Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1819/07.7TBACB.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ANABELA LUNA DE CARVALHO
Descritores: ACÇÃO ESPECIAL PARA CUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÕES PECUNIÁRIAS
MEIOS DE PROVA
DEPOIMENTO ESCRITO
AUDIÊNCIA DE JULGAMENTO
NULIDADE PROCESSUAL
Data do Acordão: 02/10/2015
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE LEIRIA - ALCOBAÇA - INST. LOCAL - SECÇÃO CÍVEL - J1
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ANULADA
Legislação Nacional: DL Nº 269/98 DE 1/9, ART.195 CPC
Sumário: 1- Não está vedado pelo nº 4 do art. 3º do regime anexo ao DL 269/98 de 01/09, o oferecimento, anteriormente à audiência, de um meio de prova correspondente a um depoimento escrito, nos termos do artigo 5º do mesmo regime.

2- O indicado artigo 3º nº 4 do regime anexo, ao referir que «(a)s provas são oferecidas na audiência (…)», quer significar apenas que as provas podem ser oferecidas na audiência, não inviabilizando que o sejam antes.

3 - A não admissão e consequente não valoração dessa prova, porque suscetível de influir no exame e na decisão da causa, acarreta uma nulidade – omissão de ato que a lei prescreve – nos termos do art. 195º nº 1 do CPC, com prejuízo da sentença proferida, que dele depende em absoluto.

Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

                                                                        I

B (…), SA, com sede em Lisboa, intentou contra A (…) residente em Aljubarrota (Prazeres), ação com processo especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos, nos termos do Decreto-Lei nº 269/98 de 1 de Setembro, pedindo a condenação do Requerido em determinada quantia (€. 6.960,42), acrescida de juros.

Fundamenta o pedido no incumprimento por parte do Requerido de um contrato de mútuo, tendo em vista a aquisição de um veículo automóvel, no qual ficara acordado o pagamento de 24 prestações mensais de determinado montante, não tendo sido pagas, a 7ª prestação e seguintes.

Juntou aos autos o contrato de mútuo (fls. 9 e 10).

O Requerido foi citado editalmente, por desconhecimento do seu paradeiro, após o que foi citado o Ministério Público em sua representação.

Foi entretanto designada data para a realização da audiência de julgamento.

Notificado da marcação da audiência, veio o Requerente através do seu mandatário, juntar aos autos depoimentos escritos das testemunhas que arrolou, funcionários do Requerente conhecedores dos factos pelas respetivas funções, acompanhados de fotocópia com os respetivos documentos de identificação, afirmando no requerimento probatório que acompanha tais depoimentos que, nem o advogado signatário nem qualquer outro dos mandatários judiciais constantes da procuração junta pelo Requerente aos autos, comparecerão no dia e hora designados para a audiência de julgamento (fls. 118).

Na sequência, a Mmª Juíza da 1ª instância proferiu o seguinte despacho (4235381), após ordenar verbalmente a abertura de conclusão:

«Para os efeitos tidos por convenientes faço consignar o seguinte entendimento do tribunal: conforme decorre do disposto no nº 4 do art.º 3º do Regime Anexo ao DL 269/98 de 01/09, as provas são oferecidas na audiência, regra que, tal como refere Carlos Pereira Gil (Algumas Notas sobre os DLs 269/98 e 247/97, Centro de Estudos Judiciários, Julho de 2000, pp. 21 e 22) cujo entendimento perfilhamos, se aplica a todas as provas, sejam elas pré-constituídas ou constituendas, aplicando-se assim inclusivamente, no nosso entender, à faculdade de apresentação de depoimento por escrito.

É aliás, com base nessa mesma regra que, conforme faz notar Salvador da Costa (A Injunção e as Conexas Ação e Execução, 5ª edição, Almedina, 2005, p. 116)), “Na hipótese de nem as partes nem os respetivos mandatários comparecerem em audiência e julgamento, mas apresentarem testemunhas para depor, parece que o tribunal não as pode considerar para efeitos de prova, porque não foram apresentadas por quem o devia fazer e o juiz não pode presumir, nessa parte, a vontade e o interesse das partes”.

