Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
360/12.0T2AND.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: MARIA JOSÉ GUERRA
Descritores: ACIDENTE DE VIAÇÃO
ACIDENTE DE TRABALHO
SEGURADORA
SUB-ROGAÇÃO
PRESCRIÇÃO
Data do Acordão: 12/18/2013
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso:
COMARCA DO BAIXO VOUGA - ANADIA - JUÍZO DE GRANDE INST. CÍVEL - JUIZ 2 -
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTS.304, 306, 309, 498, 524, 533, 593 CC, BASE XXXVII DA LEI 2127 DE 3/8/1965, LEI Nº 100/97 DE 13/9, LEI Nº 98/2009 DE 4/9
Sumário: 1. Na sub-rogação legal verifica-se uma sucessão, uma transmissão do crédito - que mantém a sua identidade e os seus acessórios - apesar da modificação subjectiva operada: o credor sub-rogado continua o direito de crédito anterior, no todo ou em parte, consoante a sub-rogação seja total ou parcial; no direito de regresso, por exemplo, no caso paradigmático nas obrigações solidárias, existe um direito novo, que nasce ou se constitui na esfera do solvens, em consequência do cumprimento de uma obrigação: é um novo direito de crédito a que corresponde também um novo dever de prestar.

2. Apesar de na letra da lei ( Base XXXVII da Lei 2127, de 3 de Agosto de 1965 e Art. 31º Nº4 Lei nº 100/97, de 13 de Setembro ) se aludir expressamente a direito de regresso nas situações nela contempladas, a doutrina e jurisprudência vêm entendendo que apesar disso, o direito da entidade patronal ou da seguradora que tenha pago a indemnização pelo acidente simultaneamente de trabalho e de viação tem direito, por força da sub-rogação, ao reembolso da indemnização que satisfez do responsável civil pelo acidente de viação.

3. Tal entendimento veio a obter consagração legal no RJATDP constante da Lei 98/2009, de 04 de Setembro, que actualmente se encontra em vigor.

4. Para o exercício do direito de sub-rogação que se operou em relação ao direito do lesado contra os causadores do acidente de que advieram os danos que determinaram a obrigação de reparação a cargo da entidade patronal ou da seguradora, o prazo de prescrição é o previsto no Artº 498º do CC.

5. A contagem de tal prazo inicia-se a partir da satisfação da obrigação de indemnização que, por força do contrato de seguro, vincula a entidade patronal ou a seguradora.

6. Tratando-se de prestações periódicas, como é o caso das pensões por morte devidas ao cônjuge e aos filhos do sinistrado falecido, o prazo para o exercício do direito unitário em relação ao reembolso das mesmas conta-se a partir do pagamento da primeira delas.

Decisão Texto Integral: Acordam os juízes do Tribunal da Relação de Coimbra

I- Relatório

            1. A A., A... Companhia de Seguros, S.A. veio propor a presente acção sob a forma de processo ordinário contra a R. Companhia de Seguros , S.A., pedindo, entre o mais, o seguinte:

         i) A Condenação da R. no pagamento à A. da quantia global de € 105.060,19, reportando-se € 25.860,61 a juros de mora vencidos sobre o capital de € 35.560,77 desde 25.09.2003 a 15.11.2011, € 25.009,10 a pensões pagas pela Autora desde 21/06/2006 a 30/06/2012 à viúva e filhos do falecido M (…) e € 54.190,48 a reserva matemática constituída pelas pensões futuras, e ainda juros de mora à taxa legal sucessivamente aplicável para as transacções comerciais, contabilizados sobre o valor de capital de € 79.199,58, desde a citação para a presente acção até integral e efectivo pagamento; e

         ii) Subsidiariamente, e para a eventualidade de assim se não entender, ser a R. condenada a pagar à A. a importância global de € 105.060,19, reportando-se € 25.860,61 a juros de mora vencidos sobre o capital de € 35.560,77 desde 25.09.2003 a 15.11.2011, € 25.009,10 a pensões pagas pela Autora desde 21/06/2006 a 30/06/2012 à viúva e filhos do falecido M (…), e € 54.190,48 a reserva matemática constituída pelas pensões futuras, e ainda juros de mora à taxa legal sucessivamente aplicável para as transacções comerciais, contabilizados sobre o valor de capital de € 79.199,58, desde a citação para a presente acção até integral e efectivo pagamento, a título de restituição por enriquecimento sem causa justificativa.

