Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
97178/13.2YIPRT.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ANABELA LUNA DE CARVALHO
Descritores: INJUNÇÃO
TRANSACÇÃO COMERCIAL
FORMA DE PROCESSO
Data do Acordão: 12/17/2014
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE VISEU - MOIMENTA DA BEIRA - INST. LOCAL - SEC. COMP. GEN. - J1
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: DL Nº 269/98 DE 1/9, DL Nº 32/2003 DE 17/2, DL Nº 303/2007 DE 24/8, DL Nº 226/2008 DE 20/1, DL Nº 62/2013 DE 10/5
Sumário: 1.- Considera-se injunção a providência que tem por fim conferir força executiva a requerimento destinado a exigir o cumprimento das obrigações a que se refere o artigo 1.° do diploma preambular, ou das obrigações emergentes de transacções comerciais abrangidas pelo Decreto-Lei n.º32/2003, de 17 de Fevereiro - de acordo com o artigo 7º do anexo ao DL nº269/98 de 01 de Setembro, na redacção resultante da alteração introduzida pelo DL nº32/2003 de 17 de Fevereiro.

2.- O artigo 7º do DL 32/2003, que conferia o direito de recorrer à injunção para reclamar o atraso de pagamento em transacções comerciais, independentemente do valor da dívida, foi revogado, mas o art. 10º do DL 62/2013 de 10 de Maio suporta uma norma idêntica.

3. - Assim, a norma do art. 7º do anexo ao DL nº269/98 de 01 de Setembro que define o que seja injunção, há-de entender-se como remetendo para este artº 10º do DL nº 62/2013 de 10 de Maio.

4.- Destinando-se o requerimento de injunção a exigir o cumprimento de obrigações emergentes de transacções comerciais abrangidas pelo DL 62/2013 de 10 de maio (outrora DL nº32/2003 de 17-02), não existe limite de valor.

5.- Havendo oposição à injunção: se a obrigação for de valor não superior a metade da alçada da Relação, o processo é remetido à distribuição seguindo-se a tramitação prevista na acção declarativa especial; se a obrigação for de valor superior a metade da alçada da Relação, o processo é remetido ao tribunal competente e distribuído como acção declarativa na forma comum.

Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

                                                                        I

R (…) LDA, requereu  em 03-07-2013 através do procedimento de injunção, contra Q (…), LDA, a notificação desta no sentido de lhe ser paga a quantia de € 27.187,92 de capital e € 40,41 de juros, por fornecimento de bens e serviços de surribas e escavações que prestou a esta entre 14-02-2013 a 10-05-2013, conforme fatura que juntou e que não foi paga.

No requerimento de injunção assinalou com “X” o espaço destinado a “Obrigação emergente de transação comercial?”

A Requerida foi notificada e no prazo da oposição apresentou requerimento a “informar que liquidamos à Empresa R (…) Lda, todas as quantias (Euros 20.000,00) referentes aos serviços de Surribas nela referidos”.

Considerando a oposição, foram os autos remetidos ao tribunal cível competente, para distribuição, tendo a ação seguido como ação especial de cumprimento de obrigações – DL 269/98.

A Requerida veio requerer que se fixasse prazo para a Requerente apresentar a p.i. com a concretização da matéria de facto alegada e viesse indicar os meios probatórios, fixando-se igualmente prazo para a apresentação de oposição.

A Requerente respondeu, pugnando pelo indeferimento de tal requerimento com fundamento em que, o requerimento de injunção constitui, no caso de oposição à mesma, uma verdadeira p.i., estando, assim, ultrapassada a fase dos articulados. Mais alegou que, quando muito, poderia o tribunal convidar as partes a aperfeiçoar aquelas peças processuais, o que no caso, não se afigura necessário, pois que se mostra suficientemente concretizada a matéria de facto. E que, quanto aos meios de prova os mesmos são a apresentar no início da audiência de discussão e julgamento.

Por despacho de 15-10-2013 o Mmº Julgador decidiu indeferir o requerido considerando encontrar-se suficientemente concretizada a matéria de facto, “pese embora esta forma de processo especial, com tramitação simplificada” e, declarando não ocorrer exceções dilatórias ou nulidades que cumprisse conhecer, marcou data para a realização da audiência de julgamento.

