Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
885/09.5T2AVR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: HENRIQUE ANTUNES
Descritores: PRESCRIÇÃO
SUSPENSÃO DA PRESCRIÇÃO
CÔNJUGE
UNIÃO DE FACTO
Data do Acordão: 05/15/2012
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DO BAIXO VOUGA - AVEIRO - JUÍZO DE GRANDE INSTÂNCIA CÍVEL - JUIZ 1
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE REVOGADA
Legislação Nacional: ARTº 218º, AL. A) DO C. CIVIL
Sumário: I – A causa subjectiva bilateral de suspensão da prescrição constante da alínea a) do artº 218º do Código Civil – de harmonia com a qual a prescrição não começa nem corre entre os cônjuges – não é aplicável, por integração analógica ou interpretação extensiva, aos membros da união de facto.

II - O prazo de prescrição da obrigação de restituição por enriquecimento sem causa de prestações realizadas no contexto de união de facto conta-se do momento da cessação desta.

III - No caso de persistência de non liquet sobre a quantidade da obrigação, o devedor deve ser condenado naquilo que se vier a liquidar em momento ulterior.

Decisão Texto Integral:             Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

1. Relatório.

C… interpôs recurso ordinário de apelação da sentença do Sr. Juiz de Direito do Juízo de Grande Instância Cível de Aveiro, Comarca do Baixo Vouga, que, do mesmo passo, julgando parcialmente tanto a acção, declarativa de condenação, com processo comum, ordinário pelo valor, que propôs contra J…, como a reconvenção deduzida por este:

a) Declarou que a fracção autónoma correspondente ao rés-do-chão e andar do edifício principal poente, entrada 1, do prédio urbano sito na …, inscrito na matriz predial urbana sob o nº  e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº …, pertence à autora;

b) Declarou que o réu não tem qualquer direito a permanecer e habitar no referido prédio;

c) Condenou o réu a restituir à autora os bens móveis constantes do arrolamento realizado no procedimento cautelar apenso.

d) No mais, face ao direito do réu de retenção do imóvel até ao recebimento do valor do seu crédito relativo às obras realizadas no imóvel e identificadas nos autos, absolveu o réu do pedido de entrega do imóvel, de abstenção de actos que impeçam a autora de o fruir e de sanção pecuniária compulsória por cada dia que mediar até essa entrega.

e) Condenou a autora a pagar ao réu as quantias de €35.000 (trinta e cinco mil euros) e de €6.000 (seis mil euros), relativas ao valor suportado para aquisição do imóvel e ao valor das obras nele realizadas pelo réu, acrescidas de juros de mora contados desde 11 de Setembro de 2009 até integral pagamento.

A recorrente, que pede, no recurso, a revogação desta sentença, na parte posta em crise, condensou a sua alegação nestas conclusões:

...

            Na resposta o recorrido - depois de obtemperar, designadamente, que o momento relevante para o início da prescrição do direito à restituição por enriquecimento sem causa surge quando cessa a união de facto e, por via disso, a fruição em comum dos bens adquiridos com participação de ambos os membros – concluiu, naturalmente, pela improcedência do recurso.

2. Factos provados.

O Tribunal de que provém o recurso julgou provados os factos seguintes:

3. Fundamentos.

3.1. Delimitação objectiva do âmbito do recurso.

            Além de delimitado pelo objecto da acção e pelos eventuais casos julgados formados na instância recorrida e pela parte dispositiva da decisão impugnada que for desfavorável ao impugnante, o âmbito, subjectivo ou objectivo, do recurso pode ser limitado pelo próprio recorrente. Essa restrição pode ser realizada no requerimento de interposição ou nas conclusões da alegação (artº 684 nºs 2, 1ª parte, e 3 do CPC).

            Na espécie do recurso, o recorrido, pediu, em reconvenção – no articulado de contestação, apresentado por via electrónica no dia 7 de Setembro de 2009 – a condenação da recorrente a pagar-lhe a quantia de € 64.800,00, tendo alegado como causa petendi, o enriquecimento sine causa da apelante, resultante do facto de parte do preço da fracção autónoma - € 35.000,00 – ter sido satisfeito com um crédito seu relativamente ao vendedor, de ter pago, desde a data da escritura – 16 de Janeiro de 2006 - até Dezembro de 2007, metade das prestações do empréstimo contraído, em nome da apelante, para aquisição da mesma fracção, e de ter realizado nela obras diversas no valor de € 25.000,00.

            A recorrente opôs ao recorrido, na réplica, a excepção peremptória da prescrição, por se terem passados mais de 3 anos entre a data da escritura e a data da apresentação do articulado de contestação.

            No tocante ao valor das obras realizadas pelo apelado, a decisão recorrida, por se saber que o réu não aplicou a totalidade da mão-de-obra, mas se ignorar se foi o réu que custeou, na totalidade, os materiais, pelo que a questão deveria ser decidida com apelo à equidade, julgou adequado fixar o valor a restituir ao réu em € 6.000,00; a mesma sentença, depois de observar que a alínea a) do artigo 318º do Código Civil é aplicável, seja por aplicação extensiva ou analógica, às situações de união de facto, e que a defesa pelo membro devedor do casal (em união) de que o prazo de prescrição correu independentemente e mesmo durante a união de facto, constitui um manifesto abuso de direito, por violação dos ditames boa-fé, que devem presidir sobremaneira nos relacionamentos pessoais – julgou improcedente a excepção peremptória da prescrição.

            São estes dois pontos que merecem a aberta discordância da recorrente. No seu ver, de um aspecto, todos os créditos do recorrido, reconhecidos pela sentença recorrida foram atingidos pela prescrição, não sendo abusiva a sua alegação, e de outro, o valor do crédito relativo à realização das obras, determinado por critérios de equidade, nunca poderá ser superior a um terço do seu custo global.