Em face do exposto e em conformidade com o entendimento supra consignado, adverte-se o ilustre mandatário do Requerente que as provas oferecidas por intermédio de fls. 118 e ss. só serão atendidas caso a parte venha a comparecer em sede de audiência de julgamento ou nela se faça representar por mandatário.»

Desse despacho veio o Requerente interpor recurso de apelação (com a referência 1195611), concluindo do seguinte modo as suas alegações de recurso:

1) É expresso o artigo 266 nº 1 do Código de Processo Civil revogado, artigo 7º do atual CPC, ao estabelecer que “na condução e intervenção no processo devem os magistrados, os mandatários judiciais e as próprias partes cooperarem entre si, concorrendo para se obter, com brevidade e eficácia, a justa composição do litígio”;

2) O art. 3º nº 3 do Decreto-Lei 269/98 de 1 de Setembro, que continua em vigor, não permite concluir, dentro de toda a economia do referido Dec-Lei que as provas tenham de ser oferecidas apenas e unicamente na audiência de discussão e julgamento, podendo as mesmas  ser efetivamente oferecidas, quer com o requerimento ou petição inicial, quer até antes da realização da audiência de discussão e julgamento, e as partes podem apresentar depoimentos escritos.

3) Atento o disposto no artigo 4º nºs 1 e 2 do Dec-Lei 269/98 de 1 de setembro, é manifestamente absurda e ilegal a interpretação do citado nº 3 do art. 3º do citado normativo legal, constante do despacho recorrido.

4) Deve, portanto, julgar-se procedente e provado o presente recurso e, em consequência, reconhecer-se que o disposto no nº 3 do artigo 3º do Decreto-Lei 269/98 de 1 de Setembro, não impede a título algum, que as provas, designadamente as testemunhas  a ser indicadas nos processos regulados pelo citado normativo legal, não possam ser oferecidas antes – por qualquer meio, por quem, para o efeito tiver competência evidentemente – da audiência de discussão e julgamento, pelo que o despacho recorrido violou não só o citado normativo do artigo 7º do atual Código de Processo Civil (art. 66º do CPC revogado) como também o disposto no artº 3º nº 3 e no art. 4º nºs 1 e 2, do referido Dec-Lei 269/98 de 1 de setembro, pelo que deve julgar-se procedente e provado o presente recurso e, em consequência, considerar-se validamente indicadas, para efeitos de inquirição aquando da realização da audiência de discussão e julgamento, as testemunhas que identificadas se encontram a fls. – dos autos, que aliás depuseram por escrito desta forma se fazendo Justiça.

Com as alegações de recurso juntou o Requerente cópia de um acórdão do Tribunal da Relação do Porto, pretensamente favorável à sua pretensão.

Tal recurso não foi admitido, conforme despacho que ora se transcreve:

«Uma vez que o despacho em apreço consubstancia a mera consignação de um entendimento do tribunal a propósito de meio de prova oferecido e não um despacho de rejeição do referido meio de prova, considero não ser de admitir o mesmo».

Dessa rejeição veio o Banco (…) reclamar (fls. 178) afirmando que, o despacho que impugnou por via do recurso teve consequências, produziu efeitos decisórios, julgando-se a ação improcedente. Não é assim, nem um despacho de mero expediente, nem um despacho proferido no uso de um poder discricionário. Integra-se o mesmo no dever de administrar a justiça, sendo um despacho proferido nos termos e de harmonia com o disposto no nº1 do art. 152 do CPC, constituindo uma decisão de harmonia com o disposto no art. 154 do referido normativo legal. Sendo, por isso, suscetível de recurso.