Foi marcada data para a audiência de julgamento e realizada uma primeira sessão, na qual foram indicados os meios de prova bem como juntos diversos documentos, tendo o tribunal proferido despacho de admissão dos meios de prova e definido que “nos presentes autos importa verificar se foi celebrado o contrato que foi alegado no requerimento de injunção, qual o valor acordado entre as partes, se os serviços foram prestados e, tendo sido prestados, se os mesmos não foram pagos na data em que deveriam ter sido pagos. Por outro lado e considerando a oposição da Ré, cumpre ainda ao Tribunal aferir se a mesma pagou por conta da referida fatura, o valor que alegou.”

Foi entretanto a audiência interrompida para exercício do contraditório quanto aos documentos e designada nova data.

A Autora procedeu à junção de novos documentos.

A Ré, em requerimento autónomo, veio exercer o contraditório e solicitar novos elementos de prova.

Seguidamente foi proferido o seguinte despacho:

“Refª 107514: Do teor da Petição/Requerimento de Injunção (fls.2) resulta que o valor da presente ação é de €27.228,33, i.e., o objeto dos presentes autos não se enquadra no regime dos procedimentos destinados a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior a €15.000, publicado em anexo ao Decreto-Lei nº269/1998, de 1 de Setembro (art. 1º do ora citado Decreto-Lei).

Face ao supra exposto e nos termos do art. 3º/1 do supra referido anexo, julga-se procedente a exceção dilatória, de conhecimento oficioso (art.º578º do CPC redação introduzida pela Lei nº41/2013, de 26.6, de ora adiante CPC), de erro sobre a forma de processo e da consequente nulidade de todo o processo (art. 577º/b) do CPC), pelo que tal obsta a que este Tribunal conheça do mérito da causa, i.e., decide-se absolver a Ré da instância (art.º576º/2 do CPC).”

Inconformado com tal decisão veio o Autor requerer a retificação de tal despacho, ou caso tal pedido não fosse atendido, recorrer, concluindo do seguinte modo as suas alegações de recurso:

1ª – O Mº Juiz do Tribunal a quo fez errada interpretação e aplicação do direito, sendo que a douta sentença proferida viola o disposto nos artigos 193º e 547º do CPC, artigo 7º do Anexo ao Decreto-Lei nº269/98 de 1 de Setembro e artigo 7º, nº1 do Dec. Lei nº32/2013 (leia-se “2003”) de 17 de fevereiro.

2ª – Porquanto, a Recorrente intentou o procedimento de injunção para cobrança de uma dívida resultante de uma transação comercial;

3ª – Conforme resulta desde logo do formulário da própria Injunção, onde assinalou trata-se de “Obrigação emergente de transação comercial (DL.32/2003 de 17 de fevereiro): sim.”, bem como da exposição de factos, onde alegou sumariamente que “A Requerente dedica-se à prestação de serviços de surribas e escavações, sendo que, no âmbito da sua atividade prestou, entre outros, os serviços melhor identificados na fatura nº2013/29, …”

4ª- Exigindo por fim o pagamento do valor de 27.381,33€, correspondente a 27.187,92€ de capital, 40,41€ de juros de mora vencidos à taxa de juro comercial (7,75%) e 153€ da taxa de justiça paga com a entrada do Requerimento de Injunção;

5ª – Sendo que, a Recorrida apresentou oposição à Injunção, tendo o processo sido remetido ao Tribunal a quo, onde foi distribuído e passou a tramitar-se como processo comum.

6ª – Tendo efetivamente a Mma. Juiz do Tribunal a quo designado dia para o Julgamento, o qual se iniciou com a apresentação dos meios de prova e com continuação designada para o dia 8 de Maio de 2014;

7ª- Sucede que, e sem que nada o fizesse prever, violando o disposto no artigo 3, nº3 do CPC, o Mmo. Juiz do Tribunal a quo proferiu a sentença de que ora se recorre;

8ª- Absolvendo a Recorrida da instância, uma vez que, e conforme se passa a citar: “Do teor da Petição/Requerimento de Injunção (fls.2) resulta que o valor da presente ação é de €27.228,33, i.e., o objeto dos presentes autos não se enquadra no regime dos procedimentos destinados a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior a €15.000….”

9ª- Julgando-se na douta sentença recorrida procedente uma eventual exceção dilatória de conhecimento oficioso de “erro sobre a forma do processo e com a consequente nulidade de todo o processo”.

