Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
24916/08.7YIPRT.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: FRANCISCO CAETANO
Descritores: SUBEMPREITADA
CLÁUSULA PENAL
EXCEPÇÃO DE NÃO CUMPRIMENTO
Data do Acordão: 04/24/2012
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: OURÉM 2º J
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE REVOGADA
Legislação Nacional: ARTS 350.º, 799.º E 812.º DO CC
Sumário: I – Porque a exceptio non rite adimpleti contractus deverá corresponder à violação do direito do credor, de acordo com o princípio da boa fé, deverá o mesmo ser condenado na importância indevidamente retida subtraída da dispendida na reparação dos defeitos em substituição do devedor;

II – Não sendo necessário a dedução específica de pedido de redução equitativa de cláusula penal deve, contudo, o devedor alegar e provar factos conducentes à consideração do seu carácter manifestamente excessivo.

Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

1. Relatório

A..., Lda.” deduziu procedimento especial de injunção contra “B..., SA”, pedindo a condenação desta a pagar-lhe a importância de € 139.342,38, sendo € 125.979,40 de capital, € 12.324,98 de juros de mora, à taxa de 11,20%, desde 7.4.07, € 750,00 de “outras quantias” e € 288,00 de taxa de justiça.

Alegou, para tanto, em síntese, que a requerida lhe adjudicou, em subempreitada, a realização de trabalhos de fabrico e montagem de uma clarabóia e perfis em alumínio, que foram por si realizados, sem que a requerida tenha efectuado o seu pagamento, sendo que o custo total dos trabalhos se encontra titulado em três facturas, uma com vencimento em 7 de Maio de 2007, outra vencida em 13 de Junho de 2007 e a terceira em 18 de Outubro do mesmo ano.

Notificada, a requerida apresentou requerimento de oposição, alegando, em síntese, que a acção só em parte procede, no que se refere à importância global de € 120.490,41 titulada nas facturas nºs 13.687 e 13.751, tendo deduzido as excepções peremptórias da compensação e daquilo que designou de incumprimento do contrato de subempreitada, mas que se reconduz a uma excepção de não cumprimento do contrato.

No que se refere à primeira destas excepções invocou o valor que lhe é devido, a título de cláusula penal, pelos atrasos com que a requerente realizou os trabalhos que lhe foram encomendados, nos termos previstos no contrato de subempreitada entre ambas celebrado, por força do que a requerente se tornou devedora da importância total de € 98.454,28, que pretende compensar com as quantias tituladas nas facturas nºs 13687 e 13751;

Quanto à segunda das invocadas excepções, porque no que se refere à construção da clarabóia a mesma foi executada com defeitos, oportuna e atempadamente denunciados à requerente e que esta ainda não corrigiu, a quantia titulada na factura nº 13.957 não lhe é devida enquanto não proceder a tal correcção.

Remetidos os autos à distribuição e notificada a requerente da oposição, apresentou articulado de resposta, concluindo pela condenação da requerida a pagar a quantia constante do requerimento de injunção e a condenação da mesma em multa, como litigante de má-fé.

Teve lugar uma audiência preliminar, em cujo decurso foi proferido despacho saneador e seleccionada a matéria de facto assente e organizada a base instrutória, que não foram objecto de reclamação.

Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, finda a qual foi proferida decisão sobre a matéria de facto, de que igualmente não houve reclamação.

Proferida sentença, foi a acção julgada parcialmente procedente e a R. condenada a pagar à A. a quantia de € 22.036,14, acrescida de juros de mora, à taxa legal dos juros comerciais, sobre a quantia de € 8.339,64, a partir da data de vencimento da factura n.º 13687 e sobre a quantia de € 13.696,50, a partir da data de vencimento da factura n.º 13751, ou seja, respectivamente, a partir do dia 7.5.07 e do dia 13.6.07.

