Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1101/08.2TBGRD.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ANTÓNIO BEÇA PEREIRA
Descritores: BASE INSTRUTÓRIA
REGISTO PREDIAL
PRESUNÇÃO
Data do Acordão: 03/02/2011
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: GUARDA 1º J
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE REVOGADA
Legislação Nacional: ARTIGO 7.º DO CÓDIGO DO REGISTO PREDIAL
Sumário: I - À base instrutória só são levados factos.

II - Os factos instrumentais não devem, em regra, ser incluídos na base instrutória.

III - A presunção estabelecida no artigo 7.º do Código do Registo Predial não se estende aos limites do imóvel, sobre que incide o direito registado, que figuram no registo.

Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra


I

A... e mulher B... instauraram, na comarca da Guarda, a presente acção declarativa, com processo sumário, contra C... e marido D..., pedindo que os réus sejam condenados a:

a) reconhecerem que os autores são donos e legítimos possuidores do prédio identificado referido nestes autos, nomeadamente da faixa mais a Norte, que constitui um socalco ou cômoro e que na sua extrema a Norte confronta com o prédio pertencente a E...;

b) absterem-se de praticar actos que perturbem a posse e o gozo do mesmo pelos autores;

c) reconhecerem a demarcação já existente da referida faixa de terreno, constituída pela referida diferença de altura do terreno (cômoro), a Poente, que delimita o prédio dos autores, com o prédio dos réus;

d) pagarem aos autores uma indemnização, a liquidar em execução de sentença pelo facto de, os réus, abusivamente, terem vindo a invadir a sua propriedade e de lhe estarem a originar dissabores, arrelias, sofrimentos, constante desassossego, receio e de os impossibilitarem de poder cultivar a faixa de terreno e retirar os respectivos rendimentos;

Alegaram, em síntese, que são donos e legítimos proprietários de um prédio rústico, denominado “Quinta ...”, situado em Quinta ..., freguesia de ..., ..., que o autor marido comprou por escritura pública outorgada no dia 19 de Outubro de 1994. Desde, a referida compra que, nesse mesmo prédio, em toda a sua extensão, têm vindo a cultivar, semear e recolher produções agrícolas, nomeadamente cereais, cortando e retirando as produções e pastando os seus animais, nomeadamente ovelhas e cavalo, à vista de toda gente, sem qualquer interrupção, sem oposição de quem quer que fosse e na convicção de que o prédio lhes pertence, por o haverem comprado aos legítimos proprietários, que receberam o respectivo preço, sempre na convicção de que não ofendem nem ofenderam direitos de terceiros. Antes da compra, enquanto foram arrendatários do referido prédio, durante cerca de 14 anos, cultivavam-no em toda a sua extensão. Os réus, desde há cerca de uns meses, têm invadido, com máquinas agrícolas e animais, a zona mais a norte do imóvel, que é constituída por uma faixa de terreno que se vai estreitando até confrontar na extrema a norte com o prédio pertencente a E.... A divisória entre esta faixa de terreno do prédio dos autores e o prédio dos réus é constituída por um desnível de terreno (cômoro).

Com a sua conduta, os réus causam aos autores dissabores, arrelias, sofrimentos, constante desassossego e receio, para além de estarem a impossibilitá-los de cultivar esta faixa de terreno, nomeadamente semeando cereais, e retirar os respectivos rendimentos, cujo cálculo total dos danos patrimoniais e não patrimoniais se remete para execução de sentença.

Os réus contestaram afirmando, em suma, que a faixa de terreno em discussão não pertence ao imóvel dos autores, pois este tem como limite norte ou noroeste um caminho ou servidão particular. Tal faixa está integrada num outro prédio rústico. Em data anterior a 1987, o então proprietário deste outro prédio, F..., fez um acordo verbal com G..., pai da ré e sogro do réu, através do qual o vendeu a este. G... faleceu em 1995 e, após a sua morte, o referido prédio foi adjudicado verbalmente aos réus. Desde a data da compra verbal que o G... até à sua morte e os réus, a partir daí, detiveram o referido prédio, incluindo a faixa referida, entrando e saindo, limpando-o, murando-o, recolhendo lenhas, pedra e areia, pastoreando animais, cedendo-o a terceiros, dele tirando todas as suas utilidades, sempre à vista de toda a gente, sem oposição de quem quer que seja, incluindo os autores. Assim, adquiriram tal faixa de terreno por usucapião.

Os autores responderam à contestação, impugnando os factos relativos à usucapião, invocada pelos réus, acrescentado que o prédio destes não está omisso na matriz, encontrando-se registado com o nº ... no Serviço de Finanças da ... e com o nº ... na Conservatória do Registo Predial da ....

Proferiu-se despacho saneador.

Procedeu-se à fixação dos factos assentes e da base instrutória.

Realizou-se a audiência de julgamento.

