Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
4023/15.7T8LRA.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: FONTE RAMOS
Descritores: PROCESSO ESPECIAL DE REVITALIZAÇÃO
PER
INDEFERIMENTO LIMINAR
LEGITIMIDADE
Data do Acordão: 06/14/2016
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE LEIRIA - LEIRIA - INST. CENTRAL - 1ª SEC.COMÉRCIO - J3
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTS. 17, 17-A, 17-B, 17-C CIRE
Sumário: 1.Ao processo de revitalização, enquanto processo especial, aplicar-se-ão, em primeiro lugar, as regras que lhe são próprias; depois, as disposições gerais e comuns do CIRE (as demais normas do CIRE) e, sempre que tal se revele necessário, as regras do CPC, nos termos prescritos no art.º 17º, do CIRE.

2.O processo especial de revitalização admite despacho de indeferimento liminar.

3. Se, na prática, o processo de revitalização poderá ser usado em casos em que não deveria sequer ter sido aberto - maxime, que se aplique a devedores em situação de insolvência actual -, portanto, à margem dos pressupostos que definem o seu âmbito de aplicação (art.ºs 17ºA e 17º-B, do CIRE), tal possibilidade ou eventualidade deverá ficar arredada se e quando o Tribunal dispuser de elementos que permitam concluir pela falta dos necessários pressupostos de natureza adjectiva e/ou pela desconformidade entre o aduzido pelo devedor e os factos demonstrados pelos documentos juntos autos e/ou que o Tribunal venha a reunir, apontando, estes, para situação de insolvência actual, como tal, tradutora da inviabilidade de um qualquer plano de revitalização.

4. O tribunal deve indeferir liminarmente o requerimento inicial do PER se o devedor não demonstrar os necessários requisitos adjectivos (designadamente, em matéria de legitimidade) e/ou se se revelar que se encontra numa situação de insolvência, recorrendo a tal procedimento de forma abusiva.

Decisão Texto Integral:

      

      Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

           

            I. Em 02.12.2015, S (…), S. A., instaurou, no Tribunal Judicial da Comarca de Leiria (Instância Central – 1ª Secção de Comércio), o presente Processo Especial de Revitalização (PER), alegando encontrar-se em situação económica difícil e a verificação dos demais requisitos previstos nos art.ºs 17º-A e seguintes do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas/CIRE[1] (aprovado pelo DL n.º 53/2004, de 18.3, e na redacção conferida pela Lei n.º 16/2012, de 20.4).

            Referiu, nomeadamente:

            - A devedora, constituída em 27.3.2003, tem como objecto social a compra e venda de propriedades e revenda das adquiridas para esse fim, construção civil e engenharia, investimentos imobiliários, administração e arrendamento de imóveis, execução de loteamentos e exploração de indústria hoteleira e similares.

            - Tem o capital social de € 600 000, dividido por 600 000 acções, com valor nominal de € 1 e de natureza nominativa ou ao portador.

            - O Conselho de Administração (CA) é composto por (…) que ocupa o cargo de Presidente e (…), que ocupa o cargo de Vogal.[2]

            - Ao longo dos anos, a devedora exerceu a sua actividade comercial com sucesso, sendo inclusive uma sociedade de referência no contexto regional em que se insere.

            - A devedora tem-se vindo a deparar com dificuldades financeiras, pelo que, presentemente não consegue cumprir as obrigações vencidas.

            - Dificuldades que estão intimamente relacionadas com a conjuntura económica actual e com a grave crise que afecta os sectores nos quais exerce a sua actividade comercial.

            - Apesar das dificuldades a devedora tem viabilidade económica, sendo susceptível de recuperação através de um plano de recuperação.

            - Presentemente, o passivo da devedora cifra-se na quantia de € 1 313 710,91.

            - Sendo certo que o valor do seu activo é manifestamente superior ao valor do passivo.

            - A devedora encontra-se numa situação financeira difícil, porquanto enfrenta dificuldades sérias em cumprir as suas obrigações, por falta de liquidez decorrente do arresto das suas contas bancárias.

            - A devedora está em insolvência iminente, prevista no art.º 3º, n.º 4, do CIRE.

            - Ainda é susceptível de recuperação, estabelecendo acordos com os credores de modo a concluir com estes acordo conducente à sua revitalização.

            - Sendo certo que conforme declaração assinada que se anexa, a devedora reúne todas as condições necessárias para a sua recuperação.

            - A devedora e o seu credor E (…)manifestam a vontade de encetar negociações conducentes à revitalização da primeira por meio de aprovação de um plano de recuperação, conforme resulta da declaração anexa, em cumprimento do disposto no art.º 17º C, n.º s 1 e 2, do CIRE.

            - Encontra-se a correr termos uma acção executiva (processo executivo n.º 2855/12.7TBLRA) movida contra a devedora, estando penhorado o seguinte bem imóvel propriedade desta: Prédio Urbano composto de r/c, 1º andar para habitação e logradouro sito na Rua (...), Pousos, descrito na 2ª CRP de Leiria sob o n.º (...) da freguesia de Pousos e inscrito na respectiva matriz sob o art.º (...).

            - A execução encontra-se na fase da venda judicial, estando agendada a abertura de propostas para o próximo dia 09.12.2015, pelas 10 horas.