Inconformada, recorreu a A. apresentando alegações onde formulou as seguintes úteis e resumidas conclusões:

a) – A resposta dada ao art.º 10.º da base instrutória (b. i.) deveria ter sido provada, em vez de não provada, já que a A. foi confrontada com trabalhos a mais com influência directa no andamento da obra;

b) – A multa aplicada à recorrente desrespeitou a cláusula contratual 10.ª, n.ºs 4 e 6 (e não 5, como por lapso se indicou) do contrato de subempreitada firmado entre as partes, dado que os atrasos não foram de sua responsabilidade e não foi seguido o processo aí previsto de comunicação, por carta registada com aviso de recepção, não podendo suprir tal omissão o envio dos faxes de 1 e 22.2, bem como o auto n.º 2 e o doc. n.º 11 junto com a oposição, por se tratar de uma nota de débito, a não admitir, já, qualquer defesa, em 8 dias;

c) – A excepção de não cumprimento quanto à quantia de € 5.488,95 objecto da factura n.º 13957 não pode proceder, uma vez que os defeitos da clarabóia já se encontravam consertados à data da sentença, conforme a motivação da decisão sobre a matéria de facto, não podendo a A. ir reparara o que está consertado;

d) – A Ré não alegou que a A. lhe tenha provocado qualquer prejuízo ou que tivesse sofrido qualquer sanção por parte do dono da obra;

e) – O valor da multa de 50% do valor da adjudicação é, por isso, manifesta e clamorosamente excessivo, pelo que deve a cláusula penal ser equitativamente reduzida;

f) – A sentença violou o disposto nos art.ºs 653.º, n.º 2 do CPC e os art.ºs 236.º, 237.º e 406.º, do CC, pelo que deve ser revogada e a acção julgada totalmente procedente e a Ré recorrida condenada nos pedidos.

Na resposta às alegações, a recorrida pugnou pela manutenção da resposta dada ao art.º 10.º da b. i., quanto ao formalismo da comunicação da multa para lá dos faxes e auto de medição n.º 2 recebidos pela recorrente enviou a esta a carta registada com A/R, sobre que nunca nada foi dito, quanto à exceptio pronunciou-se pela sua improcedência e quanto à redução equitativa da cláusula penal trata-se de matéria nova, antes não abordada e, por isso, fora do conhecimento deste tribunal de recurso e que, em último caso, deverá ser julgada improcedente.

Concluiu pela manutenção da sentença recorrida.

Colhidos os vistos, cumpre decidir, sendo questões a apreciar;

a) – A impugnação da resposta de não provado dada ao art.º 10.º da b. i., que deverá ser provado;

b) – Se a cláusula penal moratória (multa) foi substancial e formalmente bem aplicada;

c) – Se havia fundamento para o deferimento da exceptio non rite adimpleti contractus;

d) – Se a cláusula penal é manifestamente excessiva e se nesta sede pode ou deve haver lugar à sua redução.

Vejamos.


*

            2. Fundamentação

            2.1. De facto

 A factualidade a que se ateve a sentença recorrida foi a seguinte:

a) - A autora dedica-se à actividade de serralharia civil e mecânica em alumínio e PVC, decapagem e metalização (alínea A) da matéria assente);

b) - A ré dedica-se à actividade de construção de edifícios e engenharia civil (alínea B) da matéria assente);

c) - No domínio das respectivas actividades, a ré contactou a autora para que esta lhe indicasse qual o preço pela realização dos trabalhos de execução de vão e fachadas, conclusão da fachada principal e conclusão da fachada da clarabóia da obra «Edifício Multifuncional» sito em ..., Leiria (alínea C) da matéria assente)

d) - No seguimento desses contactos a autora apresentou à ré um orçamento propondo-se realizar as obras tidas em vista pelo preço total de 162.734,33 euros, acrescido de IVA (alínea D) da matéria assente);

e) - A ré aceitou o orçamento proposto pelo montante aludido em D), mediante nota de encomenda nº 3919/2006 (alínea E) da matéria assente);

f) - Em 22 de Dezembro de 2006, com a designação de «contrato de subempreitada», a autora e a ré celebraram um acordo escrito, nos seguintes termos:

g) - A autora, na qualidade de subempreiteira obrigou-se, perante a ré, esta na qualidade de empreiteira, a executar o vão e fachadas, conclusão da fachada principal e conclusão da fachada de clarabóia da obra «edifício multifuncional», sito em Leiria, de acordo com a nota de encomenda nº 3919/2006;

h) - Em contrapartida, a ré obrigou-se, perante a autora, a entregar a esta, em pagamento do preço destes trabalhos, a quantia de € 162.734,33, acrescidos de IVA à taxa legal em vigor;