A reclamação, devidamente instruída, não chegou a ser autuada por apenso, face à celeridade com que o processo foi decidido, tendo subido com o recurso interposto da decisão final, mantendo-se assim para decisão.

Aberta a audiência de julgamento, sem que o mandatário do Requerente, ou as testemunhas, tivessem comparecido, conforme aquele anteriormente anunciara, a Mmª Juíza proferiu o seguinte despacho:

«Sem prejuízo de oportunamente se apreciar o recurso intentado pelo Requerente sob a referência 1195611, uma vez que nem a Requerente nem qualquer mandatário desta compareceram nesta audiência de julgamento, nem ofereceram aqui qualquer prova, nesta que é a sede própria para o efeito, reiterando-se assim o entendimento já anteriormente expendido do despacho de fls. 129 e seg., decide-se pois, sem necessidade de outras considerações, não admitir o requerimento acima referido, e em consequência, determina-se o seu oportuno desentranhamento e devolução ao apresentante».

Após ter sido dada a palavra para alegações orais à Digna Magistrada do Ministério Público foi encerrada a audiência.

Na sentença proferida por escrito (fls. 156) consignou-se que, na ausência de qualquer prova produzida pela requerente, não se mostram provados quaisquer factos com relevo para a decisão da causa. E que, no que diz respeito aos factos não provados, resultaram todos os alegados pela requerente, nomeadamente a celebração do contrato.

Consequentemente foi a ação julgada integralmente improcedente e, em consequência, absolvido o Requerido do pedido.

Uma vez mais veio o Requerente recorrer, concluindo do seguinte modo as suas alegações de recurso:

1) É expresso o artigo 266 nº 1 do Código de Processo Civil revogado, artigo 7º do atual CPC, ao estabelecer que “na condução e intervenção no processo devem os magistrados, os mandatários judiciais e as próprias partes cooperarem entre si, concorrendo para se obter, com brevidade e eficácia, a justa composição do litígio”;

2) O art. 3º nº 3 do Decreto-Lei 269/98 de 1 de Setembro, que continua em vigor, não permite concluir, dentro de toda a economia do referido Dec-Lei que as provas tenham de ser oferecidas apenas e unicamente na audiência de discussão e julgamento, podendo as mesmas  ser efetivamente oferecidas, quer com o requerimento ou petição inicial, quer até antes da realização da audiência de discussão e julgamento, e as partes podem apresentar depoimentos escritos.

3) Atento o disposto no artigo 4º nºs 1 e 2 do Dec-Lei 269/98 de 1 de setembro, é manifestamente absurda e ilegal a interpretação do citado nº 3 do art. 3º do citado normativo legal, no sentido de que as provas não podem ser apresentadas antes da audiência de discussão e julgamento.

4) O art. 5º do regime Anexo ao Decreto-Lei 269/98 de 1 de setembro, permite a apresentação de depoimentos escritos.

5) O art. 641ºdo atual CPC impõe aos Srs. Magistrados que se pronunciem sobre os recursos interpostos, o que o Sr. Juiz “a quo” não fez.

6) De harmonia com o disposto no art. 662 nº 1 do CPC, deve este Tribunal da Relação de Coimbra, face ao que consta dos depoimentos escritos referidos, dar como provada toda a matéria de facto constante da petição inicial.

7) Deve, portanto, julgar-se procedente e provado o presente recurso e, em consequência, reconhecer-se que o disposto no nº 4 do artigo 3º e no artigo 5º do Regime Anexo ao Decreto-Lei 269/98 de 1 de Setembro, não impede que as provas, designadamente as testemunhas a ser indicadas nos processos regulados pelo citado normativo legal, não possam ser oferecidas antes da audiência de discussão e julgamento, e apresentarem-se depoimentos escritos das mesmas, que o Tribunal deve aceitar, face ao disposto no atual art. 7º do atual CPC (art. 266 do CPC revogado), preceitos estes violados, juntamente com o art. 641 do CPC, pela sentença recorrida, e tomando em consideração os ditos depoimentos escritos deve, assim, nos termos dos artigos 662 nº 1 do CPC, alterar-se a resposta dada quanto à matéria de facto em 1ª instância e julgar-se provada toda a matéria de facto constante da petição inicial, e, consequentemente, deve julgar-se procedente e provado o presente recurso e, em consequência, revogar-se a sentença recorrida, substituindo-se a mesma por Acórdão que julgue a ação procedente por provada.

