Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
47/20.0T8CLD.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: AZEVEDO MENDES
Descritores: TRABALHADOR DESLOCALIZADO NO ESTRANGEIRO
MOTORISTA DE TRANSPORTES INTERNACIONAIS
ÂMBITO DO TEMPO DE TRABALHO
REGIME DO TRABALHADOR DESTACADO NO ESTRANGEIRO
Data do Acordão: 06/24/2022
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: JUÍZO DO TRABALHO DE CALDAS DA RAINHA DO TRIBUNAL JUDICIAL DE LEIRIA
Texto Integral: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: DLEI N.º 237/2007, DE 19-6, QUE TRANSPÔS PARA A ORDEM JURÍDICA INTERNA A DIRETIVA N.º 2002/15/CE, CL.ª 41.ª, N.º 6, DO C.C.T.V., CL.ª 51.ª, N.º 1, DO C.C.T.V. DE 15/09/2018, ARTS. 476.º E 6.º A 8.º, ESTES DO CÓDIGO DO TRABALHO
Sumário: I – Não são contabilizáveis como tempo de trabalho – salvo acordo em contrário –, os tempos de deslocação de um trabalhador deslocalizado no estrangeiro, de e para a sua residência em Portugal, para gozo de descansos compensatórios e retoma do trabalho no estrangeiro.

II – O tempo de permanência do trabalhador, motorista de transportes internacionais, no estrangeiro em descanso ou sem exercer a condução profissional não pode ser considerado como tempo de trabalho e remunerado como tal.

III – Não preenche as condições do regime do trabalhador destacado no estrangeiro, o trabalhador móvel, motorista dos transportes internacionais, contratado por empregador em Portugal e com atividade exclusivamente fora do país, quando esta deslocalização não ocorre no âmbito da execução de um contrato entre o empregador e uma empresa beneficiária num quadro de subcontratação comercial em prestação transnacional de serviços, quando se trata de trabalhadores móveis e com atividade desenvolvida em diversos Estados ou quando não se verifica que a atividade é prestada em estabelecimento do mesmo empregador no outro Estado ou em empresa com o qual exista uma relação societária de participações recíprocas, de domínio ou de grupo.

Decisão Texto Integral:

Apelação 47/20.0T8CLD.C1

Relator: Azevedo Mendes

Adjuntos:

Felizardo Paiva

Paula Maria Roberto

Autor: AA

      Ré: T..., SA


            Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

I. O autor intentou contra a ré acção declarativa de condenação, na forma comum, pedindo que seja condenada a reconhecer a resolução do contrato de trabalho com justa causa por si declarada, bem como condenada a pagar-lhe a quantia de € 21.187,67, acrescida de juros moratórios à taxa legal a contar de 21-08-2019 e até integral pagamento.

Para tanto, alegou, em síntese, que: foi admitido ao serviço da ré em 18/4/2018, como motorista de transportes internacionais rodoviários de mercadorias; através de carta registada com aviso de recepção, datada de 09-07-2019, rescindiu o contrato de trabalho com justa causa, com efeitos a partir de 21-08-2019, pelos motivos que constam da mesma carta; tem direito ao pagamento de indemnização pela resolução do contrato de trabalho por justa causa, férias não gozadas, ao valor de uma viagem de Portugal para a Bélgica em 23-01-2019, valor do custo das deslocações do aeroporto de Lisboa até ... e daqui até ao aeroporto, valor das diárias não pagas de todos os dias em que permaneceu no estrangeiro às ordens da ré, retribuição de 8 horas por cada dia de descanso que esteve no estrangeiro ao serviço da ré; custo por não ter dormido em hotel suportado pela ré; diferenças salariais entre a remuneração mínima garantida da Bélgica e aquela que auferiu.

A ré contestou, pugnando pela improcedência da acção.

Efectuada a audiência de julgamento, veio a ser proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenou a ré a pagar ao autor: a) quantia a apurar em execução de sentença, mas nunca superior a € 508,80, relativa a férias não gozadas, acrescida de juros de mora, vencidos e vincendos, calculados à taxa anual de 4%, desde 21-08-2019 até efectivo e integral pagamento; b) a quantia de € 204,10, a título de reembolso de despesas de deslocação, acrescida de juros de mora, vencidos e vincendos, calculados à taxa anual de 4%, desde 21-08-2019 até integral pagamento.

Inconformado, o autor interpôs a presente apelação e, após as correspondentes alegações, apresentou as seguintes conclusões:

«a)- Dos Factos Não Provados apenas podem constar factos alegados pelas Partes e que, obviamente, não resultaram provados. ORA

b)- Nenhuma das partes alegou que os dias que constam da alínea F dos Factos Não Provados, fossem passados no estrangeiro, pelo que essa alínea deve ser eliminada.

c)- E na alínea G desses mesmo Factos Não Provados consta como alegada e não provada, a seguinte afirmação: “O A. passou no estrageiro, às ordens da Ré, todos os Sábados, Domingos e Feriados a seguir indicados: (…)”

d)- Ora os dias indicados constam no art.º 39º da p.i., como sendo todos os dias de descanso obtidos, abatendo à totalidade dos dias do contrato os dias de descanso passados em Portugal.

e)- Por outro lado, não é verdade que o A. não tivesse passado no estrangeiro, às ordens da Ré, a maior parte dos dias de descanso aí indicados, se levarmos em conta que a própria Ré, no art.º 46º da Contestação confessa ter pago ao A. pelos sábados, domingos e feriados compreendidos nos períodos de 6 semanas que o A. estava no estrangeiro ao serviço da Ré, o total de 1.465,17€ a 23,10 por cada dia de descanso, ou seja um total de 63 dias de descanso

f)- Por outro lado, ainda, a Ré veio expressamente confessar nos arts. 32º a 41º da Contestação, que o A. tinha trabalhado para ela, nada menos dos 46 dias de descanso aí indicados nos arts. 34º a 41º da Contestação

g)- Donde e por um lado não pode manter-se a afirmação levada à alínea G dos Factos Não Provados e, por outro lado, sendo importante para a acção saber, sim, quais os dias de descanso passados pelo A. no estrangeiro.

Assim

h)- Deve eliminar-se da Relação dos Factos Não Provados a alínea G) e acrescentar-se à Relação dos Factos Provados o seguinte: “49. O A. passou no estrangeiro, nos períodos de 6 semanas que pelo contrato aí tinha que permanecer, todos os dias do contrato com exceção dos dias das viagens e dos dias passados em Portugal entre essas viagens dias estes que constam do art.º 12º desta Relação dos Factos Provados”

i)- O A. tinha o direito a receber os 55,00€ das diárias relativamente aos dias das viagens Bélgica/Portugal, uma vez que o A. desde a saída até ao regresso a Portugal encontra-se sempre ao serviço da Ré

Assim

j)- Deve a Ré ser condenada a pagar ao A. os 11 dias de diárias peticionadas e relativas aos dias das viagens entre Bélgica e Portugal.

l)- Como o A. deve considerar-se ao serviço da Ré desde a saída de Portugal até ao seu regresso, deve assim considerar-se que o A. esteve ao serviço da Ré todos os dias do contrato, com exceção dos dias de descanso passados em Portugal e respetivas viagens.

m)- Daqui que deve ser reconhecido ao A. o direito a receber todos os dias de descanso (sábados, domingos e feriados) passados no estrangeiro, durante o contrato, quer estivesse a trabalhar, quer não, em montante a apurar em liquidação da decisão.

n)- Segundo o disposto no art.º 8º do Requerimento CE nº 561/2006 do Parlamento Europeu de 15/03/2006 o A. não podia passar na cabine do camião o período das 45 horas de repouso semanal regular, pelo que tal teria que acontecer em Estabelecimento Hoteleiro.

o)- O disposto na Clª 47ª-A do CCTV de 08.03.980 obrigava a Ré a adiantar as quantias necessárias para pagamento dessas despesas.

p)- E o art.º 476º do C. do T. tornava nulo à data do contrato o acordo segundo o qual era ao A. que cabia o pagamento dessas despesas, por tal ser mais desfavorável para ele do que o regime fixado na Clª 47ª-A.

q)- Ora como por via desta situação o A. acabou por não dormir vez nenhuma em estabelecimento hoteleiro com o correspetivo enriquecimento da Ré no não pagamento dessas despesas deve esta ser condenada a pagar ao A. A título de indemnização a quantia peticionada de 3.360,00€.

r)- O A. invocou além do mais como justa causa do despedimento o facto da Ré não lhe pagar os montantes devidos relativos aos dias de descanso (sábados, domingos e feriados).

ORA

s)- Caso o douto acórdão venha a reconhecer ao A. o direito a receber o pagamento de todos os dias descanso passados no estrangeiro, quer o A. Tivesse conduzido quer não, deve a Ré ser condenada a pagar ao A. o montante indemnizatório pedido na acção pelo despedimento de 2.079,00€

t)- O A. conforme ao disposto nos arts. 6º e 8º do Contrato de Trabalho preenchia as condições legais do trabalhador destacado no estrangeiro, uma vez que a razão da sua ida para a Bélgica foi a existência dum contrato da Ré com a firma T... S.A. com sede na cidade ..., na Bélgica, para a qual o A. passou o trabalhar sob a direção e as ordens da Ré.

u)- Pelo que o A., conforme ao disposto no art.º 7º do C. do T. tinha direito a ser pago pelo salário mínimo em vigor na Bélgica, devendo ser-lhe reconhecido o direito a receber o total dos 6.465,03€ pedidos a título das diferenças salariais entre os salários auferidos durante o contrato e o valor do salário mínimo então vigente na Bélgica ou, em alternativa, ser a Ré condenada a pagar a este título o montante a reconhecer em incidente de liquidação.

v)- A MMª Juiz ao decidir como decidiu, violou o disposto nos arts. 405º e 406º do C. Civil Clª 41ª nº 6 do CCTV de 08.03.980, Clª 51ª do CCTV de 15.09.2018 e Clª 50ª nº 1 do CCTV de 08.12.2019, o art.º 8º do Reg. CE 561/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho de 15.03.2006, art.º 476º do C. do T. e 473º do C. Civil, e arts. 6º, 7º e 8º do C. do T.»