10ª- Ora, salvo o devido respeito, não é isso o que resulta do disposto nos artigos 7º do Anexo ao Decreto-Lei nº269/98 de 1 de Setembro e artigo 7º, nº1 do Dec. Lei nº32/2003 de 17 de fevereiro;

11ª- Porquanto o que ali se pode ler, é que a “…injunção é uma providência que tem por fim conferir força executiva a requerimento destinado a exigir o cumprimento das obrigações a que se refere o artigo 1º do diploma preambular, ou das obrigações emergentes de transações comerciais, abrangidas pelo Decreto-Lei nº32/2003 de 17 de fevereiro”

12ª – Sendo que, o artigo 7º nº1 do supra citado Decreto-Lei dispõe que “O atraso no pagamento em transações comerciais, nos termos previstos no presente diploma, confere ao credor o direito de recorrer à injunção, independentemente do valor da dívida.”

13ª- Para o efeito, o artigo 3º alínea b) do referido Decreto-Lei define o que se deve entender por transação comercial.

14ª- Assim, e pelo exposto dúvidas não restam que a ora Recorrente podia e devia, como fez, lançar mão do procedimento de Injunção para exigir o pagamento da dívida constante dos autos.

15ª- Tudo ao abrigo e em cumprimento do disposto nos supra citados normativos legais;

16ª- Pelo que, mal andou o Tribunal a quo ao proferir a douta decisão recorrida, uma vez que não existe qualquer exceção dilatória de conhecimento oficioso de que o Tribunal tivesse obrigação de conhecer, como resulta do despacho proferido pela Mma. Juiz do Tribunal a quo em 15.10.2013.

17ª- Não existindo, em consequência, qualquer erro na forma do processo que dê lugar à nulidade de todo o processo.

Termos em que,

A) – Se requer a retificação da douta sentença proferida por erro material, substituindo-se a mesma por douto despacho que ordene o prosseguimento dos autos e continuação do julgamento.

B) - Caso assim se não entenda:

Nos mais e melhores de direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve ser concedido provimento ao recurso, revogando-se a douta decisão recorrida, substituindo-a por outra que ordene a prossecução dos presentes autos, adequando-se à respetiva forma processual para continuação do julgamento e para que seja proferida decisão, e assim se fará inteira Justiça.

Não foram apresentadas contra-alegações ao recurso, tendo a Ré, tão-somente respondido ao pedido de retificação formulado pela Autora, no sentido de o mesmo ser indeferido.

                                                                        II

Os factos a considerar constam do relatório supra.

                                                                        III

Na consideração de que o objeto dos recursos se delimita pelas conclusões das alegações (art. 635 nº 3 do CPC), sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (art. 608 in fine), são as seguintes as questões a decidir:

 - Saber se ocorreu indevida utilização do procedimento de injunção, nomeadamente erro na forma de processo.

-  Em caso afirmativo, consequências do mesmo.

I -  Saber se ocorreu indevida utilização do procedimento de injunção, nomeadamente erro na forma de processo.

Antes de desenvolver a questão em apreço, importa chamar a atenção para o facto de não ter sido respeitado o princípio do contraditório e ter sido proferida uma decisão-surpresa, à revelia do que era expetável.

Efetivamente não cuidou o tribunal recorrido de dar cumprimento ao disposto no artº 3º nº 3 do CPC, que proíbe decisões-surpresa, notificando as partes para se pronunciarem, querendo, sobre a possibilidade de vir a decidir, como decidiu, oficiosamente, por uma nulidade processual, motivada por aquilo que considerou uma dedução indevida de um procedimento de injunção, ou seja, por erro na forma de processo.

E, fê-lo, numa fase adiantada dos autos, realizada que estava uma primeira sessão de audiência, tendo o tribunal proferido anteriormente decisões que não permitiam às partes antever tal desfecho, nomeadamente, quando decidiu sobre a suficiência do requerimento inicial relativamente à alegação dos factos, quando se pronunciou sobre a admissibilidade ou não de determinados meios probatórios e quando designou nova data para prosseguimento da audiência a fim de ser exercido o contraditório relativamente à junção de documentos.

Assim, o não cumprimento do disposto no artº 3º nº 3 do CPC – “o juiz deve observar e fazer cumprir ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem” – é suscetível de acarrear nulidade processual, se objeto de reclamação, nos termos dos artºs 195º nº 1 e 196º do CPC. E, no caso foi-o, pelo Autor /recorrente.

Não haverá, contudo, necessidade de maiores desenvolvimentos, considerando a sua prejudicialidade face à decisão da questão essencial em recurso, que ora se explanará.

Apreciemos, pois, tal questão.