            Maneira que, tendo em conta os parâmetros de delimitação da competência decisória deste Tribunal representados pelo conteúdo da decisão recorrida e das alegações de ambas as partes, as questões concretas controversas que há que resolver são as de saber se:

a) Os créditos cuja titularidade a sentença impugnada reconheceu ao apelado foram ou não atingidos pela prescrição;

            b) Ao alegar essa prescrição, a recorrente actua em abuso do direito;

c) O valor das obras realizadas pelo recorrido deve ser fixado em valor não superior a um terço do seu custo global.

            A resolução destes problemas vincula naturalmente, à determinação do terminus a quo do prazo prescricional aplicável aos direitos de crédito do recorrido e ao exame do procedimento de decisão no caso de obrigação genérica.

            No julgamento do recurso importa, contudo, ter presente que a sua improcedência, e a consequente confirmação da decisão recorrida, podem resultar da modificação pelo tribunal do fundamento dessa mesma decisão. Quer dizer: o tribunal superior pode aceitar a procedência do recurso – mas encontrar outro fundamento, distinto daquele que foi utilizado pelo tribunal de que ele provém, para confirmar a decisão recorrida.

            3.2. Terminus a quo do prazo de prescrição aplicável.

            Como se notou, não se discute no recurso a obrigação de restituição, assente no enriquecimento sine causa em que a recorrente, segundo a sentença impugnada, se encontra constituída: a controvérsia gravita limitadamente em torno do problema de saber se o direito de crédito correspondente do recorrido foi ou não atingido pela prescrição.

            Realmente, cessada a união de facto, coloca-se frequentemente o problema da liquidação do património adquirido com o esforço comum dos seus membros e da restituição das atribuições patrimoniais feitas, na pendência dessa união, por um deles ao outro.

            De harmonia com certa doutrina, essa liquidação deve ser actuada de acordo com os princípios das sociedades de facto – quando os respectivos pressupostos se verifiquem[1]. Na jurisprudência, porém, havendo património adquirido com esforço comum, admite-se que a respectiva liquidação seja feita de harmonia com as regras do enriquecimento sem causa ou com os princípios das sociedades de facto[2].

             No entanto, a ausência da finalidade lucrativa da comunhão de vida[3] em que se traduz a união de facto, opõe-se ao uso da construção da sociedade de facto. Nestas condições, a composição dos interesses patrimoniais conflituantes deverá assentar no instituto do enriquecimento sine causa, que disponibiliza uma tutela adequada ao membro da união de facto que, por exemplo, contribuiu com dinheiro seu para que o outro interviesse como adquirente no contrato de compra e venda de um imóvel ou de um automóvel[4].

            Na espécie do recurso tudo está, pois, em saber se deve reconhecer-se à recorrente o direito potestativo de opor a prescrição ao direito à restituição por enriquecimento sem causa, alegado pelo recorrido e reconhecido pela sentença recorrida.

            A prescrição – de que o Código Civil não dá uma noção – assenta num facto jurídico involuntário: o decurso do tempo. A ideia comum que lhe preside é a de uma situação de facto que se traduz na falta de exercício dum poder, numa inércia de alguém que, podendo ou porventura devendo actuar para a realização do direito, se abstém de o fazer[5].

Verificada a prescrição, o seu beneficiário tem a faculdade de, licitamente, recusar a prestação a que estava adstrito (artº 304 nº 1 do Código Civil).

A prescrição não tem, portanto, uma eficácia extintiva, antes se limita a paralisar o direito do credor, dado que apenas confere o direito potestativo de a invocar: se este direito não for exercido, a obrigação mantém-se civil, não se produzindo quaisquer efeitos; se a prescrição for invocada, a obrigação converter-se-á em obrigação natural – como tal inexigível, mas com solutio retendi[6].

É, naturalmente, sobre o devedor que recai o encargo de provar a prescrição da obrigação, ou melhor, os seus elementos estruturais: a não exigência do crédito pelo credor; o início e o decurso do lapso prescricional (artº 342 nº 2 do Código Civil).

            Se o demandado conseguir provar estes dois elementos estruturais da prescrição – prescrição que sendo um facto impeditivo do direito de crédito alegado pelo autor ou pelo réu reconvinte é, ao mesmo tempo, fonte do direito potestativo invocado pelo demandado (devedor) de extinguir a relação obrigacional – passa a ser sobre o autor ou réu reconvinte que recai o ónus de provar o facto extintivo – v.g. renúncia do devedor à prescrição ou a sua suspensão - do direito potestativo do direito invocado pelo demandado[7].

            Assim, no tocante à prescrição da obrigação de restituição por enriquecimento sem causa, é a parte que, perante a invocação pela contraparte, do direito à restituição, alegue a prescrição que deve provar o decurso do prazo, articulando, evidentemente, os factos relevantes[8].

            O direito à restituição por enriquecimento sem causa prescreve no prazo de três anos, a contar da data em que o credor teve conhecimento do direito que lhe compete e da pessoa do responsável (artº 482, 1ª parte, do Código Civil).

            O início do prazo de prescrição é, evidentemente, um factor estruturante do próprio instituto. No tocante à obrigação de restituição fundada no enriquecimento sine causa, o Código Civil adopta, pois, em contrário da regra geral, o sistema subjectivo: o prazo começa a correr quando o empobrecido tenha conhecimento do seu direito e da pessoa que deve responder (artº 498 nº 1 do Código Civil). O conhecimento do direito reporta-se ao conhecimento dos elementos constitutivos do seu direito e não a um conhecimento abstracto do direito, sendo a partir desse conhecimento que se contam os três anos[9].

            À prescrição do direito à restituição assente no enriquecimento sem causa pode suspender-se nos termos gerais. Assim, por exemplo, a prescrição não começa nem corre entre cônjuges, ainda que separados judicialmente de pessoas e bens (artº 318 nº a) do Código Civil).

