Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | TELES PEREIRA | ||
Descritores: | INSOLVÊNCIA EMBARGOS RECURSO | ||
Data do Acordão: | 02/14/2012 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | TRIBUNAL JUDICIAL DE LEIRIA – 5º JUÍZO CÍVEL | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA | ||
Legislação Nacional: | ARTºS 40º, Nº 1 E 42º, NºS 1 E 2 DO CIRE | ||
Sumário: | I – As duas formas de reacção à insolvência (embargos e recurso) são cumuláveis, sendo a mesma a legitimação subjectiva num e noutro caso (artigo 40º, nº 1, no caso do recurso ex vi do artigo 42º, nº 1 ambos do CIRE), mas restringindo-se o recurso à consideração dos específicos pressupostos considerados na sentença, enquanto fundamentos legais da declaração de insolvência. II – Assim, o controlo substancial da situação de insolvência de uma devedora, face à sentença que a considera como tal, faz-se, fundamentalmente, através dos embargos (artigo 40º, nº 2 do CIRE). | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra
I – A Causa
1. Em 10 de Novembro de 2011[1], apresentou-se à insolvência, nos termos dos artigos 23º e 24º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE), a sociedade S… – Sociedade de Construções S.A. (doravante referida como Requerente, Devedora, Insolvente e como Apelada, no contexto deste recurso), sendo que neste recurso, que contesta a posterior declaração de insolvência da Requerente (através da Sentença certificada a fls. 110/114), a sociedade accionista da Devedora[2], L…, SGPS, S.A. (Apelante no presente recurso), pretende ver revogada, nos termos que adiante explicitaremos, essa Sentença que decretou a referida insolvência.
1.1. Invocou a Devedora Requerente, no respectivo requerimento inicial, em apoio da respectiva pretensão (a de ser declarada em situação de insolvência), o seguinte (transcrevemos as passagens desse requerimento inicial que contêm as asserções gerais da Requerente quanto à caracterização da respectiva situação como de insolvência): 7º A sociedade encontra-se em situação de insolvência, visto que está impossibilitada de realizar receitas que lhe permitam cumprir, seja as obrigações vencidas, seja as dívidas bancárias que se vencerão no mês de Dezembro de 2011.8º Porquanto o valor de mercado da maior parte dos activos que tem para venda sofreu grande depreciação devido à crise súbita e galopante do mercado imobiliário.9º E ainda porque, no início de 2011, foram declaradas em situação de insolvência sociedades que tinham dívidas de avultado valor à Requerente.10º Factos estes (artigos 7º, 8º e 9º supra) que determinam que o passivo da Requerente seja manifestamente superior ao seu activo e que a sua situação líquida ficasse gravemente negativa […].[…]” [transcrição de fls. 7] 1.2. Em 14/11/2011, através da Sentença certificada a fls. 110/114 – esta constitui a decisão objecto do recurso que ora nos incumbe apreciar –, foi declarada a insolvência da Requerente[3]. 1.3. Inconformada, reagiu a indicada sócia da Requerente, a L…, interpondo o presente recurso – concomitantemente opôs-se por embargos –, alegando a apelação nos termos certificados a fls. 121/135, aí concluindo o seguinte: II – Fundamentação 2. Apreciando a presente apelação – dirige-se ela, convém ter presente, à Sentença que declarou a insolvência da sociedade ora Apelada –, sublinhamos que a incidência temática da impugnação, pressuposto o enquadramento legal do recurso interposto, resulta do teor das conclusões com as quais a Apelante rematou as respectivas alegações. É o que resulta, relativamente a qualquer recurso, do disposto nos artigos 684º, nº 3 e 685º-A, nº 1 do Código de Processo Civil (CPC)[4]. Transcrevemos essas conclusões no item anterior e delas decorre pretender a Apelante suscitar questões (legitimidade da Apelada para se apresentar à insolvência e verificação dos pressupostos da respectiva declaração) no quadro da pretensão, veiculada neste recurso, de que não seja a Requerente/Apelada declarada na situação de insolvência. Existe, todavia, uma questão que reputamos de preambular na economia decisória deste recurso e que abordaremos desde já. 2.1. Refere-se a apelação, como resulta de todo o antecedente relato, à declaração de insolvência da sociedade S… – Sociedade de Construções, S.A. face à apresentação desta à insolvência, fundando-se o recurso – só podendo fundar-se – na legitimação recursória especifica, de algum dos indicados no artigo 40º, nº 1 do CIRE[5], tematicamente decorrente do artigo 42º, nº 1 do CIRE:
Importa ter presente – e recorda-se aqui que a Apelante também deduziu, cumulativamente a este recurso, embargos à declaração de insolvência da Devedora – que a disposição acabada de transcrever induz uma articulação particular, face ao decretamento da insolvência, entre a oposição por embargos e a impugnação em sede de recurso da sentença, articulação esta que poderíamos resumir nos seguintes termos: as duas formas de reacção à insolvência (embargos e recurso) são cumuláveis, sendo a mesma a legitimação subjectiva num e noutro caso (artigo 40º, nº 1, no caso do recurso ex vi do artigo 42º, nº 1 ambos do CIRE), mas restringindo-se tematicamente o recurso à consideração dos específicos pressupostos considerados na sentença, enquanto fundamentos legais da declaração de insolvência. Dito de outra maneira, significa isto que o controlo substancial da situação de insolvência da Devedora, face à sentença que a considera como tal, se faz, fundamentalmente, através dos embargos (v. o artigo 40º, nº 2 do CIRE). Note-se que esta asserção interpretativa, assente na conjugação entre o artigo 42º, nº 1 e 40º, nº 2 do CIRE – que nos parece encerrar a forma coerente de interpretação das duas normas –, é invariavelmente afirmada na doutrina: 2.2. Enquadrada a situação do recurso nestes termos, tendo presente que a Sentença aqui pretendida apelar resultou da apresentação da sociedade Devedora à insolvência, com a consequente declaração imediata dessa insolvência, assente no reconhecimento pelo devedor da sua situação (artigo 28º do CIRE), importará ponderar que esse resultado decisório – esse reconhecimento confessório – se referiu ao seguinte acervo de factos (aqui transcritos a partir do texto da Sentença): 2.2.1. Ora, tendo presente este acervo fáctico, e a necessária consideração dele em si mesmo (como decorre do efeito de reconhecimento resultante da apresentação), ponderando que dele decorre – mesmo que se diga que decorre na aparência – a legitimidade da Devedora para se apresentar à insolvência (v. os documentos juntos com o requerimento inicial, cfr. o artigo 19º do CIRE)[9] e ponderando, enfim, que os factos reconhecidos preenchem os pressupostos de declaração de insolvência, ponderando tudo isto, dizíamos, não vemos que a Sentença apelada tenha procedido incorrectamente ao decretar a insolvência da Requerente/Devedora.
Improcedem, pois, os fundamentos do recurso, sendo certo – e estamos a parafrasear pela positiva os termos da lei – que face aos elementos apurados a decisão de decretamento da insolvência deveria ter sido, como foi, proferida. 2.3. Improcedendo o recurso, formulamos aqui o seguinte sumário: III – Decisão 3. Assim, pelo exposto, na improcedência do recurso, confirma-se a decisão apelada.
Custas pela Apelante, que não obteve vencimento na sua pretensão expressa no recurso.
J. A. Teles Pereira (Relator) Manuel Capelo Jacinto Meca [1] Tratando-se de processo iniciado posteriormente à entrada em vigor (01/01/2008) do Decreto-Lei nº 303/2007, de 24 de Agosto, aplica-se o regime dos recursos introduzido por este último Diploma (v. os respectivos artigos 11º, nº 1 e 12º, nº 1). Pela mesma razão, qualquer disposição do Código de Processo Civil adiante referida, cujo texto tenha sido alterado pelo indicado DL 303/2007, sê-lo-á na versão resultante deste Diploma. [2] Indica a Requerente, no requerimento inicial, quanto à composição do seu capital social: “[…] 2º A Requerente tem, presentemente, dois accionistas, a saber: A…, que é titular de 25.025 acções ao portador com o valor nominal de €1,00 cada e com 75.075 acções do mesmo valor, L… SGPS, S.A. […]. […]” [transcrição de fls. 5/6]. [3] Fundamenta-se o pronunciamento decisório respeitante a essa declaração nos seguintes termos: “[…] Nos termos do art.º 28.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas [… ], a apresentação à insolvência por parte do devedor implica o reconhecimento por este da sua situação de insolvência que é declarada de imediato. Assim, e atendendo ao disposto neste preceito legal, impõe-se declarar de imediato a insolvência da requerente. [8] Trata-se da enunciação no texto introdutório da Sentença dos factos alegados pela requerente, funcionando eles, dada a regra de reconhecimento contida no artigo 28º do CIRE, como elenco fáctico posteriormente considerado na decisão de decretamento da insolvência. Embora consideremos esta prática (a posterior omissão no texto da sentença de um elenco dos factos provados/reconhecidos) como ritualmente menos perfeita, não deixamos de a considerar como adequada à expressão dos pressupostos de facto da insolvência no caso de apresentação do devedor. Trata-se de uma prática muito corrente e que se nos apresenta conforme, com base em fortes argumentos de identidade de razão, às diversas indicações que a tal respeito nos são fornecidas pela nossa lei adjectiva geral, face ao funcionamento de efeitos cominatórios reportados à matéria de facto (cfr. os artigos 484º, nº 3 e 784º do CPC). |