Relativamente a ambos os recursos não foram apresentadas contra-alegações.

                                                                       

                                                                        II

Na consideração de que o objeto dos recursos se delimita pelas conclusões das alegações (art. 635 nº 3 do nCPC), sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (art. 608 in fine), são as seguintes as questões a decidir, as quais, sendo comuns a ambos os recursos interpostos, o primeiro não admitido e o segundo admitido, e esgotando as mesmas o conflito que as três reações do Requerente corporizam (recursos e reclamação), justificam uma decisão conjunta e retiram utilidade prática ao conhecimento autónomo da Reclamação:

I - Se as provas apresentadas pelo Requerente, sob a forma de depoimentos testemunhais escritos, não podiam deixar de ser admitidas.

II - Em caso, afirmativo, consequências.

I. Da (i)legalidade do despacho de não admissão dos meios de prova com fundamento em extemporaneidade

Entendeu o tribunal recorrido que os depoimentos escritos, porque apresentados em data anterior à audiência de julgamento, eram extemporâneos, invocando, para o efeito o disposto no nº 4 do artigo 3º do Regime Anexo ao DL 269/98 de 01/09, diploma que regula os procedimentos para cumprimento de obrigações emergentes de contratos e injunção.

Rege o artigo 3.º:

«Termos posteriores aos articulados

1 - Se a ação tiver de prosseguir, pode o juiz julgar logo procedente alguma exceção dilatória ou nulidade que lhe cumpra conhecer ou decidir do mérito da causa.

2 - A audiência de julgamento realiza-se dentro de 30 dias, não sendo aplicável o disposto nos n.ºs 1 a 3 do artigo 155.º do Código de Processo Civil às ações de valor não superior à alçada do tribunal de 1.ª instância.

3 - Quando a decisão final admita recurso ordinário, pode qualquer das partes requerer a gravação da audiência.

4 - As provas são oferecidas na audiência, podendo cada parte apresentar até três testemunhas, se o valor da ação não exceder a alçada do tribunal de 1.ª instância, ou até cinco testemunhas, nos restantes casos.

5 - Em qualquer dos casos previstos no número anterior, não pode a parte produzir mais de três testemunhas sobre cada um dos factos que se propõe provar, não se contando as que tenham declarado nada saber». (negritos nossos)

Por sua vez o artigo 5.º do mesmo diploma legal estabelece um regime facilitado de prestação de depoimento testemunhal, estabelecendo que:

«Depoimento apresentado por escrito

1 - Se a testemunha tiver conhecimento de factos por virtude do exercício das suas funções, pode o depoimento ser prestado através de documento escrito, datado e assinado pelo seu Requerente, com indicação da ação a que respeita e do qual conste relação discriminada dos factos e das razões de ciência invocadas.

2 - O escrito a que se refere o número anterior será acompanhado de cópia de documento de identificação do depoente e indicará se existe alguma relação de parentesco, afinidade, amizade ou dependência com as partes ou qualquer interesse na ação.

3 - Quando o entenda necessário, poderá o juiz, oficiosamente ou a requerimento das partes, determinar, sendo ainda possível, a renovação do depoimento na sua presença». (negritos nossos)

Remetendo-nos para esta última norma, importa atentar que o meio probatório em causa – depoimento testemunhal por escrito – admissível no Código de Processo Civil, tem aqui um regime de aplicação mais livre, sem necessidade de chamar à colação pressupostos, como impossibilidade ou dificuldade do depoente (art.ºs 419 e 518º do CPC), ou o acordo das partes (art. 517 do CPC) exigidos naquele.

