Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
314/15.5T8FND.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: MARIA JOÃO AREIAS
Descritores: ASSOCIAÇÕES
DELIBERAÇÃO
ACÇÃO DE ANULAÇÃO
CADUCIDADE
ASSEMBLEIA GERAL
CONVOCATÓRIA
Data do Acordão: 12/15/2016
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE CASTELO BRANCO - FUNDÃO - JL CÍVEL
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTS. 173, 174, 178, 327 CC
Sumário: 1. A propositura na secção de comércio da instância central, de uma ação de anulação de deliberações sociais respeitante a uma associação, que deu azo ao seu indeferimento liminar por incompetência do tribunal, não constitui um “motivo processual imputável ao titular de direito”, para efeitos de afastar a atribuição do prazo suplementar previsto no nº2 do artigo 327º CC.

2. A competência para convocar a assembleia geral reside em exclusivo no órgão da administração, designado vulgarmente de Direção relativamente às associações sem fins lucrativos.

3. O facto de o autor, tendo pertencido ao conselho fiscal durante alguns anos, não ter invocado determinadas irregularidades na convocatória de assembleias gerais respeitantes a anos anteriores, não constitui qualquer comportamento contraditório com a sua atitude de, face a uma assembleia na qual é rejeitada a lista à qual pertence, vir arguir a anulabilidade das deliberações tomadas nessa assembleia com base nessas mesmas irregularidades.

Decisão Texto Integral:



                          
                                                                     

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra (2ª Secção):

I – RELATÓRIO

M (…) intentou a presente ação declarativa para anulação de deliberações sociais contra S (…) Organização de Produtores de Pecuária,

pedindo a anulação do deliberado na assembleia geral da Ré do passado dia 27 de Outubro de 2014, pelas 10 horas, em segunda convocatória, com todas as consequências.

Alegando para tal e em síntese:

não existindo nos estatutos da associação Ré qualquer disposição específica para estabelecer o modo de convocar a assembleia geral, a mesma terá que ser convocada, nos termos do nº 1 do artº. 173º do Código Civil, pela administração do Agrupamento, que o mesmo é dizer pela direção do Agrupamento, pois nos termos do artº. 11º dos estatutos a direção é órgão executivo do Agrupamento;

tendo a assembleia geral realizado no passado dia 27 de Outubro de 2014 sido convocada pelo Presidente da Mesa, tal convocação é ilegal;

a convocação da assembleia em apreço não obedeceu ao formalismo previsto no artigo 174º do CC;

a ordem de trabalhos dessa assembleia geral era a Eleição dos corpos sociais para o triénio 2014 -2017;

no anúncio de convocação Publicado no Jornal do (...) fixava-se como data limite para a apresentação das candidaturas o dia 17 de Outubro às 18 horas;

no dia 16 de Outubro de 2014 foi entregue na sede do Agrupamento uma lista concorrente à eleição dos órgãos sociais, acompanhada do manifesto eleitoral, a qual não foi aceite ilegalmente pelo Presidente da Mesa da Assembleia Geral, por alegadamente o candidato ao cargo de Presidente da Direção ((…)), não ser Sócio Efetivo da Associação e não gozar, assim, de qualquer direito associativo no seio desta, não podendo candidatar-se ao preenchimento de cargos associativos conforme Parecer Jurídicos solicitados.

a não admissão a sufrágio da lista aos órgãos sociais do Agrupamento em que é candidato a presidente da direção o associado (…) implica um vício que gera a anulabilidade do deliberado em tal assembleia geral.

a lista que tinha como candidato a presidente da Direção (…), não devia ter sido aceita a sufrágio, como foi, por limitação de mandatos.

A ré contesta, alegando, em síntese

invoca a caducidade do direito de ação, pelo decurso do prazo legal de 6 meses entre a realização da assembleia (em 27 de Outubro de 2014) e a interposição da ação (30 de Abril de 2015);

invoca ainda o abuso de direito, na modalidade de venire contra factum proprium, porquanto, enquanto pertenceu aos órgãos sociais da associação (mormente ao Conselho Fiscal), de 2002 a 2013, nunca o autor se manifestou contra o facto as assembleias gerais terem sido convocadas pelo Presidente da mesa e quanto à forma de convocação das mesmas, por anúncio publicado em jornal, sendo ainda certo que a inexistência de referência ao local de assembleia não releva dada a tradição de realização das mesmas na respetiva sede, sendo que tal omissão igualmente se verificou em anteriores convocatórias;

expediu avisos postais a todos os associados que, tendo aderido à S (...), respeitaram o compromisso assumido por escrito de “adquirir no prazo de 60 dias” um determinado número de efetivos bovinos, ovinos e caprinos;

relativamente ao facto de o Presidente da respetiva Mesa da Assembleia Geral ter recusado a admissão à votação de uma lista cujo nome apresentado para Presidente da Direção era o Sr. Dr. (…), salienta que, em bom rigor, nesta recusa não estamos perante uma “deliberação social”, mas perante uma decisão do Presidente da Mesa da Assembleia Geral, sendo que, conforme o próprio Autor reconhece, a mesa da Assembleia Geral não é um órgão do agrupamento”;