A ré apresentou contra-alegações, no termo das quais conclui do seguinte modo:

(…)

Em parecer, pronunciou-se o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto no sentido da improcedência da apelação.


*

II. Factos considerados como provados e não provados pela 1.ª instância:
Da decisão sobre a matéria de facto, é a seguinte a factualidade que vem dada como provada:

1. A R. dedica-se ao transporte público rodoviário de mercadorias;

2. O A. foi admitido ao serviço da R., em 18/4/2018, como motorista, desempenhando as funções de motorista de transportes internacionais rodoviários de mercadorias;

3. A R. não pagava ao A. as refeições à factura;

4. Nem antes da saída para as viagens lhe fazia adiantamentos previstos na cláusula 47.ª-A do CCTV de 8/3/1980, tanto para alimentação como para a dormida quando necessário;

5. Em vez disso, a R. pagava ao A. uma diária de € 55,00, que levava aos recibos sob o "Código 39" com a designação de "ajudas de custo – estrangeiro - motoristas”;

6. O horário do A. era de 40 horas semanais, 8 horas por cada dia útil, sendo os Sábados e Domingos dias de descanso, complementar e obrigatório, respectivamente;

7. A R. pagou ao A.:

- de Abril a Setembro de 2018

retribuição base (fixada pela R.): € 580,00

cláusula 74.ª, n.º 7 (fixada pela R.): € 326,26

prémio TIR (fixado pela R.): € 105,74

prémio ADR (fixado pela R.): € 107,36

- em Outubro de 2018

retribuição base: € 630,00

prémio TIR (ajudas de custo TIR): € 130,00

cláusula 61.ª (fixada pela R.): € 326,82

subsídio nocturno: € 63,00

complemento salarial: € 63,00

8. Foi estabelecido no n.º 2 da cláusula 2.ª do contrato de trabalho celebrado entre as partes:

«Sempre que deslocado no estrangeiro, para além da retribuição indicada o trabalhador tem direito a:

«-Prestação da Cláusula 74, n.º 7 do CCT que regula a actividade.

«-Ajuda de Custo/ Prémio TIR: Euros 105,75

«-Prémio ADR – Euros 107,36

«-Ao pagamento do trabalho prestado em dias de feriado e dias de descanso semanal.

«- Pagamento de Ajuda de Custo / diária até ao limite máximo de €55,00»;

9. A R. colocou o A. a efectuar viagens apenas no estrangeiro;

10. No contrato de trabalho celebrado entre as partes, cuja cópia consta de fls. 33-39, foi estabelecido:

«SEGUNDA

«(Retribuição)

«1. A retribuição base mensal do TRABALHADOR é fixada na quantia bruta de 580,00 € (Quinhentos e oitenta Euros), ficando sujeita a todos os descontos legalmente previstos;

«2. Sempre que deslocado no estrangeiro, para além da retribuição acima indicada o trabalhador tem direito a:

«-Prestação da Cláusula 74, n.º 7 do CCT que regula a actividade;

«-Ajuda de Custo/Prémio TIR: Euros 105,75

«-Prémio ADR – Euros 107,36

«-Ao pagamento do trabalho prestado em dias feriado e dias de descanso semanal.

«-Pagamento de Ajuda de Custo /diária até ao limite máximo de € 55,00

«(…)

«QUARTA

«(Período e horário de trabalho e descanso/repouso semana)

«(…)

«4. Após cada período de 6 semanas de trabalho o TRABALHADOR goza 2 semanas de descanso em Portugal.

«5. De quinze em quinze dias o repouso de 45 horas estabelecido pelo Regulamento (CE) n.º 561/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, publicado em 15 de Março de 2066 alterado pelo Regulamento (CE) n.º 1073/2009 de 4 de Dezembro, quando coincida com a estada do veículo pesado em França e na bélgica, a respectiva dormida tem de ser efectuada obrigatoriamente em hotel/hospedaria à escolha do TRABALHADOR, privilegiando a rede de hotéis Formula 1 e IBIS; este fica obrigado a entregar ao 1.º Outorgante o recibo de pagamento da dormida em hotel de forma a ser reembolsado.

«(…)

«DÉCIMA PRIMEIRA

«(Informação)

«Para complemento dos elementos informativos determinados pelo Art.º 106 do Código do Trabalho, consigna-se o seguinte:

«a) A duração das férias do TRABALHADOR é determinada segundo as regras dos art.ºs 238.º a 245.º do Código do Trabalho.

«b) Que o gozo do período de férias é interpolado respeitando-se o critério estabelecido no n.º 8 do Art.º 241 do Cod. do Trabalho

«c) (…)»;

11. No período de 17/7/2019 a 8/8/2019, o A. gozou férias;

12. O A. realizou as seguintes viagens Portugal/Bélgica e Bélgica/Portugal:

- 18/4/2018: Portugal/Bélgica

- 30/5/2018 a 13/6/2018: Bélgica/Portugal e regresso

- 25/7/2018 a 8/8/2018: Bélgica/Portugal e regresso

- 19/9/2018 a 3/10/2018: Bélgica/Portugal e regresso

- 14/11/2018 a 28/11/2018: Bélgica/Portugal e regresso

- 22/12/2018 a 23/1/2019: Bélgica/Portugal e regresso

- 6/3/2019 a 20/3/2019: Bélgica/Portugal e regresso

- 1/5/2019 a 15/5/2019: Bélgica/Portugal e regresso

 - 26/6/2019 a 10/7/2019: Bélgica/Portugal e regresso

- 17/7/2019: Bélgica/Portugal

13. Todas as viagens entre Portugal e a Bélgica foram realizadas de aviação, com excepção da realizada a 22/12/2018 Bélgica/Portugal que foi realizada de autocarro, tendo o A. ficado de baixa médica em Portugal de 23/1/2018 a 22/1/2019;

14. A R. pagou todos os bilhetes de avião e o de autocarro, com excepção da viagem Portugal/Bélgica do dia 23/1/2019, no valor de € 43,40, que descontou ao A.;

15. Todas as viagens da localidade belga de ... que servia de base à ... ao aeroporto de Bruxelas foram efectuadas em veículos da R.;

16. O A., quando chegava ao aeroporto de Lisboa, seguia de metropolitano até Sete Rios, e daí seguia de autocarro para ..., onde reside;

17. No regresso à Bélgica, o A. fazia a viagem de ... ao Campo Grande de autocarro e depois seguia de metropolitano para o aeroporto;

18. A R. pagava os alimentos ao A. considerando valor da diária de € 55,00;

19. A R. pagava os dias de descanso (Sábados, Domingos e feriados) a € 10,40 à hora, caso fosse efectuado trabalho, que a R. levava ao recibo sob o código 49;

20. No mês de Abril de 2018, a R. pagou ao A.:

- vencimento: € 251,33

- prémio TIR: € 45,82

- cláusula CCT 74 (n.º 7): € 141,38

- prémio ADR: € 46,52

- ajudas de custo estrangeiro-motorista: € 715,00 (13 x € 55,00)

- horas de trabalho suplementar Sáb,Dom,Fe: € 20,08 (2 x € 10,04)

- proporcional subsídio de férias: € 40,42

- proporcional de subsídio de Natal: € 20,94;

21. No mês de Maio de 2018, a R. pagou ao A.:

- vencimento: € 580,00

- prémio TIR: € 105,74

- cláusula CCT 74 (n.º 7): € 326,26

- prémio ADR: € 107,36

- ajudas de custo estrangeiro-motorista: € 1.100,00 (20 x € 55,00)

- horas de trabalho suplementar Sáb,Dom,Fe: € 70,28 (7 x € 10,04)

- proporcional subsídio de férias: € 93,28

- proporcional de subsídio de Natal: € 48,33;

22. No mês de Junho de 2018, a R. pagou ao A.:

- vencimento: € 580,00

- prémio TIR: € 105,74

- cláusula CCT 74 (n.º 7): € 326,26

- prémio ADR: € 107,36

- ajudas de custo estrangeiro-motorista: € 880,00 (16 x € 55,00)

- horas de trabalho suplementar Sáb,Dom,Fe: € 50,20 (5 x € 10,04)

- proporcional subsídio de férias: € 93,28

- proporcional de subsídio de Natal: € 48,33;

23. No mês de Julho de 2018, a R. pagou ao A.:

- vencimento: € 580,00

- prémio TIR: € 105,74

- cláusula CCT 74 (n.º 7): € 326,26

- prémio ADR: € 107,36

- ajudas de custo estrangeiro-motorista: € 1.650,00 (30 x € 55,00)

- horas de trabalho suplementar Sáb,Dom,Fe: € 100,40 (10 x € 10,04)

- proporcional subsídio de férias: € 93,28

- proporcional de subsídio de Natal: € 48,33;

24. No mês de Agosto de 2018, a R. pagou ao A.:

- vencimento: € 580,00

- prémio TIR: € 105,74

- cláusula CCT 74 (n.º 7): € 326,26

- prémio ADR: € 107,36

- ajudas de custo estrangeiro-motorista: € 880,00 (16 x € 55,00)

- horas de trabalho suplementar Sáb,Dom,Fe: € 50,20 (5 x € 10,04)

- proporcional subsídio de férias: € 93,28

- proporcional de subsídio de Natal: € 48,33;