         Alegou, para tanto, que sob o nº 996/03.0TBALB correram os autos de processo ordinário, nos quais foi proferida sentença a condenar a Ré no pagamento à Autora da quantia global de € 35.560,77, já transitada em julgado, após confirmação por Acórdãos da Relação de Coimbra e Supremo Tribunal de Justiça juntos aos autos, correspondente ao reembolso de montantes parcelares pagos pela ora Autora aos herdeiros da infeliz vitima, em sede de acidente de trabalho, e por causa da regularização do sinistro estradal, e simultaneamente, acidente de trabalho, até 21/06/2006, no qual se considerou a Ré obrigada a proceder ao seu pagamento em virtude de se decidir aí que o acidente de viação e simultaneamente acidente de trabalho, que vitimou a infeliz vítima M (…) foi causado pelos riscos de circulação do veículo «OB» (ou seja, responsabilidade pelo risco), cujo proprietário havia transferido a responsabilidade civil pela indemnização por danos causados pela circulação do veículo para a ora Ré através da apólice nº 1607571; também se decidiu aí que a obrigação do responsável não abrangia as pensões futuras, ou sequer as reservas matemáticas; em cumprimento do ai decidido, a Ré procedeu, em 15/11/2011, ao pagamento à Autora da quantia de capital de €35.560, 77 acrescido da quantia de € 2.077,14 a título de juros moratórios legais; posteriormente, e reportado ao período compreendido entre 21/06/2006 e até 30/06/2012, a Autora despendeu mais €25.009,10 com as pensões devidas à viúva e filhos da infeliz vitima, em sede de acidente de trabalho, e por causa da regularização do sinistro estradal, e simultaneamente, acidente de trabalho, assistindo-lhe, assim, o direito de ser reembolsada de tais quantias nos mesmos termos do decidido anteriormente nos autos atrás mencionados.

         2. Regularmente citada, a R. Companhia de Seguros B..., S.A. deduziu contestação, na qual se defendendo-se por excepção e por  impugnação.

         Por impugnação, defende-se por negação directa quanto aos montantes

parcelares pagos pela Autora aos herdeiros da infeliz vitima.

         Por excepção, invocou a prescrição extintiva da obrigação de reembolso das quantias parcelares pagas, por um lado, e que o valor reclamado pela Autora, no caso de não se verificar a prescrição extintiva, excede, tendo em conta os montantes já pagos à Autora e outros lesados, em consequência do sinistro, em discussão, o limite legal do capital seguro obrigatório automóvel de €600.000,00, em vigor à data do acidente, por outro lado.

            3. Replicou a A. A... - Companhia de Seguros, S.A.,  pugnando pela improcedência das alegadas excepções de prescrição e violação da limitação legal da obrigação indemnizatória da Ré, alegando, sucintamente, que o prazo prescricional é de 20 anos em virtude de uma sentença condenatória ter reconhecido tal direito à Autora, e mesmo se, assim, não se entendesse, então, só as prestações pagas a mais de 3 anos em relação à citação da Ré estariam prescritas, e quanto ao limite legal do capital seguro obrigatório automóvel, deflui do contrato de seguro automóvel que o proprietário do veículo seguro e a Ré asseguraram pelo montante máximo de €1.250.000,00 os danos emergentes dos riscos de circulação do dito veículo automóvel, e só, assim, se compreendendo, que a Ré, à ordem de outro processo, transigiu pelo montante de € 500.000,00 com outro(s) lesado(s) numa altura em que já havia sido condenada a pagar outros valores que implicavam, então, que excedesse o tal limite legal, afigurando-se, assim, de ambíguo, o entendimento sustentado pela Ré.