a eventual discordância do Autor relativamente ao que foi deliberado pelo Presidente da Mesa da Assembleia Geral da Ré deveria ter sido objeto de recurso para a própria Assembleia Geral, que sobre o assunto seria soberana a decidir;

defende ainda a regularidade da exclusão da lista em apreço;

rejeita que a lista que ganhou as eleições não devesse ter sido admitida, lembrando que, sendo verdade que o atual Presidente da Direção da Ré, (…), foi eleito para o desempenho deste cargo em 2005, foi reeleito em 2008, em 2011 e em 2014, sendo que porém em 2002 integrou a Direção da Ré como “vogal”;

quanto ao desempenho do cargo de “vogal” da Direção no mandato de 2002/2004, foi entendimento do Presidente da Mesa da Assembleia Geral da Ré que o limite à reeleição consignado no n.º 2 do artigo 8.º dos Estatutos da Ré se aplica ao cargo social desempenhado.

Realizada audiência prévia, foi proferida sentença a julgar a ação procedente, julgando anulado o deliberado na assembleia geral da Ré realizada no passado dia 27 de Outubro de 2014, palas 10 horas, em 2ª convocatória, com as legais consequências.


*

Não se conformando com tal decisão, a Ré dela interpôs recurso de apelação, concluindo a respetiva motivação, com as seguintes conclusões, que aqui se reproduzem:

(…)