25. No mês de Setembro de 2018, a R. pagou ao A.:

- vencimento: € 580,00

- prémio TIR: € 105,74

- cláusula CCT 74 (n.º 7): € 326,26

- prémio ADR: € 107,36

- ajudas de custo estrangeiro-motorista: € 1.595,00 (29 x € 55,00)

- horas de trabalho suplementar Sáb,Dom,Fe: € 96,38 (9,60 x € 10,04)

- proporcional subsídio de férias: € 93,28

- proporcional de subsídio de Natal: € 48,33;

26. No mês de Outubro de 2018, a R. pagou ao A.:

- vencimento: € 630,00

- prémio TIR: € 130,00

- cláusula CCT 61 (ex-74): € 326,82

- s. nocturno – motor internacional: € 63,00

- complemento salarial (+44t-int: € 63,00

- retroactivos CCT: € 79,94

- ajudas de custo estrangeiro-motorista: € 990,00 (18 x € 55,00)

- TS-CCT2018: € 138,60 (6 x € 23,10)

- proporcional subsídio de férias: € 101,07

- proporcional de subsídio de Natal: € 57,75;

27. No mês de Novembro de 2018, a R. pagou ao A.:

- vencimento: € 630,00

- prémio TIR: € 130,00

- cláusula CCT 61 (ex-74): € 326,82

- s. nocturno – motor internacional: € 63,00

- complemento salarial (+44t-int: € 63,00

- ajudas de custo estrangeiro-motorista: € 1.320,00 (24 x € 55,00)

- TS-CCT2018: € 184,80 (8 x € 23,10)

- proporcional subsídio de férias: € 101,07

- proporcional de subsídio de Natal: € 57,75;

28. No mês de Dezembro de 2018, a R. pagou ao A.:

- vencimento: € 630,00

- prémio TIR: € 130,00

- cláusula CCT 61 (ex-74): € 326,82

- s. nocturno – motor internacional: € 63,00

- complemento salarial (+44t-int: € 63,00

- ajudas de custo estrangeiro-motorista: € 1.265,00 (23 x € 55,00)

- TS-CCT2018: € 138,60 (6 x € 23,10)

- proporcional subsídio de férias: € 101,07

- proporcional de subsídio de Natal: € 57,75;

29. Em Janeiro de 2019, a R. pagou ao A.:

- ajudas de custo estrangeiro-motorista: € 55,00 (1 x € 55,00)

- proporcional subsídio de férias: € 101,07

30. Em Fevereiro de 2019, a R. pagou ao A.:

- vencimento: € 609,00

- prémio TIR: € 125,67

- cláusula CCT 61 (ex-74): € 315,93

- s. nocturno – motor internacional: € 60,90

- complemento salarial (+44t-int: € 60,90

- ajudas de custo estrangeiro-motorista: € 1.595,00 (29 x € 55,00)

- TS-CCT2018: € 184,80 (8 x € 23,10)

- proporcional subsídio de férias: € 101,07

- proporcional de subsídio de Natal: € 57,75;

31. No mês de Março de 2019, a R. pagou ao A.:

- vencimento: € 630,00

- prémio TIR: € 130,00

- cláusula CCT 61 (ex-74): € 326,82

- s. nocturno – motor internacional: € 63,00

- complemento salarial (+44t-int: € 63,00

- ajudas de custo estrangeiro-motorista: € 770,00 (14 x € 55,00)

- TS-CCT2018: € 92,40 (4 x € 23,10)

- proporcional subsídio de férias: € 101,07

- proporcional de subsídio de Natal: € 57,75;

32. No mês de Abril de 2019, a R. pagou ao A.:

- vencimento: € 630,00

- prémio TIR: € 130,00

- cláusula CCT 61 (ex-74): € 326,82

- s. nocturno – motor internacional: € 63,00

- complemento salarial (+44t-int: € 63,00

- ajudas de custo estrangeiro-motorista: € 1.705,00 (31 x € 55,00)

- TS-CCT2018: € 231,00 (10 x € 23,10)

- proporcional subsídio de férias: € 101,07

- proporcional de subsídio de Natal: € 57,75;

33. No mês de Maio de 2019, a R. pagou ao A.:

- vencimento: € 630,00

- prémio TIR: € 130,00

- cláusula CCT 61 (ex-74): € 326,82

- s. nocturno – motor internacional: € 63,00

- complemento salarial (+44t-int: € 63,00

- ajudas de custo estrangeiro-motorista: € 880,00 (16 x € 55,00)

- TS-CCT2018: € 138,60 (6 x € 23,10)

- proporcional subsídio de férias: € 101,07

- proporcional de subsídio de Natal: € 57,75;

34. No mês de Junho de 2019, a R. pagou ao A.:

- vencimento: € 630,00

- prémio TIR: € 130,00

- cláusula CCT 61 (ex-74): € 326,82

- s. nocturno – motor internacional: € 63,00

- complemento salarial (+44t-int: € 63,00

- ajudas de custo estrangeiro-motorista: € 1.705,00 (31 x € 55,00)

- TS-CCT2018: € 231,00 (10 x € 23,10)

- proporcional subsídio de férias: € 101,07

- proporcional de subsídio de Natal: € 57,75;

35. No mês de Julho de 2019, a R. pagou ao A.:

- vencimento: € 630,00

- prémio TIR: € 130,00

- cláusula CCT 61 (ex-74): € 326,82

- s. nocturno – motor internacional: € 63,00

- complemento salarial (+44t-int: € 63,00

- ajudas de custo estrangeiro-motorista: € 660,00 (12 x € 55,00)

- TS-CCT2018: € 92,40 (4 x € 23,10)

- proporcional subsídio de férias: € 101,07

- proporcional de subsídio de Natal: € 57,75;

36. No mês de Agosto de 2019, a R. pagou ao A.:

- vencimento: € 441,00

- prémio TIR: € 91,00

- cláusula CCT 61 (descontado S.nocturno): € 228,78

- s. nocturno – motor internacional: € 44,10

- complemento salarial (+44t-int: € 44,10

- TS-CCT2018: € 46,20 (2 x € 23,10)

- proporcional subsídio de férias: € 70,74

- proporcional de subsídio de Natal: € 40,42;

37. Na base da R. em ..., o A. tinha de dormir no camião uma vez que a R. não dispunha aí de quartos;

38. O A. enviou à R. uma carta registada, datada de 9/7/2019, pela qual comunicou.

«Venho pela presente e atento o disposto no artigo 394.º da Lei 7/2009 de 12/02, rescindir o meu contrato de trabalho com a vossa firma com os seguintes fundamentos:

«a) Por não me serem pagos os montantes devidos relativos ao trabalho prestado nos dias de descanso (sábados, domingos e feriados);

«b) Em virtude de não me serem dados a gozar os descansos compensatórios relativos aos domingos e feriados passados ao serviço da firma no estrangeiro;

«c) Pelo facto de a firma, praticamente todos os meses, me descontar do vencimento quantias variáveis de dinheiro para saldar supostas multas, sendo eu apenas uma vez me foi comprovado que tinha sido eu a ser efectivamente multado, nunca mais me tendo sido mostrado qualquer comprovativo respeitante aos outros descontos que para esse efeito me eram feito.

«d) Pelo facto de a firma, enquanto eu estava em Portugal de baixa médica em Janeiro de 2019 e por isso não ter ido trabalhar para a Bélgica, me ter descontado o valor do bilhete de avião por eu não ter podido utilizado o mesmo para me deslocar da Bélgica para Portugal em 09 de Janeiro de 2019.

«Nestes termos, com fundamento nas referidas violações dos meus direitos pela firma, rescindo o meu contrato de trabalho, com efeitos a partir de 21 de Agostos de 2019, quarta-feira, último dia em que me manterei ao vosso serviço.

«Dou, assim, à firma um prazo superior a trinta dias, no sentido de evitar, à cautela, que o Tribunal possa entender que eu não tinha direito à rescisão com efeitos imediatos.»;

39. O A. prestou a sua actividade de motorista durante todo o tempo em que trabalhou para a R., a partir da cidade ..., na Bélgica, onde a R. tinha a sua base de parqueamento para os pesados, e de onde o A. saía e onde regressava após as viagens a outros países estrangeiros;

40. O A. nunca carregou mercadoria na cidade ..., fazendo-o a partir de França, Alemanha, Holanda e Bélgica;

41. O A. gozou férias em alguns dos períodos de 2 semanas que passava em Portugal;

42. Os mapas de férias foram organizados pela R., em Janeiro de cada ano, e afixados na sede da R. e enviados por correio electrónico para cada um dos motoristas da R., incluindo o A.;

43. O fecho de contas mensal, para efeitos de contabilização dos dias de pagamento das ajudas de custo, é do dia 21 de cada mês ao dia 21 do mês seguinte;

44. O A. não trabalhou em todos os Sábados e Domingos correspondentes às seis semanas passadas no estrangeiro;

45. Quando não tinha serviço atribuído, o A. podia realizar actividades pessoais como bem entendesse;

46. Nesses dias, o A. não tinha a obrigação de guardar o camião que lhe estivesse atribuído, podendo ausentar-se de junto do mesmo;

47. Sempre que o A. trabalhou para a R. em Sábados e Domingos, esta procedeu ao respectivo pagamento;

48. O A. nunca apresentou à R. qualquer recibo relativo a dormidas em hotel.

Na mesma decisão sobre a matéria de facto, foram considerados não provados quaisquer outros factos dos alegados pelas partes com relevância para o julgamento da causa, designadamente:

A) Mais de 80% das viagens do A. foram realizadas entre a Bélgica e a França;

