de cumprimento declarada antes do vencimento”, nos Estudos em Memória do Professor Doutor João de Castro Mendes, Lisboa, s.d., mas de 1994, pp. 290/317; António Menezes Cordeiro, “A declaração de não-cumprimento da obrigação”, in O Direito, Ano 138º, 2006/I, pp. 25/38, este Estudo foi posteriormente incorporado no Tratado de Direito Civil Português, II, Direito das Obrigações, tomo IV, Coimbra, 2010, pp. 143/154; Pedro Romano Martinez, Da Cessação do Contrato, 2ª ed., Coimbra, 2006, p. 140.
[24] “A declaração de não-cumprimento…”, cit., p. 25, cfr. uma caracterização mais desenvolvida desta enunciação do problema no Tratado de Direito Civil Português, II, cit., p. 143.
[25] António Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil Português, II, cit., pp. 143/144.
[26] Expresso, no período anterior à propositura da presente acção (data esta de Fevereiro de 2008), na ausência de qualquer oferta pela R. de um cumprimento posterior, mesmo que situado fora de prazo.
[27] António Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil Português, II, cit., p. 154.
[28] Ibidem.
[29] Cancelamento, entendido diversamente de resolução, só poderá corresponder à ideia de “revogação” do contrato: “[…] corresponde[nte] a um acto bilateral, carecendo de assentimento das partes, mediante o qual estas decidem fazer cessar a relação contratual” (Pedro Romano Martinez, Da Cessação…, cit., p. 50). Esta possibilidade refere-se ao disposto no artigo 406º, nº 1 do CC, que afirma que o contrato “[…] só pode modificar-se ou extinguir-se por mútuo consentimento dos contraentes […]”.
Resolução, corresponde a um instituto com consagração legal expressa (artigos 432º a 436º do CC), traduzindo “[…] um meio de extinção do vínculo contratual por declaração unilateral e encontra-se condicionada por um motivo previsto na lei ou depende de convenção das partes” (Pedro Romano Martinez, Da Cessação…, cit., p. 67).
[30] Diz a Apelante na conclusão 13. da motivação: “[…] a pretensão da A., no que respeita aos lucros cessantes, é incompatível com a operada resolução ou cancelamento, que foi aceite por aquela, e cujo cumprimento não foi peticionado nos autos” (transcrição de fls. 166).
[31] Interesse Contratual Negativo e Interesse Contratual Positivo, vol. I e II, Coimbra, 2008.
[32] § 2º do Capítulo III do Vol. II da Obra (pp. 1471/1703).
[33] A citação é de Antunes Varela. Poderíamos resumir a posição deste último Autor quanto ao conteúdo do dever de indemnizar na responsabilidade contratual, fora da hipótese (a que aludiremos de seguida) da resolução do contrato, através da seguinte citação:
“[…]
No dano indemnizável cabe, não só o dano emergente (o prejuízo causado a que se refere o nº 1 do artigo 564º [CC]), como o lucro cessante, constituído pelos benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão […]” (Das Obrigações em Geral, vol. II, 2ª ed., Coimbra, 1978, p. 101).
[34] Interesse Contratual Negativo e Interesse Contratual Positivo, cit., vol. II, pp. 1473/1475.
[35] V. Pedro Romano Martinez, Da Cessação do Contrato, cit., pp. 207/208.
[36] Aqui citada através do texto da edição referida na nota 34, supra, p. 104.
[37] V. “Impossibilidade superveniente e cumprimento imperfeito imputáveis ao devedor”, no BMJ (1955), 47, 5/97 (concretamente, pp. 39 e seguintes).
[38] Anotação ao Acórdão do STJ de 30/06/1970, na Revista de Legislação e de Jurisprudência, Ano 104º, 01/11/1971, nº 3454, pp. 204/208 (207).
[39] V., seguindo tal posição, o Acórdão da Relação de Coimbra de 08/02/2000 (António Geraldes), proferido no processo nº 2117/99, sumariado na base do ITIJ, no seguinte endereço: http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005cd5bb/f591e60cc18080ad802569ca00356453.
Aqui se transcreve o respectivo sumário:
“[…]
I – No âmbito de um contrato de compra e venda cuja resolução tenha sido accionada por uma das partes, na falta de estipulação de cláusula penal que preveja a indemnização pelos lucros cessantes, o recurso à norma supletiva do artigo 801º, nº 2 do CC, apenas confere ao credor o direito a ser ressarcido pelos danos correspondentes ao interesse contratual negativo.
II – Conquanto seja inconclusivo o elemento literal extraído desse preceito e se mostre insuficiente o recurso aos elementos histórico e sistemático, a limitação da indemnização pelo interesse contratual negativo é a que melhor se ajusta à figura da resolução contratual e à retroactividade dos efeitos que resultam do artigo 434º do CC.

[…]”.
[40] V. o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12/02/2009 (João Bernardo), proferido no processo nº 08B4052, disponível na base do ITIJ, nos campos indicados, no seguinte endereço: http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/07fb864d462872b1802575600037be44.
Aqui se transcreve, parcialmente, o respectivo sumário:
“[…]
1. Por regra, a resolução contratual abre caminho a indemnização apenas pelos danos negativos.
2. Pode, porém, excepcionalmente, ter lugar indemnização pelos danos positivos.
3. Se a parte que resolveu o contrato pretende indemnização por este tipo de danos, terá de alegar e provar, além do mais, os factos que possam integrar essa situação de excepcionalidade.

[…]”
[41] Tratado de Direito Civil Português, II, cit., p. 162.
[42] Tratado de Direito Civil Português, II, cit., p. 163. No mesmo sentido, cfr. Pedro Romano Martinez, Da Cessação do Contrato, cit., pp. 208/216; Paulo Mota Pinto, Interesse Contratual Negativo e Interesse Contratual Positivo, cit., vol. II, pp. 1639/1655. Note-se que a reforma de 2002 do Código Civil alemão, a denominada “Modernização” (Modernisierung, introduzida pela Lei de 26 de Novembro de 2001, Gezets zur Modernisierung des Schuldrecechts, entrada em vigor em 01/01/2002), passou a dar cobertura expressa à ideia de cumulabilidade, dispondo no novo § 325 (“ressarcimento do dano e resolução”) que “[o] direito a exigir ressarcimento do dano num contrato bilateral não é excluído com a resolução” (“[d]as Recht, bei einem gegenseitigen Vertrag Schadensersatz zu verlangen, wird durch den Rücktritt nicht ausgeschlossen“), v. Reinhard Zimmermann, The New German Law of Obligations, Oxford, Nova York, 2005, pp. 68/69 e nota 166 e Pedro Romano Martinez, Da Cessação do Contrato, cit., pp. 211/213.
[43] Como sublinhámos anteriormente a indemnização respeitante às 30 cabines, incluindo a margem de lucro da A., expressa, combinadamente, um dano negativo (o que a A. despendeu com a aquisição destas cabines à « C...») e um dano caracteristicamente positivo (a margem de lucro da A. relativamente a essas 30 cabines).