            Com a petição foram juntos os documentos reproduzidos a fls. 7 verso a 108, assim enunciados pela devedora: declaração subscrita pela devedora, “cumprindo o disposto no art.º 17º A, n.º 2, do CIRE”; declaração subscrita pela devedora e pelo seu credor, na qual manifestam a vontade de encetar negociações conducentes à revitalização por meio de aprovação de um plano de recuperação, “em cumprimento do disposto no art.º 17º C, n.º s 1 e 2, do CIRE”; relação por ordem alfabética de todos os credores (alínea a) do n.º 1 do art.º 24º do CIRE); relação e identificação de todas as acções judiciais pendentes (alínea b) do n.º 1 do art.º 24º do CIRE); documento que explicita a actividade desenvolvida pela devedora nos últimos três anos, bem como as causas da situação em que se encontra (alínea c) do n.º 1 do art.º 24º do CIRE); documento que identifica os membros do CA da  devedora (alínea d) do n.º 1 do artigo 24º do CIRE); relação de bens de que a devedora é titular e respectivas certidões (alínea e) do n.º 1 do artigo 24º do CIRE); contas dos últimos três exercícios (alínea f) do n.º 1 do artigo 24º do CIRE); mapa de pessoal (alínea i) do n.º 1 do artigo 24º do CIRE); certidão permanente da devedora (alínea b) do n.º 2 do artigo 24º do CIRE); acta que documenta a deliberação de apresentação da devedora a PER (alínea b) do n.º 2 do artigo 24º do CIRE); anúncio da publicação da venda do bem, no âmbito do processo n.º 2855/12.7TBLRA.

            Concluiu, depois, a requerente que, admitido o requerimento, deve ser proferido de imediato o despacho a que se reporta o art.º 17º-C, n.º 3, alínea a), nomeando-se o administrador judicial provisório, atenta a indicação da devedora, e ordenada a suspensão das acções judiciais em curso contra a devedora designadamente do processo n.º 2855/12.7TBLRA e de quaisquer outras que entretanto venham a ser propostas, nos termos do disposto no art.º 17º-E, n.º 1.

            Por despacho de 07.12.2015, a requerente foi convidada a apresentar no prazo de 5 dias, sob pena de indeferimento liminar, nos termos do art.º 27º, n.º 1, al. b):

            - Uma acta nos termos e para os efeitos do art.º 24º, n.º 2, al. a) e onde figure “a nomeação da Sr.ª (…) como Presidente da Mesa da Assembleia de Accionistas da requerente ou a sua qualidade de accionista, se for esse o caso, de todo ou parte do capital social da requerente, mediante a apresentação da lista de assinatura de presenças que subjaz à deliberação em causa e o registo de acções junto da sociedade emitente ora autora, pois que de outra forma, atenta a forma como se mostra redigida a mencionada acta, temos reservas quanto à qualidade e à legitimidade com que aquela intervém naquele acto – sociedade de que outrora foi administradora (cessou funções pela Ap.6 de 13.8.2012) – à revelia dos seus demais accionistas para apresentar a requerente a PER – arts. 53, 63º, 271º, 274º, 278º, 298º, 299º, 248º, 351º, 373º a 377º e 382º a 389º do Código das Sociedades Comerciais”;

            - “Documentar a deliberação ou o acordo escrito de onde resulte a constituição de uma situação de trabalho dependente entre a sociedade requerente e o alegado credor, E (…), seu Director da Produção, ex-presidente do conselho de administração e actual vogal do conselho de Administração”;

            - “Complementar a lista de credores com a data de vencimento de cada um dos indicados créditos, pronunciar-se sobre a verificação de tal excepção ao pedido que é formulado e nessa decorrência juntar aos autos documento de diagnóstico da situação económica e financeira da empresa nos termos do art.º 2-A e 3 do DL n.º 178/2012, de 03 de Agosto”.

            Em resposta, a requerente/devedora juntou nova relação de credores indicando que todos os créditos se venceram a 30.11.2015 (inclusive, naturalmente, o da exequente Banco (…), S. A.). Referiu que os resultados negativos dos exercícios de 2012, 2103 e 2014 (- € 10 407,08 - € 13.212,50 e - € 2 071,28, respectivamente) correspondem a “amortizações e depreciações que sendo um custo contabilístico-fiscal não é uma despesa que implique saídas de dinheiro”; para este “Resultado” contribuíram os rendimentos que a empresa aufere dos imóveis e que foram nos últimos anos de € 18 835,18, € 21 318 e € 18 000, respectivamente; no mesmo período, apresentou um Activo Total líquido de € 1 319 717,15, € 1 163 055 e € 1 124 773,58, enquanto o seu Passivo Total foi de - 129 565,61, € - 115 619,26 e € - 113 597,29. Juntou dois documentos reproduzindo a denominada “acta número vinte e um”, de 30.11.2015.

            Por despachos de 21.12.2015 e 06.01.2016 - considerando-se que a pretensa “presidente da mesa da assembleia geral” e o seu marido (vogal do CA e alegado “director de produção”/“trabalhador” da requerente) haviam sido declarados insolventes e o processo encerrado por ausência de bens e bem assim, e nomeadamente, que a acta deliberando a apresentação a PER continha apenas a assinatura daquela e da pessoa que assumiu o secretariado, nada mais se dizendo ou esclarecendo a respeito dos detentores do capital social, permanecendo, assim, a dúvida a respeito de quem detém o capital social, e portanto de quem deliberou de facto a sua apresentação a PER (face à constatação de que a referida presidente da assembleia de accionistas e o vogal e proposto credor da autora foram declarados insolventes no processo n.º 6508/12.8TBLRA e o processo encerrado por ausência de bens) - foi determinado, primeiro, a solicitação de informações sobre o estado e as vicissitudes do processo executivo n.º 2 855/12.7TBLRA e, depois, a requisição do processo n.º 4037/12.9TBLRA para consulta e a junção de certidão matricial da sociedade V (…), Lda..