B) Durante todo o tempo que trabalhou para a R. o A. apenas gozou as férias referidas no número 7 dos factos provados;

C) As viagens referidas em 8. dos factos provados foram todas para gozo dos descansos compensatórios;

D) O A. pagou € 1,50 pelo transporte em metropolitano e € 7,90 pelo transporte em autocarro mencionados em 17 dos factos provados;

E) O A. pagou € 1,50 pelo transporte em metropolitano e € 8,00 pelo transporte em autocarro mencionados em 18 dos factos provados;

F) O A. passou no estrangeiro ao serviço da R:

► 2018

- de 21 de Maio a 20 de Junho

- 21 de Julho a 20 de Agosto

- 21 de Agosto a 20 de Setembro

- 21 de Outubro a 20 de Novembro

► 2019

- de 21 de Dezembro a 22 de Janeiro

- 21 de Fevereiro a 20 de Março

- 21 de Abril a 20 de Maio

- 21 de Junho a 20 de Julho;

G) O A. passou no estrangeiro às ordens da R. todos os Sábados, Domingos e feriados a seguir indicados:

► 2018

- Abril: 21, 22, 25, 28 e 29

- Maio: 1, 5, 6, 12, 13, 19, 20, 26 e 27

- Junho: 16, 17, 23, 24 e 30

- Julho: 1, 7, 8, 14, 15, 21 e 22

- Agosto: 11, 12, 15, 18, 19, 25 e 26

- Setembro: 1, 2, 8, 9, 15 e 16

- Outubro: 5, 6, 7, 13, 14, 20, 21, 27 e 28

- Novembro: 1, 3, 4, 10 e 11

- Dezembro: 1, 2, 8, 9, 15, 16 e 22

► 2019

- Janeiro: 26 e 27

- Fevereiro: 2, 3, 9, 10, 16, 17, 23 e 24

- Março: 2, 3, 5, 23, 24, 30 e 31

- Abril: 6, 7, 13, 14, 19, 20, 21, 25, 27 e 28

- Maio: 1, 18, 19, 25 e 26

- Junho: 1, 2, 8, 9, 10, 15, 16, 20, 22 e 23

- Julho: 13 e 14;

H) O A. dormia normalmente no seu camião na base de ... na Bélgica, embora algumas vezes dormisse em França, mas sempre no camião;

I) O A. nunca dormiu em hotel, uma vez que a R. nunca lhe entregou os respectivos avanços para esse efeito;

J) O A. viajava principalmente a França.


*

III. Apreciação

As conclusões das alegações do recurso delimitam o seu objecto, não podendo o tribunal conhecer de questões nelas não compreendidas, salvo tratando-se de questões de conhecimento oficioso.

Decorre do exposto que as questões que importa dilucidar e resolver, no âmbito das conclusões apresentadas, se podem equacionar da seguinte forma:

a) se se justifica a alteração da matéria de facto nos termos pretendidos;

b) se o autor tem direito ao pagamento de 11 dias de diárias peticionadas e relativas aos dias das viagens entre Bélgica e Portugal, a € 55,00 diários, uma vez que desde a saída até ao regresso a Portugal se encontrava sempre ao serviço da ré;

c) se o autor tem direito ao pagamento dos dias de descanso (sábados, domingos e feriados) passados no estrangeiro, durante o contrato, quer estivesse a trabalhar, quer não, em montante a apurar em liquidação da decisão, considerando-se que esteve ao serviço da ré todos os dias do contrato, com exceção dos dias de descanso passados em Portugal e respetivas viagens;

d) se o autor tem direito ao pagamento, a título de indemnização, da quantia peticionada de € 3.360,00, relativa a despesas de dormidas em estabelecimento hoteleiro que acabou por não fazer porque a ré não lhe adiantou as quantias necessárias;

e) se foi lícita a resolução com justa causa do contrato de trabalho declarada pelo autor e se tem direito por isso ao montante indemnizatório pedido na acção, de € 2.079,00;

f) se o autor preenchia as condições legais do trabalhador destacado no estrangeiro e assim tinha direito a ser pago pelo salário mínimo em vigor na Bélgica, devendo ser-lhe reconhecido o direito a receber o total dos € 6.465,03 pedidos a título das diferenças salariais entre os salários auferidos e o valor do salário mínimo então vigente na Bélgica ou, em alternativa e a este título, ao montante a reconhecer em incidente de liquidação.

Apreciando:

1- Quanto à matéria da impugnação da decisão relativa à matéria de facto:

(…)

Pelo que, igualmente nesta parte, entendemos que não pode ter sucesso o que vem requerido, tendo que improceder na totalidade a impugnação da decisão relativa à matéria de facto.

2- A questão do pagamento das “diárias” dos dias das viagens entre Bélgica e Portugal:

O autor equaciona no recurso o direito ao pagamento das “ditas” diárias peticionadas a € 55,00 como relativas aos dias das viagens entre Bélgica e Portugal, defendendo que desde a saída até ao regresso a Portugal se encontrava sempre ao serviço da ré.

Provou-se que (facto 3.) a ré não pagava ao autor as refeições à factura, mas em vez disso a pagava-lhe (facto 5.) uma diária de € 55,00, que levava aos recibos com a designação de "ajudas de custo – estrangeiro - motoristas”, estando estabelecido no contrato (factos 8. e 10.) que “sempre que deslocado no estrangeiro, para além da retribuição indicada o trabalhador tem direito a: (…) Pagamento de Ajuda de Custo / diária até ao limite máximo de € 55,00».

É, portanto, a esta “diária” a que o autor se refere.

Na sentença recorrida, foi negado o pedido do autor quanto a isso, escrevendo-se a esse respeito o seguinte:

«O A. pede, a título de alimentos, o pagamento das diárias, no montante unitário de € 55,00, por todos os dias que permaneceu no estrangeiro às ordens da R., no montante global de € 605,00 (11 dias x € 55,00), assim discriminados: dois dias em cada um dos meses de Junho e Agosto e um dia em cada mês de Setembro e Novembro de 2018 e um dia em cada um dos meses de Janeiro, Março e Maio e dois dias em Julho de 2019.

O A. não logrou provar a factualidade invocada para sustentar este pedido – cfr. alínea F) dos factos não provados.

Nestes termos, não estando provados os factos que constituam a causa deste pedido, improcede o pedido.»

Se bem observamos a questão, em verdade o que o autor pretendia na acção, do modo como se exprimiu no art. 34.º da petição, era o pagamento da diferença do valor das “diárias” mensais pagas pela ré e as que entendia serem devidas, num total - feitas as contas - de 11 “diárias”.

Mas nunca se referiu na mesma petição que essa diferença se relacionava com a questão da consideração dos dias em que efectuou as viagens dias entre Bélgica e Portugal e volta para gozo de descanso.

Di-lo agora no recurso, alegando que:

«portanto a questão a dilucidar é se o A. tinha ou não direito a receber o pagamento da diária nos dias em que tinha que realizar as viagens entre a Bélgica e Portugal. Ora, por um lado, encontrando-se o A. deslocado no estrangeiro é evidente que em todos esses dias em que se encontra deslocado tem ele que ter direito à diária dos 55,00€ pelo que e uma vez que esses dias passados nas viagens fazem parte do período de deslocação no estrangeiro, que o A. tem direito e a Ré a obrigação de pagar a referida diária.

Com efeito, as diárias, nas viagens, têm que ser suportadas pela Ré, uma vez que o A. desde a saída de Portugal até ao regresso, sempre no cumprimento do acordado, está sempre ao serviço da Ré.»

Ora, a questão assim colocada acaba por ser uma questão nova, não apreciada pela 1.ª instância porque não lhe foi colocada.

Como quer que seja, esta Relação já se pronunciou sobre essa questão, mantendo-se a nossa concordância quanto à abordagem efectuada, em vários Acórdãos, designadamente no Acórdão de 06.12.2029, proferido no processo 1313/18.0T8FIG.C1 (disponível em www.dgsi.pt) onde se escreveu a propósito: o seguinte:

«Comece por dizer-se que não está demonstrado qualquer acordo entre o autor e a ré no sentido de que esta devesse pagar àquela o valor das “diárias” que está em consideração.

A despeito do acabado de referir, o autor parte do princípio de que são tempos de trabalho os tempos de viagem de e para o local de trabalho na Bélgica para efeitos de serem gozados em Portugal os descansos compensatórios por trabalho no estrageiro aos sábados, domingos e feriados, razão pela qual sustenta que a ré estava legalmente obrigada ao pagamento das “diárias” em consideração.

Não vislumbramos fundamento legal que nos permita acompanhar o entendimento do apelante.

Assim, começando pelo CT/09, o tempo de trabalho corresponde ao período em que o trabalhador está a trabalhar ou se encontra à disposição da entidade empregadora e no exercício da sua actividade ou das suas funções, bem como determinadas interrupções ou intervalos como tal taxativamente enunciados e dos quais não importa aqui cuidar por nenhum deles estar em equação – art. 197º/1/2 do CT/09.

O tempo de descanso obtém-se por exclusão, no sentido de que deve ser considerado como tal todo o tempo que não possa qualificar-se como de trabalho – art. 199º do CT/09.

Ora, não é do primeiro tipo o tempo compreendido entre o início das viagens em ... ou no aeroporto belga de embarque e o termo dessas viagens em Portugal, para o autor gozar descansos ou férias.

Outrossim, não é desse tipo o tempo compreendido entre o início das viagens em Portugal e o termo dessas viagens na Bélgica, para o autor retomar o seu trabalho na Bélgica.