            A razão material desta causa bilateral subjectiva de suspensão inicial da prescrição – dado que uma vez verificada ou no momento em que consubstanciam os requisitos que marcam o início da prescrição, esta não começa – radica no carácter peculiar do vínculo jurídico que liga os cônjuges – o vínculo jurídico do casamento – e da relação jurídica que dele emerge: a relação jurídica familiar em que o estado de casado se resolve. Uma pessoa casa e, depois, é outra, é juridicamente outra. E é outra a condição da sua pessoa, como é outra a situação dos seus bens.

            A praescripitio dormens resultante da suspensão da prescrição apontada, visa, justamente obviar, por um lado, a que, com receio da prescrição se instale entre os cônjuges uma litigiosidade desnecessária, comprometedora, em última extremidade, da subsistência do casamento, e, por outro, que qualquer dos cônjuges, ordenado pelo propósito de salvaguardar a estabilidade do casamento ou por temor reverencial, prescinda dos seus direitos.

            São portanto, duas as razões, embora de desigual importância, que presidem a esta causa de suspensão da prescrição: a primeira, e de longe mais significante, é a da exigência, na constância do casamento, por um dos cônjuges ao outro, da prestação devida, ser susceptível de causar danos graves na harmonia conjugal e de degradar, irremediavelmente, a relação dos cônjuges[10]; a outra, nitidamente subalterna, é constituída pelo perigo de um dos cônjuges, por força da ascendência que eventualmente tenha sobre o outro, determinar este cônjuge a abster-se do exercício do direito de crédito. A suspensão mantém-se mesmo no caso de separação judicial de pessoas e bens dado que, o vínculo conjugal, embora enfraquecido, ainda subsiste, com uma relevância interpessoal suficiente para que os cônjuges não tenham optado pelo divórcio[11].

            No caso do recurso, a sentença apelada, depois de verificar que a recorrente e o recorrido viveram em união de facto – embora se ignore a exacta duração dessa convivência, sabendo-se apenas que teve início em momento posterior à do respectivo divórcio, decretado por decisão passada em julgado no dia 20 de Novembro de 2003, e que já não subsistia em 22 de Dezembro de 2007 – e partindo, decerto, do pressuposto de que o prazo de prescrição direito à restituição da quantia de € 35.000,00 que foi descontado no preço de aquisição da fracção autónoma da recorrente, teve inicio na data em que foi outorgada a respectiva escritura pública de compra e venda – 16 de Junho de 2006 – concluiu pela sua suspensão, seja por aplicação extensiva ou analógica da estatuição da alínea d) do artº 318 do Código Civil às situações de união de facto.

            A causa de suspensão da prescrição discutida – como, de resto, todas as demais – configura uma excepção à regra da continuidade e do curso ininterrupto do prazo da prescrição (artº 296 do Código Civil)[12]. As normas reguladoras da suspensão são, por esse motivo, excepcionais – já que devem entender-se como tais as regras que contrariam o regime geral.

Além disso, as causas de suspensão da prescrição são típicas e, por isso, a enumeração legal obedece ao princípio do numerus clausus, sendo, pois, taxativa, só comportando as concretizações do tipo que nela estiverem previstas. Como as tipologias taxativas são tipologias fechadas, elas não admitem a aplicação analógica a subtipos não previstos.

Nestas condições, as causas de suspensão são insusceptíveis de integração por analogia[13] - tomando-se aqui o conceito de analogia como aplicação de uma regra jurídica a um caso concreto não regulado pela lei através de um argumento de semelhança substancial com os casos regulados – a chamada analogia legis, não a analogia iuris (artº 10 do Código Civil)

            Em face do carácter excepcional e típico das normas reguladoras da suspensão da prescrição, deve ter-se, seguramente, por excluída a aplicação, por integração analógica, à prescrição do direito de restituição por enriquecimento sine causa, actuado pelo recorrido, da apontada causa de suspensão (artº 11, 1ª parte, do Código Civil).

            Não é admissível, pois, por um argumento a simile – ou argumento com base na analogia – aplicar à situação objecto do recurso a apontada praescripitio dormens.

            Sempre que a lei proíba a analogia – como sucede genericamente no tocante às normas excepcionais e às tipologias taxativas – mas admita a interpretação extensiva, a proibição pressupõe a prévia resolução desta questão delicada: a dos limites da interpretação admissível, ou seja, a questão de saber o que pertence à interpretação permitida e o que pertence já à analogia proibida.

Salienta-se este ponto, dado que não falta quem sustente que não é logicamente possível nem metodologicamente legítimo distinguir entre interpretação e analogia[14].

Decerto que o processo lógico é o mesmo; decerto que integração e interpretação são momentos, ambos, do processo metodológico de aplicação fundamentalmente unitário. Todavia, nada disto deve fazer esquecer que existem processos hermenêuticos cuja conclusão se mantém no quadro dos significados comuns atribuídos às palavras utilizados pelo legislador e processos cuja conclusão o ultrapassa.

            O legislador é obrigado a exprimir-se através de palavras; as quais nem sempre possuem um único sentido, mas pelo contrário se apresentam quase sempre polissémicas. Por isso, o texto legal se torna carente de interpretação - e neste sentido, atenta a primazia da teleologia legal, de concretização, complementação ou desenvolvimento judicial – oferecendo as palavras que o compõem, segundo o seu sentido comum, literal, um quadro de significações dentro do qual o aplicador da lei se pode mover e pode optar sem ultrapassar os limites legítimos de interpretação. Fora deste quadro, sob não importa que argumento, o aplicador encontra-se já inserido num domínio da analogia proibida. Neste sentido, aquele quadro não constitui um critério ou elemento – mas limite da interpretação admissível.

