Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
181/20.7GACNF.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: JOÃO NOVAIS
Descritores: CONDUÇÃO SEM HABILITAÇÃO LEGAL
PENA ACESSÓRIA
PROIBIÇÃO DE CONDUZIR VEÍCULOS COM MOTOR
Data do Acordão: 09/08/2021
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: VISEU (JUÍZO DE COMPETÊNCIA GENÉRICA DE CINFÃES)
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ART. 3º., N.ºS 1 E 2 DO DECRETO LEI Nº. 2/98, DE 03/01; ART. 69.º, N.º 1, AL. B), DO CP
Sumário: I – Hodiernamente, a redacção da al. b) do n.º 1 do art. 69.º do CP contempla as situações em que a utilização do veículo com motor é elemento acessório, ou instrumental, do crime, e não os casos, como o de condução sem habilitação legal, em que o veículo é elemento principal, necessário e típico da prática do ilícito penal.

II – Consequentemente, a prática de crime de condução de veículo motorizado sem a habilitação legal do condutor não é punida com a pena acessória de proibição de conduzir prevista no normativo acima indicado.

Decisão Texto Integral:





Acórdão da 5ª secção criminal do Tribunal da Relação de Coimbra


       I - Relatório
       1.1.   O Ministério Público veio recorrer da sentença proferida pelo Juízo de Competência Genérica de Cinfães, do Tribunal Judicial da Comarca de Viseu, que condenou o arguido C. pela prática de um crime de crime de condução sem habilitação legal, previsto e punível pelo artigo 3º., n.ºs 1 e 2 do Decreto Lei nº. 2/98, de 03/01, por referência ao artigo 121.º, n.ºs 1 e 4 do Código da Estrada, na pena de 1 ano e 2 meses de prisão, relativamente à parte em que não aplicou a pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor, por falta de fundamento legal, art. 69.º, 1, al. b) a contrario.
     
       1.2. No recurso em apreciação o Ministério Público apresentou as seguintes conclusões:
       1. O Ministério Público deduziu despacho de acusação contra o arguido C. pela prática de um crime de condução de veículo a motor na via pública sem habilitação legal, previsto e punido pelos artigos 3.º, n.ºs 1 e 2 do Decreto-lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro, por referência ao disposto nos artigos 105.º, 106.º, 121.º e 123.º do Código da Estrada e 69.º, n.º 1, alínea b) do Código Penal.
       2. Por sentença datada a 30 de Setembro de 2020, pelo Mm.º Juiz do Juízo de Competência Genérica de Cinfães do Tribunal Judicial da Comarca de Viseu, nos autos supra mencionados, em que é arguido C., na qual foi condenado pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de condução sem habilitação legal, previsto e punível pelo artigo 3º., n.ºs 1 e 2 do Decreto Lei nº. 2/98, de 03/01, por referência ao artigo 121.º, n.ºs 1 e 4 do Código da Estrada, na pena de 1 (um) ano e 2 (dois) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 2 (dois) anos, subordinada ao dever de entregar a quantia de 300 (trezentos) euros ao Estado, através do IGFEJ, no prazo de tal suspensão.
       3. Mais foi decidido “Não aplicar a pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor, por falta de fundamento legal, art. 69.º, 1, al. b) a contrario”.
       4. Quanto à condenação do arguido C. na pena acessória de inibição de conduzir veículos a motor, prevista no artigo 69.º, n.º 1, alínea b) do Código Penal, o Mm.º Juiz do tribunal a quo referiu, em síntese: “não se pode considerar que existe um elemento que facilite de modo relevante uma determinada conduta quando é ele próprio que a criminaliza e que a torna criminalmente relevante. Por outro lado, com a alteração operada pela Lei n.º 77/200, crê-se, tal como defende Paulo Pinto de Albuquerque, que não é esse o entendimento a extrair de tal normativo legal, porquanto, na economia do n.º 1 do artigo 69.º, estando este ilícito típico excluído do catálogo da alínea a), bem como da alínea c), na alínea b) entender-se-á o veículo como um elemento externo à conduta e não um elemento determinante para a caracterização dessa mesma conduta como ilícita típica”.
       5. Contudo, o crime de condução sem habilitação legal no qual o arguido C. foi condenado está abarcado pela alínea a) do n.º 1 do artigo 69.º do Código Penal (quereria escrever al. b), na medida em que, se a lei não exige que o uso do veículo tenha sido condição necessária da prática do crime, nos casos em que o uso do veículo é condição necessária da prática do crime, por maioria de razão, deverá ser aplicada a pena acessória.
       6. Daqui resulta que a norma se basta com um mero auxílio relevante, mas logo surge uma questão necessária: se o legislador quis punir o menos, não quis também punir o mais?
       7. Melhor dizendo, não é compreensível que a lei penal punisse um comportamento pelo facto de ele ser facilitador da prática de um crime e não punisse esse mesmo comportamento pelo facto de ele ser essencial para a prática do crime, o que no caso do cometimento do crime de condução sem habilitação legal, a utilização do veículo é essencial, já que, sem o veículo, o crime não seria cometido.
       8. Por outro lado, a pena acessória de proibição de conduzir veículos a motor, prevista no artigo 69.º do Código Penal, como qualquer outra pena acessória legalmente consagrada, tem uma função preventiva e colaboradora da pena principal.
       9. Acresce que as finalidades de prevenção resultam reforçadas pelo facto de, se o agente do crime de condução sem habilitação legal for punido, além da pena principal, com a pena acessória de inibição de conduzir, violando tal proibição pode resultar para o agente, ainda que não seja titular de carta de condução, a responsabilização pela prática, em concurso efectivo, de um crime de condução sem habilitação legal, previsto e punido pelo artigo 3.º do Decreto - Lei n.º 2/98, de 03 de Janeiro, e de um crime de violação de imposições, proibições ou interdições, previsto e punido pelo referido artigo 353.º do Código Penal.
       10. Assim sendo, a sentença ora recorrida violou o disposto no artigo 69.º, n.º 1, alínea b) do Código Penal.
        Termos em que a sentença ora recorrida deve ser revogada e substituída por outra que condene o arguido C. na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor, no respeito pelo disposto no artigo 69.º, n.º 1, alínea b) do Código Penal, devendo assim o presente recurso ser julgado procedente, como é de toda a inteira e acostumada justiça.
 