Pelo art. 1º do DL nº269/98 de 01de setembro – após várias alterações, nomeadamente as introduzidas pelo DL nº32/2003 de 17 de fevereiro, DL nº303/2007 de 24 de agosto e DL n.º 226/2008, de 20 de novembro- foi aprovado “o regime dos procedimentos destinados a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior a (euro) 15000, publicado em anexo, que faz parte integrante do presente diploma”.

Consistem tais procedimentos na ação declarativa e na injunção, cujo regime consta daquele anexo.

Para o presente caso, importa ter presente o regime da injunção, previsto no art.7º e ss. do referido anexo.

Dispõe o art. 7º do anexo ao DL nº269/98 de 01 de setembro, na redação resultante da alteração introduzida pelo DL nº32/2003 de 17 de fevereiro, o seguinte:

“Considera-se injunção a providência que tem por fim conferir força executiva a requerimento destinado a exigir o cumprimento das obrigações a que se refere o artigo 1.° do diploma preambular, ou das obrigações emergentes de transações comerciais abrangidas pelo Decreto-Lei n.º32/2003, de 17 de fevereiro”. (sublinhado nosso).

Havendo oposição regem, em princípio, os art.s 15º e ss..

Donde resulta que, havendo oposição, os autos são apresentados à distribuição – art.16º - seguindo-se a tramitação prevista para a ação declarativa (cujo regime consta dos art.s 1º a 5º) - art.17º, ambos do referido anexo.

Mas, tratando-se de obrigações emergentes de transações comerciais abrangidas pelo DL nº 32/2003 de 17 de fevereiro, - diploma que transpõe para a ordem jurídica interna a Diretiva n.º 2000/35/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de junho, a qual estabelece medidas de luta contra os atrasos de pagamento nas transações comerciais - dispõe o art. 7º deste diploma legal que:

“1 - O atraso de pagamento em transações comerciais, nos termos previstos no presente diploma, confere ao credor o direito a recorrer à injunção, independentemente do valor da dívida;

2- Para valores superiores à alçada da Relação, a dedução de oposição e a frustração da notificação no procedimento de injunção determinam a remessa dos autos para o Tribunal competente, aplicando-se a forma de processo comum.

3 - Recebidos os autos, o juiz pode convidar as partes a aperfeiçoar as peças processuais.

4 - As ações destinadas a exigir o cumprimento das obrigações pecuniárias emergentes de transações comerciais, nos termos previstos no presente diploma, de valor não superior à alçada da Relação seguem os termos da ação declarativa especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos.

Sucede que, este diploma foi revogado pelo(a) Decreto-Lei n.º 62/2013, de 10 de maio, com exceção dos artigos 6º e 8º.

Assim, aquele artigo 7º mostra-se revogado.

Vindo este Decreto-Lei nº 62/2013 de 10 de Maio a regular a mesma matéria, ou seja, a estabelecer medidas contra os atrasos no pagamento de transações comerciais transpondo a Diretiva n.º 2011/7/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de fevereiro de 2011.

Estabelecendo no artigo 10º deste último diploma que:

“Procedimentos especiais

1 - O atraso de pagamento em transações comerciais, nos termos previstos no presente diploma, confere ao credor o direito a recorrer à injunção, independentemente do valor da dívida.

2 - Para valores superiores a metade da alçada da Relação, a dedução de oposição e a frustração da notificação no procedimento de injunção determinam a remessa dos autos para o tribunal competente, aplicando-se a forma de processo comum.

3 - Recebidos os autos, o juiz pode convidar as partes a aperfeiçoar as peças processuais.

4 - As ações para cumprimento das obrigações pecuniárias emergentes de transações comerciais, nos termos previstos no presente diploma, seguem os termos da ação declarativa especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos quando o valor do pedido não seja superior a metade da alçada da Relação”. (sublinhados nossos).

Ou seja, estabelecendo-se no artº 10º uma norma equivalente (embora não igual) à norma do artº 7º do Dec-Lei 32/2003 de 17 de fevereiro (entretanto revogada).

Assim, a norma do art. 7º do anexo ao DL nº269/98 de 01 de setembro que define o que seja injunção, há-de entender-se como remetendo para este artº 10º do DL nº 62/2013 de 10 de maio, uma vez que, não está já em vigor o artº 7º do Dec-Lei nº 32/2003, mas colhendo aquele artº 10º uma idêntica previsão normativa.

Podemos então concluir:

Destinando-se o requerimento de injunção a exigir o cumprimento de obrigações emergentes de transações comerciais abrangidas pelo DL 62/2013 de 10 de maio (outrora DL nº32/2003 de 17-02), desde logo, não existe limite de valor.