            Um dos resultados possíveis da interpretação é, assim, a interpretação extensiva: o intérprete chega à conclusão de que a letra do texto da lei fica aquém do espírito da lei, que a fórmula verbal utilizada pelo legislador peca por defeito, pois diz menos do que aquilo que se pretendia dizer. Em face disso, o intérprete estende então o texto, imprimindo-lhe um alcance conforme com o pensamento legislativo, fazendo coincidir a letra da lei com o seu espírito. Não se tratará de uma lacuna da lei, porque os casos não directamente abrangidos pelo texto são indubitavelmente abrangidos pelo seu espírito: da própria ratio legis decorre, v.g., que o legislador se quis referir a um género; mas, numa perspectiva casuística, apenas se referiu a uma espécie desse género.

            A interpretação extensiva verifica-se, pois, sempre que a letra da lei se refira à espécie e o seu significado deva abarcar, por imposição dos elementos não literais da interpretação, o género ou sempre que a letra de uma tipologia taxativa respeito a um a alguns subtipos e o seu significado deva abranger, pelo mesmo motivo, outros subtipos do mesmo tipo[15].

            A interpretação extensiva é, portanto, uma interpretação praeter litterum, dado que a dimensão pragmática da lei vai além da sua dimensão semântica e tem subjacente um juízo de agregação – o que vale para a parte deve valer para o todo

            Como daqui decorre, a interpretação extensiva, assume, regra geral, a forma de extensão teleológica: a própria razão de ser da lei reclama a aplicação aos casos que não são directamente abrangidos pela letra da lei, mas que indubitavelmente se compreendem na sua finalidade.

            São dois os argumentos que se podem convocar para fundamentar uma interpretação extensiva: o argumento de identidade de razão – argumento a pari – e o argumento de maioria de razão – argumento a fortiori. De harmonia com o primeiro, onde a razão de decidir seja a mesma, mesma há-de ser a decisão; de acordo com o segundo, se a lei contempla, explicitamente, certas situações para que estabelece um dado regime, há-de forçosamente pretender abranger também outra ou outras que, com mais fortes motivos, exigem ou justifiquem aquele regime.

            Como se notou, a previsão da causa de suspensão indicada refere-se aos cônjuges, ainda que separados judicialmente de pessoas e bens, e, portanto, visa directamente a relação jurídico-familiar instituída pelo casamento. Dado que a palavra cônjuge tem, no contexto da lei, uma significado preciso e unívoco – o de pessoas unidas pelo vínculo jurídico jurídico do casamento – atribuir-lhe também o sentido de pessoas unidas de facto, ultrapassa nitidamente os limites da interpretação admissível e o caso já é nitidamente de aplicação analógica, dado que as pessoas que mantém uma relação de convivência e de comunhão à margem do casamento não são, para o bem e para o mal, cônjuges,

            Mas ainda que ex-adverso o contrário se devesse entender, a verdade é que não há razões – seja de identidade ou de maioria de razão – para interpretar extensivamente aquela norma, de modo estender a respectiva causa de suspensão da prescrição aos unidos de facto, dado que a letra da lei não comporta uma excepção implícita que não é admitida pelo seu espírito.

            A união de facto – heterossexual – é a convivência duradoura de homem e uma mulher como se casados fossem (artº 1 nº 1 da Lei nº 7/2001, de 11 de Maio)[16]; descritivamente, a única diferença entre esta união e o verdadeiro matrimónio será, pois, a falta do vínculo formal do casamento[17].

            A conjugação dos direitos de fundação constitucional de constituir família e de contrair casamento mostra que a Constituição não admite a redução do conceito da família à união conjugal, baseada no casamento.

            O conceito constitucional de família não compreende, portanto, apenas a família matrimonializada. Do ponto de vista constitucional, o casal nascido da união de facto juridicamente protegida também é família, ainda que os seus membros não tenham o estatuto de cônjuges[18].

            Todavia, nada impõe, mesmo constitucionalmente, um tratamento jurídico inteiramente igual das famílias baseadas no casamento e das não matrimonializadas, desde, claro está, que as diferenciações não sejam arbitrárias, irrazoáveis ou desproporcionadas[19].

            O princípio da protecção da união de facto – quer decorra directamente da abertura constitucional à união de facto quer do direito ao livre desenvolvimento da personalidade – não exige que o legislador – e muito menos o intérprete e o aplicador - dê à união de facto direitos idênticos aos que dá ao casamento, equiparando as duas situações.

            Casamento e união de facto são situações materialmente diferentes: os casados assumem um compromisso de vida em comum, do qual resultam limitações graves aos seus direitos absolutos, pessoais e patrimoniais; os unidos de facto não querem, ou não podem, assumir esse compromisso.

            Um tratamento diferente das duas situações, em que as pessoas que vivem em união de facto não tendo os mesmos deveres, não tenham em contrapartida os mesmos direitos das pessoas casadas, mostra-se, portanto, conforme com o princípio da igualdade, que só trata como igual o que é igual e não o que é diferente.

            A norma que equiparasse, por inteiro, a união de facto ao casamento é que seria, ela sim, constitucionalmente ilegítima. Uma norma que nivelasse a união de facto e o casamento, impondo aos seus membros os mesmos deveres e reconhecendo-lhes os mesmos direitos que impõe e concede às pessoas casadas seria inconstitucional dado que o violaria o direito de não casar, dimensão ou vertente negativa ineliminável do direito de casar; Se as pessoas não podem casar, porque, por exemplo, existe um impedimento legal ao seu casamento, mal se compreenderia que a união de facto tivesse os mesmos efeitos do casamento que elas não podem celebrar (artº 2º da Lei 7/2001, de 11 de Maio); se as pessoas unidas de facto não querem casar, embora lhes fosse lícito contrair casamento, seria violento impor-lhes um estatuto matrimonial que, deliberadamente, não desejam: uma tal imposição violaria, abertamente o seu direito de não casar[20].