        1.3 Notificado o arguido, o mesmo não respondeu ao recurso.

 

       1.4. No parecer a que alude o art. 416º, n.º 1, do Código de Processo Penal, o Ministério Público junto ao Tribunal da Relação pronunciou-se no sentido de sufragar as alegações do Ministério Público na 1ª Instância. 

***

      II -  Fundamentação de Facto

      (Parte da decisão que fundamenta a não aplicação da pena acessória)

      O Tribunal entende que ao crime vertente não deve ser aplicada qualquer pena acessória, na medida em que o artigo 69.º, n.º 1 alínea b) do Código Penal estriba a aplicação da pena acessória na utilização de veiculo e na medida em que este tenha facilitado de forma relevante a prática e a execução do ilícito, bem se percebe que nos termos deste artigo e, salvo o devido respeito por opinião diversa, ao falar-se de facilitar está a atentar-se a um elemento acessório

da conduta e não a um elemento constitutivo, como é aquele do artigo 3.º, n.º 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro. Dizendo de outro modo, não se pode considerar que existe um elemento que facilite de modo relevante uma determinada conduta quando é ele próprio que a criminaliza e que a torna criminalmente relevante.

Por outro lado, com a alteração operada pela Lei n.º 77/200, crê-se, tal como defende Paulo Pinto de Albuquerque, que não é esse o entendimento a extrair de tal normativo legal, porquanto, na economia do n.º 1 do artigo 69.º, estando este ilícito típico excluído do catálogo da alínea a), bem como da alínea c), na alínea b) entender-se-á o veículo como um elemento externo à conduta e não um elemento determinante para a caracterização dessa mesma conduta como ilícita típica.

Assim sendo, deve o arguido ser absolvido da condenação em pena acessória da proibição de conduzir veículos a motor”.