            Finalmente, por decisão de 18.01.2016, foi rejeitado o pedido de apresentação a processo especial de revitalização por ausência do requisito de legitimidade a que alude o art.º 24º, n.º 3[3], al. a) do CIRE, por ausência de junção da deliberação do conselho de administração com vista à instauração desta acção especial, o que implica a falta de prova da legitimidade do apresentante, e ainda que assim não se entendesse, o que se reputou ser falso, salvo o devido respeito por opinião diversa, por ausência de um requisito material de que depende nos termos do art.º 17-A, n.º 1 do CIRE, por encontrar-se a devedora em actual situação de insolvência.

            Inconformada, a devedora/requerente interpôs a presente apelação formulando as seguintes conclusões:  

            1ª - A sentença viola o disposto nos art.ºs 17º-A e ss. do CIRE, a Resolução do Conselho de Ministros n.º 43/2011 de 25.10 - que aprovou os “Princípios Orientadores da Recuperação Extrajudicial de Devedores” -, os art.ºs 607º e 615º, do Código de Processo Civil (CPC), 8º do Código Civil (CC) e 205º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa (CRP).

            2ª - A Apelante tem legitimidade para apresentação do PER, tal como dispõem os art.ºs 17º-A e 17º-C do CIRE.

            3ª - A Apelante deu cumprimento ao despacho liminar proferido pelo Tribunal, requerendo a junção aos autos de acta de nomeação da Sr.ª M (...), como Presidente da Mesa da Assembleia, sendo que não é accionista da devedora.

            4ª - A sentença não está devidamente fundamentada, sendo nula; a sentença não é isenta, mas sim parcial, baseada em meras convicções pessoais e/ou opiniões do julgador, sem qualquer fundamento.

            5ª - Se dúvidas houvesse acerca da legitimidade, sempre se dirá que bastaria ao tribunal ter em conta a procuração forense junta aos autos, assinada pela administração, para concluir, sem margem para quaisquer dúvidas, da legitimidade da Apelante.

            6ª - A legitimidade decorre ainda das declarações subscritas pela Apelante e, conjuntamente pela Apelante e pelo credor, em cumprimento do que exige o art.º 17º-A, n.º 2 e 17º C, do CIRE; ambas as declarações são subscritas pelos administradores da Apelante.

            7ª - No âmbito do PER - atentas as regras do CIRE e da Resolução do Conselho de Ministros n.º 43/2011 de 25.10 - o papel do Juiz é meramente residual; entender que o Juiz tem poder para decidir que o devedor não é passível revitalização é totalmente contrário à lei.

            8ª - O papel determinante cabe aos credores, cuja vontade é soberana, sujeita apenas ao cumprimento de preceitos legais imperativos, e a fiscalização pelo cumprimento de tais preceitos cabe ao juiz em sede de homologação (ou não) do plano.

            9ª - O devedor em estado de insolvência “meramente iminente”, pode, livremente, optar pelo PER ou pelo CIRE.

            10ª - No caso de optar pelo PER, o devedor tem de instruir o requerimento “mediante declaração escrita e assinada” que “ateste que reúne as condições necessárias para a sua recuperação” (art.º 17º-A, n.º 2, do CIRE); basta um atestado meramente declarativo subscrito pelos interessados.

            11ª - Quer o juízo prévio de avaliação sobre o concreto estado do devedor, quer o de ponderação do melhor caminho para se regenerar, quer a conformidade dessa decisão à lei e adequação do processo requerido, surgem subtraídos à apreciação e controlo da autoridade.

            12ª - O Juiz no “despacho imediato” de “admissão liminar” do PER - a que alude a alínea a), do n.º 3, do art.º 17º-C - nem na sentença de homologação, não tem poder para determinar se o devedor está em “situação económica difícil”, ou em “situação de insolvência meramente iminente” ou em “situação de insolvência actual”.

            13ª - A Apelante encontra-se em situação económica difícil e/em insolvência iminente, tal como previsto nos art.ºs 17º-A e 17º-B, do CIRE.

            14ª - No âmbito de um PER o tribunal não pode notificar a devedora para juntar um documento referente ao SIREVE e exigido pelo respectivo regime legal - documento de diagnóstico da situação económica e financeira da empresa nos termos dos art.ºs 2º-A e 3º do DL n.º 178/2012, de 03.8 - o diploma legal do SIREVE é inaplicável ao PER, que se rege pelas regras do CIRE e pela Resolução.

            15ª - De todo o modo, do documento de diagnóstico da situação económica e financeira da empresa, junto aos autos pela Apelante, decorre a sua situação de (sic) – o Diagnóstico da Plataforma do IAPMEI caracteriza a situação da empresa por desequilíbrios a vários níveis quer de estrutura de capitais quer de ganhos e perdas, o que coincide com o diagnóstico que a empresa faz de si mesma.

            16ª - No que se refere a afastar a situação de insolvência actual, o mencionado Diagnóstico do IAPMEI é claro na observação que faz: “A empresa reúne os requisitos de desempenho para, caso assim entenda, recorrer ao Procedimento SIREVE”.

            17ª - Em caso de dúvida acerca da situação económica e financeira da Apelante, o Juiz podia/devia nomear técnico especializado para esse efeito, ao abrigo de faculdade prevista nos art.ºs 477º e 601º do CPC, aplicáveis ex vi art.º 17º do CIRE.

            18ª - Para os presentes autos são irrelevantes os processos de insolvência de V (…), S. A., de E (…) e de M (…), sendo que, a respeito dos mesmos, o Juiz deu como provados factos sem qualquer fundamento, designadamente documental e/ou outro.

            Remata pedindo a revogação da sentença, “devendo ser proferido o despacho a que alude a alínea a) do n.º 3 do art.º 17º C do CIRE”.