            O direito a não ser forçado a contrair matrimónio, designadamente porque se quer desenvolver livremente a personalidade, ficaria vazio se as consequências jurídicas de viver em união de facto fossem exactamente as mesmas, em termos de deveres e direitos recíprocos, que as derivadas do casamento[21]. Se duas pessoas se recusam a casar são submetidas ao mesmo estatuto de direitos e deveres recíprocos que se aplica às pessoas casadas, que sentido tem recusar-se a contrair matrimónio, e, consequentemente, que sentido tem o reconhecimento do direito a não casar?

            Está, portanto, fora de causa a equiparação da união de facto ao casamento, tão evidente se torna que da união de facto não decorrem para os respectivos sujeitos as obrigações de fidelidade, respeito, cooperação e assistência a que vincula os cônjuges (artº 1779 do Código Civil), e que, por outro lado, a união de facto não tem efeitos sucessórios nem determina a aplicação de um regime de bens aos respectivos sujeitos, cujas relações patrimoniais são regidas, em princípio, pelo direito comum das obrigações e dos direitos reais.

            È claro que esta circunstância não impede, porém, que a união de facto se qualifique como relação de família, embora de conteúdo incomparavelmente mais pobre que a relação matrimonial. Nem a tanto fará obstáculo a norma que enumera as fontes das relações jurídicas familiares – o artº 1576 do Código Civil - pois o elenco das relações familiares nela constante, que mantém a redacção de 1966, poderá considerar-se alterado pela evolução legislativa - e jurisprudencial – posterior.

Crê-se, porém, que mesmo na fase ou no estado actual do nosso direito, e cingindo-nos aos efeitos meramente civis, a união de facto não deve considerar-se para a generalidade dos efeitos, como relação de família[22].

Como se notou, as relações patrimoniais entre os cônjuges e entre estes e terceiros estão sujeitas a um estatuto especial, denominado regime de bens do casamento. Não assim na união de facto: os seus membros são, em princípio, estranhos um ao outro, estando as suas relações jurídicas patrimoniais sujeitas, por inteiro, ao regime geral ou comum das relações obrigacionais e reais e, por isso, podem contratar com terceiros ou entre si como de estranhos se tratasse. De outro aspecto, ao passo que o casamento, apesar do crescimento amolecimento do vínculo conjugal resultante da flexibilização ou da facilitação crescente do divórcio, é marcado por uma vocação de perpetuidade, ainda que meramente tendencial, a união de facto é caracterizada pela extrema precariedade, dado que pode dissolver-se, ad nutum, por simples acto de vontade de um dos seus membros: a permanência ou a cessação da união de facto é coisa que o Direito abandona por inteiro à vontade discricionária e mesmo arbitrária de cada um dos seus membros (artº 8 nº 1 b) da Lei nº 7/2001, de 11 de Maio).

            Nestas condições, não é admissível, através da simples actividade de interpretação, estender à união de facto normas cuja ratio assente na existência de uma relação jurídica familiar e tenham, por fundamento final principal, ainda que não exclusivo, a preservação do vínculo de que decorre essa relação, como é, notoriamente, a norma relativa à suspensão da prescrição entre cônjuges.

            Em absoluto remate: não há razão para supor que, na norma considerada, o espírito da lei vá além da sua letra, de modo a que dessa fonte seja permitido inferir uma regra que não está abrangida na sua letra.

            De resto, no caso, se deve ter-se por certo que a recorrente e o recorrido, posteriormente, à extinção, por divórcio, do seu casamento, conviveram em união de facto – dado que viveram juntos e a fazer vida de casal, em comunhão de mesa e leito, como se fossem marido e mulher – também se deve ter-se por exacto que não está demonstrada uma das condições de relevância dessa união: a duração superior a dois anos. Na verdade, a matéria de facto disponível não é suficiente para concluir que a convivência entre o recorrido e a recorrente teve aquela duração.

Ora, não estando demonstrada um dos pressupostos exigidos para que a união de facto possa beneficiar das medidas específicas de protecção indicadas na lei, como maior razão se deve recusar a aplicação – seja por via analógica ou simplesmente interpretativa – de normas especificamente dispostas para pessoas casadas.

Apesar disso, a união de facto em que viveram a recorrente e o recorrido não pode deixar de se ter por relevante, designadamente para o aspecto capital do recurso ao instituto do enriquecimento sine causa para regular as consequências patrimoniais decorrentes da cessação daquela convivência, dado que este efeito é de todo independente da sua duração e resulta das regras de direito comum, a que é indiferente o facto de a união não beneficiar também das especiais medidas de protecção.

            Nestas condições, a recorrente, tem, quanto a este ponto, inteira razão: ao contrário do que sustenta a sentença apelada, aquela causa de suspensão da prescrição não é aplicável, seja por integração analógica, seja por interpretação extensiva, aos membros da união de facto.

            Mas esta conclusão não é incompatível com a improcedência, neste segmento, do recurso.

            Estando irrecusavelmente assente que as partes viveram em união de facto, já cessada e que, no contexto dessa convivência, se verificaram transferências patrimoniais do património do recorrido para o da recorrente, o prazo de prescrição do direito à sua restituição, por enriquecimento sine causa, conta-se, não do momento em que foram feitas as atribuições patrimoniais – mas do momento em que união de facto cessou[23].