(…)

Pelo exposto, julgo a acusação pública totalmente procedente, por provada, e consequentemente, decido:

A) condenar (…)

B) Não aplicar a pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor, por falta de fundamento legal, art. 69.º, 1, al. b) a contrario.

 (…)

       

       III – Fundamentação de Direito  

       a) O objecto do recurso encontra-se limitado pelas conclusões apresentadas pelo recorrente, sem prejuízo da necessidade de conhecer oficiosamente a eventual ocorrência de qualquer um dos vícios referidos no artigo 410º do Código de Processo Penal (jurisprudência fixada pelo Acórdão do STJ n.º 7/95, publicado no DR, I Série-A, de 28.12.1995);

       b) A única questão a apreciar nesta instância de recurso, prende-se em saber se a decisão da 1ª instância deve ser revertida na parte em que absolveu o arguido da pena de acessória de proibição de conduzir veículos a pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor, por falta de fundamento legal.

         c) A resposta a essa pergunta comporta dois diferentes passos; o primeiro saber se é possível a aplicação da pena acessória de proibição de condução de veículos com motor a alguém que seja condenado pela prática de um dos crimes previstos no artigo 69º, mas não tenha habilitação legal para conduzir, e a segunda, caso se conclua que a resposta à primeira questão é positiva, saber se pode ser condenado na mesma sanção acessória quem pratique apenas o crime de condução sem habilitação legal.

          d)  Relativamente à primeira sub-questão, existe jurisprudência, que perante a aparente contradição lógica decorrente da circunstância de se aplicar uma proibição a quem já está impossibilitado de o fazer (porque não tem título que o habilite), recusa a aplicação da referida sanção acessória, ainda que ocorra a condenação por um dos crimes especificamente previstos nas als a) a c) do n.º 1 do art 69º do Cód. Penal.

A posição contrária, defende que no caso de o arguido, não titular de licença para conduzir, pratique, por exemplo o crime de condução sob a influência do álcool, pode ser aplicada a sanção penal prevista no artigo 69º n.º 1 do Cód. Penal.

Os argumentos principais a favor desta última posição encontram-se expostos no Ac. desta Relação de Coimbra, de 18-3- 2020, Processo nº 854/19.7PCCBR.C1, disponível em www.dgsi.pt, também citado pelo Ministério Público:

Um argumento histórico, desenvolvido no Ac. da Rel. Lisboa, de 15 de Janeiro de 2019, onde se assinala que aquando da revisão do Código Penal de 1982, a questão da aplicação da inibição de conduzir a quem não tinha licença de condução foi abordada, tendo a Comissão Revisora aceite que os condutores que conduzissem sob estado de embriaguez, deveriam ser inibidos da faculdade de conduzir, para obviar a um tratamento desigual que adviria da sua não punição posição.

No mesmo acórdão desta Relação de Coimbra de 18-3- 2020, acrescenta-se que do disposto no art. 126.°, n.º 1, al. d), do Código da Estrada, resulta estar o condenado impedido de obter carta de condução durante o período da pena acessória de proibição de condução de veículos motorizados. E relembra a possibilidade de, entre a condenação e o trânsito em julgado da sentença, o arguido que foi condenado por crime de condução em estado de embriaguez, vir a obter carta ou licença de condução para veículos com motor, verificando-se também quanto a ele as finalidades de prevenção que estão na base da pena acessória

Adicionalmente, considere-se a argumentação sintetizada no Acórdão da Rel. do Porto de 10-3- 2010, processo n.º 1440/09.5GBAMT.P1: 

- Seria «um contra-senso que o condutor não habilitado legalmente a conduzir, podendo vir a obter licença ou carta de condução logo pouco depois da sentença condenatória, não se visse inibido de conduzir, quando o já habilitado fica sujeito a tal sanção - Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa, de 19/09/95, CJ Ano XX, 1995, Tomo IV, pág. 147.

-   o conteúdo material da sanção em causa é o da imposição de uma proibição de conduzir e não o da previsão de uma suspensão dos direitos conferidos pela titularidade da carta de condução.

- A aplicação da proibição de conduzir visa não só assegurar de uma forma reforçada a tutela dos bens jurídicos como também evitar que o agente de tal crime volte a praticar factos semelhantes.