O art. 5º do DL 269/98 de 01/09 estabelece apenas, como requisito de legitimação do depoimento escrito por parte da testemunha - “o conhecimento de factos por virtude do exercício das suas funções”.

Tanto basta para que tais depoimentos sejam suscetíveis de análise crítica e do exercício de contraditório, em audiência de julgamento, sendo que “quando o entenda necessário, poderá o juiz, oficiosamente ou a requerimento das partes, determinar (…) a renovação do depoimento na sua presença”.

Assente que se trata de um meio probatório válido, analisemos a oportunidade da sua apresentação.

Ora, procedendo a uma interpretação meramente literal e estrita da norma do artigo 3º do Dec-Lei nº 268/98 de 01/09, entendeu a Srª Juíza que, se as provas são oferecidas na audiência, não são admissíveis as provas oferecidas fora da audiência, ainda que em data anterior a esta.

Posição que, a ser consequente em toda a sua extensão, obrigaria a tomar idêntica posição de extemporaneidade relativamente ao contrato junto aos autos com o requerimento inicial, o que não aconteceu.

Ora, em coerência com tal entendimento, e como a audiência se poderia realizar sem a presença dos mandatários, cuja falta não é sequer suscetível de provocar adiamento se ação for de valor inferior à alçada de 1ª instância, ou sendo superior, o mandatário anuncie que não vai comparecer, como foi o caso[1], temos de admitir que, de acordo com tal interpretação, o mandatário do Requerente, podendo não comparecer, haveria, contudo, que ter mandado o requerimento probatório e os depoimentos escritos ao processo tão só no dia designado para a audiência e não antes.

Na consideração deste cenário, importa questionar que prejuízo pode acarretar para as partes ou para o tribunal, a junção antecipada dos meios de prova.

Nenhum prejuízo daí decorre.

Convém, aliás, ter presente qual o escopo do legislador com tal comando e se o mesmo conflitua com uma interpretação mais lata e proveitosa que permita a apresentação dos meios de prova em momento anterior.

O Dec-Lei nº 268/98 de 01/09 foi criado no domínio do cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos que não excedam o valor da alçada dos tribunais de 1.ª instância, num espírito de desjudicialização e de consensualidade dum certo tipo de litígios, de simplificação, de remoção de obstáculos processuais, em consonância com a normal simplicidade desse tipo de ações (cfr. diploma preambular).

Contende, a interpretação restrita da 1ª instância, com os propósitos de agilização e simplificação processual do diploma.

Contende ainda, com princípios e direitos processuais civis relevantes, como sejam: o princípio da cooperação imposto aos magistrados, mandatários judiciais e partes, com vista à obtenção, com brevidade e eficácia, da justa composição do litígio (previsto no art. 7º do CPC); o direito à prova (consignado, entre outros, no art. 598 do CPC), o direito a obter em prazo razoável a justa composição do litígio (previsto no artº 2º nº 1 do mesmo compêndio).

O despacho que não admitiu o requerimento probatório junto aos autos em data anterior à audiência de julgamento é, assim, com todo o respeito, injustificado e desacompanhado de qualquer razão plausível que o sustente.

Entendemos, assim, acompanhando, a posição tomada em recente “Decisão Sumária” pelo Exmº Sr. Desembargador Teles Pereira, no âmbito do Processo nº 1369/09.77TBACB.C1, neste Tribunal da Relação que, “não está vedado pelo nº 4 do artº 3º do referido regime anexo o oferecimento de um meio de prova correspondente a um depoimento escrito, nos termos do artigo 5º do mesmo regime, anteriormente à audiência. Envolve este entendimento, pois, a consideração de que o indicado artigo 3º nº 4 do regime anexo, ao referir que «(a)s provas são oferecidas na audiência (…)», quer significar que as provas podem ser oferecidas na audiência, não inviabilizando que o sejam antes”.