Foi proferida sentença em que se decidiu:

I. condeno os réus a reconhecerem que os autores são proprietários do prédio referido no ponto 1) dos factos provados, que inclui a faixa descrita no ponto 5) dos factos provados, situada mais a Norte, que constitui um socalco ou cômoro e que na sua extrema Norte confronta com o prédio pertencente a E...o;

II. condeno os réus a absterem-se de praticar actos que perturbem a posse e o gozo do mesmo pelos autores;

III. condeno os réus a reconhecerem a demarcação já existente da referida faixa de terreno, constituída pela diferença de altura do terreno (cômoro), a poente, que delimita o prédio dos autores com o prédio dos réus;

IV. Absolvo os réus de tudo o mais peticionado pelos autores.

Inconformados com tal decisão, os réus dela interpuseram recurso, que foi admitido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo, findando a respectiva motivação, com as seguintes conclusões:

I – O presente recurso versa sobre matéria de facto e sobre matéria de direito.

II – Através de requerimento dos Réus (referência 430076) estes reclamaram da não inclusão na Base Instrutória (nomeadamente) da matéria dos artigos 6.º a 12.º, 30.º a 41.º e 43.º a 46.º da contestação, por se tratar de matéria relevante para a boa decisão da causa, tendo tal reclamação sido indeferida por douto despacho com a referência1840728.

III – A matéria de facto reclamada e referida no ponto anterior é relevante e essencial para a defesa dos Réus e para o apuramento da verdade, nos precisos termos alegados no ponto 2.º destas Alegações, pelo que a sua não inclusão na Base Instrutória impediu e impede os Réus de exercerem o seu efectivo direito de defesa em ordem ao apuramento da verdade.

IV – Com tal decisão (referência 1840728) a Mmª. Juiz a quo violou e/ou fez errada interpretação do disposto nos artigos 20.º da Constituição da República Portuguesa e 511.º do C.P.C., pelo que deverá tal decisão ser revogada e substituída por decisão que admita e defira a reclamação dos Réus anulando-se, consequentemente, todo o processado subsequente com as legais consequências.

V - Os Réus impugnam expressamente a decisão proferida sobre a matéria de facto no que diz respeito aos quesitos/números 12.º a 24.º, inclusive e 27.º da Base Instrutória.

VI - Nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 685.º-B n.º 1 alínea a) do C.P.C. os Réus declaram que os concretos pontos de facto que consideram incorrectamente julgados por aquela decisão, são os constantes dos quesitos 12.º a 24.º inclusive, e 27.º da Base Instrutória.

E consideram que foram incorrectamente julgados já que, em tal decisão, a Mmª. Juiz a quo respondeu no sentido de “não provado” relativamente a tais quesitos quando, no entender dos Réus e perante os elementos probatórios dos autos, deveria ter decidido no sentido de dar resposta positiva ou “provado” a todos os aludidos quesitos.

VII - Nos termos do art.º. 685.º-B n.º 1 alínea b) do C.P.C., os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo da gravação nele realizados que impunham decisão diversa sobre aqueles pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida, e no sentido acima apurado, são:

a) As declarações, na sua íntegra, das seguintes testemunhas arroladas pelos Réus

• H....

• I....

• J....

• L....

b) Fotografias juntas com a contestação dos Réus.

c) Inspecção ao local documentada pela respectiva acta de fls.

VIII - Por tudo o exposto nas presentes Alegações, se conclui que à matéria de facto constante dos quesitos 12.º a 23.º e 27.º da BI deveria ter sido dada resposta positiva ou resposta “provado”.

Não o tendo sido e antes tido tal matéria sido respondida no sentido de “não provado”, a Mmª. Juiz a quo, e sempre com todo o respeito, errou e/ou fez errada interpretação quanto à apreciação das provas produzidas nos autos, tendo violado o disposto nos artigos 515.º, 653.º e 668.º do C.P.C., o que se invoca.

Consequentemente deverá a douta decisão sobre a matéria de facto, na parte ora recorrida, ser revogada e substituída por outra decisão que considere provados os factos constantes dos quesitos 12.º a 24.º e 27.º da Base Instrutória, nos termos do art.º. 712.º -1 do C.P.C.

IX - Sendo dado provimento às Alegações e conclusões anteriores, como se requer e espera, tal significa que a matéria dos quesitos 12.º a 24.º e 27.º da BI se deve considerar provada.

Assim sendo, encontram-se provados todos os factos da aquisição originária de propriedade (usucapião) por parte dos Réus relativamente à faixa de terreno referida em E) dos F.A.

Consequentemente, não tendo os AA logrado fazer prova dos factos dos quesitos 1.º a 9.º da B.I., então não podem ser declarados proprietários dessa mesma parcela de terreno razão pela qual a acção terá de improceder totalmente e os Réus serem absolvidos de todos os pedidos, o que se requer.

X - Na douta Sentença recorrida a Mmª. Juiz “a quo” interpretou o disposto no art.º 7.º do C. R. Predial no sentido de que a presunção dele derivada abrange também os elementos que compõem a descrição do prédio e, consequentemente, julgou a acção parcialmente procedente porque os Réus não lograram ilidir tal presunção.

Contudo, e com todo o respeito, entendem os réus que o artigo 7.º do C.R.P. não deve ter tal interpretação.

XI - A presunção derivada do registo predial nos termos do art.º 7.º do C.R.P. respeita apenas à existência de um direito que tenha como objecto determinado prédio, mas não vale quanto à definição dos seus direitos concretos, não abrangendo os elementos descritivos e físicos do prédio, não se estendendo às áreas, confrontações, delimitações e demarcação do prédio, mas tão só ao facto jurídico em si.