- A não aplicação da pena acessória a alguém que conduziu embriagado e sem dispor de título que o habilitasse à condução, traduzir-se-ia num privilégio injustificado para quem teve um comportamento globalmente mais grave relativamente aquele que somente conduziu em estado de embriaguez 

Esta posição merece actualmente acolhimento, ao que pensamos maioritário, por parte da nossa jurisprudência, designadamente nas decisões citadas por aquele Ac da Rel. de Coimbra de 18-3- 2020:  Acórdãos desta Rel. de Coimbra de 3-07-2012, de 11-09-2013, de 07.06.2017, de 12.04.2018, no Ac.  da Rel. Évora de 7-04-2015, e 26-5-2009, ou no Ac. da Rel. Guimarães de 11-06-2012 e de 4-05-2015, acrescentando-se os Ac. da Rel.  de Lisboa de 12.09.2007, de 26.07.2007 disponíveis  para consulta em www.dgsi.pt, e na doutrina, Germano Marques da Silva, Crimes Rodoviários, Pena Acessória e Medidas de Segurança, pág. 32 e nota 54,.

e) Todavia, como referimos, e ainda que aderindo a esta posição maioritária, no caso o arguido não foi condenado pela prática de algum dos crimes elencados na al. a) e na al. c) do art 69 n.º 1 do Cód. Penal (crimes de homicídio, ou de ofensa à integridade física cometidas no exercício da condução com violação das regras de trânsito, crimes condução perigosa de condução sob embriaguez ou de desobediência); o arguido foi condenado somente pela prática de um crime de condução sem habilitação legal artigo 3º., n.ºs 1 e 2 do Decreto Lei nº. 2/98, de 03/01, que não figura expressamente naquela norma.

Resta assim a possibilidade de ao arguido ser aplicada a sanção acessória por aplicação do da al. b) do referido art 69º do Cód. Penal, recordando-se que prevê a aplicação da referida proibição no caso de punição por crime cometido com utilização de veículo e cuja execução tiver sido por este facilitada de forma relevante, como defende o recorrente.

A redacção desta norma estabelece duas condições; a primeira que o crime seja cometido com utilização de veículo, e a segunda que a execução desse mesmo crime mediante a utilização do veículo, tenha sido por este facilitada de forma relevante.

E a letra da lei aponta com clareza para que essas condições sejam cumulativas, uma vez que as separam a expressão e; logo, cada uma daquelas condições tem que ser acompanhada pela outra.

f) Ora a prática singular de um crime sem habilitação legal não se enquadra naquela hipótese normativa; é que o agente desse crime não recorre à utilização de um veículo para cometer um crime; ele comete um crime independentemente da utilização que dê ao veículo, por mais meritório ou louvável que seja o objectivo da utilização do veículo (por exemplo, o indivíduo conduz sem habilitação para comparecer a um evento de beneficência, ou para dar apoio emocional a um amigo).

A redacção da al. c) do artigo 69º do Cód. Penal dirige-se nitidamente a situações em que a utilização do automóvel é elemento acessório, ou instrumental, do crime, e no caso da condução sem habilitação legal a utilização do automóvel é o elemento principal, necessário e típico da prática do crime.

Não obstante a referida redacção da lei, o recorrente defende que o crime de condução sem habilitação legal pelo qual foi condenado o arguido condenado “está abarcado pela alínea a) do n.º 1 do artigo 69.º do Código Penal (quereria certamente escrever al. b), na medida em que, se a lei não exige que o uso do veículo tenha sido condição necessária da prática do crime, nos casos em que o uso do veículo é condição necessária da prática do crime, por maioria de razão, deverá ser aplicada a pena acessória.

É de recusar esta argumentação do Ministério Público; Tentar forçar a aplicação da al. b) do n.º 1 do art 69º do Cód. Penal contra a sua letra, criando a possibilidade de aplicação de penas a crimes que a lei não prevê, com o argumento de que é mais grave conduzir sem habilitação legal do que utilizar o veículo para a prática de um crime (o que nem sequer resulta evidente, pense-se por exemplo num sequestro praticado com a utilização de um automóvel), viola manifestamente o princípio da tipicidade.

g) Para além daquele argumento literal/gramatical, acresce um argumento que se retira das últimas 2 alterações legislativas que tiveram por o objecto citado artigo 69º do Cód. Penal.