*

Foram apresentadas contra-alegações, no sentido da improcedência do recurso.
Dispensados os vistos legais, cumpre decidir do objeto do recurso.
II – DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO
Tendo em consideração que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações de recurso, sem prejuízo da apreciação de eventuais questões de conhecimento oficioso – cfr., artigos 635º e 639º, do Novo Código de Processo –, as questões a decidir são as seguintes:
1. Caducidade da ação.
2. Anulabilidade das deliberações por irregularidades na convocação da assembleia.
3. Verificação de abuso de direito na invocação do vício em causa.
III – APRECIAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO
A. Matéria de Facto
São os seguintes, os factos dados como provados, por assentes, na sentença recorrida:
1) Por petição entrada em juízo aos 24/04/2015, o A. intentou previamente a esta uma ação na Secção de Comércio do Tribunal de Castelo Branco, alegando a mesma materialidade e formulando o mesmo pedido ora deduzido (cf. fls.52 a fls.71).
2) Ao processo foi atribuído o nº 289/15.0T8FND.
3) Logo na petição o A. requereu a citação urgente da Associação Ré.
4) Por despacho de 28 de Abril de 2015, patenteado nos autos a fls.73 a fls.78, cujo teor se dá como reproduzido, foi a petição indeferida liminarmente por declaração de incompetência em razão da matéria, da Secção de Comercio do Tribunal da Comarca de Castelo Branco.
5) Em 13 de Outubro de 1989, foi, no Cartório Notarial do (...), por:
“J (..), casado, natural da freguesia da Sé Nova do Concelho de Coimbra e residente nesta cidade do (...);
P (…), casado, natural da freguesia da Conceição do Concelho da Covilhã e residente na freguesia de (...) deste Concelho;
L (…), casado, natural da freguesia de (...) do Concelho de Belmonte, onde reside;
V (…), casado, natural da freguesia de (...) deste Concelho e residente nesta cidade do (...);
L (…), casado, natural da freguesia de São Sebastião da Pedreira do Concelho de Lisboa e residente na freguesia de (...) deste Concelho;
V (…), casado, natural da freguesia de Unhais da Serra do Concelho da Covilhã e residente na freguesia da (...) deste Concelho;
D (…), casado, natural da freguesia de Castelo Novo deste Concelho, onde reside;
M (…), solteiro, maior, natural da freguesia da (...) deste Concelho, onde reside;
F (…), solteiro, maior, natural desta freguesia e Concelho do (...), onde reside.
Foi constituída uma associação a que foi dado o nome de S (…), tudo conforme escritura patenteada nos autos a fls.25 e seg., cujo teor se dá como reproduzido.
6) Foram os estatutos da associação publicados em Diário da República (cf. fls.36).
7) Em 28 de Junho de 1999, no Cartório Notarial do (...) foi celebrada escritura pública pela qual os estatutos do Agrupamento foram alterados, tudo conforme o teor da escritura patenteada nos autos a fls.37 e seg., cujo teor se dá como reproduzido.
8) Essa alteração foi publicada em Diário da República (cf. fls.41).
9) Nos termos do artigo OITAVO dos estatutos da sobredita associação – sob a epígrafe órgãos associativos - «São órgãos do Agrupamento a a) assembleia geral, b) a direção e c) o conselho fiscal.
10) Nos termos do artigo NONO dos estatutos da sobredita associação – sob a epígrafe ASSEMBLEIA GERAL composição e funcionamento – consta que:
“UM – A Assembleia Geral é o órgão supremo do Agrupamento, constituída por todos os sócios no pleno gozo dos seus direitos.
DOIS – A Assembleia Geral é presidida por uma Mesa, composta por um Presidente, um Vice-Presidente e um Secretário, e funciona nos termos legais”.
11) O nº 2 do artigo NONO foi alterado pela escritura a que se alude em 7), tendo passado a ter o seguinte teor:
Dois: A Assembleia Geral é presidida por uma mesa composta por um Presidente e dois Secretários e funciona nos termos legais.
12) Nos termos do artigo DÉCIMO dos estatutos da sobredita associação – sob a epígrafe (da assembleia geral), consta que:
Cabe à Assembleia Geral:
a. – Eleger e destituir os titulares do Agrupamento.
b. Deliberar acerca da alteração ou reforma dos Estatutos.
c. Deliberar sobre o recurso de admissão, rejeição e expulsão de qualquer sócio, sob proposta da Direção.
d. Deliberar sob proposta da Direção sobre o montante das joias e das quotas anuais.
e. Aprovar sob proposta da Direção, os Regulamentos Internos do Agrupamento.
f. Apreciar, discutir e votar, o orçamento, o relatório anual da Direção, as contas da gerência e o parecer do Conselho Fiscal e decidir do saldo do exercício.
g. Apreciar os atos da Direção.
h. Decidir sobre o estabelecimento de uma Federação com outros Agrupamentos.
13) São estes os dois únicos artigos nos estatutos do Agrupamento que se referem à assembleia geral.
14) O estatuto da associação em apreço não regula a forma de convocação da assembleia geral.
15) Os estatutos do Agrupamento também não têm qualquer artigo específico que fixe o modo como a assembleia geral deve ser convocada.
16) No passado dia 27 de Outubro de 2014, ocorreu, pelas 10H00, uma assembleia geral do Agrupamento, assembleia que reuniu em segunda convocatória, pois às 9H desse mesmo dia, hora da primeira convocatória não estariam presentes mais de metade dos seus associados.
17) Na reunião em segunda convocatória não estavam presentes a totalidade dos associados do Agrupamento.
18) A ordem de trabalhos dessa assembleia geral era a seguinte:
Ponto único: Eleições dos corpos sociais para o triénio 2014 - 2017. O acto eleitoral decorrerá entre as 10 horas e as 12H30M.
19) O ora. A. é associado fundador do Agrupamento, pois subscreveu a escritura de constituição e nunca foi objeto de qualquer medida de expulsão do Agrupamento.
20) Nos termos do artigo sétimo do estatuto da associação em causa – sob a epígrafe Quem pode ser associado – consta, entre o mais, que são sócios do Agrupamento as pessoas singulares coletivas que subscreveram a escritura de constituição e todas as pessoas a que ela aderirem.
21) Tomou o A. conhecimento que, em o “Jornal do (...)” do passado dia 2 de Outubro de 2014, foi publicada um anúncio com o seguinte teor:
CONVOCATÓRIA ASSEMBLEIA GERAL EXTRAORDINÁRIA
1 – M (…), Presidente da Mesa da Assembleia Geral da S (…)Organização de Produtores Pecuários (O.P.P.), Associação constituída por escritura pública no Cartório Notarial do (...) com folhas 50 e seguintes do livro 119C com as folhas 39 e 40 do livro 212 B, do referido Cartório, convoca os Associados para uma Assembleia Geral Extraordinária, da mencionada Associação, com sede na (...), no próximo dia 27 de Outubro 2014 pelas 9.00 horas (2ª feira), com a seguinte ordem de trabalhos:
Ponto Único: Eleições dos Corpos Sociais para o Triénio 2014- 2017.O acto eleitoral decorrerá entre as 10.00 horas e as 12h30m.Os Associados interessados devem apresentar as respectivas listas até às 18.00 horas do dia 17 de Outubro de 2014 (6ª Feira) a fim de se afixarem para conhecimento dos Associados. Se à hora marcada não se encontrarem presentes a maioria dos Associados, a Assembleia reunirá uma hora depois, com qualquer número de Associados.
(...), 30 de Setembro de 2014
O Presidente da Mesa da Assembleia Geral
M (…)(Dr)” - tudo conforme documento patenteado nos autos a fls.42, cujo teor se dá como reproduzido.
22) Esse anúncio estava assinado pelo sócio do Agrupamento de nome (…)que invocava a qualidade de Presidente da mesa da assembleia geral do Agrupamento.
23) Em tal anúncio verifica-se que do mesmo não é referido o local onde ocorreria essa assembleia geral.
24) Nesse anúncio Publicado no Jornal do (...) fixava-se como data limite para a apresentação das candidaturas o dia 17 de Outubro às 18 horas.
25) No dia 16 de Outubro de 2014, foi entregue na sede do Agrupamento uma lista concorrente à eleição dos órgãos sociais, acompanhada do manifesto eleitoral e com a seguinte composição:
Constituição de lista candidata a sufrágio
Assembleia Geral:
Cargo Nome Nº Sócio
Presidente(…). H (...))
Secretário (…) 3010
Secretário (…) 338
Suplente (…) 3397
Suplente (…) 3729
Suplente (…) 3388
Direção:
Cargo Nome Nº Sócio
Presidente Dr. (…)
Vogal (…) 072
Vogal (…) 3270(…). Soc. Agrícola, Lda. () 696
Suplente (…)1712
Suplente (…) 3034
Conselho Fiscal:
Cargo Nome Nº Sócio
Presidente (…) 3380
Vogal (…) 1991
Vogal (…) (Cabeça de Casal (…) 078)
Vogal (…) 034
Suplente (…), Lda. (Representada por: (…)) 3442
Suplente (…) 3321
E com a denominação “Renovação e Reconciliação, nos termos dos documentos patenteados nos autos a fls.44 a fls.48, cujo teor se dá como reproduzido (DOC. 7,8 e 9).
26) No dia 24 de Outubro de 2014, foi afixado na sede do Agrupamento um comunicado assinado por (…) com o seguinte teor:
COMUNICADO
Uma das listas candidatas ao acto eleitoral da S(…), não reúne os requisitos Estatutários para a sua admissão, uma vez que o candidato ao cargo de Presidente da Direção, não ser Sócio Efetivo da Associação e não gozar, assim, de qualquer direito associativo no seio desta, não podendo candidatar-se ao preenchimento de cargos associativos conforme Parecer Jurídicos solicitados.
O Presidente da Mesa da Assembleia Geral
(M (…))” - tudo conforme o teor do documento patenteado nos autos a fls.50 – DOC.11 – cujo teor se dá como reproduzido.
27) No mesmo não se faz qualquer referência a que a lista que não foi admitida é a lista “B” atrás transcrita e constante do documento 7, mas certo é que só foram entregues duas listas - a que tinha como candidato a presidente da direção L (…), a Lista A, e a que tinha como candidato a presidente da direção P (…), a Lista B – pelo que o comunicado refere-se à Lista B.
28) No comunicado refere-se, em carregado e sublinhado “Sócio Efetivo” da Associação.
29) Compulsados os estatutos da associação verifica-se a inexistência da referência a sócios efetivos”.
30) Nos termos do artº. 7º dos Estatutos, fala-se somente em sócios do Agrupamento, dizendo que: “São sócios do Agrupamento, pessoas singulares ou coletivas que subscreverem a escritura de constituição e todas as pessoas a que a ela adiram”.
31) P (…) já fez para da direção do Agrupamento.
32) Quando se iniciou a assembleia geral o A. apresentou um protesto, patenteado nos autos a fls.12, cujo teor se dá como reproduzido, alegando a errada convocatória da assembleia por falta de aviso postal.
33) Dizem os estatutos do Agrupamento, no nº 2 do seu artº. 8º, (cf. doc. 1) que “a duração dos mandatos é de três anos, não sendo permitida a reeleição por mais de três mandatos consecutivos”.
34) L (…) foi eleito presidente da direção do Agrupamento pela primeira vez em 2005, tendo sido reeleito na eleição que se lhe seguiu e na outra que se seguiu a esta, sendo que 2002 foi eleito para a direção do Agrupamento.
35) Ou seja, L (…) foi na eleição da assembleia geral do passado dia 27 de Outubro de 2014, eleito pela quarta vez sucessiva, presidente da direção do Agrupamento, sendo que é a quinta vez, que é eleito como membro da direção.
36) A presente ação foi instaurada em 30 de Abril de 2015.
37) O Autor esteve presente na Assembleia Geral da Ré de 27 de Outubro de 2014.
38) O Autor pertenceu, entre 2002 e 2004, ao Conselho Fiscal da Ré, como “Vogal”.
39) O Autor presidiu, entre 2005 e 2007, ao Conselho Fiscal da Ré. 40) O Autor presidiu, entre 2008 e 2010, ao Conselho Fiscal da Ré.
41) O Autor presidiu, entre 2011 e 2013, ao Conselho Fiscal da Ré.
42) Pelo menos nos últimos quinze anos têm sido convocadas as Assembleias Gerais da Ré pelo Presidente da Mesa da Assembleia Geral da Ré e não pela sua Direção.
43) E como sempre sucedeu desde que o Autor integrou o Conselho Fiscal da Ré, em 2002.
44) Nunca tendo este procedimento merecido da parte do Autor o reparo ou qualquer comentário.
45) Desde que existe a Ré que sempre as suas Assembleias Gerais se realizaram na respetiva sede.
46) O que é do conhecimento generalizado de todos os associados.
47) Também a Assembleia Geral convocada para 16 de Abril de 2012 o foi nos mesmos termos.
48) Também a Assembleia Geral convocada para 15 de Abril de 2013 o foi nos mesmos termos.
49) Também a Assembleia Geral convocada para 31 de Março de 2014 o foi nos mesmos termos.
50) Sendo que nas Assembleias Gerais de 16 de Abril de 2012 e de 15 de Abril de 2013 o Autor ocupava o cargo de Presidente do Conselho Fiscal da Ré.
51) Não tendo, relativamente a estes procedimentos convocatórios, formulado reparo ou qualquer comentário.
52) O Sr. (…), que foi sócio fundador da Ré, tendo em 28 de Julho de 2002 dirigido ao então presidente da assembleia geral da associação do escrito patenteado nos autos a fls.141, cujo teor se dá como reproduzido.
53) O atual Presidente da Direção da Ré, L(…), foi eleito para o desempenho deste cargo em 2005, foi reeleito em 2008, em 2011 e em 2014.
54) E que em 2002 integrou a Direção da Ré como “vogal”.
55) Em Assembleia Geral realizada em 15 de Abril de 2013, na qual participou o Autor, foi aprovada por unanimidade uma alteração ao n.º 2 do artigo 8.º dos Estatutos da Ré, que passaria a ter a seguinte redação: “A duração dos mandatos são de três anos, sem qualquer limite de mandatos sucessivos” – doc. n.º 21.
56) Tal alteração estatutária não foi plasmada em escritura pública.
*
1. Caducidade da presente ação.