XII – A presunção registral derivado do art.º 7.º do C.R.P., não abrange, relativamente ao prédio referido na alínea A) dos Factos Assentes, os seus elementos e factores integrantes, áreas e confrontações e não abrange consequentemente a parcela referida na alínea E) dos F.A. pelo que aos Autores, se quisessem ver declarada a propriedade desta parcela a seu favor, teriam obrigatoriamente fazer prova dos factos integrantes da aquisição originária da propriedade de tal prédio, nos termos do artigo 342.º do C. Civil, factos esses constantes dos quesitos 1.º a 9.º da BI, prova essa que não lograram fazer como resulta da resposta negativa a esses quesitos.

XIII - Não tendo os Autores em seu beneficio a presunção derivada do registo predial do seu prédio (alínea A) dos F.A) relativamente à parcela/cômaro aludida na alínea E) dos F.A., e não tendo feito prova dos factos constitutivos de uma qualquer forma de aquisição originária da propriedade relativamente a essa parcela, temos que os Autores não são proprietários da mesma e o Tribunal a quo não poderia ter declarado isso como o fez na douta sentença recorrida e consequentemente não deveria ter condenado os Réus nos pedidos.

Tendo-o feito, a douta sentença recorrida violou e/ou fez errada interpretação do disposto nos artigos 342.º, 350.º, 1305.º, 1311.º do C.C. e 7.º do C. R. Predial, já que deveria ter feito interpretação no sentido de declarar que os Autores não são proprietários da parcela em questão e no sentido de absolver os Réus dos pedidos.

Terminam pedindo que se julgue procedente o recurso e que e em consequência:

a) Seja proferida decisão no sentido de ser deferida a reclamação dos RR sobre a matéria de facto com a referência 430076 e a que se refere a Conclusão II, aditando à Base Instrutória a matéria de facto lá referida e consequentemente anular todo o processado seguinte à decisão de indeferimento, com as legais consequências.

b) Caso assim se não entenda, e sem prescindir, deve ser revogada a douta sentença recorrida julgando-se a acção totalmente improcedente e não provada e absolvendo-se de todos os pedidos.

Os réus não contra-alegaram.

Face ao disposto nos artigos 684.º n.º 3 e 685.º-A n.os 1 e 3 do Código de Processo Civil[1], as conclusões das alegações de recurso delimitam os poderes de cognição deste Tribunal e, considerando a natureza jurídica da matéria versada, as questões a decidir consistem em saber se:

a) a matéria dos artigos 6.º a 12.º, 30.º a 41.º e 43.º a 46.º da contestação deve ser levada à base instrutória, conforme os réus defenderam na reclamação que, a em devido tempo, apresentaram, nos termos do n.º 2 do artigo 511.º do Código de Processo Civil, reclamação essa que nesta parte foi indeferida[2];

b) há erro no julgamento da matéria de facto que figura nos quesitos 12.º a 24.º e 27.º;

c) a presunção estabelecida no artigo 7.º do Código do Registo Predial se estende às confrontações do imóvel que constam no registo predial.


II

1.º


Os réus, ao abrigo do disposto no artigo 511.º n.º 2, apresentaram uma reclamação[3] contra a selecção da matéria de facto que figura na base instrutória dizendo que o alegado nos artigos 6º a 13º, 24º, 25º, 30º a 41º e 43º a 46º da sua contestação, com todo o respeito, é relevante para a boa decisão da causa e descoberta da verdade já que se trata de toda uma factualidade circunstancial no sentido da demonstração de que os AA não foram possuidores da faixa de terreno em questão, razão pela qual deverá tal matéria ser considerada controvertida e incluída na Base Instrutória.

Apreciando esta parte da reclamação, pela Meritíssima Juíza foi dito:

Avançando na análise da reclamação, verifica-se quanto aos artigos 6º e 7º da contestação, que a base instrutória, nos artigos 12º e 13º, está incorrecta, pois, na versão dos réus, a faixa em litígio inclui-se no prédio descrito no artigo 6º do referido articulado, que se encontra omisso no registo predial. Destarte, tais artigos devem ser corrigidos em conformidade.

No que concerne ao artigo 8º da contestação, os limites de um prédio são definidos pelos limites do direito de propriedade que incide sobre o mesmo, pelo que dois prédios são autónomos entre si se os limites dos direitos de propriedade respectivos forem diversos. Isto significa que a afirmação de que o prédio referido no artigo 1º da petição inicial e o prédio descrito nos artigos 6º e 7º da contestação são autónomos entre si é conclusiva, pois a sua demonstração exigiria a alegação dos factos concretizadores dos limites dos direitos de propriedade respectivos.

Quanto aos artigos 9º a 12º da contestação, os factos aí vertidos têm interesse instrumental para demonstração de que a faixa em discussão não pode pertencer ao prédio dos autores, mas ao prédio dos réus. A razão pela qual não se incluíram na base instrutória deve-se ao facto de não serem suficientes, nem necessários, para, só por si, sustentarem presunções judiciais (cfr. art. 351º do Código Civil – CC), uma vez que os factos essenciais não suscitam dificuldades acentuadas de demonstração e, para além disso, podem ser objecto da instrução e discussão da causa (cfr. art. 264º/2, do CPC), sem terem de ser incluídos na base instrutória, porque estão compreendidos nos factos essenciais que cabe aos réus demonstrar, bem como nos factos essenciais que cabe aos autores provar e aos réus pôr em dúvida (cfr. art. 346º do CC).