i) - O prazo de execução destes trabalhos foi fixado em 44 dias, contados de forma contínua incluindo sábados, domingos e feriados, com início a partir de 18 de Dezembro de 2006, sendo que a conclusão da fachada principal e da fachada da clarabóia deveriam ocorrer até ao dia 30 de Dezembro de 2006;

j) - A montagem da clarabóia deveria estar concluída até ao dia 10 de Janeiro de2007 e a conclusão dos restantes vãos, até ao dia 30 de Janeiro de 2007;

l) - O pagamento dos trabalhos seria feito com base em medições elaboradas mensalmente pela empreiteira, no primeiro dia útil do mês seguinte à realização dos trabalhos e as respectivas quantias pagas 60 dias após a entrada da factura, nos escritórios da empreiteira, acompanhada da respectiva nota de encomenda, sendo que a factura teria de ser entregue à empreiteira no prazo máximo de oito dias, após a realização da medição dos trabalhos executados pela subempreiteira;

m) - Nos termos do mesmo acordo (cláusula décima, parágrafos terceiro e quarto), «se o subempreiteiro não concluir os trabalhos no prazo contratualmente fixado ou nos prazos parciais acordados, acrescidos das prorrogações a que tenha havido direito, ser-lhe-á aplicada uma multa diária de 2% do valor da adjudicação, até um máximo de 50% do valor da adjudicação (…) as multas referidas no número anterior serão comunicadas pelo empreiteiro ao subempreiteiro, por carta registada com aviso de recepção, para que este deduza a defesa que tenha por conveniente, no prazo de oito dias» (acordo consubstanciado no escrito de fls. 18 a 31 dado por integralmente reproduzido e alínea F) da matéria assente);

n) - Após o que a ré entregou à autora a realização dos trabalhos aludidos em C) (alínea G) da matéria assente);

o) - Para além dos trabalhos acordados levar a cabo pela autora houve outros que não estavam compreendidos nesse acordo (resposta ao nº 8 da base instrutória);

p) - E esses trabalhos a mais foram solicitados pela ré (resposta ao nº 9 da base instrutória);

q) - Por fax remetido à autora, em 15 de Dezembro de 2006, a ré comunicou-lhe o seguinte:

«Assunto: D... de Leiria

«(…) Vimos por este meio apresentar a nossa preocupação pela forma como estão a decorrer os trabalhos na obra mencionada em epígrafe. O início dos vossos trabalhos em obra está marcado para a próxima 2ª feira dia 18/12/2006 e no dia de hoje 6ª feira dia 15/12/2006 ainda não foram à obra tirar medidas conforme combinado no dia de ontem com o Sr. E... e as tentativas telefónicas de o contactar tornaram-se infrutíferas.

(...) ficaram claros os prazos de execução desta subempreitada conforme a nossa adjudicação (…):

Entrada em obra 18/12/2006;

Final da fachada principal e da fachada da clarabóia 30/12/2006; Início da clarabóia 03/01/2007;

Final da clarabóia 10/01/2007;

Final da obra 15/01/2007.

r) - Prazos que terão de ser cumpridos, caso contrário terão como consequência custos que não poderão ser suportados pela B... SA (comunicação de fls. 33 dada por reproduzida e resposta ao nº 3 da base instrutória);

s) - Em 26 de Dezembro de 2006, a ré remeteu um fax à autora, acerca do início dos mesmos trabalhos a que aludem a comunicação de fls. 33 e a alínea F) da matéria assente, com o seguinte teor:

«Vimos por este meio, após várias tentativas de contactar o Sr. E..., solicitar que nos seja dito qual a data de entrada em obra, uma vez que tinha sido combinado verbalmente a entrada no dia de hoje (…).» (comunicação de fls. 34 e 35 dada por reproduzida e resposta ao nº 3 da base instrutória);

t) - Em 28 de Dezembro de 2006, a ré remeteu um fax à autora, acerca do início dos mesmos trabalhos a que aludem a comunicação de fls. 33 e a alínea F) da matéria assente, com o seguinte teor:

«Vimos por este meio mais uma vez apresentar a nossa preocupação pela forma como estão a decorrer os trabalhos na obra mencionada em epígrafe. No dia de hoje, 28 de Dezembro de 2006, ainda não entraram em obra comprometendo já neste momento os prazos parciais acordados. O Sr. E... já nos comunicou inúmeras datas de entrada em obra não tendo cumprido nenhuma até ao momento. Ontem não iniciaram os trabalhos conforme combinado, telefonicamente comunicou que seria hoje às 8 da manhã e hoje, comunicou que seria amanhã às 8 da manhã …

«Neste sentido, a nossa preocupação centra-se neste momento com o facto de os trabalhos no interior do edifício terem avançado conforme o planeamento e a fachada não ficar concluída até ao dia acordado com a empresa A..., Lda., dia 30/12/2006, ou seja, neste momento estão os tectos falsos e as paredes de pladur sujeitas às intempéries.

«Assim é da vossa responsabilidade todos e quaisquer estragos que venham a acontecer devido às intempéries dentro do edifício (…)» (comunicação de fls. 36 e 37 dada por reproduzida e resposta ao nº 3 da base instrutória);

u) - Em 11 de Janeiro de 2007, a ré remeteu um fax à autora, acerca dos mesmos trabalhos a que aludem a comunicação de fls. 33 e a alínea F) da matéria assente, como seguinte teor:

«Vimos por este meio mais uma vez apresentar a nossa insatisfação e preocupação pela forma como estão a decorrer os trabalhos na obra (…)».

«No dia de hoje 11 de Janeiro de 2007 ainda não está concluída a fachada principal nem a clarabóia, estando a empreitada de alumínios neste momento com um atraso de 20 dias, saliente-se que a obra é para estar toda fechada até final deste mês.

«Neste momento continuam os tectos falsos e as paredes de pladur sujeitas às intempéries.

«Actualmente a B... SA está a ser gravemente prejudicada perante a vossa passividade para com a situação. É urgente o reforço de mão-de-obra, de horário de trabalho e de materiais em obra de modo a não prejudicar mais os trabalhos interiores que continuam condicionados à vossa empreitada.

«Tendo em conta a situação actual, a B... SA não hesitará em aplicar todas as multas previstas aquando da adjudicação à vossa empresa (…)» (comunicação de fls. 38 e 39 dada por reproduzida e resposta ao nº 3 da base instrutória);

v) - Ainda com referência aos trabalhos a que aludem a comunicação de fls. 33 e a alínea F) da matéria assente, em 1 de Fevereiro de 2007, a ré remeteu um fax à autora, com o seguinte teor:

«No seguimento de vários faxes enviados por nós, de várias conversas telefónicas, da nossa reunião de Janeiro nas vossas instalações com o Sr. C... e do vosso fax ref.41/2007/MP, relativamente ao atraso dos vossos trabalhos na obra mencionada em epígrafe, vimos por este meio mais uma vez manifestar o nosso total desagrado e desapontamento pelo trabalho realizado pela vossa empresa.

«A B... SA é neste momento uma empresa com uma imagem denegrida devido ao vosso constante incumprimento nesta obra, datas parciais a serem alteradas e falhadas semana após semana e outros trabalhos que não podem avançar devido à vossa falta de responsabilidade.

«Toda esta situação continua a arrastar-se perante a vossa passividade, desmazelo e indiferença pelo cumprimento.

«Face ao atrás exposto e como já é do vosso conhecimento a B... não hesitará em aplicar todas as multas do contrato:

33 dias 2% fachada = 48.286,92 euros;

22 dias 2% clarabóia = 12.075,69 euros;

01 dias 2% restantes vãos = 1.242,55 euros (…)» (comunicação de fls. 40 e 41dada por reproduzida e resposta ao nº 3 da base instrutória);

x) - Ainda com referência aos trabalhos a que aludem a comunicação de fls. 33 e a alínea F) da matéria assente, em 22 de Fevereiro de 2007, a ré remeteu um fax à autora, com o seguinte teor:

«Mais uma vez é de lamentar a postura da vossa empresa representada na pessoa do Sr. E..., no dia de hoje não está ninguém em obra e a clarabóia que era para ficar desta vez terminada, no dia de hoje, não ficará uma vez que o material nem chegou à obra. É também de lamentar uma vez que receberam hoje os vidros para os vãos da Baobab Env 4, não os terem montado.

«Assim manifestamos mais uma vez o nosso total desagrado e desapontamento pelo trabalho realizado pela vossa empresa.