O juiz a quo veio a julgar improcedente a exceção de caducidade da ação, por entender que o prazo de seis meses previsto no artigo 178º do Código Civil (CC), foi validamente interrompido pela propositura da ação intentada pelo autor junto do tribunal de comércio, e cuja petição foi liminarmente indeferida por declaração de incompetência daquele tribunal, por se afigurar “legítima/defensável a aceção do autor em considerar competente a seção de comércio para o conhecimento dos vertentes autos, em face do disposto no artigo 128º/1ºalínea d), da Lei de Organização do Sistema Judiciário, dado que o citado artigo expressamente prevê que compete às seções de comércio preparar e julgar “as ações de suspensão e de anulação de deliberações sociais”.

Insurge-se a Ré contra o decidido, com a alegação de que o vício de incompetência material do tribunal do comércio é imputável ao autor, e que a opção por intentar a ação naquele tribunal não é defensável, consolidada que está desde 99 no nosso ordenamento jurídico que esta opção constitui um erro.

A questão a decidir passa por determinar se a propositura da ação na Instância  Central, secção de comércio (em vez da sua propositura num tribunal de competência genérica, como o é a instância local) de uma ação para a anulação de deliberações sociais de uma associação civil, constitui “um motivo processual não imputável ao titular do direito” para efeitos de se considerar que o autor beneficia do prazo suplementar de dois meses após o trânsito em julgado da primeira ação previsto no nº2 do artigo 327º do CC.

A questão suscitada pela referida norma reside na determinação a dar à expressão “motivo processual não imputável ao titular do direito”.

Como salienta Filipa Morais Antunes[1], o nº3 do artigo 327º não poderá ser dissociado de uma ideia de culpa, devendo entender-se que o legislador faz depender a dilação do efeito interruptivo da prescrição da ausência de um comportamento do titular do direito suscetível de ser objeto de censura. A aplicação da norma está assim dependente da insusceptibilidade de se poder qualificar a conduta processual do titular do direito como culposa.

  Defende o apelante que “a opção por intentar a ação no tribunal do comércio não é defensável “consolidada que está desde 99 nosso ordenamento jurídico que tal opção constituiu um erro”. Contudo, a apelante não justifica, de todo, tal afirmação que, além do mais, não podemos acompanhar.

E que a determinação da atribuição da competência para julgar as ações de anulação de deliberações sociais quando respeitantes a associações – ao tribunal de competência especializada de comércio ou a um tribunal com competência genérica –, não será isenta de dúvidas (face à atribuição de competência que lhe é feita pela al. f), do nº2 do artigo 182º da LOFTJ, para julgar “ações de anulação de deliberações sociais”), resulta, desde logo, da leitura do despacho de indeferimento liminar que, acabando por considerar incompetente tal tribunal, absolveu a ré da instância, onde se afirma:

Sem prejuízo de (como muito bem salienta o requerente) termos aceite a competência para tramitar um procedimento cautelar de suspensão de deliberações sociais de uma associação (precisamente a requerida nos presentes autos) e que terminou na homologação da transação – no âmbito do processo nº169/14.7T8FNBD – certo é que já tivemos oportunidade de, em sede de novo procedimento, reponderar a apreciação que efetuámos naquela altura, invertendo o entendimento que nesse momento perfilhamos (e que na realidade não decidimos de forma expressa mas apenas tácita) julgando, neste momento, não ser este tribunal o competente para apreciar este tipo de procedimentos cautelares/ações.”

Ora, assimilando o conceito de culpa ao de imputabilidade, os tribunais têm recusado reconduzir ao conceito de motivo processual imputável ao titular do direito aquelas situações em que a complexidade do caso ou as dificuldades hermenêuticas podem justificar, nomeadamente a escolha de um tribunal incompetente[2].

Também Adriano Vaz Serra[3] dá como ex. de uma decisão de extinção da instância fundada numa conduta processual não culposa, a hipótese de não lhe ser imputável o facto de ter proposto uma ação num tribunal incompetente, por ser difícil a interpretação da lei sobre competência.

Assim sendo, é de confirmar a decisão recorrida, na parte em que julgou improcedente a exceção de caducidade do direito do autor.


*

2. Anulabilidade das deliberações por irregularidades na convocação da assembleia

Pretendendo o autor que se declare a anulabilidade do deliberado na assembleia de 27 de outubro pelas 10 horas com fundamento em diversas irregularidades ao nível da convocação de tal assembleia e da comunicação da mesma aos sócios, o juiz a quo veio dar procedência a tal pedido, considerando que tal assembleia foi convocada por entidade (Presidente da mesa da Assembleia Geral) que não dispunha de poderes estatutários para o efeito.