             Atento o referido acervo conclusivo, delimitativo do objecto do recurso, importa decidir, principalmente, se está suficientemente demonstrada a legitimidade para a instauração do presente procedimento especial (requisito adjectivo) e, simultaneamente, se existem fortes indícios de uso anormal do processo a que se deva pôr cobro.


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            II. 1. Para a decisão do recurso releva o que se descreve no antecedente “relatório” e a seguinte factualidade considerada na 1ª instância:

         a) A requerente é uma sociedade anónima com um capital social de € 600 000, repartido por 600 000 acções no valor nominal de € 1, que tem por objecto societário a compra e venda e revenda de propriedades e revenda das adquiridas para esse fim, construção civil e engenharia, investimentos imobiliários, administração e arrendamento de imóveis, execução de loteamentos, exploração de indústria hoteleira e similares.

            b) Obriga-se com a assinatura do presidente do CA, com a do administrador único ou pela assinatura conjunta de dois dos restantes administradores.

            c) A sociedade não procede ao registo das contas de gestão e de exercício desde o ano de 2012.

            d) O CA é actualmente composto por M (…), na qualidade de presidente, e E (…), na qualidade de vogal.

            e) A devedora apresentou no ano de 2010 resultados líquidos de exercício de - 10 871,65 €; em 2011 de - 23 035,44 €; em 2012 de - 29 901,95 €; no ano de 2013 de - 27 096,53 € e no ano de 2014 de - 38 237,75 €.

            f) O passivo reconhecido da devedora é de € 1 313 710,91 nos termos documentados a fls. 136.

            g) O único património por si detido, indicado na sua contabilidade e elencado no requerimento a que alude o art.º 24º, n.º 1, al. e) do CIRE, é um prédio urbano composto de rés-do-chão, 1º andar e logradouro destinado à habitação, que se mostra descrita a seu favor na 2ª Conservatória do Registo Predial de Leiria sob o n.º (...) /20060914, e que possui o valor patrimonial de € 575 595,93 e contabilístico (2014 – fls. 78) de € 1 158 669.

            h) Pela Ap. 1 de 06.5.2008 mostra-se inscrita uma hipoteca voluntária a favor do Banco Santander Totta, S. A., até ao valor máximo assegurado de € 2 055 000.

            i) Pela Ap. 1837 de 04.7.2011 mostra-se inscrito um encargo com um contrato de arrendamento pelo prazo de 20 anos, com início a 01.6.2011, contra o pagamento de uma renda mensal de € 1 500 pela arrendatária M (…)

            j) Pela Ap. 5 de 12.10.2012 uma penhora no valor de € 1 190 484,81 a favor de Banco (…), S. A..

            k) Banco (…) S. A., instaurou contra a devedora a execução comum para pagamento de quantia certa 2855/12.7TBLRA, para cujos termos a devedora foi citada a 07.9.2012 e deduziu ali oposição à penhora que veio a ser alvo de sentença datada de 03.6.2014, transitada em julgado, que julgou a oposição[4] improcedente nos termos documentados a fls. 148-152.

            l) Nomeadamente deu-se como provado que a 20.3.2006 a sociedade V (…), S. A., participou no aumento do capital social da devedora em € 540 000 e que entre as duas sociedades existia uma relação de grupo.

            m) A referida sociedade foi declarada insolvente por sentença datada de 27.9.2012, transitada em julgado, no âmbito do processo n.º 4037/12.9TBLRA.

            n) Não integram o auto de apreensão e arrolamento quaisquer valores mobiliários.

            o) Sendo o seu CA composto por E (…) na qualidade de presidente, S (…) e M (…), enquanto vogais, apenas tendo esta última renunciado ao cargo por acto inscrito pela Ap. 1/2012.07.03.

            p) Tal como aconteceu com a V (…), Lda., também ela declarada insolvente.

            q) No âmbito do processo de insolvência da V (…) S. A., não foram apreendidas as mencionadas acções e a mesma é aqui indicada como credora da requerente sem nunca se aludir à sua Massa Insolvente (fls. 136).

            r) A I (…) S. A., é uma sociedade de direito Luxemburguês, que tem a sua sede no n.º (...) Luxembourg, e que se destina à compra e venda de imóveis e revenda dos adquiridos para esse fim, administração e exploração de imóveis próprios e alheios, tal como a sua sucursal em Portugal, com um capital social de € 31 000, tem a sua sede no (...) Coimbra, tendo como seu representante M (…), residente na Rua (...) Porto Salvo, não sendo conhecido os titulares do seu capital social.

            s) E (…) e M (…) foram declarados insolventes por sentença transitada em julgado e proferida no processo n.º 6508/12.8TBLRA, encerrado por ausência de bens.

            t) A acta n.º 21 da devedora, datada de 30.11.2015, documenta a realização de uma assembleia geral da devedora, onde se diz que marcaram presença todos os accionistas representativos do capital social, embora sem identificar cada um deles e a sua participação social ou sem que hajam subscrito aquela deliberação, onde a presidente da mesa daquela assembleia, M (…), propôs à discussão como seu único ponto dos trabalhos a apresentação da devedora a PER, que fez constar ter sido aprovado por unanimidade.

            u) A referida acta documentada a fls. 140 mostra-se, tão-somente, subscrita pela presidente da mesa da assembleia e pela sua secretária[5], e sem indicação da identidade de cada um dos accionistas ali presentes e percentagem do capital detido.

            v) O único imóvel da requerida não foi vendido no processo executivo onde se mostra apreendido por irregularidades na publicitação do acto de venda.[6]

         2. Cumpre apreciar e decidir com a necessária concisão.

            Nos termos do n.º 1 do art.º 17º-A, o processo especial de revitalização (PER) destina-se a permitir ao devedor que, comprovadamente, se encontre em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, mas que ainda seja susceptível de recuperação, estabelecer negociações com os respectivos credores de modo a concluir (com estes) acordo conducente à sua revitalização.