«A B... SA continua a ficar uma empresa com uma imagem denegrida devido ao vosso constante incumprimento nesta obra.

«Face ao atrás exposto e como já é do vosso conhecimento a B... nãohesitará em aplicar todas as multas do contrato:

55 dias x 2% fachada;

44 dias x 2% clarabóia;

23 dias x 2% restantes vãos (…)» (comunicação de fls. 42 e 43 dada por reproduzida e resposta ao nº 3 da base instrutória);

z) - Todas estas comunicações constantes dos documentos juntos aos autos de fls.33 a 43 foram recebidas pela autora (parte da resposta ao nº 3 da base instrutória);

aa) - Os trabalhos de execução e montagem da fachada principal e da fachada da clarabóia foram concluídos pela autora, no dia 16.03.2007 (resposta ao nº 1 da base instrutória);

bb) - A fachada da clarabóia, em alguns pontos, deixava entrar a água da chuva para o interior do edifício, em virtude do tipo de perfis de alumínio escolhidos pela autora e da forma como a autora realizou o encaixe desses perfis e borrachas com o vidro (resposta ao nº 4 da base instrutória);

cc) - Esses defeitos foram comunicados prontamente à autora, por parte da ré (resposta ao nº 5 da base instrutória);

dd) - Em Maio de 2007, a autora ainda efectuou trabalhos de reparação de focos de infiltração de águas pluviais que a fachada da clarabóia apresentava (resposta ao nº 2 da base instrutória);

ee) - Não obstante os trabalhos de reparação da fachada da clarabóia levados acabo pela autora, a mesma fachada continuou a apresentar focos de infiltração de águas pluviais (resposta ao nº 6 da base instrutória);

ff) - A autora emitiu e enviou à ré a factura nº 13687 no montante de 106.793,91euros com data de vencimento a 07.05.2007, referente a fornecimento e montagem de clarabóia com perfis metálicos e alumínio com chapa de termonuclear de 25 ww, fornecimento e montagem de caixilharias em alumínio termolacado com vidros duplos; a factura nº 13751, no montante de 13.696,50 euros com data de vencimento no dia 13.06.2007, referente a fornecimento e montagem de caixilharia em alumínio termolacado com vidro duplo, fornecimento e aplicação de rufod metalixos, de caleira em clarabóia, de estruturas de apoio e chapas de remate da clarabóia e a factura nº13957 no montante de 5.488,95 euros, referente ao fornecimento e montagem da mesma clarabóia, com vencimento em 18.10.2007 (facturas de fls. 85 a 89 todas dadas por integralmente reproduzidas e alínea H) da matéria assente);

gg) - A ré devolveu a factura nº 13957 à autora (alínea I) da matéria assente);

hh) - A quantia global aludida em H) não se mostra paga (alínea J) da matéria assente);

ii) - Os autos de medição juntos de fls. 44 a 51 foram aceites pelo responsável da obra (resposta ao nº 11 da base instrutória).


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            2.2. De direito

            Com é sabido, são as conclusões do recurso que delimitam o seu âmbito de conhecimento, só podendo ser apreciadas as questões nelas versadas, salvo se outras forem de conhecimento oficioso.

            Começando pela 1.ª, da impugnação da matéria de facto da resposta dada ao art.º, 10.º da b. i., perguntava-se nele se “o que determinou [os trabalhos a mais] a conclusão dos trabalhos inicialmente acordados na data em que o foram?” e respondeu-se negativamente, com fundamento (motivação) no depoimento do sócio da A. E... que, “quanto à natureza dos trabalhos a mais, que consistiram em mais dois caixilhos para duas fachadas, na zona das escadas rolantes, portas interiores da zona comercial e outros trabalhos de serralharia metálica, à luz das regras de experiência comum, recorrendo aos conhecimentos básicos de qualquer cidadão em matéria de construção civil, reportando-se estes trabalhos extra a outras zonas do edifício, não se vislumbra em que é que a execução dos trabalhos a mais condicionava a conclusão daqueles que faziam parte do acordo inicial.

Por outro lado, porque do mesmo depoimento resultou de forma clara e inequívoca que o atraso começou por ser determinado pela circunstância de a autora ter iniciado os trabalhos apenas após o Natal de 2006, quando os devia ter iniciado em 18 de Dezembro desse ano.