            De harmonia com regras de experiência e critérios sociais, a causa jurídica, ou ao menos, o motivo, das atribuições patrimoniais feitas no contexto de uma união de facto, é, justamente, essa convivência comum e a comunhão correspondente. Com a cessação dessa convivência desaparece, simultaneamente, a causa jurídica ou motivo da atribuição, em termos que legitimam o surgimento de uma pretensão dirigida à restituição do enriquecimento (artº 473 nº 2 do Código Civil). Seja qual for o enquadramento dogmático que se tenha por preferível – a condictio ob causam finitam ou outro[24] - deve entender-se que é no momento em que cessa a convivência e a comunhão de facto que surge o direito à restituição e, portanto, que é nesse momento que o membro da união adquire o conhecimento do seu direito à restituição por enriquecimento sem causa e, naturalmente, da pessoa que deve restituir.

            Como no caso entre o momento em que cessou a união de facto em que viveram a recorrente e o recorrido e a dedução por este do pedido de restituição não decorreram mais de três anos, é meramente consequencial a conclusão de que o seu direito à restituição por enriquecimento sine causa não foi atingido pela prescrição (artºs 279 do Código Civil e 267 nº 1 do CPC).

            Note-se que esta conclusão sempre permaneceria exacta no tocante ao direito à restituição, por enriquecimento sem causa, no tocante aos trabalhos realizados pelo recorrido, ainda que o prazo de prescrição, contra o que se disse, se devesse contar do momento da realização da atribuição patrimonial. É que a recorrente não demonstrou – como era seu ónus – a data em que a atribuição patrimonial correspondente teve lugar, e, portanto, a data do início do curso do prazo prescricional. Como haveria que resolver contra a apelante a dúvida correspondente, sempre seria de concluir pela improcedência, no tocante a essa prestação, da excepção peremptória da prescrição (artºs 342 nº 2 e 346, in fine, do Código Civil e 516 do CPC).

            Em absoluto remate: o direito à restituição por enriquecimento sem causa alegado pelo recorrido e amparado pela sentença apelada não foi atingido pela prescrição.

Esta conclusão prejudica, evidentemente, a apreciação da questão abuso do direito, pela apelante, na actuação do direito potestativo de invocar a prescrição (artº 660 nº 2 do CPC). Dir-se-á, em todo o caso, que o argumento fundado no abuso do direito, adiantado, subsidiariamente, pela sentença impugnada, para deter a invocação pela recorrente, da prescrição sempre se deveria ter por improcedente. Patentemente, a matéria de facto disponível é insuficiente, para, com fundamento, na boa fé ou na tutela da confiança, deter o exercício pela recorrente do direito potestativo de invocar a prescrição (artº 334 do Código Civil).

Neste ponto, o recurso deve, pois, ter-se por improcedente. Resta por isso, aferir da bondade do outro fundamento da impugnação: o referido à questão do direito à restituição do enriquecimento relativo aos materiais aplicados pelo recorrido na fracção da recorrente e à mão-de-obra gasta por aquele naquela aplicação.

A sentença impugnada fixou o valor da obrigação, por recurso à equidade, em € 6 000,00. A recorrente discorda, achando que aquele cálculo é manifestamente exagerado, sendo adequado, no seu ver, quantificar aquela obrigação em um terço do custo global, daqueles materiais e desta mão-de-obra, apurado - € 7 000,00.

O conhecimento deste segmento da impugnação vincula ao exame do procedimento de decisão no caso da obrigação genérica.

            3.3. Procedimento de decisão no caso de obrigação genérica.

            Constitui ocorrência ordinária, o juiz chegar à sentença e verificar que, devendo condenar o demandado, o processo não lhe fornece, porém, os elementos necessários para determinar o objecto ou a quantidade da condenação. Em face desses factos, só lhe resta uma solução jurídica: proferir uma condenação genérica, quer dizer, condenar o réu no que se vier a liquidar (artº 661 nº 2 do CPC).

A condenação genérica no cumprimento de uma prestação pode, assim, dar lugar à incerteza ou à iliquidez da obrigação.

            A obrigação é incerta quando a respectiva prestação não se encontra determinada ou individualizada; é ilíquida quando a sua quantidade não se encontra determinada. A iliquidez pode referir-se quer a prestações pecuniárias quer a prestações de dare.

É axiomático que as obrigações ilíquidas não podem ser realizadas de forma coactiva, pela razão evidente de que não se pode executar o património do devedor antes de determinar a quantia devida ou pedir a entrega de uma coisa antes de saber a quantidade que deve ser prestada (artº 47 nº 5 do CPC). Assim, tem de ser liquidada a condenação em quantia ilíquida (artº 661 nº 2 do CPC).

            A regra é esta: a liquidação há-de fazer-se no processo de declaração que tenha por objecto o direito à prestação e, portanto, só pode reservar-se para momento ulterior, em última extremidade, quando não seja possível fazê-lo naquele processo (artº 378 nº 1 do CPC).

            Porém, quando a existência do direito á prestação e do correspondente dever de prestar não ofereça dúvida mas se desconhece o respectivo quantum, a única solução materialmente admissível é a condenação do devedor na realização daquela prestação – e a remessa da fixação do seu quantum para momento posterior[25].

            Portanto, diversamente da solução normal para as situações de non liquet – que é o proferimento de uma decisão onerada com a prova – a incerteza sobre a quantia devida justifica apenas que se relegue para momento ulterior a sua quantificação (artº 516 do CPC). Esta solução parece decorrer da circunstância de, na determinação do quantum da obrigação, não se poder ficcionar o facto contrário àquele que devia ser provado como fundamento da decisão do tribunal[26].

            Este pensamento transparece nitidamente na solução disposta na lei para o caso de, mesmo no incidente ulterior específico da liquidação, a prova produzida pelas partes se mostrar insuficiente para fixar a quantia devida: quando isso sucede, incumbe-se o juiz de a completar, mediante indagação oficiosa e, nomeadamente, através da produção de prova pericial (artº 380 nº 4 do CPC). Mesmo aqui, a persistência do non liquet sobre a quantidade da obrigação não dá lugar à intervenção da regra de julgamento representada pelo ónus da prova e ao consequente desfavorecimento da pretensão do credor, antes se impõe ao tribunal o dever de ultrapassar a deficiência, mediante iniciativa própria.