Acresce dizer que esse tempo também não é passível de ser considerado como “tempo de disponibilidade” passível de ser contabilizado como tempo de trabalho, ou seja, aquele em que o trabalhador se mantém em presença física no local de trabalho - cfr. o acórdão do STJ de 02/11/2004, proferido no Recurso n.º 340/04 - 4.ª Secção (https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2018/01/social2004.pdf), numa situação em que estava em causa uma relação de trabalho referente a motorista profissional; o acórdão do STJ de 23/02/2005, proferido no processo 04S3164; o acórdão do STJ de 19/11/2008, proferido no processo 08S0930; o acórdão da Relação de Coimbra de 08/11/2007, proferido no processo 482/05.4TTVIS.C1; os acórdãos do STJ de 20/6/2018, proferido no processo 641/15.1T8LSB.L1.S1, de 2/5/2018, proferido no processo 157/14.3TTSTR.E1.S1, da Relação de Lisboa de 17/12/2014, proferido no processo 715/13.3TTVFX.L1-4, da Relação de Évora de 14/9/2017, proferido no processo 97/14.6T8STR.E1, de 16/2/2017, proferido no processo 618/13.1TTFAR.E1.

Como assim, à Luz do CT/09 e por exclusão, esse “tempo de viagem” não pode deixar de ser considerado como tempo de descanso.

Considerando o mesmo problema à luz da Directiva 2002/15/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de Março de 2002, relativa à organização do tempo de trabalho das pessoas que exercem actividades móveis de transporte rodoviário, não vemos como a solução correspondente possa deixar de ser a mesma.

Com efeito, nos termos do art. 3º dessa Directiva, “… entende-se por:

a) "Tempo de trabalho":

1. No caso dos trabalhadores móveis, o período compreendido entre o começo e o fim do trabalho, durante o qual o trabalhador se encontre no seu posto de trabalho, à disposição do empregador e no exercício das suas funções ou actividades, ou seja:

- o tempo consagrado a todas as actividades de transporte rodoviário. Essas actividades incluem, nomeadamente:

i) condução;

ii) carga e descarga;

iii) assistência aos passageiros que entrem ou saiam do veículo;

iv) limpeza e manutenção técnica;

v) todas as restantes tarefas destinadas a assegurar a segurança do veículo, carga e passageiros ou a satisfazer as obrigações legais ou regulamentares directamente ligadas à operação específica de transporte em curso, incluindo o controlo das operações de carga e descarga, formalidades administrativas com a polícia, alfândegas, serviços de imigração, etc. - os períodos durante os quais não pode dispor livremente do seu tempo, sendo-lhe exigida a presença no posto de trabalho, pronto para retomar o trabalho normal, desempenhando certas tarefas associadas ao serviço, nomeadamente períodos de espera pela carga ou descarga cuja duração previsível não seja antecipadamente conhecida, isto é, antes da partida ou imediatamente antes do início efectivo do período em questão, ou de acordo com as condições gerais negociadas entre os parceiros sociais e/ou previstas pela legislação dos Estados-Membros.

(…)

São excluídos do tempo de trabalho os períodos de pausa referidos no artigo 5.o, os períodos de repouso referidos no artigo 6.o e ainda, sem prejuízo da legislação dos Estados-Membros ou de acordos entre os parceiros sociais que prevejam a compensação ou limitação desses períodos, o tempo de disponibilidade referido na alínea b) do presente artigo”.

Como assim, à luz desta Directiva comunitária o “tempo de viagem” em consideração não pode ser considerado como tempo de trabalho.

Além disso, não se vislumbra que esse “tempo de viagem” possa ser qualificado como tempo de trabalho à luz do DL 237/2007, de 19/6, que transpôs para a ordem jurídica interna a Directiva n.º 2002/15/CE.

À mesma conclusão se chega tendo em consideração o IRCT aplicável, designadamente a cláusula 41ª/6 que o apelante convoca em seu benefício e nos termos da qual “Por cada dia de descanso semanal ou feriado em serviço no estrangeiro o trabalhador, além do adicional referido nos n.ºs 1 e 2 desta cláusula, tem direito a 1 dia de descanso complementar, gozado seguida e imediatamente à sua chegada.”.

Com efeito, dessa cláusula não resulta minimamente que deva qualificar-se como tempo de trabalho o “tempo de viagem” que ora está em equação.

Improcedem assim, por ausência de suporte legal que as sustente, as conclusões do autor no sentido de que

“a) – Desde que o A. vai de Portugal, em cumprimento das suas funções de motorista TIR e do acordado com a Ré, até que regressa a Portugal, o A. encontra-se sempre ao serviço da Ré.

Só após entrar em Portugal e enquanto aqui permanecesse ele deixa de estar ao serviço e sob as ordens da Ré. ASSIM

b) – As diárias dos alimentos respeitantes aos dias das viagens acordadas entre Bélgica/Portugal e Portugal/Bélgica, terão que ser suportadas Ré.”.»

Por conseguinte, com os fundamentos resultantes desta transcrição, não acolhemos a posição do apelante na parte aqui tratada.

3- Quanto à questão do direito ao pagamento dos dias de descanso (sábados, domingos e feriados) passados no estrangeiro durante o contrato:

Na sentença recorrida escreveu-se a este respeito:

«O A. peticiona o pagamento da quantia de € 7.965,74 correspondente a 8 horas, quer trabalhasse, quer não trabalhasse, por cada Sábado, Domingo e feriado passado no estrangeiro.

O A. não reclama o pagamento do trabalho efectivamente prestado em dias de Sábado, Domingos e feriados, antes se refere aos Sábados, Domingos e feriados em que esteve estrangeiro, e, por isso, entende ser-lhe devido o pagamento de, pelo menos 8 horas, como se efectivamente prestasse trabalho, porque se encontrava ao serviço da R.

Para a resolução desta questão importa atentar na circunstância de, no decurso da relação laboral que as partes mantiveram, todas as viagens efectuadas pelo A. ao serviço da R. o foram no estrangeiro, a partir de uma base situada, igualmente, no estrangeiro.

O A. não foi motorista que partia de Portugal para fazer viagens ao estrangeiro e aqui regressava e que mercê desse trabalho e do cumprimento dos períodos de descanso e de condução, tinha de passar fins-de-semana e feriados no estrangeiro, ocasião em que mantinha a obrigação de vigilância sobre a carga e o veículo.

Pelo contrário, o A. fez todas as viagens no estrangeiro, a partir de uma base igualmente situada no estrangeiro, e nos períodos em que não estava em viagem, poderia deixar o carro nessa base que tinha vigilância, e ir dispor do tempo como bem entendesse.

Esta distinção é crucial para se concluir que o A. não tem direito a retribuição por trabalho suplementar nos Sábados, Domingos e feriados que, estando incluídos nas 6 semanas no estrangeiro, não efectuou qualquer trabalho por conta da R.

Carece de justificação a remuneração como trabalho suplementar de 8 horas em cada Sábado, Domingo e feriado nos quais o A. não prestou qualquer trabalho efectivo, nem existe razão que imponha a equiparação a trabalho suplementar os dias em que o A. ficou no estrangeiro, sem prestar trabalho para a R..

Finalmente, o A. não logrou demonstrar que passou no estrangeiro os Sábados, Domingos e feriados que alega e, tendo passado, que tenha, efectivamente, efectuado trabalho para a R.»

 Pretende o autor que os dias de descanso (sábados, Domingos e feriados) passados no estrangeiro, independentemente de estar ou não a trabalhar, lhe sejam pagos com acréscimo, de 200%, apoiando-se nos exemplos similares das “Clª 41ª nº 6 do C.C.T.V. de 08/03/980 ou Clª 51ª nº 1 do C.C.T.V. de 15/09/2018 e Clª 50ª nº 1 do C.C.T.V.”, aplicáveis, e por se encontrar deslocado no estrangeiro ao serviço da ré todos os dias do contrato.

Também esta Relação já se pronunciou sobre esta questão dando-lhe resposta negativa, designadamente no Acórdão de 27.11.2020, no proc. 2356/19.2T8LRA.C1 (in www.dgsi.pt).

E no Acórdão da Relação de Guimarães, de 17-12-2020, no processo 1257/19.9T8BCL-G1, no mesmo sentido e num caso muito similar, escreveu-se negando-se o acréscimo com o seguinte fundamento:

«A questão que agora incumbe apreciar respeita ao estipulado na Clª 41ª do CCTV aplicável, a qual prescreve o seguinte:

41ª (Retribuição do trabalho em dias de descanso e feriados)

“1- O trabalho prestado em dias feriados ou dias de descanso semanal e ou complementar é remunerado como a créscimo de 200% (…)

2- Qualquer período de trabalho prestado nos dias feriados de descanso semanal e ou complementar será pago pelo mínimo de cinco horas, de acordo com os nºs 1 e 2

(…)

6- Por cada dia de descanso semanal ou feriado em serviço no estrangeiro o trabalhador, além do adicional referido nos nºs 1 e 2 desta cláusula, tem direito a um dia de descanso complementar, gozado seguida e imediatamente à sua chegada”.

Importa apurar se a transcrita cláusula se aplica ao trabalhador destacado no estrangeiro quando nos dias de descanso e feriados esteja efectivamente a trabalhar ou se também será de aplicar no caso em que o trabalhador embora esteja no estrangeiro, goza efectivamente esses dias de descanso, ou seja não trabalhou nesses dias.

Reconhecendo que esta questão suscita dúvidas temos vindo a defender que os motoristas quando estão deslocados no estrangeiro (sendo o seu local de trabalho em Portugal) são de considerar sempre em serviço, estejam ou não no exercício da condução – cfr. Ac. Relação de Guimarães de 19/06/2019, processo n.º 3056/17.3T8BCL.G1, consultável in ww.dgsi.pt.