            Prevê o art.º 17º-C (sob a epígrafe “Requerimento e formalidades”) que o processo especial de revitalização inicia-se pela manifestação de vontade do devedor e de, pelo menos, um dos seus credores, por meio de declaração escrita, de encetarem negociações conducentes à revitalização daquele por meio da aprovação de um plano de recuperação (n.º 1). Munido da referida declaração, o devedor deve, de imediato, adoptar os seguintes procedimentos: comunicar que pretende dar início às negociações conducentes à sua recuperação ao juiz do tribunal competente para declarar a sua insolvência, devendo este nomear, de imediato, por despacho, administrador judicial provisório, e, ainda, remeter ao tribunal cópias dos documentos elencados no n.º 1 do artigo 24º, as quais ficam patentes na secretaria para consulta dos credores durante todo o processo (n.º 3 – a) e b)).

            Assim, com a petição ou requerimento inicial, o devedor deverá juntar os documentos mencionados no art.º 24º, n.º 1, nomeadamente, relação de todos os credores, com indicação dos respectivos domicílios, dos montantes dos seus créditos, datas de vencimento, natureza e garantias de que beneficiem, e da eventual existência de relações especiais, nos termos do artigo 49º [a)]; relação e identificação de todas as acções e execuções que contra si estejam pendentes [b)]; documento em que se explicita a actividade ou actividades a que se tenha dedicado nos últimos três anos e os estabelecimentos de que seja titular, bem como o que entenda serem as causas da situação em que se encontra [c)]; tendo o devedor contabilidade organizada, as contas anuais relativas aos três últimos exercícios, bem como os respectivos relatórios de gestão, de fiscalização e de auditoria, pareceres do órgão de fiscalização e documentos de certificação legal, se forem obrigatórios ou existirem, e informação sobre as alterações mais significativas do património ocorridas posteriormente à data a que se reportam as últimas contas e sobre as operações que, pela sua natureza, objecto ou dimensão extravasem da actividade corrente do devedor [f)]; mapa de pessoal que o devedor tenha ao serviço [i)].

            Por outro lado, tendo presente a alínea a) do n.º 2 do mesmo art.º do CIRE, o devedor deverá ainda juntar documento comprovativo dos poderes dos administradores que o representem e cópia da acta que documente a deliberação da iniciativa do pedido por parte do respectivo órgão social de administração, se aplicável.

            E estabelece o art.º 27º (sob a epígrafe “apreciação liminar”), aplicável ao PER - atenta a regra geral consignada no art.º 549º, n.º 1, do CPC, donde resulta que ao processo de revitalização, enquanto processo especial, aplicar-se-ão, em primeiro lugar, as regras que lhe são próprias; depois, as disposições gerais e comuns do CIRE (as demais normas do CIRE) e, sempre que tal se revele necessário, as regras do CPC, nos termos prescritos no art.º 17º, do CIRE[7] -, que no próprio dia da distribuição, ou, não sendo tal viável, até ao 3º dia útil subsequente, o juiz: a) Indefere liminarmente o pedido (…) quando seja manifestamente improcedente, ou ocorram, de forma evidente, excepções dilatórias insupríveis de que deva conhecer oficiosamente; b) Concede ao requerente, sob pena de indeferimento, o prazo máximo de cinco dias para corrigir os vícios sanáveis da petição, designadamente quando esta careça de requisitos legais ou não venha acompanhada dos documentos que hajam de instrui-la, nos casos em que tal falta não seja devidamente justificada.

            3. Com o processo especial de revitalização pretendeu-se instituir um mecanismo gerador de consenso entre o devedor e os principais credores com vista ao estabelecimento de um plano de recuperação; a intervenção do juiz é reservada, por regra, apenas a três momentos essenciais: ao início do processo [art.º 17º-C, n.º 3, al. a)], à decisão das impugnações à lista provisória de créditos [art.º 17º-D, n.º 3] e, no final, à homologação, ou não, do acordo obtido, se for caso disso, ou à determinação dos efeitos derivados da falta desse mesmo acordo [art.ºs 17º-F, n.º 5 e 17º-G, n.ºs 1 a 3].

            O consenso negociado entre credores e devedor é a ferramenta privilegiada para o estabelecimento do plano de recuperação, mas não se trata de um consenso a qualquer custo - os intervenientes estão adstritos ao princípio da boa-fé, da cooperação e da confidencialidade, recaindo ainda sobre o devedor a obrigação de manter uma conduta transparente e de defender os seus credores [cf. o art.º 17º-D, n.ºs 6 a 11 e a Resolução do Conselho de Ministros n.º 43/2011, de 25.10], visando-se, com a observância da tramitação e das demais exigências legalmente previstas, a obtenção de um consenso válido, entre credores e devedor, sobre a recuperação económica deste e, reflexamente, a optimização da defesa de todos os interesses envolvidos.[8]

            4. Embora a lei não preveja, expressamente, a possibilidade de ser proferido despacho de indeferimento do requerimento de instauração do processo especial de revitalização, no seguimento do expendido em II. 2, in fine, supra, há que ter em conta o que dispõe o n.º 2 do art.º 17º-E, que, ao estatuir “Caso o juiz nomeie administrador judicial provisório nos termos da alínea a) do n.º 3 do artigo 17º-C (…)”, permite inferir a possibilidade do juiz não nomear administrador por entender não dar seguimento ao pedido de instauração do PER.