Por último, no que concerne aos factos vertidos nos artigos 30º a 41º e 43º a 46º da contestação, poder-se-ia pensar, à partida, que tais factos seriam essenciais para afastar uma eventual presunção de animus, com fundamento no art. 1252º/2, do CC, para a hipótese dos autores apenas conseguirem provar o corpus. Sucede, contudo, que as presunções legais apenas podem ser ilididas mediante prova em contrário – cfr. art. 350º/2, do CC – o que exige a alegação de factos consubstanciadores da simples detenção (cfr. art. 1253º do CC), não sendo o caso.

Por conseguinte, tais factos têm natureza meramente instrumental e não serão levados à base instrutória pelas razões expostas a propósito dos artigos 9º a 12º da contestação.

O despacho termina, no que a esta parte diz respeito, dizendo que:

Em face de todo o exposto, julgo parcialmente procedente a presente reclamação e, em consequência, altero a matéria de facto assente e a base instrutória nos seguintes termos:

(…)

d) o artigo 12) da base instrutória passará a ter o seguinte conteúdo: “Em 1985/1986, F... declarou vender a G... e este declarou comprar, verbalmente, um prédio composto de terreno de sequeiro, centeio, mato e pinheiros, sito na Quinta das ..., freguesia da ..., concelho da ..., que confronta a norte com um prédio dos réus (antes com E...o), sul com caminho e prédio dos réus, nascente com caminho público e poente com ..., prédio este omisso na matriz”?

e) o artigo 13) da base instrutória passará a ter o seguinte conteúdo: “Tendo incluído no acordo referido, a faixa de terreno descrita em E), como parte integrante do prédio descrito em 12)?”

Assim, salvo melhor juízo, a matéria dos artigos 6.º e 7.º da contestação encontra-se já vertida nos quesitos 12.º e 13.º. Na verdade resulta do teor do quesito 12.º a existência de um outro prédio (que não o dos autores), com as confrontações indicadas pelos réus, que é o que se alegou naquele artigo 6.º. E, tendo-se alegado no artigo 7.º da contestação que a faixa de terreno em disputa integrava esse outro prédio, não há dúvidas de que essa matéria foi levada ao quesito 13.º.

O alegado no artigo 8.º da contestação, isto é, que o prédio referido pelos autores e este outro a que se reportam os réus são diferentes e distintos é, como bem observa a Meritíssima Juíza, conclusivo; esta alegação não comporta um facto[4]. Conjugando-se o que figura em A dos factos assentes com o que se encontra em C dos factos assentes e no quesito 12.º (provando-se este) logo se conclui que estamos na presença de dois prédios diferentes e distintos.

Ora, do artigo 511.º n.os 1 e 2 resulta que à base instrutória só são levados factos[5]. Aliás, à luz do princípio consagrado no n.º 4 do artigo 646.º, é pacífico que o tribunal só deve pronunciar-se sobre matéria de facto[6]. Na verdade, o juízo de provado ou não provado, a formular mais tarde, só pode recair sobre factos.

Assim, o alegado no artigo 8.º da contestação não deve ser incluído na base instrutória.

Finalmente, com o alegado nos artigos 9.º a 12.º, 30.º a 41.º e 43.º a 46.º, os réus querem demonstrar que, face à realidade que aí descrevem, não é verdadeira a tese sustentada pelos autores. Trata-se, como bem assinalou a Meritíssima Juíza, de factos instrumentais, que, a provarem-se, indiciarão que o prédio dos autores não abrange a faixa de terreno em causa. Sucede que já estão quesitados factos, nomeadamente nos quesitos 1.º e 13.º, que abordam directamente a questão. Foram, pois, formulados quesitos com os factos que são, realmente, relevantes para a decisão da causa[7], tendo em consideração o direito alegado pelos autores e a excepção deduzida pelos réus.

Os factos instrumentais não têm de ser seleccionados para a relação dos factos assentes ou para a base instrutória, dada a sua natureza instrumental (art. 264-2): só devem sê-lo quando constituem a base duma presunção legal ou um facto contrário ao presumido[8]. Para os incluir na base instrutória, mister é que o juiz tenha motivos para considerar tais factos instrumentais necessários para o apuramento da verdade[9]. O princípio a observar é, pois, o de que só devem ser objecto da base instrutória questões de facto fundamentais, não as instrumentais[10]. Uma ponderação do custo/benefício processual, tendo por subjacente critérios de eficácia, economia[11] e de celeridade, aponta, claramente, no sentido de que os factos instrumentais não devem, em regra, ser incluídos na base instrutória, pois vão sobrecarregá-la, o que implica que se produza mais prova, o que, por sua vez, exige mais tempo, para, depois, esses factos não nos darem uma resposta directa e suficiente quanto ao que de essencial importa saber. E o elemento literal do n.º 1 do artigo 511.º, ao estabelecer que o juiz selecciona a matéria de facto relevante, também aponta nesse sentido.