Contudo, no caso em apreço o autor não se encontrava deslocado no estrangeiro, mas sim por força do acordo estabelecido com o empregador foi destacado para trabalhar no estrangeiro (passando o seu local de trabalho a ser na Bélgica – ...), tendo sempre trabalhado 6 semanas no estrangeiro, vindo 2 semanas a Portugal, para gozar os descansos compensatórios. Ou seja, o autor acabou por prestar trabalho, sob a autoridade, direcção e fiscalização de uma empresa portuguesa, estabelecida em Portugal, que presta a sua actividade no território de outro Estado – cfr. arts.º 8.º e 6.º do CT.

Da factualidade provada a este propósito apurou-se o seguinte:

- Nos fins de semana (sábados e Domingos) passados pelo autor na Bélgica, este podia ausentar-se do camião que lhe estava atribuído, podia ausentar-se da base, pelo tempo que desejasse e para fazer o que entendesse, dispondo o autor livremente do seu tempo (alínea PP) dos pontos de facto provados).

- Os camiões TIR da ré nesses sábados e domingos ficam aparcados na base de ..., base alugada pela ré na Bélgica, dias em que o autor não conduz a viatura, como também não ficava obrigado à sua guarda e vigilância (alínea QQ) dos pontos de facto provados).

- Caso o camião ficasse aparcado em parques de áreas de serviço, num fim de semana estas encontram-se equipadas com restaurante, café, lojas comerciais, casas de banho e zonas de lazer e são áreas vigiadas, pelo que o camião permanece sob o sistema de vigilância da área de serviço (alínea RR) dos pontos de facto provados).

- A ré sempre liquidou ao autor os montantes referentes ao trabalho prestado nos dias de descanso, sob a rubrica “HORA trabalho suplementar, Sáb, Dom, Fe” nos montantes que constam dos documentos juntos pelo autor, que se reportam aos seus recibos de remuneração, que se dão por reproduzidos nos seus precisos termos (alínea SS) dos pontos de facto provados).

Importa reter que no caso em apreço o autor passou inúmeros dias de descanso e feriados no estrangeiro sendo certo que naqueles em que efectivamente prestou a sua actividade, a Ré compensou-o, liquidando-lhe a respectiva remuneração.

Quanto aos restantes dias de descanso e ou feriados devem ser proporcionados de modo a que o trabalhador possa destinar esse tempo como bem entender, ainda que com as limitações decorrentes do facto de estar trabalhar no estrangeiro, não deixando contudo de poder usufruir efectivamente do seu tempo de descanso, não se encontrando por isso na disponibilidade da Ré para a prestação de trabalho.

O motorista internacional destacado no estrangeiro, como qualquer outro trabalhador destacado no estrangeiro, tem de gozar os descansos e os dias feriados no estrangeiro, só devendo ser considerado trabalho suplementar, aquele que efectivamente é prestado nesses dias, tal como resulta do teor da cláusula 41.ª n.ºs 1 e 2 do CCT aplicável.

Efectivamente foi o que sucedeu, o autor nos fins-de-semana e feriados nos quais não prestou trabalho efectivo pode dispor livremente do seu tempo, não estando obrigado a observar o dever de vigilância e de guarda da viatura que conduzia, não tendo efectivamente prestado qualquer trabalho, nem esteve disponível para o prestar.

Situação diferente e não equiparável é a do trabalhador deslocado no estrangeiro que por razões de organização da entidade empregadora tem de passar os dias de descanso no estrangeiro, sem que possa regressar a casa, devendo em tal situação ser encarada como prestação efectiva de trabalho, dado que o motorista está disponível para o fazer, mantendo as obrigações de verificação e vigilância e manutenção da viatura que lhe está atribuída. O que não se verificou no caso em apreço.

Em suma o motorista deslocado no estrangeiro, por força das circunstâncias e pela natureza da sua actividade está em permanente disponibilidade ao serviço do empregador, enquanto o motorista destacado no estrangeiro, por força do acordado com o empregador, tem necessariamente de usufruir dos descansos no estrangeiro, dispondo dos tempos de descanso como bem entende.

De tudo isto resulta que apenas nos dias de descanso e feriados em que o autor prestou efectivamente a sua actividade por conta do empregador terá direito ao pagamento da respectiva prestação. E isto significa que o direito ao pagamento da compensação pelo trabalho prestado nesses dias exige a alegação e subsequente prova de que foi prestado efectivamente trabalho em dia de descanso ou feriado, incumbindo o ónus da prova ao autor.

Ora, não tendo o autor logrado provar que tivesse trabalhado, para além daqueles dias de descanso em que foi compensado pela ré, em alguns dos 79 dias de sábado, domingo e feriados passados no estrangeiro no ano de 2016; que tivesse trabalhado em alguns dos 64 dias de sábado, domingo e feirado passados no estrangeiro no ano de 2017 e que tivesse trabalhado em alguns 42 dias de sábado, domingo e feirado passados no estrangeiro no ano de 2018, não tem direito ao pagamento que reclama, impondo-se assim a revogação, nesta parte da sentença recorrida.»

Deste último Acórdão ressalvaremos apenas, na manifestação da concordância que o mesmo genericamente nos merece, na parte transcrita, uma divergência quanto à referência à figura de “destacamento de trabalhador”, uma vez que no caso, tratando-se de trabalhador móvel, a situação se apresenta antes como uma situação de deslocalização espacial contratualmente assumida para o desempenho natural da actividade de transporte e não necessariamente como uma situação típica da figura jurídica de “destacamento de trabalhador” regulada nos arts. 6.º e segs. do Código do Trabalho.

Assim, com esta ressalva, com os fundamentos expostos nos referidos Acórdãos não há que alterar a sentença, pelo que a manteremos também nesta parte.

4- Quanto à questão das dormidas em estabelecimento hoteleiro:

Como se disse, no recurso o autor pede a condenação no pagamento da quantia de € 3.360,00, relativa a despesas de dormidas em estabelecimento hoteleiro que acabou por não fazer porque a ré não lhe adiantou as quantias necessárias.

Na sentença recorrida foi dito o seguinte, a este propósito:

«O A. pede o pagamento da quantia de € 3.360,00 (96 noites x € 35,00) correspondente às noites em que deveria ter dormido num hotel, e não dormiu porque a R. não pagou.

O A. sustenta a sua pretensão no disposto no art.º 8.º, n.º 8 do Regulamento (CE) 561/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Março de 2006.

O art.º 8.º regula os períodos de repouso dos motoristas de transportes rodoviários e estabelece no n.º 8 que caso o condutor assim o deseje, os períodos de repouso diário e os períodos de repouso reduzido fora do local de afectação podem ser gozados no veículo, desde que este esteja equipado com instalações de dormida adequadas para cada condutor e não se encontre em andamento.

Foi acordado contratualmente, na cláusula 4.ª, que «De quinze em quinze dias o repouso de 45 horas estabelecido pelo Regulamento (CE) n.º 561/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, publicado em 15 de Março de 2066 alterado pelo Regulamento (CE) n.º 1073/2009 de 4 de Dezembro, quando coincida com a estada do veículo pesado em França e na bélgica, a respectiva dormida tem de ser efectuada obrigatoriamente em hotel/hospedaria à escolha do TRABALHADOR, privilegiando a rede de hotéis Formula 1 e IBIS; este fica obrigado a entregar ao 1.º Outorgante o recibo de pagamento da dormida em hotel de forma a ser reembolsado» - sublinhado meu.

Nos autos, não ficou apurado que o A. tenha dormido em hotel alguma noite, antes foi demonstrado que o A. não apresentou à R. recibos referentes a dormidas em hotel.

Se é certo que ficou provado que a R. não fazia ao A. adiantamentos para alimentação, nem para a dormida, não é menos verdade que o A. não provou que não tenha pernoitado em hotel (nos termos acordados no contrato de trabalho) por falta de adiantamento por parte da R. (…)».

O autor apelante, na divergência, argumenta que sendo a obrigação de pagar as dormidas uma obrigação legal imposta à ré, não pode ela ser transferida para a parte mais débil do contrato, o trabalhador, já que isso levaria a que os motoristas nunca dormissem nos estabelecimentos hoteleiros sem quaisquer consequências para os empregadores. Invoca neste entendimento a nulidade do acordo quanto a tal pagamento e tendo em conta esse desequilíbrio e , ainda, tendo em conta o disposto no art. 476.º do C.T., quando prescreve que as disposições dos IRCT só poderão ser afastadas desde que estabeleçam condições mais favoráveis para o trabalhador.

No Acórdão desta Relação de Coimbra de 17.01.2020, no processo 46/19.5T8CTB.C1 (in www.dgsi.pt), numa situação completamente similar à dos autos (Acórdão também citado na decisão da 1.ª instância relatado pelo aqui 1.º Adjunto e tendo também como adjunta a aqui 2.ª Adjunta), teceram-se as seguintes considerações em conforto da posição da sentença recorrida:

«A este propósito, alega o autor que a alínea i) do artº 4º do Reg. (CE) nº 561/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho de 15/03/2006 estipula para todos os países da comunidade que a semana de trabalho dos motoristas é o período de 7 dias completos compreendidos entre as 00h00 de 2ª feira e as 24h00 de domingo.

E a alínea h) desse normativo dispõe que “período de repouso semanal” é um período de repouso de 45 horas

Dispondo o nº 6 do artº 8º que em cada período de 2 semanas consecutivas o condutor deve gozar pelo menos 2 períodos de repouso semanal regular, de 45 horas cada um.

No entanto o nº 6 desse artigo permite que o condutor goze nas duas semanas um período de repouso semanal regular, portanto de 45 horas e um período de repouso semanal reduzido no mínimo de 24 horas e depois outro período igual de 24 horas período “equivalente” na 3ª semana e o nº 8 desse artigo permite que o condutor, querendo, goze esse repouso semanal reduzido de 24 horas na viatura.