            Assim sucederá sempre que ocorra a ausência de um elemento considerado por lei como formalidade, ao abrigo do citado art.º 17º-C (v. g., a falta dos documentos elencados no n.º 1 do art.º 24º); tal verificação incidirá, desde logo, sobre os aspectos formais da petição e o conteúdo das declarações (do requerente e de pelo menos um dos credores) efectuadas por quem requer a revitalização, pelo que a nomeação do administrador judicial provisório, dando continuidade ao processo [art.º 17º-C, n.º 3, alínea a)], tem por implícito um juízo de apreciação (admissibilidade) sobre os requisitos do PER.[9]

            5. Se, na prática, o processo de revitalização poderá ser usado em casos em que não deveria sequer ter sido aberto - maxime, que se aplique a devedores em situação de insolvência actual -, portanto, à margem dos pressupostos que definem o seu âmbito de aplicação[10], tal possibilidade ou eventualidade, naturalmente, deverá ficar arredada se e quando o Tribunal dispuser de elementos que permitam concluir pela falta dos necessários pressupostos de natureza adjectiva e/ou pela manifesta desconformidade entre o aduzido pelo requerente/devedor e os factos demonstrados pelos documentos juntos autos e/ou que o Tribunal venha a reunir, apontando, estes, para situação de inegável penúria ou insolvência actual, como tal, tradutora da irrecuperabilidade do requerente ou da inviabilidade de um qualquer plano de revitalização.

            Os credores gozam de grande liberdade e autonomia na composição da lide desenvolvida no confronto do seu devedor, mas têm que o fazer dentro do pressuposto de o devedor não estar já insolvente.[11]

            6. Expostos os princípios e as regras fundamentais do PER (que aqui relevam) e não se vendo a menor razão para não acolher toda a factualidade mencionada em II. 1. supra, na prossecução da verdade enquanto pressuposto necessário do direito e da justiça, vejamos o que mais resulta dos autos.

            Assim, e nomeadamente (atenta a ordem de junção dos documentos), importa considerar e equacionar os seguintes elementos de facto:

            a) Através da procuração reproduzida a fls. 6 a requerente concedeu “os mais amplos poderes forenses em direito permitidos”.

            b) Não sabemos em que circunstâncias E (…) se fez credor da requerente ou, sequer, seu “director de produção” ou “trabalhador dependente” (?) (fls. 103 anverso e verso), embora seja evidente que era e é vogal do respectivo CA (fls. 12 verso e 104) e que o seu invocado crédito “surgiu” numa altura em que a requerente já não desenvolvia qualquer actividade e a sua exclusiva fonte de rendimento seria o valor das rendas do imóvel arrendado à presidente da mesa da assembleia geral [nos anos de 2012, 2013 e 2014, os “rendimentos e ganhos” da requerente foram de € 18 835,18, € 21 318 e € 18 000, respectivamente, por ela identificados como “os rendimentos que a empresa aufere dos imóveis”/cf. a petição e a alegação de recurso; apenas no exercício de 2014 foram indicadas “remunerações do pessoal” no montante global de € 8 460 e respectivos “encargos sobre remunerações” no valor de € 2 015,64 – cf., sobretudo, fls. 20 verso, 38, 65 verso, 77 verso, 95 e 137].

            c) Poder-se-á assim dizer que o referido E (…)s foi “remunerado” para receber as rendas que a mulher (fls. 15 verso) devia pagar à requerente…

            d) O documento de fls. 10 verso e seguintes respeitante à explicitação da “actividade desenvolvida pela Devedora nos últimos três anos, bem como a causa da situação em que se encontranada concretiza ou explicita, sendo que, por um lado, dele nada se retira acerca de qual tenha sido a actividade naquele período (inexistente!) e, por outro lado, não diz a verdade quando refere que só então (i. é, em finais de Novembro de 2015) a requerente deixou de “cumprir as obrigações vencidas” (pois encontra-se documentado que esse incumprimento ter-se-á verificado, pelo menos, em meados de 2012! – cf., v. g., fls. 111) ou que “o valor do seu activo é manifestamente superior ao valor do passivo”, sendo que também não se vê minimamente comprovado, por exemplo, que as dificuldades sérias em cumprir as suas obrigações tenham sido originadas “por falta de liquidez decorrente do arresto das suas contas bancárias” [sabe-se, sim, que nos exercícios de 2012, 2013 e 2014 a requerente efectuou movimentos em contas bancárias nos montantes globais anuais de, apenas, € 2 225,58 (valor único dos movimentos), € 13 663 (movimento a débito) e € 8 020 (movimento a débito), respectivamente - cf. fls. 23, 50 e 80 -, sendo que, nesse mesmo período, os movimentos de caixa foram nulos (2012 e 2014) ou de € 7 705 (2013].

            e) Aparentemente, a requerente considera que não tem de demonstrar que a arrendatária do seu único bem (fls. 13 verso) e mulher do dito E (...) é/era a presidente da mesa da assembleia geral da sociedade requerente [e bem sabe ou devia saber - até pelo que resulta da forma como decidiu exprimir-se na alegação de recurso, e que dispensa outros considerandos…[12] - que o “documento n.º 5” que fez juntar com o seu requerimento de 18.12.2015, não é a “ata que procedeu à nomeação” para qualquer cargo da mesa da assembleia geral (e da qual conste, designadamente - no dizer da recorrente - “a nomeação da Sr.ª M (…) como Presidente da Mesa da Assembleia de acionistas da requerente”), antes uma mera cópia ou duplicado do “documento n.º 4” – cf. fls. 135, 140 e 140 verso], nem tem de esclarecer quais os accionistas presentes na assembleia geral de 30.11.2015 e o seu concreto contributo para a deliberação pretensamente tomada [no dizer da recorrente: “a lista de assinatura de presenças que subjaz à deliberação em causa e o registo de acções junto da sociedade emitente/autora”], sendo certo que a aludida acta de fls. 107 verso/140 é um documento que nada esclarece, nada nos diz sobre os factos… [desde logo, e sobretudo, não sabemos quais os accionistas presentes ou se algum dos presentes era accionista (!) mas apenas - perante os esclarecimentos que a requerente se dignou prestar - que a presidente da mesa não era accionista…].