Não se verificando nenhuma das situações de excepção mencionadas, conclui-se que a matéria alegada nos artigos 9.º a 12.º, 30.º a 41.º e 43.º a 46.º da contestação não deve ser levada à base instrutória.

Nestes termos, não há, neste capítulo, fundamento para alterar a decisão da Meritíssima Juíza, sem prejuízo de, como se disse, se entender que o alegado nos artigos 6.º e 7.º da contestação já figura nos quesitos 12.º e 13.º.


2.º

Os réus sustentam que a prova produzida conduz a conclusões diferentes das extraídas pelo tribunal a quo, no que se refere ao julgamento da matéria de facto que se encontra nos quesitos 12.º a 24.º e 27.º.

Estes quesitos têm o seguinte teor:

12) Em 1985/1986, F... declarou vender a G... e este declarou comprar, verbalmente, um prédio composto de terreno de sequeiro, centeio, mato e pinheiros, sito na Quinta das ..., freguesia da ..., concelho da ..., que confronta a norte com um prédio dos réus (antes com E....), sul com caminho e prédio dos réus, nascente com caminho público e poente com ..., prédio este omisso na matriz?

13) Tendo incluído no acordo referido, a faixa de terreno descrita em E), como parte integrante do prédio descrito em 12)?

14) Desde a data referida e durante mais de vinte anos, G..., até falecer, e os réus, após o falecimento daquele, entraram e saíram da faixa referida em E), como parte integrante do prédio descrito em C)?

15) Mais limparam-na?

16) Muraram-na?

17) Nela recolheram lenhas, pedra e areia?

18) Pastorearam animais?

19) E cederam-na a terceiros?

20) Sempre à vista de toda a gente?

21) Sem oposição de quem quer que seja, incluindo os autores?

22) Ininterruptamente?

23) Na convicção de serem os seus legítimos proprietários e de ser parte integrante do prédio descrito em C)?

24) O prédio descrito em A)[12] sempre confrontou a norte com um caminho de servidão?

27) Após a morte de G..., os seus únicos filhos dividiram os bens entre si, verbalmente, tendo o prédio descrito em 12) e a faixa de terreno descrita em E)[13] sido adjudicados aos réus?

A Meritíssima Juíza respondeu não provado aos quesitos 12.º a 24.º e 27.º[14].

Os réus entendem que a todos eles se devia responder provado.

É oportuno lembrar que a Meritíssima Juíza respondeu não provado, não apenas aos quesitos 12.º a 24.º e 27.º, como também a todos os restantes que figuram na base instrutória e, ao fundamentar a sua decisão, deixou dito que:

Efectivamente, as testemunhas arroladas pelos autores depuseram de uma forma simples, sem sinais de desconforto e concretizaram em factos os actos de posse afirmados. No entanto, pese embora nada na forma como depuseram permita duvidar da sua credibilidade, a verdade é que têm uma relação familiar directa com os autores e um inegável interesse nos autos, sendo certo que suscita alguma estranheza a circunstância de não terem sido arroladas testemunhas estranhas à família, uma vez que estão em causas factos alegadamente do conhecimento público.

Processado por computador É certo que os elementos referidos, que fragilizam a credibilidade da prova testemunhal apresentada pelos autores, poderiam eventualmente ser suplantados pela forma como as testemunhas depuseram caso não tivesse sido produzida qualquer prova em sentido contrário, passível de tornar duvidosos os factos em apreço. O que não é o caso.

Com efeito, as testemunhas arroladas pelos réus contrariaram a factualidade em análise, tendo afirmado nunca terem visto os réus a praticarem actos de posse na parcela de terreno em discussão. Quanto à credibilidade de tais depoimentos, salienta-se que as duas últimas testemunhas indicadas ( I... e L...) têm uma relação familiar com os réus, ainda que menos próxima do que as testemunhas apresentadas pelos autores. Já a primeira testemunha H... não tem qualquer elo familiar com as partes, pelo que, à partida, sem qualquer interesse pessoal no desfecho da lide. Contudo, pese embora as testemunhas arroladas pelos réus apresentem, no plano da isenção, menos razões para faltarem conscientemente à verdade, o certo é que a maneira como depuseram se revelou mais duvidosa, uma vez que ressaltou dos seus depoimentos uma convicção pessoal e firme no sentido de que a parcela em discussão pertence aos réus, ou seja, um certo comprometimento com a defesa dos interesses destes.

(…)

Verifica-se, assim, que tanto os depoimentos das testemunhas apresentadas pelos autores, como os depoimentos das testemunhas arroladas pelos réus apresentaram fragilidades que não permitem ao Tribunal dar mais credibilidade a uns do que a outros.

Ouvida a prova produzida em julgamento, temos que, desde já, dizer que se concorda com o juízo formulado pela Meritíssima Juíza.

Na verdade, as três testemunhas arroladas pelos autores confirmaram a tese trazida por estes para a lide. Disserem, em síntese, que a faixa de terreno em disputa é dos autores, pois ela integra o prédio que o autor comprou e que antes tinha de renda. Referiram que o autor levava para lá ovelhas e depois um cavalo e que também o semeava com centeio. Isto à vista de todos e sem que ninguém se opusesse. Mencionaram ainda que na aldeia todos sabiam que essa parcela pertence aos autores.