Insurge-se a ré contra o decidido, com a alegação de que o termo “administração” utilizado no artigo 173º, nº1 do CC não pode ser entendido como limitado ao órgão “Direção”, contendo uma indicação enumerativa e não taxativa, até porque o nº3 atribui tal faculdade igualmente a qualquer associado.

Dispõe a tal respeito o citado artigo 173º, CC. sob a epígrafe: “Convocação da assembleia”:

“1. A assembleia geral deve ser convocada pela administração nas circunstâncias fixadas pelos estatutos e, em qualquer caso, uma vez em cada ano para a provação do balanço.

2. A assembleia será ainda convocada sempre que a convocação seja requerida, com um fim legítimo, por um conjunto de associados não inferior à quinta parte da sua totalidade, se outro número não for estabelecido nos estatutos.

3. Se a administração não convocar a assembleia nos casos em deve fazê-lo, a qualquer associado é lícito efetuar a convocação.”

Antes de mais, haverá que começar por distinguir a convocação da assembleia, a que se refere o artigo 173º - ato pelo qual os membros de um órgão coletivo, no caso, os associados, são chamados a reunir-se – da convocatória a que se refere o artigo 174º – instrumento em que se materializa a convocação.

Os estatutos da pessoa coletiva designam os respetivos órgãos, entre os quais um órgão colegial de administração constituído por um número impar de titulares, dos quais um será o presidente, e um órgão de fiscalização, que pode ser constituído por um fiscal único ou por um número impar de titulares, dos quais um será o presidente – artigo 162º CC.

Segundo o artigo 8º do respetivo Estatuto, são órgãos do Agrupamento Réu: a) a assembleia geral; b) a direção; e c) o conselho fiscal.

A assembleia deve ser convocada pela “administração”, que corresponde ao órgão executivo da associação, sendo que, nas associações sem fins lucrativo tal órgão de gestão designa-se habitualmente por “direção”.

No caso em apreço, a direção era composta por um Presidente e dois vogais (artigo 11º) dos Estatutos.

Sendo a direção um órgão colegial, a mesma é convocada pelo respetivo presidente e, só podendo deliberar com a presença da maioria absoluta dos respetivos membros, salvo disposição legal em contrário as deliberações são tomadas por maioria de votos dos titulares presentes (artigo 171º CC).

Em caso de silêncio dos estatutos:

a) Cabe à direção representar a associação em juízo e fora dele (art. 163º nº 1 C.Civil).

b) A direção terá poderes de simples administração ordinária, dependendo a sua atuação das deliberações da assembleia geral (art. 172º nº 1 e 2 C.Civil).

c) É a assembleia geral que elege a direção (art. 170º C.Civil).

d) É da competência imperativa da assembleia geral a destituição da direcção (art. 170º nº 2 C.C).

e) É a direção que convoca a assembleia geral (art. 173º C.C).

Quanto à assembleia deverá ser convocada pelo referido órgão executivo.

Como salienta Luís A. Carvalho Fernandes[4], embora a lei não lhe faça referência expressa em matéria de associações, é recorrente a previsão no estatuto de uma espécie de subórgão, a chamada mesa da assembleia geral, que tem um presidente e um ou mais secretários que asseguram a direção e a boa ordem dos trabalhos da assembleia e o respetivo expediente, nomeadamente a elaboração da ata. A regra é atribuir ao presidente a função da sua convocação. Contudo, há que distinguir entre o ato material de convocação e o poder (que deve ser entendido como um poder dever) de pedir (rectius, exigir) a sua convocação.

Ainda segundo tal autor, sendo desta última questão que se ocupa o artigo 173º, deve entender-se que o presidente da mesa da assembleia geral não cabe o direito de convocar a assembleia, por sua iniciativa. Bem pelo contrário tem o dever de o fazer sempre que a convocação lhe seja pedida por quem, para tanto, tenha poderes.

Em igual sentido se pronuncia António Vilar de Macedo: “A competência para convocar a assembleia é, em exclusivo, do órgão da administração – a vulgarmente denominada direção. A atribuição de competência de convocar nas sessões da assembleia a uma entidade diversa redundaria numa ingerência intolerável nas competências da direção[5].”

No caso em apreço, os respetivos estatutos preveem como órgãos do agrupamento: a) A assembleia geral; b) a Direção; c) o Conselho Fiscal (artigo 8º dos Estatutos).

Aí se prevê que a Assembleia Geral – órgão supremo do agrupamento constituída por todos os sócios – é presidida por uma mesa, composta por um Presidente, e dois secretários, e funciona nos termos legais (artigo 9º)

Quanto à Direção é composta por um Presidente e dois vogais devendo reunir pelo menos uma vez por mês (artigo 11º Estatutos), incumbindo-lhe, nos termos do artigo 12º do Estatuto:

a) Dirigir e gerir o bom funcionamento do Agrupamento

b) Criar, organizar e dirigir os serviços do Agrupamento

c) Aprovar ou rejeitar a admissão dos associados

(…)

g) Exercer todas as demais funções decorrentes da lei, dos Estatutos e regulamento interno.