            7. Daí que se conclua que a requerente/apelante não deu cumprimento ao ordenado no despacho de 07.12.2015, pelo que ficou por comprovar a sua legitimidade (nos autos) - desde logo, a deliberação do Conselho de Administração da devedora ou dos seus accionistas -, a qual, naturalmente, dada a finalidade e as circunstâncias de um PER, não resultava da procuração forense junta aos autos ou, menos ainda, das “declarações” subscritas pela apelante e pelo seu pretenso credor (cf., ainda, nomeadamente, os art.ºs 53º, 63º, n.ºs 2, al. c) e 8, 271º, 299º, 373º e seguintes e 382º e seguintes, do Código das Sociedades Comerciais).

            Ademais, desrespeitando o determinado pelo Tribunal, a recorrente não se dignou esclarecer quando e como o vogal do seu CA passou também a assumir a qualidade de “director de produção” e a ser remunerado como “trabalhador”[13] único do respectivo “quadro de pessoal”, existindo, ao invés, fortíssimos indícios de que se tratou de um “esquema”/“expediente” visando a eventual instauração de um PER e, quiçá, algum benefício presente e/ou futuro derivado dessa aparente (não comprovada e inexistente) qualidade...

            E é também inequívoco que, aquando da apresentação do requerimento inicial, há muito (há mais de três anos!) que a devedora se achava não numa situação de insolvência meramente iminente, mas numa real situação de insolvência, verificando-se, designadamente, os factos-índice ou presuntivos de insolvência elencados nas alíneas b), e), g) (iv) e h) do n.º 1 do art.º 20º do CIRE. 

            8. Tudo quanto fica indiciado ou provado aponta, claramente, para a existência de promiscuidades e de (omitidos) “especiais relacionamentos” (art.º 49º), e, por conseguinte, para o uso anormal do processo, pelo que não se vê como não decretar a consequência que a lei prevê (!), obstando ao objectivo anormal prosseguido pelas partes (art.º 612º, do CPC, ex vi do art.º 17º, do CIRE), evitando-se, designadamente, trabalho e custos inúteis e os efeitos próprios do processo sobre os outros processos já em curso (art.º 17º-E)[14].

            9. Não tendo o tribunal recorrido praticado qualquer “nulidade” ou “irregularidade” ou desrespeitado qualquer preceito da lei ordinária ou da lei fundamental, soçobram, desta forma, todas as “conclusões” da alegação de recurso.

            10. Resta, pois, concluir pela manifesta improcedência da posição feita valer na presente apelação, assumindo pleno cabimento legal o indeferimento liminar do requerimento de instauração do PER[15].


*

            III. Face ao exposto, julga-se improcedente a apelação e confirma-se a decisão recorrida.           

            Custas pela apelante.


*

14.6.2016


            Fonte Ramos ( Relator)

Maria João Areias

Fernando Monteiro


[1] Diploma a que respeitam os normativos adiante citados sem menção da origem.
[2] Sublinhado nosso, como os demais a incluir no texto.
[3] Existe lapso manifesto quanto à indicação do n.º (“n.º 2”).
[4] Rectifica-se tendo em atenção o mencionado documento (fls. 152).
[5] Contudo, como se referirá infra, a requerente não se dignou juntar aos autos documento comprovativo da qualidade das subscritoras.
[6] Na acção executiva, o valor de avaliação foi de € 562 930, o valor base foi de € 848 593 e o valor da venda foi de € 721 304,05 (cf. fls. 108).
[7] Cf., neste sentido, entre outros, os acórdãos da RL de 16.6.2015-processo 811/15.2T8FNC-A.L1-7 e da RP de 16.12.2015-processo 2112/15.7T8STS.P1, publicados no “site” da dgsi
[8] Cf., de entre vários, o acórdão da RP de 17.6.2014-processo 148/12.9TBCDR.P2, publicado no “site” da dgsi.
[9] Cf. os cit. acórdãos da RL de 16.6.2015-processo 811/15.2T8FNC-A.L1-7 e da RP de 16.12.2015-processo 2112/15.7T8STS.P1.

[10] Vide Catarina Serra, Processo especial de revitalização - contributos para uma rectificação, ROA, 72, 2012, Vol. II/III, Abril/Setembro, pág. 721.