            4. Depois de cumprido o contraditório, ao abrigo do Art. 3º Nº3 do C.P.C., no que tange à questão da violação do caso julgado material decorrente do segmento do petitório formulado nos presentes autos em que a A. peticiona a condenação da R. no pagamento da reserva matemática constituída pelas pensões futuras no montante de € 54.190,48, por se antever que tal questão poderia ter ficado dirimida na decisão proferida no âmbito da acção ordinária Nº 576/2002 do 2º Juízo do Extinto Tribunal Judicial da Comarca de Albergaria-a-Velha, foi proferido despacho saneador, no qual de procedeu à apreciação oficiosa da excepção dilatória de caso julgado material quanto ao segmento do pedido condenatório formulado nos autos de pagamento da quantia de € 54.190,48 referente a reserva matemática constituída pelas pensões futuras e respectivos juros de mora, seleccionando-se, ainda, no mesmo a matéria de facto assente e controvertida, a qual se fixou após reclamação apresentada pela R. que foi deferida.

         5. Após se proceder à realização das diligências instrutórias, procedeu-se à realização de audiência final, com observância das formalidades legais, em sede da qual, a Autora ampliou o pedido reportado às pensões pagas até Abril de 2013, para o valor global de € 30.820,44, ampliação essa que foi admitida, tendo as partes admitido, por acordo, o único facto controvertido reportado ao pagamento de tal montante global e a esse título e prescindido das alegações finais.

         6. Proferida sentença, veio esta a decidir-se pela condenação da R. no pagamento à A. da quantia de € 30.820,44, acrescida de juros moratórios, à taxa em vigor de 4% a contar da citação até integral e efectivo pagamento.

 

         7. Inconformada com tal decisão dela veio a R. interpor recurso, cujas alegações remata com as seguintes conclusões:

         (…)

         8. Contra-alegou a A. terminando as contra-alegações com as seguintes conclusões:

         (…)

II – ÂMBITO DO RECURSO

Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões da recorrente não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, sem prejuízo das de conhecimento oficioso ( Arts. 684º, nº 3, 685º-A e 660º, nº 2, do CPC na redacção anterior à Lei 41/2013, de 26.06, por ser esta versão a aplicável ao presente recurso), são as seguintes as questões a apreciar:

         I- saber se se mostra prescrito o direito da A.;

II- saber se mostra excedido o limite legal até ao qual a R. pode ser responsabilizada.

 

III – FUNDAMENTAÇÃO

A) De Facto

A 1ª instância considerou provada a seguinte factualidade:

         1-Sob o nº 996/03.0TBALB, correram autos de acção ordinária nos quais, após apensação à acção ordinária nº 576/2002, no extinto Tribunal Judicial de Albergaria-a-Velha, foi proferida douta Sentença Judicial constante de fls. 477 e ss., já transitada em julgado, por mor do qual se julgou procedente, por provado o pedido formulado pela então interveniente I..., Companhia de Seguros, S.A., que reclamou aí o reembolso dos montantes despendidos e que viesse a despender em regularização do sinistro estradal em discussão naqueles autos, na sua vertente de acidente de Trabalho, e consequentemente, condenou a ora Ré a pagar à, ora, Autora a quantia global de €. 35.560,77.

         2-A sentença aludida em a), obteve confirmação, por Acórdãos proferidos pelo Tribunal da Relação de Coimbra e do Supremo Tribunal de Justiça constantes de fls. 410 a 476 e de fls. 376 a 409, respectivamente.

         3-Nos autos aludidos em 1), foram julgados provados os factos seguintes, com relevância para a presente instância:

         “ /…/

         a) M (…), pai dos autores M (…) e F (…) faleceu no dia 10.11.1999 no estado de casado com a autora E (…);

         /…/

         c) Entre a empresa Transportes (…), Lda. e a Interveniente I..., S.A., foi celebrado um contrato de seguro de acidentes de trabalho, titulado pela apólice nº 29120838, na modalidade de folha de férias

         d) Por contrato de seguro titulado pela apólice nº 1607571, em 10.11.1999 encontrava-se transferida para a Interveniente/Ré B..., S.A., a responsabilidade pelos danos causados com a circulação do veículo e reboque de matrículas (...)HR e L-108975;

         /…/

         f) O referido veículo pesado de mercadorias de matrícula (...)HR tinha acoplado o reboque com a matrícula L-103975 e era propriedade de Transportes Dora, Lda., e no dia 10.10.1999 era conduzido pelo funcionário desta empresa, J (…);