No caso em apreço, da respetiva convocatória consta que a assembleia geral extraordinária é convocada por (…), na qualidade de “Presidente da mesa da assembleia geral da S(…)”, pessoa que assina tal convocatória. E podia a convocatória estar assinada pelo presidente da mesa, e a deliberação sobre a sua convocação ter sido tomada por deliberação da mesa ou da direção. Efetivamente, podia, mas, não tendo tal facto sido alegado pela Ré, a quem o mesmo aproveitaria, temos de ter por provado que a assembleia em causa foi convocada, não por qualquer órgão colegial, mas por (…), na qualidade de presidente da mesma.

Ou seja, não é alegado que tenha sido a direção a deliberar ou que tenha tido qualquer intervenção na decisão de convocação da assembleia.

Assim sendo, confirma-se o entendimento da decisão recorrida no sentido de que, no silêncio dos Estatutos é à direção que incumbe deliberar sobre a convocação da assembleia geral, sendo a consequência a anulabilidade das deliberações socias tomadas na assembleia geral convocada naqueles termos.


*

3. Abuso de direito

Invoca a apelante a existência de abuso de direito por parte do autor, na modalidade de venire contra factum proprium, alegando que, se é verdade que a Assembleia de 27 de outubro de 2014 foi convocada pelo Presidente da mesa, tal assim sucedeu durante os últimos quinze anos, sendo que, entre 2002 e 2013 o autor integrou o Conselho Fiscal, órgão ao qual presidiu entre 2005 e 2013, sem que tal procedimento tenha merecido ao autor algum reparo.

A sentença recorrida nega a verificação do invocado abuso de direito, com base na seguinte argumentação:

Antes de mais, não poderá olvidar que estamos no domínio de uma associação de direito privado sem fins lucrativos e não perante uma sociedade comercial, razão pela qual, muito embora igualmente se entendam aplicáveis por analogia os normativos do Código das Sociedades Comerciais, a verdade é que a aplicação analógica terá de se efetuar cum grano salis.

Nesta medida, entende-se que não se poderá exigir o mesmo nível/intensidade de diligência aplicáveis aos titulares de órgãos sociais com funções de fiscalização das pessoas coletivas, dado o carácter eminentemente profissional e lucrativo destas.

Neste aspeto, nem sequer se sabe se as funções então exercidas pelo autor eram ou não remuneradas, sendo certo que «uma remuneração digna reforça os graus de exigência dos sócios e conduz a uma maior responsabilidade dos remunerados.» - cf. neste sentido, acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 27-05-2002, relatado por FONSECA RAMOS, disponível no site www.dgsi.pt.

Por outro lado e sobretudo, não surge alegado que o autor, enquanto exercia as suas funções nos órgãos da associação em causa, tivesse tido conhecimento/consciência de que o procedimento de convocação das assembleias gerais era ilícito/irregular, e, ainda assim se tenha conformado sistematicamente com ele, ou tenha com ele concordado abertamente.

Neste caso, aí sim, poderíamos falar com propriedade em abuso de direito, na modalidade de “venire contra factum proprium”.

Ora, para nós, o facto de não vir alegado expressamente que o autor sabia que tal forma de convocação era irregular, prejudica a aferição do abuso de direito, dado que é de admitir que as pessoas mais e melhor informadas acerca dos procedimentos em apreço possam alterar a sua conduta anterior.

Assim, o que desponta é a circunstância de a assembleia geral ter sido sistematicamente convocada de forma irregular, sem que que se conhecessem oposições dos associados ou órgãos da associação em causa, incluindo do autor.

Porém, quanto a nós, não podemos concluir a partir da repetição e eternização da irregularidade por uma espécie de imunidade jurídica por via da figura do abuso de direito, como se uma irregularidade repetida várias vezes deixasse, na prática, de o ser, sobretudo, como vimos, no campo da violação de normas imperativas.

Por conseguinte, não se sabendo se o autor calou todos estes anos a irregularidade apontada, estando perfeitamente ciente da mesma, ou tenha expressamente concordado com a mesma, é, quanto a nós, de afastar o invocado abuso de direito.”

Pela nossa parte, subscrevendo inteiramente o raciocínio e a solução a que se chegou na sentença recorrida, acrescentaremos, ainda, um último argumento no sentido da não verificação de uma situação de abuso de direito.

É que, embora se tenha feito constar do ponto 42 dos factos dados como provados que “Pelo menos nos últimos quinze anos têm sido convocadas as Assembleias Gerais da Ré pelo Presidente da Mesa da Assembleia Geral da Ré e não pela sua Direção”, tal facto não poderá ser tido por assente, pelo menos, não com o sentido que o apelante pretende.

Com efeito, com a alegação que faz de tal facto no art. 53º da sua contestação, a Ré procede à junção, como doc. 5 a 9, de cópia das convocatórias respeitantes às assembleias a realizar nos anos de 2000, 2004, 2005, 2012 e 2013. E a alegação da Ré/apelante cai pela base quando, da leitura de tais convocatórias se constata que, embora assinadas pelo Presidente da mesa, pelo menos, nos anos de 2004 e 2005, foi a Direção quem, pelas reuniões ocorridas nos dias 09.01-2004 e 21-01-2005, respetivamente, convocou a Assembleia Geral da mencionada Associação[6]. Ou seja, como já foi referido, uma coisa é estar o Presidente da Mesa encarregado de executar os procedimentos necessários à convocação da assembleia, entre os quais o de assinar o aviso da convocatória e de enviar as notificações a cada um dos associados, e outra é a decisão em si de convocar a assembleia. E essa, como consta expressamente da cópia das convocatórias juntas aos autos, foi, pelo menos nos anos de 2004 e de 2005, tomada pela Direção.