[11] Cf., neste sentido, Carvalho Fernandes e João Labareda, CIRE Anotado, 2ª edição, Quid Juris-Sociedade Editora, págs. 142 e 144 [“Quando, pela documentação inicialmente junta pelo devedor, o juiz dê conta da inexistência de qualquer uma das situações fundamentantes do processo de revitalização, deve indeferir o requerimento inicial por falta de pressuposto processual insuprível”; “o processo de revitalização é, por assim dizer, um processo pré-insolvencial, de que se pode lançar mão precedendo uma situação económica difícil ou de insolvência iminente por parte do devedor, mas que deve excluir-se quando já se verifica alguma das situações que, segundo os n.ºs 1 e 2 do art.º 3º do Código, caracterizam tipicamente a insolvência”]; Luís M. Martins, Recuperação de Pessoas Singulares, vol. I, 2ª edição, Almedina, 2012, págs. 20 e 32 [“Para concorrer ao PER o devedor não pode é estar numa situação de insolvência actual como consagrada no art.º 3º, situação que se verifica quando o devedor já se encontra impossibilitado de cumprir as suas obrigações vencidas, pois o PER é vedado a estes devedores”; “Se existirem factos impeditivos ou que não sejam, supríveis por convite, deve ser rejeitado (ex. uso abusivo do procedimento, para regular a posição de um credor em especial ou a empresa encontrar-se numa situação de insolvência atual), pois, apesar do PER ter como finalidade a recuperação do devedor através do consenso, não deixa de pretender garantir os interesses dos credores – que são chamados a intervir no mesmo. Nestas e noutras situações abusivas, o juiz deve repudiar tal conduta e não admitir o procedimento, pois este não tutela o interesse coletivo nem os fins para que foi instituído], Fátima Reis Silva, Processo Especial de Revitalização, Notas Práticas e Jurisprudência recente, Porto Editora, 2013, pág. 20 [ao referir que se impõe «(…) um nível mínimo de controlo (…) sendo possível o indeferimento liminar em caso de insolvência atual comprovada»] e Catarina Serra, O Processo Especial na Revitalização na jurisprudência, Almedina, 2016, pág. 47, bem como, de entre vários, os acórdãos do STJ de 03.11.2015-processo 1690/14.2TJCBR.C1.S1 [referindo-se no respectivo “sumário” que “Pese embora o processo especial de revitalização se resolver num procedimento de feição marcadamente extrajudicial, tal não significa que a liberdade e a autonomia da vontade dos intervenientes no processo não sofram limitações e não possam ser contrariadas pelo tribunal.”], da RC de 10.7.2013-processo 754/13.4TBLRA.C1 e 19.01.2016-processo 9425/15.6T8CBR.C1 [“Embora o processo especial de revitalização tenha uma feição marcadamente extrajudicial, se a petição revelar inequivocamente que o devedor se encontra numa situação de insolvência, sendo o uso daquele ilegal ou abusivo, o juiz deve recusá-lo liminarmente.”] e da RG de 20.02.2014-processo 8/14.9TBGMR.G1 [“Não pode recorrer ao PER (processo especial de revitalização) o devedor que, face ao que o próprio alega, está já em estado de insolvência, devendo ser indeferido liminarmente o respectivo pedido, para, além do mais, evitar a violação do dever de apresentação (art.º 18º do CIRE).”], publicados no “site” da dgsi.

   Destacando os requisitos formais mas não afastando totalmente a possibilidade de análise e ponderação de aspectos relacionados com a razão de ser ou os pressupostos materiais do procedimento, ainda que propendendo para a sua desconsideração na fase liminar, cf., entre outros, os acórdãos da RP de 15.11.2012-processo1457/12.2TJPRT-A.P1 [aresto em que se concluiu que “No processo especial de revitalização criado pela Lei n.º 16/2012, de 20 de Abril, o juiz, ao proferir o despacho a que se refere a segunda parte da alínea a) do n.º 3 do art.º 17.º-C do CIRE, não tem que verificar a existência dos requisitos materiais de que depende o recurso a tal procedimento, nem o seu eventual abuso.”; cremos, no entanto, pelas razões expendidas supra, na presente nota e no texto da presente decisão, que esta perspectiva das coisas será porventura “demasiado liberal” e poderá potenciar o “uso anormal do processo”, ao arrepio da norma imperativa do art.º 612º do CPC] e 18.02.2016-processo 3521/15.7T8AVR.P1 [assim sumariado: “No processo especial de revitalização, o juiz, ao proferir o despacho a que se refere a segunda parte da alínea a) do n.º 3 do art.º 17.º-C do CIRE, não tem que verificar a existência dos requisitos materiais de que depende o recurso a tal procedimento, indagando se a recuperação do devedor é ou não viável.”] e da RE de 21.4.2016-processo 39/16.4T8EVR-A.E1 [constando da respectiva fundamentação: “(…) o processo de Revitalização tem mais que ver com as partes (´rectius`, com a entidade objecto do processo e com os seus credores) do que propriamente com o Tribunal, a este competindo mais uma função de defesa da legalidade e contra abusos ou esquemas que nele se pretendam cometer, do que com uma real situação económica ou financeira da parte visada, que deverá ser atendida pelos interessados/credores nos termos do acordo/plano de recuperação que eventualmente venha a ser alcançado. Nesta fase (fase liminar do processo), apenas lhe compete ver da verificação dos requisitos formais da apresentação à revitalização (…)”.], publicados no “site” da dgsi.

[12] Veja-se, por exemplo, o seguinte excerto: «(…) Menos se compreendem as considerações pessoais, parciais, tecidas sem qualquer isenção e sem qualquer fundamentação, do Juiz quando alega que ´Os esclarecimentos prestados e documentos juntos não dissiparam as dúvidas a respeito de quem detém o capital social da autora.` Num estado de direito, não se concebe que um juiz teça considerações pessoais e com base nelas, e apenas nela, retire ilações sem qualquer fundamento legal. Pelo que é inequívoco que a Apelante deu cumprimento ao despacho judicial, juntando a documentação que o tribunal solicitou
[13] Ou “colaborador”, como hoje se diz, ao arrepio das normas, das fontes e da história do direito do trabalho, mas em clara sintonia com os interesses de quem tem pretendido dominar a economia ao longo das últimas décadas…
[14] Cf. o cit. acórdão da RC de 19.01.2016-processo 9425/15.6T8CBR.C1 (relatado pelo aqui segundo adjunto).
[15] Vide, ainda, além do que se fez constar da 1ª parte da “nota 11”, supra, Carvalho Fernandes e João Labareda, CIRE Anotado, Quid Juris-Sociedade Editora, 2009, pág. 163 e, dos mesmos autores, CIRE Anotado, 2ª edição, Quid Juris-Sociedade Editora, págs. 149 a 151.