            No caso que constitui o universo das nossas preocupações, está assente que o custo da mão-de-obra e dos materiais necessários para executar os trabalhos realizados na fracção da autora ascenderia a cerca de € 7 000,00. Mas – como notou a sentença apelada ela mesma – desconhece-se quantidade exacta de mão-de-obra que o recorrido despendeu na aplicação daqueles materiais e também não se sabe se foi o apelado que custeou a totalidade dos materiais aplicados.

            Sendo irrecusável que ao recorrido assiste o direito à restituição dessas prestações – e que a recorrente está vinculada ao dever correspondente - também é inegável que se ignora o seu quantum exacto.

            Importa, portanto, relegar para momento ulterior a fixação do exacto quantum daquele direito e da correspectiva obrigação de restituição.

            Expostos todos os argumentos, afirma-se em síntese que:

            1º) A causa subjectiva bilateral de suspensão da prescrição constante da alínea a) do artº 218 do Código Civil – de harmonia com a qual a prescrição não começa nem corre entre os cônjuges – não é aplicável, por integração analógica ou interpretação extensiva, aos membros da união de facto;

            2º) O prazo de prescrição da obrigação de restituição por enriquecimento sem causa de prestações realizadas no contexto de união de facto conta-se do momento da cessação desta;

            3º) No caso de persistência de non liquet sobre a quantidade da obrigação, o devedor deve ser condenado naquilo que se vier a liquidar em momento ulterior.

            O recurso deve, pois, nestes termos proceder. As custas dele deverão ser satisfeitas pelo sucumbente – a recorrente – excepto na parte da obrigação cuja liquidação se relega para momento ulterior, em que as custas serão satisfeitas, provisoriamente, pela recorrente e pelo recorrido, em partes iguais (artº 446 nºs 1 e 2 do CPC).

Dada a pouca complexidade do tratamento processual do objecto do recurso, a respectiva taxa de justiça deve ser fixada nos termos da Tabela I-B que integra o RCP (artº 6 nº 2).

            4. Decisão.

            Pelos fundamentos expostos, julga-se o recurso parcialmente procedente e, consequentemente:

a) Revoga-se a decisão impugnada no segmento em que condenou a recorrente, C… a pagar ao recorrido, J…, a quantia de € 6 000,00, e condena-se a primeira a pagar ao segundo o que se vier a liquidar em momento ulterior, no tocante à mão-de-obra e aos materiais aplicados pelo último na fracção autónoma da primeira, até ao limite de € 7 000,00.

b) Mantém-se, no mais, a sentença impugnada.

As custas do recurso – cuja taxa de justiça deve ser fixada nos termos da Tabela I-B, integrante do RCP – serão satisfeitas pela recorrente, excepto no tocante às custas da parte da condenação cuja liquidação é relegada para momento ulterior, que serão suportadas, provisoriamente, pela recorrente e pelo recorrido.

                                                                                       

                                                                            Henrique Antunes (Relator)

                                                                                              Regina Rosa

                                                                                              Artur Dias


[1] Pereira Coelho, “Casamento e família no direito português”, Temas de Direito da Família, Almedina, Coimbra, 1986, pág. 17 e RLJ, Ano 120, pág. 80 e Acs do STJ de 07.01.10, www.dgsi.pt., e de 09.03.04, CJ, STJ, XII, I, pág. 112. Segundo Gerado da Cruz Almeida – Da União de Facto, Convivência “More Uxorio” em Direito Internacional Privado, Lisboa, Pedro Ferreira - Editor, 1999, pág. 214 – essa opinião parecia ser a dominante em 1999 na doutrina portuguesa.
[2] Acs. da RL de 18.12.85, 29.09.07, 15.11.11, 18.01.11 e de 22.11.11., www.dgsi.pt.
[3] Telma Carvalho, “A união de facto: a sua eficácia jurídica”, Comemorações dos 35 Anos do Código Civil e dos 25 anos da Reforma de 1977, FDUC, Vol. I, Direito da Família e das Sucessões, Coimbra Editora, Coimbra, 2004, pág. 234
[4] Jorge Duarte Pinheiro, O Direito da Família Contemporâneo, Reimpressão, AAFDL, 2008, pág. 657.
[5] José Dias Marques, Prescrição Extintiva, Coimbra, 1953, pág. 4.
[6] António Menezes Cordeiro, Da prescrição do pagamento dos denominados serviços públicos essenciais, O Direito, Ano 133º, T, IV (Outubro -Dezembro), 2001, págs. 803 a 805 e Tratado de Direito Civil Português, I, T, IV, Almedina, Coimbra, 2007 (reimpressão), pág. 172. Contra, sustentando que a prescrição não converte a obrigação civil numa obrigação natural, Pedro Pais de Vasconcelos, Teoria Geral do Direito Civil, 4ª edição, Almedina, Coimbra, 2007, pág. 381.
[7] Vaz Serra, Prescrição e Caducidade, cit. pág. 151, nota nº 299; em sentido diverso, Dias Marques, Teoria Geral da Caducidade, Lisboa, 1953, pág. 105.
[8] Ac. da RL de 23.02.88, CJ, XIII, I, pág. 141.
[9] Acs. do STJ de 15.10.92, BMJ nº 420, pág. 448, e de 20.06.95, CJ, STJ, III, pág. 133.
[10] Vaz Serra, Prescrição e Caducidade, BMJ nº 106, pág. 145.
[11] Pedro Pais de Vasconcelos, Teoria Geral do Direito Civil, 5ª edição, Almedina, Coimbra, 2008, pág. 386.
[12] Luís A. Carvalho Fernandes, Teoria Geral do Direito Civil, Volume II, Lisboa, Lex, 1996, pág. 550.
[13] Manuel de Andrade, Teoria Geral da Relação Jurídica, vol. II, Almedina, Coimbra, 1998 (reimpressão), págs. 457 a 459, Dias Marques, Prescrição Extintiva, cit., págs. 119, 120 e 122, e Ana Filipa Morais Antunes, Prescrição e Caducidade, Coimbra Editora, 2008, pág. 116.
[14] Pinto Bronze, Lições de Introdução ao Direito, 2002, pág. 809 e ss.
[15] Miguel Teixeira de Sousa, Introdução ao Direito, Almedina, Coimbra, 2012, pág. 375.
[16] Esta Lei foi objecto de reconformação pelo artº 1 da Lei nº 23/2010, de 30 de Agosto. Todavia, o conjunto de modificações trazidas pela lei nova não releva para a economia do recurso. De resto, dado que a união de facto entre a recorrente cessou em momento anterior ao da entrada em vigor da nova lei, sempre lhe seria aplicável a lei anterior (artº 12 do Código Civil).