Já as quatro testemunhas indicadas pelos réus sustentaram a versão destes, afirmando que a faixa de terreno em causa faz parte de um prédio que hoje é dos réus, por o terem herdado após a morte do pai da ré (G...), que o havia comprado a F...[15]. Segundo estas testemunhas, o pai da ré usou essa faixa de terreno, nomeadamente tendo lá ovelhas. Depois da sua morte, foram os réus quem passou a usá-la, tendo, em certo momento, permitido que, em períodos diferentes, as testemunhas H... e I..., lá levassem animais para pastar. Tudo à vista de toda a gente e sem que ninguém se opusesse. Disseram também que nunca o autor alegou que essa parte lhe pertencia e que na aldeia todos consideram que ela é dos réus.

Das testemunhas arroladas pelos autores, a primeira ( M...) é nora deles e as outras duas (N... e O.) são seus filhos. Esta proximidade aos autores e aos seus interesses, não pode deixar de suscitar dúvidas e reservas.

Nas testemunhas indicadas pelos réus regista-se que uma é tio deles (I...) e outra é primo (L...). Esta última depôs com nítido empenho em sustentar a versão dos réus, deixando uma ideia de parcialidade. Já aquela primeira (I...) depôs com pouca convicção; quando lhe foi perguntado se G... tinha comprado o terreno a F... respondeu acho que sim e deu igual resposta quando lhe perguntaram se G... tinha de pedir autorização a alguém para ocupar a faixa em disputa e se as pessoas da aldeia tinham a ideia de essa faixa de terreno pertencer a G.... Depois de afirmar, nos três caso, que achava que sim, acabou por dizer que tinha a certeza que assim era.

H... , que é agricultor e vizinho das partes, depôs com aparente isenção. Mas, acaba por colocar em causa a credibilidade do seu depoimento ao relatar a conversa que teve com o réu, quando este o autorizou a usar a faixa de terreno para aí pastarem animais seus (da testemunha). Lembra H... que o réu lhe disse, olha ó H...queres ir para além com as ovelhas? Vais com as ovelhas além pelo lameirinho. Então H... responde vou para lá, mas quero-te dizer quanto é que queres de renda?, ao que o réu lhe respondeu não te quero nada de renda. Vais para lá com elas.

Não se percebe que interesse teria o réu em que outra pessoa usasse o seu terreno e em ser ele a tomar a iniciativa de oferecer tal possibilidade. Também é estranho que, dispondo-se a testemunha a pagar renda, o réu, sem mais, não quisesse aceitar essa contrapartida. Isto, quando, segundo referiu H..., ele andou a pastar animais nesse terreno durante quatro anos. Aliás, também ficou por explicar por que é que o réu, já antes, tinha autorizado I..., conforme este disse, a levar animais seus (de I...) para pastarem nesse local, sem lhe cobrar renda, prolongando-se essa situação por 4/5 anos,

O depoimento de P... também deixa algumas dúvidas. Esta testemunha declarou ter sido Presidente da Junta de Freguesia de ... de 1978[16] até 2004 e que sempre viveu nessa localidade. Com estas credenciais era razoável supor que se tratava de alguém que conhecia bem a freguesia. Porém, a testemunha disse que não sabia a quem é que o terreno dos réus pertenceu antes de ser do pai da ré, dizendo mesmo que não foi de F.... Se, como disseram as testemunhas L..., I...e H..., o pai da ré comprou o imóvel a F..., como é que P... desconhecesse isso, quando esse negócio, segundo alegam os réus, ocorreu em 1985/1986, ou seja num momento em que ele era Presidente da Junta de Freguesia. Se L..., I...e H... se lembram que o pai da ré adquiriu o terreno a F..., por que é que P... não se recorda disso, quando é certo que, como a certa altura mencionou, tem presente que o prédio dos autores foi de F... e que o autor o teve, antes de o comprar, arrendado.

Há aqui dois blocos de depoimentos, absolutamente inconciliáveis, que acabam por se descredibilizar e anular mutuamente. A única certeza que se pode ter é que alguém mente e mente sem hesitar e sem qualquer pudor.

Perante este cenário, não oferecendo os documentos juntos aos autos respostas claras e inequívocas para as questões em apreço, conclui-se que não é possível chegar a um patamar mínimo de certeza quanto à matéria de facto levada à base instrutória, nomeadamente a dos quesitos 12.º a 24.º e 27.º.

Não há, pois, razões para, neste aspecto, divergir do julgamento feito pela Meritíssima Juíza, quando respondeu não provado à matéria dos quesitos 12.º a 24.º e 27.º, sendo certo que o uso, pela Relação, dos poderes de alteração da decisão da 1.ª instância sobre a matéria de facto deve restringir-se aos casos de flagrante desconformidade entre os elementos de prova disponíveis e aquela decisão, nos concretos pontos questionados[17].

Mantém-se, portanto, a resposta de não provado aos quesitos 12.º a 24.º e 27.º.