De qualquer maneira o A. só não gozava estes repousos semanais sempre nos hotéis e, portanto, fora dos veículos que conduzia, porque a Ré não lhe fazia os necessários adiantamentos antes da saída para as viagens conforme ao disposto na Clª 47-A al. b) do C.C.T.V.

Ora uma dormida num hotel custa em média, 50,00 € nos vários países da Europa.

Assim, reclama o A. o pagamento dos preços destas dormidas com os quais a Ré se locupletou ao não entregar ao A. os adiantamentos necessários para este efeito, pelo que o A. considerando que tinha o direito de dormir nos Hotéis, duas noites em cada semana, pelo que é credor da quantia total de €3.500,00.

Na sentença recorrida abordou-se esta questão do seguinte modo: “(…) conforme resulta da matéria de fato, o autor passou ao serviço da ré no estrangeiro um total de 35 semanas, pelo que teria direito a dormir 70 noites em hotéis.

E assim sendo, sabendo-se, por assim resultar da matéria de facto considerada provada, que uma dormida num hotel custa em média, 50,00 € nos vários países da Europa, a ré teria de pagar ao autor a quantia de 3.500€.

Sucede que, conforme acima adiantámos, à condenação da ré no pagamento das prestações do regime convencional aplicável, devem ser deduzidos os montantes pagos pela ré a título de "ajudas de custo”, por se entender que tal abono pudesse compensar, por excesso, as retribuições complementares estabelecidas na CCT.

E assim sendo, tendo a ré pago sempre a diária de 50€ ou 55€ por dia ao autor, conclui-se que, deduzido tal montante ao que montante devido, nada fica por pagar ao autor, pelo que nada lhe será devido”.

Ora, conforme reconhece a sentença, em segmento não impugnado, o autor passou ao serviço da ré no estrangeiro um total de 35 semanas, pelo que teria direito a dormir 70 noites em hotéis (35 x €50 = €3.500,00.).

Está provado que a ré antes da saída para as viagens não lhe fazia os adiantamentos previstos na Clª 47-A do CCTV (facto 7), designada e concretamente, os adiantamentos relativos a despesas que o trabalhador tenha que efectuar consigo mesmo, nas quais se incluem, estamos em crer, as despesas com alojamento.

Mas já não se encontra provado, conforme alega o recorrente, que este não tivesse gozado os repousos semanais nos hotéis, ou seja, fora dos veículos que conduzia, porque a Ré não lhe tivesse feito esses adiantamentos.

Por outro lado, estipulou-se contratualmente que “o repouso regular de 45 horas, quando coincida com a estada do veículo pesado em França ou na Bélgica tem de ser efetuada obrigatoriamente em hotel à escolha do trabalhador, privilegiando a rede de Hotéis Fórmula 1 e IBIS, ficando o trabalhador obrigado a apresentar o recibo de pagamento da dormida de forma a ser reembolsado” nº 5 da Clª.4º do contrato de trabalho.

Esta cláusula contratual, salvo melhor opinião, não consagra, no nosso entendimento, um regime menos favorável, no que às dormidas concerne, do que aquele que resulta do CCTV pois este apenas determina que deve haver aditamentos não especificando o local ou locais onde devam ser gozadas as pernoitas nos dias de descanso.

Acresce que, no caso, nem sequer se provou (ónus que recaía sobre o autor) que a falta dos adiantamentos fosse a causa das pernoitas não terem sido passadas em hotel.

Por isso mesmo, entendemos que, a dita cláusula contratual é válida atento o disposto no artº artº 476 do CT.

Ora, como o autor não apresentou o recibo de pagamento de dormidas em hotel/hospedaria, não tem direito à quantia que reclama.

Aliás, relembre-se que o autor pernoitava na cabina do seu camião à semelhança de todos os motoristas do transporte internacional de mercadorias, cabines aquelas que estão devidamente preparadas e com condições adequadas ao efeito de pernoita e que nos fins de semana de descanso do autor no estrangeiro, por norma, ocorriam na base logística de ... - Bélgica, a qual se encontra devidamente habilitada com balneários, refeitório totalmente equipado, que os motoristas da Ré poderiam usar (factos 47 e 48).

Ainda que os pagamentos aludidos nos recibos sob a rubrica “ajudas de custo – Cód. 34”, se destinassem ao pagamento do alojamento/dormidas (tais pagamentos destinam-se apenas ao pagamento da alimentação -factos 6 a 8 e 29 e 31), sempre pelos fundamentos expostos a quantia peticionada a título de dormidas não seria na mesma devida ao autor.

Este acórdão continua a merecer o nosso inteiro acordo, pelo que mantemos o entendimento da validade da referida cláusula contratual (consequentemente, ela não é nula como pretende o recorrente) e os demais pressupostos que conduziram à apreciação feita pela sentença recorrida

5- Quanto à questão de saber se pode reconhecer-se justa causa para a resolução do contrato de trabalho:

Sustenta o apelante que invocou, para além do mais como justa causa para a resolução do contrato o facto da ré não lhe pagar os montantes devidos relativos aos dias de descanso (sábados, Domingos e feriados). Nesta circunstância, pede que “caso o douto acórdão venha a reconhecer ao A. o direito a receber o pagamento de todos os dias descanso passados no estrangeiro, quer o A. tivesse conduzido quer não, deve a Ré ser condenada a pagar ao A. o montante indemnizatório pedido na acção pelo despedimento de 2.079,00€”.

Já acima dissemos que não podemos reconhecer o invocado direito a receber o pagamento dos “dias descanso passados no estrangeiro”.

Por conseguinte, fica prejudicada a apreciação da verificação de justa causa, uma vez que o apelante, sem aquele reconhecimento, não contesta no recurso o julgamento da 1.ª instância que a não considerou verificada, apresentando os seguintes acertados fundamentos:

«Realizado o julgamento apurou-se apenas [dos fundamentos invocados pelo trabalhador]que a R. descontou no recibo de vencimento do A. a viagem Portugal/Bélgica do dia 23/1/2019, no valor de € 43,40.

Crê-se que este facto, considerando-se especialmente o montante em causa (€ 43,40) e por ser de ocorrência única e não repetida, não é bastante para colocar em crise a relação laboral mantida entre as partes e constituir justa causa para a resolução do contrato de trabalho.

A inexistência de justa causa de resolução do contrato de trabalho afasta, desde logo, o direito do A. à indemnização prevista no art.º 396.º do Código do Trabalho.»

 

6- Quanto à questão de saber se o autor preenchia as condições legais do regime trabalhador destacado no estrangeiro e se, assim, tinha direito a ser pago pelo salário mínimo em vigor na Bélgica:

O apelante defende que, de acordo com os arts. 6.º e 8.º do Código do Trabalho, preenchia as condições legais do trabalhador destacado no estrangeiro “uma vez que a razão da sua ida para a Bélgica foi a existência dum contrato da Ré com a firma T... S.A. com sede na cidade ..., na Bélgica, para a qual o A. passou o trabalhar sob a direção e as ordens da Ré” (conclusão t) do recurso). Por isso mesmo, alega que face ao disposto no art. 7.º do Código do Trabalho tinha direito a ser pago pelo salário mínimo em vigor na Bélgica.

Na sentença recorrida negou-se esta posição, do seguinte modo:

«O A. pede a quantia de € 6.465,03, correspondente a diferenças salariais em relação a todo o tempo que trabalhou para a R.

Sustenta a sua pretensão na directiva 96/71/CE que lhe atribui o direito à remuneração mínima garantida na Bélgica.

A directiva 96/71/CE, relativa ao destacamento de trabalhadores no âmbito de uma prestação de serviços, à semelhança de todas as directivas, por ser essa a sua natureza, não concede ela própria e directamente direitos, aos cidadãos. Necessita, sempre, de transposição por parte dos Estados-Membros.

A directiva vincula o Estado-Membro destinatário quanto ao resultado a alcançar, deixando, no entanto, às instâncias nacionais a competência quanto à forma e aos meios.

Diferentemente, o regulamento tem carácter geral e é obrigatório em todos os seus elementos e directamente aplicável em todos os Estados-Membros – cfr. art.º 288.º do Tratado da União Europeia.

Em regra, as directivas só produzem efeitos após a sua transposição.

Admite-se que possam produzir efeitos directos as directivas que não tenham sido objecto de transposição caso o Estado-Membro não tenha efectuado a transposição para a legislação nacional ou tenha sido objecto de transposição incorrecta, desde que as disposições da directiva sejam incondicionais, claras e precisas e as disposições particulares da directiva confiram direitos a particulares.

No caso dos autos, o A. parece querer aplicar a directiva, olvidando a norma nacional de transposição.

A Directiva 96/71/CE foi transposta pela Lei 9/2000, entretanto revogada com a entrada em vigor das normas regulamentares do Código do Trabalho aprovado pela Lei 99/2003 (já revogado).

Assim, as normas actualmente aplicáveis são as dos art.os 6.º a 8.º do Código do Trabalho que regulam o destacamento de trabalhadores em território português e o destacamento de trabalhadores para outro Estado.

O trabalhador contratado por uma empresa estabelecida em Portugal, que preste actividade no território de outro Estado em situação a que se refere o artigo 6.º, tem direito às condições de trabalho previstas no artigo 7.º, sem prejuízo de regime mais favorável constante da lei aplicável ou do contrato – cfr. art.º 8.º, n.º 1 do Código do Trabalho.