A apelante não juntou aos autos as convocatórias respeitantes aos anos de 2006 a 2011, limitando-se a juntar cópia das Convocatórias respeitantes às assembleias de 2012 a 2014, essas sim, em que surge o referido (…), a, na qualidade de Presidente da Mesa da Assembleia, convocar a Assembleia.

Ora, por si só, o facto de durante os dois anos anteriores a assembleia ter sido convocada nos mesmos termos da aqui impugnada, e de, nesses dois anos, o autor ter presidido ao conselho fiscal da Ré sem que tenha arguido tal vício junto dos tribunais, é claramente insuficiente para preencher uma situação de abuso de direito. Sobretudo se se entender que, encontrando-nos aqui perante normas imperativas, haverá um interesse público em que tais irregularidades não se repitam.

Assim sendo, afastada fica a caraterização do comportamento do autor como integrando um abuso de direito na invocada modalidade de venire contra factum proprium, desde logo, por falta do primeiro dos requisitos – existência de uma posição jurídica contraditória com uma conduta anteriormente assumida ou proclamada pelo agente[7].

A apelação é de improceder, sem outras considerações.

IV – DECISÃO

 Pelo exposto, acordam os juízes deste tribunal da Relação em julgar a apelação improcedente, confirmando a decisão recorrida.

Custas da apelação pela apelante.

                                                                            Coimbra, 15 de dezembro de 2016

Maria João Areias ( Relatora )

Vítor Amaral

Luís Cravo

 V – Sumário elaborado nos termos do artigo 663º, nº7 do CPC.

1. A propositura na secção de comércio da instância central, de uma ação de anulação de deliberações sociais respeitante a uma associação, que deu azo ao seu indeferimento liminar por incompetência do tribunal, não constitui um “motivo processual imputável ao titular de direito”, para efeitos de afastar a atribuição do prazo suplementar previsto no nº2 do artigo 327º CC.

2. A competência para convocar a assembleia geral reside em exclusivo no órgão da administração, designado vulgarmente de Direção relativamente às associações sem fins lucrativos.

3. O facto de o autor, tendo pertencido ao conselho fiscal durante alguns anos, não ter invocado determinadas irregularidades na convocatória de assembleias gerais respeitantes a anos anteriores, não constitui qualquer comportamento contraditório com a sua atitude de, face a uma assembleia na qual é rejeitada a lista à qual pertence, vir arguir a anulabilidade das deliberações tomadas nessa assembleia com base nessas mesmas irregularidades.


 


[1] “Algumas questões sobre prescrição e Caducidade”, in Estudos em homenagem ao Prof. Doutor Sérvulo Correia, pág. 54, e “Prescrição e Caducidade, Anotação aos artigos 296 a 333º do CC).
[2] Neste sentido, Ana Filipa Morais Antunes, artigo citado, pág. 57.
[3] Prescrição extintiva e Caducidade”, BMJ nº106, pág. 257 e 258, nota 1010.
[4] “Teoria Geral do Direito Civil, I Introdução Pressupostos da Relação Jurídica”, 6ª ed. Universidade Católica Editora, pág. 640.
[5] “As Associações no Direito Civil”, Coimbra Editora 2007, pág. 95.
[6] Cfr., Convocatória junta a fls. 122 do processo físico, onde consta “Nos termos do nº1 do artigo 173º do Código Civil conjugado com o disposto na alínea G) do artigo 12º dos Estatutos da S (…) (…), a Direção, por reunião ocorrida no dia 09/01/2004, pela qual foi feita a acta nº 25 convoca a Assembleia Geral da mencionada associação (…), e no final “Esta convocatória de Assembleia Geral, apesar de ter sido deliberada conforme obriga a lei, pela Direção, vai assinada pelo membro da mesa da assembleia geral que exerce a função de Presidente, por ser tradição da associação”. Quanto à convocatória respeitante a 2005, junta a fls. 123, ostenta uma redação exatamente igual à de 2004.
[7] Os efeitos do abuso do direito nesta especial modalidade exigem a verificação dos seguintes pressupostos, que aqui se não verificam: 1. Uma situação objetiva de confiança: uma conduta de alguém que de facto possa ser entendida como uma tomada de posição vinculante em relação a dada situação futura; 2. Investimento na confiança: o conflito de interesses e a necessidade de tutela jurídica surgem quando uma contraparte, com base na situação de confiança criada, toma disposições ou organiza planos de vida de que lhe surgirão danos se a confiança legítima vier a ser frustrada; 3. Boa-fé da contraparte que confiou: a confiança do terceiro ou contraparte só merecerá proteção jurídica quando de boa-fé e tenha agido com cuidado e precaução usuais no tráfico jurídico – neste sentido, entre outros, Baptista Machado, “Tutela da confiança e venire contra factum proprium”, in Obra Dispersa, Vol. I, pág. 415 a 418.