3.º

Estão provados os seguintes factos:

1) Mostra-se descrito na Conservatória do Registo Predial da ..., com o n.º .../19940922, da freguesia de ..., um prédio rústico, sito na Quinta das ..., inscrito na matriz sob o artigo ..., constando no registo predial com a área de 4970 m2 e com a seguinte composição e confrontações: “terra de regadio e fruteiras (…) norte: E...o; sul e poente: G...; nascente: caminho” (alínea A) da matéria de facto assente).

2) O prédio referido em 1) encontra-se inscrito, no registo predial, a favor dos autores, por “compra” a F..., Q..., R...e S...em 19-10-1994, inscrição essa que derivou da apresentação 1 de 1994/10/28 (alínea B) da matéria de facto assente).

3) Mostra-se descrito na Conservatória do Registo Predial da ..., com o n.º .../20050926, da freguesia de ..., um prédio rústico, sito na Quinta das ..., inscrito na matriz sob o artigo ..., constando no registo predial a seguinte composição e confrontações: “terra de regadio (…) norte e nascente: F...; sul: ...; poente: ...” (alínea C) da matéria de facto assente).

4) O prédio referido em 3) encontra-se inscrito, no registo predial, a favor dos réus, por “sucessão deferida em partilha extrajudicial” de G..., inscrição essa que derivou da apresentação 12 de 2005/09/26 (alínea D) da matéria de facto assente).

5) Dentro das confrontações referidas em A) existe uma faixa de terreno, que constitui um socalco (cômoro), com uma largura de cerca de 23 metros no início e que se vai estreitando no sentido sul-norte, tendo cerca de 2,5 metros de largura na sua extrema norte, e é delimitada a nascente pelo caminho (alínea E) da matéria de facto assente).

6) Os réus desde há, pelo menos, cerca de uns meses ocupam com máquinas agrícolas e animais a faixa referida em 5) (alínea F) da matéria de facto assente).

7) A parcela descrita em 5) confronta a norte com E...o e, na sua confrontação poente, existe o socalco referido em 5).


4.º

A Meritíssima Juíza considerou na decisão recorrida que:

Por todas as razões expostas, entende-se que o art. 7.º do C. R. Predial deve ser interpretado no sentido de incluir os elementos de localização do prédio e respectivos limites, dados pelas confrontações da descrição predial, quando as mesmas permitem a localização e delimitação exacta do objecto do registo, ou seja, nas situações em que, de acordo com os elementos da descrição, se pode delimitar, no local, os limites exactos do prédio, como sucede justamente no caso vertente.

Com efeito, ficou provado que a parcela em discussão está inserida dentro das confrontações resultantes da descrição predial (facto este que também se pôde constatar no local, especificamente quanto à confrontação norte, que os réus aceitaram confrontar com E...o – cfr. pontos 1) e 7) dos factos provados), não havendo qualquer dúvida, à luz da situação registral do prédio, quais os limites exactos do mesmo.

Importa também salientar que não existe qualquer duplicidade de registos, pois o prédio dos réus, descrito no ponto 3) dos factos provados, descrição essa posterior à descrição do prédio dos autores, não inclui a parcela em discussão, porquanto não confronta a nascente com o caminho.

Por todo o exposto, entende-se e conclui-se, à luz do disposto no art. 7.º do C. R. Predial, que se presume que os autores são os proprietários do prédio descrito no ponto 1) dos factos provados, que este prédio inclui a faixa de terreno descrita em 5) e que a demarcação entre o prédio dos autores e o prédio dos réus se faz justamente pelo cômoro, por ser esta a confrontação poente da parcela (cfr. ponto 7) dos factos provados).

Tal presunção não foi abalada, pois os réus não demonstraram os factos constitutivos da aquisição por usucapião (que haviam alegado) e, pese embora os factos vertidos no ponto 6) dos factos provados sejam suficientes para concretizarem a posse em nome dos réus, a verdade é que é posterior ao registo em nome dos autores, pelo que, por força do art. 1268.º/1, do CC, cede em relação à presunção de que os autores beneficiam.

O artigo 7.º do Código do Registo Predial dispõe que o registo definitivo constitui presunção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito, nos precisos termos em que o registo o define.

Esta norma estabelece uma presunção de verdade ao dispor que o registo definitivo constitui presunção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito, nos precisos termos em que o registo o define. (…) Ao limitar esta presunção – iuris tantum como já ficou dito – ao direito e à pessoa do seu titular, o art.º 7.º não abrange os elementos de identificação do prédio, designadamente a sua área ou as suas confrontações[18]

A presunção tem por objecto somente o direito e a pessoa do seu titular, motivo por que não abrange a definição da respectiva delimitação física[19]. Com efeito, a expressão nos precisos termos em que o registo o define reporta-se, somente, à identificação da pessoa do titular inscrito e ao tipo de direito registado, nomeadamente, o de propriedade, o de usufruto ou o de superfície. Os contornos concretos do direito registado, como sejam os limites do imóvel sobre que incide o direito de propriedade, de usufruto, ou outro já não beneficiam da presunção consagrada no citado artigo 7.º. Este tem sido o entendimento, quase uniforme, da jurisprudência, como, aliás, se pode constatar pelas citações que a esse nível se fazem, quer na sentença recorrida[20], quer nas alegações dos réus[21], sendo, por isso, inútil acrescentar qualquer outra.