Este depoimento, quanto a estes aspectos veio, aliás, a ser corroborado pelo depoimento da testemunha F... ”.

Vejamos se o registo fonográfico dos depoimentos prestados em audiência de julgamento, v. g., dos depoimentos em que se louva a impugnação, das testemunhas G... , do próprio D..., H... e F..., impõe inflexão na resposta, a contento dos recorrentes.

Quanto à 1.ª, trabalhador da firma fornecedora dos alumínios à A., de nada soube. Começou o seu depoimento por dizer ter uma vaga ideia sobre o problema, para terminar que nunca esteve na obra…

Quanto à 2.ª, gestor de obras e produção da A., com manifesto interesse na causa, atenta a sua qualidade de sócio da A. e filho do sócio-gerente desta (patente, de resto, no modo como assumiu o litígio - “ A B... deve-me dinheiro”) imputou os atrasos na conclusão da obra ao atraso de entrega dos perfis e à impossibilidade de reunir os materiais e mão-de-obra suficientes para começar a obra nas datas previstas e, depois, porque alguns dos trabalhos a mais que a A. aceitou condicionaram a realização dos inicialmente adjudicados.

A 3.ª ( H...), serralheiro civil da A. na obra, limitou-se a esclarecer ter havido trabalhos a mais, mas nada disse, nem nada lhe foi perguntado, qual a repercussão destes no prazo de conclusão da obra.

Finalmente, quanto à testemunha F..., eng.º civil da Ré e responsável pela obra, começou por esclarecer que a Ré ofereceu garantias, sobretudo em termos de prazo, que desde o início houve uma desorganização muito grande da A. que imputou a falta de preparação, experiência e mão-de-obra e que os trabalhos a mais propostos à A. e que ela aceitou, não condicionaram os prazos dos trabalhos adjudicados, nem sobre isso a subempreiteira nunca nada disse.

Do exposto resulta que, dos depoimentos em que assenta a impugnação, não pode concluir-se que foram os trabalhos a mais que determinaram o atraso de conclusão final da subempreitada da A.

Aliás, sabendo esta que o prazo de entrega da obra para 30.1.07 era um elemento essencial do contrato (tratava-se de um complexo comercial onde iria funcionar o D...de Leiria, com data anunciada para abertura), ao aceitar os trabalhos a mais, deveria ter-se munido dos materiais bastantes e reforçar a mão-de-obra de forma as cumprir o prazo a que se obrigara.

Como a Ré comunicara à A. pelo fax, assente entre as partes, de 11.1.07 (fls. 38), “é urgente o reforço de mão-de-obra, de horário de trabalho e de materiais em obra…”.

Cremos que a recorrente só de si própria poderá queixar-se.

Fixado o prazo do contrato em 44 dias (com sábados, domingos e feriados) e o seu início em 18 de Dezembro de 2006, em 28 desse mês e ano ainda a A. não tinha entrado em obra (v. fax aceite pela da Ré de fls. 36), o que, de acordo com o depoimento da testemunha F..., só ocorreu em 31.12.06 ou 2.1.07, desde logo comprometendo o prazo intermédio fixado para a realização da fachada principal e fachada da clarabóia contratualmente fixado para 30.12.06 e tudo isso não obstante os alertas e preocupações veiculados pela Ré mediante os faxes de 15.12.06 (fls. 32), 26.12.06 (fls. 34) e 28.12.06 (fls. 36).

Não pode, portanto, concluir-se terem sido os trabalhos a mais que determinaram o atraso da A. na entrega da obra.

Improcede, assim, a impugnação requerida, mantendo-se a resposta negativa dada ao art.º 10.º da base instrutória em causa.


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            2. Quanto à validade substancial da cláusula penal fixada no contrato de subempreitada de fls. 18 e que sob n.º 10, n.º 3, comina o atraso com a multa diária de 2% sobre o valor da adjudicação, com o limite de 50% de tal valor, dispõe, é certo, o seu n.º 6 que, “nos casos de existência de atrasos na execução da subempreitada que não sejam por culpa do subempreiteiro, este ficará isento de qualquer multa”.