[17] Guilherme de Oliveira, A família e os Menores, Enciclopédia Legal, Selecções do Readers Digest, Lisboa, 1987, pág. 19 e F. M. Pereira Coelho, Filiação, UC, FD, Coimbra, 1978, pág. 123.
[18] Há, assim, senão uma obrigação, pelo menos uma abertura constitucional à relevância jurídica das uniões familiares de facto. Neste sentido, J. J. Gomes Canotilho, CRP, Constituição da República Portuguesa, Anotada, artºs 1º a 107º, vol. I, Coimbra Editora, pág. 581; contra, F.M. Pereira Coelho – Casamento e Família no Direito Português, in Temas do Direito da Família, págs. 9, e RLJ, Ano 120, pág. 375 - para quem a norma constitucional não pretende referir-se à união de facto, respeitando, exclusivamente, à matéria da filiação, decorrendo o princípio da protecção da união de facto do direito de matriz constitucional ao livre desenvolvimento da personalidade (artº 26 da CRP).
[19] J. J. Gomes Canotilho, CRP, Constituição da República Portuguesa, Anotada, artºs 1º a 107º, vol. I, Coimbra Editora, pág. 581.
[20] Francisco Manuel Pereira Coelho e Guilherme de Oliveira, CDF, Curso de Direito da Família, vol. I, Introdução do Direito Matrimonial, 2ª edição. Coimbra Editora, 2001, págs 89 e 90.

[21] Para uma enumeração dos efeitos – favoráveis, neutros e desfavoráveis – da união de facto, cfr. Nuno de Salter Cid, A Comunhão de Vida à Margem do Casamento, Entre o Facto e o Direito, Almedina, Coimbra, 2005, págs. 674 a 691. A lei mantém uma clivagem entre o estatuto social da união de facto – invocação da relação perante terceiros, maxime entidades públicas sempre que isso convier aos interessados para efeitos de benefícios sociais, laborais, etc. – e o seu estatuto privado, relativo aos direitos e deveres recíprocos, às exigências de solidariedade, cooperação e responsabilidade, aos efeitos da ruptura, alimentos, etc. Ao reconhecimento público da união de facto não correspondeu uma responsabilização mínima dos seus membros nas suas relações recíprocas e para com a sociedade. A reivindicação da consagração para os unidos de facto apenas de direitos ficou a dever-se a uma propensão para a dependência face ao Estado que cada vez mais evidente na sociedade portuguesa. Todas as contas feitas, pode retirar-se esta conclusão: a união de facto não envolve a responsabilidade e a solidariedade inerentes ao compromisso matrimonial. Cfr. Rita Lobo Xavier, Novas sobre a União “More Uxorio” em Portugal, in Estudos dedicados ao Prof. Doutor Mário Júlio de Almeida Costa, UCP, 2002, págs. 1392 a 1406.
[22] Pereira Coelho, RLJ, Ano 120, pág. 84 e “Casamento e família”, cit., pág. 6, Francisco Manuel Pereira Coelho e Guilherme de Oliveira, CDF, Curso de Direito da Família, vol. I, Introdução do Direito Matrimonial, cit., págs. 90 e 91, e Acs. do STJ de 09.03.04 e de 09.03.10, e da RL de 18.11.11, www.dgsi.pt. Não sendo a união de facto, para a generalidade dos efeitos, uma relação de família, o princípio constitucional da protecção da família, não impõe ao legislador ordinário a atribuição de efeitos favoráveis à união de facto: mas é também evidente que aquele princípio também não proíbe que o legislador conceda à união de facto os efeitos que tenha opor adequados e justificados. O princípio constitucional da protecção da família, assim como o princípio da protecção do casamento, só podem considerar-se violados se os efeitos gerais do casamento fossem extensíveis ao casamento, o que, mesmo face ao elevado nível de protecção de que goza a união de facto, está longe de ser o caso.
[23] Acs. da RL de 18.01.2011, www.dgsi.pt, e do STJ de 31.05.11 e de 15.11.95, www.dgsi.pt BMJ nº 451, pág. 387, respectivamente. Segundo o primeiro destes acórdãos, este entendimento constitui jurisprudência corrente.
[24] Cfr., Luís Manuel Teles de Menezes Leitão, O Enriquecimento sem Causa no Direito Civil, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal (176), CEF, Lisboa, 1996, págs. 504 a 517.
[25] Lebre de Freitas, “Competência do tribunal de execução para a liquidação da obrigação no caso de sentença genérica arbitral”, Estudos sobre Direito Civil e Processo Civil, Volume II, 2ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 2009, págs. 636 e 637. O mesmo autor informa que se trata do entendimento largamente dominante quer na doutrina, quer na jurisprudência.
[26] Miguel Teixeira de Sousa, Acção Executiva Singular, Lex, Lisboa 1998, pág. 110.