São condições estabelecidas no art.º 6.º, o trabalhador presta a actividade noutro Estado:

a) Em execução de contrato entre o empregador e o beneficiário que exerce a actividade, desde que o trabalhador permaneça sob a autoridade e direcção daquele;

b) Em estabelecimento do mesmo empregador, ou empresa de outro empregador com o qual exista uma relação societária de participações recíprocas, de domínio ou de grupo;

c) Ao serviço de um utilizador, à disposição do qual foi colocado por empresa de trabalho temporário ou outra empresa.

Para efeitos da determinação da retribuição mínima esta integra os subsídios ou abonos atribuídos ao trabalhador por causa do destacamento que não constituam reembolso de despesas efectuadas, nomeadamente com viagens, alojamento e alimentação – cfr. art.º 7.º, n.º 2, al. a) do Código do Trabalho.

Ponderada a factualidade apurada, constata-se que o A. não provou, ou sequer alegou, os factos que permitiriam considerar verificada alguma das condições estabelecidas no art.º 6.º acima transcritas e, por isso, que estamos perante um caso de destacamento.

Acresce que, igualmente, o A. não logrou provar que o regime de retribuição belga é mais favorável que aquele de que beneficia à luz do direito português (que abrange o decorrente da lei e da regulamentação colectiva), sendo certo que a determinação da retribuição mínima mais favorável não pode atender exclusivamente ao montante da retribuição base mensal (que é apenas uma parte da retribuição de um trabalhador), à luz também da alínea a) do n.º 2 do art.º 7.º.

Por outro lado, o que se prevê é a aplicação do regime relativo à retribuição mínima, isto é, a totalidade da regulação que disciplina a retribuição em cada um dos Estados, não podendo o A. escolher, de entre os ordenamentos jurídicos abstractamente aplicáveis, apenas as normas reguladoras da retribuição que entenda serem-lhe mais favoráveis, de modo a poder até ficar em situação privilegiada/mais favorecido em relação, no caso, aos trabalhadores a quem seja aplicada a lei belga por trabalharem na Bélgica.

Finalmente, na determinação da lei material aplicável não há dúvida que foi vontade das partes optar pelo Direito português como ficou expresso no contrato de trabalho.

Em suma, o ónus de demonstrar os factos que conduzissem à aplicação do regime previstos nos art.s 6.º a 8.º do Código do Trabalho recaia sobre o A., o que este não logrou fazer.

Nestes termos, improcede esta pretensão do A.»

Cumpre antes de mais referir, para simplificar a abordagem da questão, que independentemente da origem legislativa da figura do destacamento de trabalhadores e seu desenvolvimento, com as aproximações dadas no transcrito extracto da sentença recorrida, as normas a que nos temos de submeter – e com suficiência, acrescentamos – são as normas dos arts. 6.º, 7.º e 8.º do Código do Trabalho.

Podemos encontrar já alguma jurisprudência relevante sobre a figura do destacamento, embora porventura uma jurisprudência ainda pouco consolidada, uma vez que as questões tratadas não merecem inteira convergência de entendimento  (nesta Relação podemos contar com os Acórdãos de 12-01-2018, proc. 233/16T8LRA.C1 e de 06-12-2019, proc. 1313/18.0T8FIG.C1, na Relação do Porto com o de 22-05-2019, processo 4800/16.1T8MTS.P1, e na Relação de Guimarães com o de 19-11-2020, proc. 469/17.5T8BCL.G1, todos in www.dgsi.pt).

Tratando-se de um trabalhador destacado, parece-nos claro que ele beneficia da retribuição mínima garantida no Estado do destacamento, de acordo com o previsto no art. 7.º n.º 1 al. b) do CT.

Mas no caso dos autos, independentemente dos demais considerandos e fundamentos constantes da sentença recorrida na parte acima transcrita, os quais nos dispensaremos de analisar por desnecessidade, importa sobretudo definir se pode considerar-se o autor como “trabalhador destacado” em face dos elementos dos autos. Ou seja, se estão ou não apurados os requisitos estabelecidos na lei para que o autor estivesse submetido ao regime de destacamento.

Nesta apreciação, deve afastar-se a alegação do autor no recurso de acordo com a qual “a razão da sua ida para a Bélgica foi a existência dum contrato da Ré com a firma T... S.A. com sede na cidade ..., na Bélgica, para a qual o A. passou o trabalhar sob a direção e as ordens da Ré”.

A existência de tal contrato com tal firma não foi alegada na acção, nem resulta dos factos provados, tratando-se de um facto completamente novo e em alegação extemporânea.

Logo, temos que nos limitar à ponderação da matéria de facto que possa relevar, constante dos factos considerados como provados.

Podemos então recortar dessa mesma matéria que o “autor foi admitido ao serviço da ré, em 18/4/2018, como motorista, desempenhando as funções de motorista de transportes internacionais rodoviários de mercadorias” (facto 2.), que “a ré colocou o autor a efectuar viagens apenas no estrangeiro” (facto 3.), que o autor “prestou a sua actividade de motorista durante todo o tempo em que trabalhou para a ré, a partir da cidade ..., na Bélgica, onde a ré tinha a sua base de parqueamento para os pesados, e de onde o autor saía e onde regressava após as viagens a outros países estrangeiros” (facto 39.) e que “o autor nunca carregou mercadoria na cidade ..., fazendo-o a partir de França, Alemanha, Holanda e Bélgica” (facto 40.).

No quadro do disposto no art. 6.º do CT, aplicável por força do art. 8.º ao regime de destacamento de trabalhador contratado por empresa estabelecida em Portugal e que preste actividade noutro Estado, as situações passíveis de enquadramento no regime de destacamento são:

- a execução de um contrato entre o empregador e um beneficiário (no outro Estado), em Portugal) onde o trabalhador vai exercer a sua atividade sob a autoridade e direção do empregador - alínea a), do n.º 1;

- a actividade prestada pelo trabalhador deslocado ocorrer em estabelecimento do mesmo empregador no outro Estado ou em empresa de outro empregador com o qual exista uma relação societária de participações recíprocas, de domínio ou de grupo - alínea b), do n.º 2;

- a actividade ser prestada pelo trabalhador contratado por uma empresa de trabalho temporário ou outra empresa e colocado ao serviço de um utilizador noutro Estado -alínea b), do n.º 2.

Relativamente à terceira das situações (trabalho temporário) é manifesto que ela não se verifica.

Quanto à primeira delas (execução de um contrato entre o empregador e um beneficiário) deve dizer-se que também não a encontramos verificada, desde logo porque a alegação introduzida pelo autor em sede de recurso e acima referida não está transposta nos factos provados. Por outro lado, o serviço de transporte porventura efetuado a diversos clientes ocasionais não pode estar, a nosso ver, abrangido pela norma, uma vez tais clientes não podem ser qualificados como “beneficiários” num quadro de subcontratação comercial e que é o que está compreendido na norma, na transposição do art. 1.º da Directiva 96/71/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, relativa ao destacamento de trabalhadores no âmbito de uma prestação transnacional de serviços. Sobretudo, quando se trata de trabalhadores móveis, como era o caso do autor, sem actividade demonstrada (nos factos provados) para cliente único ou predominante e com actividade desenvolvida em diversos Estados - recorde-se que, de acordo com o que está provado, o autor nunca carregou mercadoria na cidade ..., fazendo-o a partir de França, Alemanha, Holanda e Bélgica.

Neste caso, devem mesmo considerar-se de fora do regime do destacamento, consagrado na Directiva e no Código do Trabalho, as situações em que a atividade inicialmente contratada com o trabalhador inclua a execução de funções em diversos Estados (sobre este aspecto, v. Kátia Costa e Silva, Mobilidade transnacional de trabalhadores e empresas: algumas considerações práticas sobre o destacamento de trabalhadores, Prontuário de Direito do Trabalho, I, 1º Semestre 2018, pags. 307-333, e Joana Amorim, Rui Arrifana, Eduarda Canelas, José Magalhães, Kátia Costa e Silva, Marina Tavares, Luis Rodrigues, Mobilidade transnacional de trabalhadores e empresas, Lisboa, ACT, 2015, disponível in https://www.act.gov.pt/(pt-PT)/crc/PublicacoesElectronicas/Relacoesdetrabalho/Documents/Guia%20Pr%C3%A1tico_Mobilidade%20Transnacional%20de%20Trabalhadores%20e%20Empresas.pdf.).

Quanto à segunda das situações admitidas para a aplicabilidade do regime do destacamento (a atividade prestada em estabelecimento do mesmo empregador no outro Estado ou em empresa com o qual exista uma relação societária de participações recíprocas, de domínio ou de grupo), está fora de causa, porque não verificada, a hipótese da empresa beneficiária em relação societária e não se configura uma situação de prestação de actividade num estabelecimento do empregador situado noutro Estado.

A dita base de ..., na Bélgica (de onde o autor saía e onde regressava após as viagens a outros países estrangeiros) não pode ser aqui caracterizada como um estabelecimento (no sentido de filial, sucursal ou unidade económica,  como conjunto de meios organizados com o objectivo de exercer uma actividade económica), sendo apenas caracterizada, como está, nos factos provados como uma “base de parqueamento para os pesados”, (facto 39.) da qual “o autor nunca carregou mercadoria (…), fazendo-o a partir de França, Alemanha, Holanda e Bélgica” (facto 40.).

Deste modo, podemos afirmar que não se demonstraram nos autos os pressupostos do regime de trabalhador destacado no estrangeiro e, assim, não se constata qualquer direito do autor a ser pago pelo salário mínimo em vigor na Bélgica, como pretendia

Por consequência, a apelação improcede na totalidade.


*
Sumário:

(…).


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IV- DECISÃO

Termos em que se delibera julgar improcedente a apelação.

Custas no recurso pelo apelante.


*

   Coimbra, 24 de Junho de 2022

 (Luís Azevedo Mendes)

 (Felizardo Paiva)

 (Paula Maria Roberto)