            Ora, não provado que o atraso se devera aos trabalhos a mais (que, de resto, a subempreitada aceitou sem, à partida, questionar qualquer prorrogação do prazo final), presumindo-se a culpa do devedor na responsabilidade contratual (art.º 799.º do CC), a ora recorrente, que começou por imputar os atrasos não aos trabalhos a mais, mas ao atraso no fornecimento dos perfis (v. carta de fls. 83), não provou, como lhe competia (art.º 350.º, n.º 1, do CC), a sua falta de culpa, antes esta colhe demonstração da factualidade provada a partir do atraso (avisado) com que iniciou os trabalhos.

            Quanto ao procedimento seguido na comunicação da multa, que o n.º 4 da cláusula 10.ª referida previa fosse efectuada mediante carta registada com aviso de recepção, para que o subempreiteiro, querendo, deduzisse defesa no prazo de 8 dias úteis, importa atentar que foi esse o procedimento seguido pela A.

            Pese embora os faxes de 1.2.07 e 22.2.07 (fls. 40 e 42) comunicarem à recorrente os quantitativos da multa que se iam vencendo, foi mediante a carta registada com A/R de fls. 53 e 54 que procedeu à liquidação e comunicação da multa (no valor de € 98.454,28) e que motivou, de resto, a resposta da recorrente de fls. 83, já acima assinalada e cuja razão não teve acolhimento na recorrida.

            Assim e tendo podido a recorrente desde logo e então apresentar a sua defesa quanto à multa anunciada e imposta pelos atrasos, não deixou de fazê-lo na resposta ao meio contratualmente previsto (carta registada com A/R).

            Improcede, portanto, esta conclusão recursiva.


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            3. Quanto à excepção de não cumprimento relativamente à parte da dívida (€ 5.488,95) é indiscutível que a excepção releva tanto em caso de falta integral de cumprimento, como de incumprimento parcial ou cumprimento defeituoso da prestação (exceptio no rite adimpleti contractus).[1]

            Os seus efeitos são meramente temporários, isto é, só perduram enquanto o devedor faltoso não cumprir ao que se obrigou.

            Por outro lado, a excepção deve ser invocada tendo em conta o princípio da boa fé e daí que no caso de empreitada o devedor não possa excepcionar o pagamento do preço em montante sobremaneira superior ao valor do direito pretendido exigir.

            Como ilustra Pedro Martinez[2], sendo possível eliminar o defeito por 1/5 do preço, o comprador (ou dono de obra na empreitada) não poderá reter a totalidade do preço. A excepção de pagamento deverá corresponder à violação.

            Ora, da matéria de facto provada resulta que, após atempada denúncia dos defeitos na fachada da clarabóia e reparação em Maio de 2007 pela A., os defeitos de infiltração de águas pluviais persistiram (continuaram), o que permite a conclusão de que a A. não cumpriu adequadamente a sua obrigação de resultado de entrega da obra, sem vícios, mesmo após tentativa de reparação.

            Os defeitos foram, entretanto, reparados e, embora sem tradução na matéria de facto apurada, pela própria Ré (o depoimento da testemunha F... foi no sentido de ter sido ele próprio com o encarregado da Ré a proceder à sua eliminação, o que fez em 2 dias – o que o depoimento, ouvido, do encarregado I... igualmente confirmou).

            Ignora-se o montante pecuniário dispendido pela Ré a imputar no valor devido à recorrente pela subempreitada.

Ora, de acordo com o mencionado princípio da boa fé na execução dos contratos, a Ré não poderia reter integralmente o montante da factura.

Porque a excepção deverá corresponder à violação, importará condenar também a Ré no pagamento da 3.ª factura (n.º 13957), no valor de € 5.488,95, mas porque não há elementos que permitam determinar qual o valor dispendido pela Ré na reparação dos defeitos subsequentes à própria reparação não totalmente conseguida da A., importa relegar para o incidente de liquidação o seu diferencial (art.ºs 661.º, n.º 2 e 378.º, do CPC), nesta parte se alterando a sentença recorrida quando se pronunciou pela procedência total, ao invés de parcial, da excepção.


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            4. Finalmente, quanto à onerosidade manifestamente excessiva da cláusula penal, cuja redução equitativa é permitida pelo art.º 812.º do CC, cumpre assinalar que só agora, em alegações, tal questão é colocada quando, em princípio, a A. o deveria ter feito na petição inicial e não fez.