Na mesma linha de entendimento, em substituição da decisão impugnada, que ora se revoga, decide-se, admitir os meios de prova apresentados.

II. Consequências da decisão de admissão dos meios de prova

A audiência de julgamento que se realizou sem atender a tais meios de prova, ato que a lei prescreve (depoimentos escritos das testemunhas que exercendo funções na Requerente, declararam ter conhecimento dos factos por via do exercício das suas funções- art. 5º do DL 269/98 de 01/09) e, cujo não atendimento, foi suscetível de influir no exame e na decisão da causa, uma vez que a ação foi julgada improcedente por falta de prova dos factos alegados pelo Requerente, está, assim, inquinada de nulidade, nos termos do art.195 nº 1 do CPC.

Nulidade essa que foi objeto de arguição pela parte interessada, nos termos do artigo 196 do CPC, pelo que, não está o Tribunal inibido de dela conhecer.

Assim, julgando-se nula a audiência de julgamento por omissão de um ato – assaz relevante – que a lei prescreve, importa que o Tribunal de 1ª instância repita o julgamento tendo, agora, em consideração, os depoimentos escritos apresentados (bem como o contrato junto aos autos) e, se o entender necessário, poderá o tribunal, oficiosamente ou a requerimento das partes, determinar, sendo ainda possível, a renovação do(s) depoimento(s) na sua presença, nos termos do nº 3 do art. 5º do citado DL 268/98 de 1/9.

Importa, ainda, dar sem efeito a sentença proferida, por se tratar de ato afetado pela nulidade (art. 195 nº 2 do CPC).

Em suma:

- Não está vedado pelo nº 4 do art. 3º do regime anexo ao DL 269/98 de 01/09, o oferecimento, anteriormente à audiência, de um meio de prova correspondente a um depoimento escrito, nos termos do artigo 5º do mesmo regime.

- O indicado artigo 3º nº 4 do regime anexo, ao referir que «(a)s provas são oferecidas na audiência (…)», quer significar apenas que as provas podem ser oferecidas na audiência, não inviabilizando que o sejam antes.

- A não admissão e consequente não valoração dessa prova, porque suscetível de influir no exame e na decisão da causa, acarreta uma nulidade – omissão de ato que a lei prescreve – nos termos do art. 195º nº 1 do CPC, com prejuízo da sentença proferida, que dele depende em absoluto.

                                                            IV

Termos em que acorda-se em anular o despacho constante da ata de fls. 154/155 determinando-se que o Tribunal de 1ª instância, nos termos do art. 5º do regime anexo ao DL 269/98 de 01/09, aprecie e valore os depoimentos escritos apresentados a fls. 119 a 126. Mais se anula o julgamento e sentença de fls. 156/158, ordenando-se a repetição do julgamento.

Custas a fixar a final, pela parte que ficar vencida.

 Anabela Luna de Carvalho ( relatora )

 João Moreira do Carmo

 José Fonte Ramos


[1] Artigo 4.º - Audiência de julgamento
1 - Se as partes estiverem presentes ou representadas, o juiz procurará conciliá-las; frustrando-se a conciliação, produzem-se as provas que ao caso couber.
2 - Não é motivo de adiamento a falta, ainda que justificada, de qualquer das partes e, nas ações de valor não superior à alçada do tribunal de 1.ª instância, também a dos seus mandatários.
3 - Nas ações de valor superior à alçada do tribunal de 1.ª instância, em caso de adiamento, a audiência de julgamento deve efetuar-se num dos 30 dias imediatos, não podendo haver segundo adiamento.
4 - Nas ações de valor não superior à alçada do tribunal de 1.ª instância, quando as partes não tenham constituído mandatário judicial ou este não comparecer, a inquirição das testemunhas é efetuada pelo juiz.
(…)