Pelo que, pode, no respetivo requerimento injuntivo, ser exigido o cumprimento de obrigações de valor  de € 27.228, 33, como aconteceu no presente caso.

Importa, apurar o procedimento a adotar havendo oposição.

Destinando-se o requerimento de injunção a exigir o cumprimento de obrigações a que se refere o art.1º do DL nº269/98 de 1 de Setembro e art.10º do DL nº 62/2013 de 10 de maio  – obrigações pecuniárias emergentes de transações comerciais - de valor não superior a metade da alçada da Relação, havendo oposição, o processo é apresentado à distribuição, seguindo-se a tramitação prevista na ação declarativa especial, prevista no anexo àquele diploma legal.

Mas se estiver em causa um valor superior a metade da alçada da Relação, havendo oposição, o processo será remetido ao tribunal competente, onde será distribuído com ação declarativa, na forma comum.

Resta dizer que, por transação comercial deve entender-se “…uma transação entre empresas ou entre empresas e entidades públicas destinada ao fornecimento de bens ou à prestação de serviços contra remuneração» - art. 3º alª b) DL 62/2013 de 10 de maio.

Ora, no caso em apreço, estão, inequivocamente, em causa transações comerciais entre empresas: prestação de serviços de surribas e escavações, solicitando a requerente o pagamento de € 27.228,33 (€ 27.187,92 de capital e € 40,41 de juros).

Podia, assim, a requerente, e não obstante o montante peticionado ultrapassar o valor de € 15.000, recorrer ao processo de injunção – art.7º, nº1, do DL nº32/2003 de 17 de fevereiro, como o fez.

Processo que, sendo o respetivo valor superior a metade da alçada da Relação, que é de € 30.000 – art.24º da Lei nº3/99 de 13 de Janeiro, à data da interposição da ação – deveria ter sido distribuído, no tribunal competente, como ação declarativa, na forma de processo comum e não como processo especial como o foi.

Mas, se é assim, não se pode concluir por erro na forma de processo. O que ocorreu foi erro na distribuição, com consequências no formalismo subsequente, facto não imputável à parte.

Por isso, os autos devem prosseguir, corrigindo-se a espécie que será a de ação declarativa, na forma de processo comum ordinário (em sentido idêntico o Ac. TRP de 28-05-2012 P.356872/10.7YIPRT.P1 in www.dgsi.pt).

Assim, uma vez que o processo, por erro do tribunal, seguiu a tramitação prevista para a ação especial para cumprimento de obrigações estabelecida no DL 269/98, quando devia ter seguido a tramitação prevista para a ação declarativa na forma de processo comum, não tem a Requerente que ser penalizada por isso, pois que, ao apresentar o requerimento de injunção, respeitou os requisitos exigidos por lei.

Haverá tão só que, ouvidas as partes, fazer uso do disposto no artº 547º do CPC.

Pelo que o recurso merece provimento.

Em suma:

- Considera-se injunção a providência que tem por fim conferir força executiva a requerimento destinado a exigir o cumprimento das obrigações a que se refere o artigo 1.° do diploma preambular, ou das obrigações emergentes de transações comerciais abrangidas pelo Decreto-Lei n.º32/2003, de 17 de Fevereiro - de acordo com o artigo 7º do anexo ao DL nº269/98 de 01 de setembro, na redação resultante da alteração introduzida pelo DL nº32/2003 de 17 de fevereiro.

- O artigo 7º do DL 32/2003, que conferia o direito de recorrer à injunção para reclamar o atraso de pagamento em transações comerciais, independentemente do valor da dívida, foi revogado, mas o art. 10º do DL 62/2013 de 10 de maio suporta uma norma idêntica.

- Assim, a norma do art. 7º do anexo ao DL nº269/98 de 01 de setembro que define o que seja injunção, há-de entender-se como remetendo para este artº 10º do DL nº 62/2013 de 10 de Maio.

- Pelo que, destinando-se o requerimento de injunção a exigir o cumprimento de obrigações emergentes de transações comerciais abrangidas pelo DL 62/2013 de 10 de maio (outrora DL nº32/2003 de 17-02),  não existe limite de valor.

                                                                        IV

Termos em que, acorda-se em julgar a apelação procedente, revogando-se a decisão recorrida, devendo os autos prosseguir os seus termos como ação declarativa, sob a forma de processo comum ordinário.

Custas pela parte vencida a final.

Coimbra,

Anabela Luna de Carvalho ( Relatora )

João Moreira do Carmo

José Fonte Ramos