Aqui chegados, considerando o que acaba de se dizer, logo se conclui que, face à matéria de facto provada, designadamente aos factos que estão sob 1) e 2) dos factos provados, aos autores deve ser reconhecido o direito de propriedade sobre o imóvel registado em nome deles, pois, nessa parte, beneficiam da presunção do artigo 7.º do Código do Registo Predial, que não foi ilidida. Aliás, os réus, não obstante a afirmação genérica feita no artigo 1.º da sua contestação, reconhecem que esse prédio pertence aos autores[22]; o que eles impugnam é que certa faixa de terreno faça parte desse imóvel.

Assim, neste capítulo, deve manter-se o decidido pelo tribunal a quo.

Mas, uma vez que dos factos provados não resulta que a parcela em disputa (que constitui um socalco ou cômoro) integra o prédio dos autores, qualquer pedido que tenha esse facto como pressuposto não pode ser satisfeito, devendo, nesta parte, revogar-se a sentença recorrida.


III

Com fundamento no atrás exposto, julga-se:

1- parcialmente procedente o recurso, revogando-se a sentença recorrida nos segmentos em que condenou os réus a:

a) reconhecerem que o prédio referido no ponto 1) dos factos provados inclui a faixa descrita no ponto 5) dos factos provados, situada mais a Norte, que constitui um socalco ou cômoro e que na sua extrema Norte confronta com o prédio pertencente a E...o, e que os autores são proprietários da mesma;

b) absterem-se de praticar actos que perturbem a posse e o gozo dessa faixa pelos autores;

c) reconhecerem a demarcação já existente da referida faixa de terreno, constituída pela diferença de altura do terreno (cômoro), a poente, que delimita o prédio dos autores com o prédio dos réus.

e absolve-se os réus destes pedidos.

2- improcedente o recurso na restante parte, mantendo-se, no mais, a decisão recorrida.

Custas pelos autores e pelos réus, na proporção de 70% para aqueles e 30% para estes.


António Beça Pereira (Relator)
Nunes Ribeiro
Hélder Almeida


[1] São do Código de Processo Civil todos os artigos adiante mencionados sem qualquer outra referência.
[2] Cfr. despacho das folhas 124 a 128.
[3] Cfr. folhas 123-A a 123-D.
[4] São factos as ocorrências concretas da vida real, Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2.ª Edição, pág. 406. Defendendo esse entendimento, veja-se Remédio Marques, Acção Declarativa à Luz do Código Revisto, 2.ª Edição, pág. 525 e 526.
[5] Neste sentido pode ver-se o Ac. STJ de 30-11-2010 no Proc. 2192/06.6TVPRT.P1. S1, em www.gde.mj.pt. Como dizia Castro Mendes, Direito Processual Civil, Vol. III, 1980, pág. 173, referindo-se à especificação e ao questionário, só de factos portanto se compõe o seu conteúdo.
[6] Pais de Amaral, Direito Processual civil, 8.ª Edição, pág. 376.
[7] Cfr. n.º 1 do artigo 511.º do Código de Processo Civil.
[8] Lebre de Freitas, Código de Processo Civil Anotado, Vol. II, 2.ª Edição, pág. 410.
[9] Remédio Marques, obra citada, pág. 527.
[10] Castro Mendes, obra citada, pág. 175, referindo-se ao questionário.
[11] Segundo o princípio da economia processual deve procurar-se o máximo resultado processual com o mínimo emprego de actividade; o máximo rendimento com o mínimo custo, Manuel Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, 1979, pág. 387.
[12] Em A) dos factos assentes consta que mostra-se descrito na Conservatória do Registo Predial da ..., com o n.º .../19940922, da freguesia de ..., um prédio rústico, sito na Quinta das ..., inscrito na matriz sob o artigo ..., constando no registo predial com a área de 4970 m2 e com a seguinte composição e confrontações: “terra de regadio e fruteiras (…) norte: E...o; sul e poente: G...; nascente: caminho.
[13] Em E) dos factos assentes consta que dentro das confrontações referidas em A) existe uma faixa de terreno, que constitui um socalco (cômoro), com uma largura de cerca de 23 metros no início e que se vai estreitando no sentido sul-norte, tendo cerca de 2,5 metros de largura na sua extrema norte, e é delimitada a nascente pelo caminho.
[14] Cfr. folhas 143 e 144.
[15] A testemunha António Almeida foi, das indicadas pelos réus, a única que disse não saber a quem é que o prédio dos réus pertenceu antes de ser do pai da ré. Afirmou até que antes de ser do pai da ré o imóvel não pertenceu a F....
[16] Na parte final do seu depoimento acabou por admitir que o seu primeiro mandato pode não se ter iniciado em 1978.
[17] Ac. Rel. Porto de 19-9-00, CJ 2000-IV-186.
[18] Seabra Lopes, Direito dos Registos e Notariado, 5.ª Edição, pág. 413 e 414.
[19] Ac. STJ de 8-10-2009 no Proc. 839/04.8TBGRD, www.gde.mj.pt.
[20] Cfr. folha 161.
[21] Cfr. folhas 178 a 181.
[22] Cfr. artigos 11.º e 17.º a 21.º da contestação.