            A questão do conhecimento oficioso da excessiva onerosidade da cláusula penal é matéria controvertida na jurisprudência, seja a propósito da lei geral, seja das cláusulas contratuais gerais do DL n.º 446/85, de 25.10.[3]

            Sem radicalismos, o STJ tem, contudo, entendido que, pese embora a inoficiosidade do conhecimento, não é necessária a dedução de qualquer pedido de redução equitativa da indemnização, devendo, contudo, o devedor alegar e provar factos de onde possa concluir-se pelo carácter manifestamente excessivo da cláusula penal e que à luz do caso concreto possam balizar a equidade do julgador.[4]

                   Ora, seguindo este entendimento jurisprudencial[5], impor-se-ia que a A., enquanto devedora, alegasse factos que pudessem integrar a excessividade da cláusula e sobre ela incidindo tal ónus[6], não o tendo feito, na expressão de Manuel de Andrade incorrerá nas desvantajosas consequências de se ter como líquido o facto contrário.[7]

                   Eis por que nem em abstracto, nem em concreto se justifica a redução equitativa da cláusula penal acordada.


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                   3. Sumariando (art.º 713.º, n.º 7, do CPC):

                   I – Porque a exceptio non rite adimpleti contractus deverá corresponder à violação do direito do credor, de acordo com o princípio da boa fé, deverá o mesmo ser condenado na importância indevidamente retida subtraída da dispendida na reparação dos defeitos em substituição do devedor;

                   II – Não sendo necessário a dedução específica de pedido de redução equitativa de cláusula penal deve, contudo, o devedor alegar e provar factos conducentes à consideração do seu carácter manifestamente excessivo.


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                   4. Decisão

                   Face ao exposto, acordam em julgar parcialmente procedente a apelação e, revogando parcialmente a sentença recorrida, acordam em:

                   a) – Manter a condenação da Ré “ B..., SA” a pagar à A. “ A..., Lda.” a importância de € 22.036,14, acrescida de juros de mora à taxa comercial, sobre a quantia de € 8.339,64 a partir da data de vencimento da factura n.º 13687 e sobre a quantia de € 13.696,50 a partir da data de vencimento da factura n.º 13751, ou seja, respectivamente, a partir do dia 7.5.07 e 13.6.07;

                   b) – Condenar a Ré a pagar à A. a quantia que vier a liquidar-se em execução, no incidente da própria causa, quanto ao pedido correspondente à factura n.º 13957, no valor de € 5.488,95, após dedução da quantia dispendida pela Ré recorrida na reparação dos defeitos, com juros de mora à mesma taxa comercial sobre o seu vencimento em 18.10.07.

                   Custas em ambas as instâncias, na proporção do vencido e após apuramento final no incidente de liquidação.


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Francisco M. Caetano (Relator)

António Magalhães

Ferreira Lopes


[1] V. Pedro Martinez, “Cumprimento Defeituoso, Em Especial na Compra e Venda na Empreitada”, 2001, pág. 290.
[2] Ob cit., pág. 296.
[3] Em sentido afirmativo v, por ex,, Ac. STJ de 15.12.98, Proc. 98A1090, 10.7.08, Proc. 08B1846 e 9.3.10, Proc. 627/098.5YFLS B, in www.dgsi.pt e em sentido contrário o Ac. do STJ de 7.3.06, CJ/STJ, 2006. 1.º, pág. 101.
Na doutrina e no 1.º sentido v. P. Lima e A. Varela, “CC, Anot, II”, pág. 81.
[4] V. Acs. STJ de 30.9.03, Proc. 03A1738, 17.4.08, Proc. 08A603 e 12.7.11, Proc. 1552/03.9TBVLG.P1, in www.ggsi.pt.
[5] O conhecimento oficioso de cláusula penal excessivamente onerosa ou desproporcionada no âmbito das cláusulas contratuais gerais é mais defensável, desde logo porque o art.º 12.º do DL n.º 446/85 comina tal vício com nulidade, que, por natureza, é de conhecimento oficioso – V. Ac. RC por nós relatado, de 8.11.11, na Apel. n.º 648/10.5TBLRA. C1, in www.dgsi.pt .
[6] A natureza da cláusula penal é a própria dispensa do credor da prova de ter sofrido prejuízos e do seu montante.
[7] “Noções Elementares de Processo Civil”, 1976, pág.