Recorde-se a este propósito, que a redacção da al. a) do n.º 1 do  art 69º  do Cód. Penal, anterior à entrada em vigor da Lei nº 77/2001, de 15-7, previa a condenação em pena acessória de proibição de condução no caso da prática  de “crime cometido no exercício daquela  condução com grave violação das regras do trânsito rodoviário”;   Essa previsão legislativa abrangia, sem dificuldades, a prática de um crime sem habilitação legal, uma vez que dificilmente se pode deixar de considerar que a condução de veículos motorizados sem a respectiva habilitação legal não constituísse a grave violação de uma regra estradal – cfr. os artigos 121º e ss do Código da Estrada.

A referida Lei n.º 77/2001, alterou a redacção ao dito artº 69º do Cód. Penal, eliminando da al. a) a referência ao «crime cometido no exercício daquela condução com grave violação das regras do trânsito rodoviário», passando a prever a aplicação da proibição de condução e veículos com motor apenas quando ocorresse a prática do «crime previsto no artº 291º ou artigo 292º».

E mais tarde, a Lei n.º 19/2013 de 21-2, alterou essa mesma al. a) do n.º 1 do art 69º, passando a prever a aplicação da mesma pena acessória no caso da prática de crimes com violação das regras de trânsito rodoviário, mas cingindo-se aos crimes de homicídio ou de ofensa à integridade física praticados nessas condições, assim se mantendo excluído da sua previsão o crime de condução sem habilitação legal.

Se fosse intenção do legislador aplicar a pena acessória de proibição aos condenados pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, não teria restringido, mediante a Lei n.º 77/2001, o âmbito de aplicação da al. a) do art 69º aos crimes previstos nos artigos 291º e 292º do Cód. Penal, eliminando a anterior possibilidade de a aplicar ainda a outros crimes relacionados com a violação e regras estradais, como o crime de condução sem habilitação.

De igual modo, se fosse essa a intenção do legislador, teria adicionado ao elenco dos crimes expressamente previstos na mesma norma o crime de condução sem habilitação legal, aproveitando a alteração legislativa operada Lei n.º 19/2013, inserindo adicionalmente, na mesma norma, os crimes de homicídio e de ofensa à integridade física praticados na condução com violação de regras estradais.

 Assim, à pergunta do Ministério Público, ora recorrente, “se o legislador quis punir o menos, não quis também punir o mais?” com a qual pretendia sustentar a previsão da aplicação da pena acessória ao crime de condução sem habilitação, a resposta só pode ser negativa; o legislador não quis punir a prática daquele crime com essa pena acessória. 

i) Concluímos pela improcedência do recurso, uma vez que  a aplicação da pena acessória de proibição de condução de veículos com motor não encontra previsão em nenhuma das alíneas do n.º 1 artigo 69º do Cód. Penal – neste sentido cfr. o Ac. da Relação do Porto de 10-3-2010 (logo publicado  ainda antes da alteração legislativa operada pela Lei n.º 19/2013, e que reforça a sua argumentação), processo n.º 1440/09.5GBAMT.P1 in https://jurisprudencia.pt, onde se citam outros   arestos concordantes,  e Paulo Pinto de Albuquerque,  Comentário ao Cód. Penal (…), 3ª edição, Ed. Univ. Católica,  comentário 6 ao art 69º, p. 349, onde se citam  ainda os Ac. Rel. Évora 30-10-2001, CJ XXVI, T. 4, p. 289, Ac. Rel. Coimbra 23-1-2002, CJ XX, T 1 p. 43,  e Ac. Rel. Lisboa 3-7-2003, CJ XXVIIII, t. 4, 126.

IV- Dispositivo

Face ao exposto, acordam os juízes da secção criminal deste Tribunal da Relação de Coimbra, em julgar improcedente o recurso interposto pelo Ministério Público.

Sem custas.

Coimbra, 8 de Setembro de 2021

João Novais (relator)

Elisa Sales (adjunta)


João Novais

                         

Elisa Sales