         /…/

         i) No dia 10.11.1999, pelas 18.00 horas, a interveniente/ré C (…)conduzia o veículo ligeiro de passageiros com a matrícula (...)LM, na A1, no sentido norte-sul, pela via de trânsito da esquerda;

         j) A faixa de rodagem no local e no sentido em que circulava o LM tem uma largura de 7,40 e a berma 2,50 metros;

         l) Na altura o piso estava bom e fazia bom tempo;

         m) Era já ao escurecer e a Interveniente/Ré Carla podia avistar, com as luzes do veículo, a faixa de rodagem em toda a sua largura;

         n) Ao chegar ao Km 245,760 daquela estrada e ao entrar numa curva à esquerda, com boa visibilidade, o LM embateu numa tela pneumática que se encontrava na mesma via;

         o) Em consequência desse embate, a interveniente/ré C (…) não conseguiu controlar o LM na fila de trânsito por onde seguia, que, desgovernado, invadiu a fila de trânsito à sua direita, aproximou-se da berma direita e invadiu essa mesma berma;

         p) E foi embater com o LM em M (…) e A (…), que na altura se encontravam na berma, onde se encontrava também, além de outros, o veículo ligeiro de matrícula 49-49-LB;

         q) Em consequência do referido embate, M (…)  e A (…) foram projectados para o talude que rodeia a berma da estrada;

         r ) Em consequência do descrito em p) e q) , M (…) sofreu lesões toraxico-abdominais, nomeadamente a nível cardio-pulmonar e víscero abdominal, as quais vieram a constituir causa directa e necessária da sua morte;

         s) M (…) conduzia o veículo pesado com a matrícula 90-37-OB, propriedade da sua entidade patronal, quando foi embatido pela tela de um pneumático de outro veículo pesado que seguia á sua frente;

         t) Por tal facto, o M (…) parou o OB na berma da estrada e saiu do veículo.

         u) As despesas do funeral M (…) importaram na quantia de €. 1.352,30;

         v) À data do sinistro, M (…) exercia a actividade de motorista de pesados aos serviço de Transportes (…) Lda., auferindo o vencimento mensal ilíquido de € 561,23, acrescido de ajudas de custo no montante médio mensal de € 408,76;

         /…/

         e-1) Por morte do marido, a autora E (…) passou a receber da interveniente I..., S.A., uma pensão anual no montante de € 2.240,64 e a pensão anual e temporária de cada filho menor no montante de € 1.493,76;

         /…/

         i-1) No momento descrito em n) , em função da localização daquela tela na via e condições de circulação, a interveniente/ré C (…) não tinha possibilidades de evitar o embate na referida tela pneumática;

         j-1) A presença da referida tela pneumática na via apenas era perceptível para nos automobilistas quando já estavam muito próximos dela;

         l-1) A tela supra referida fora deixada cair na faixa de rodagem pelo veículo pesado de mercador ias de matrícula (...)HR / L-1013975, fruto de descolagem do resto do pneu;

         m-1) Essa tela havia caído na via pouco tempo antes do referido embate na mesma pelo LM;

         n-1) O HR era conduzido por J (…) ao serviço da sua proprietária, Transportes (…), Lda., e com o conhecimento e autorização desta;

         o-1) Após a queda da tela pneumática, o J (…) veio a parar o HR a cerca de 2,5 quilómetros mais à frente para troca do pneumático de onde a tela se havia descolado;

         p-1) O falecido M (…) era, à data do sinistro, trabalhador de Transportes Ideal (…), Lda., na qualidade de motorista;

         q-1) Em cumprimento do contrato aludido em c), e até 31.12.2003, a interveniente I..., S.A., pagou aos autores E (…) e filhos prestações a título de pensão anual temporária, num total de €. 10.881,15 à autora E (…)e num total de €. 7.358,23 a cada um dos filhos de M (…);

         r -1) Em reembolsos de despesas de funeral, transladação e despesas judiciais e de regularização de sinistro a interveniente I..., S.A. , despendeu €.1.434,71;

         /…/

         e-2) Após a data em que a interveniente I..., S.A., formulou pedido de reembolso nos presentes autos, pagou aos autores Elisabete e filhos, além daquele valor e até 21.02.2006, a importância global de €. 8.528,45, a título de pensões laborais;

         /…/ ”

         4-Em cumprimento da Decisão proferida em 1), a Ré procedeu, em 15.11.2011, ao pagamento à autora da importância de € 37.637,91, reportando-se €. 35.560,77 ao capital decidido naquela Sentença judicial, e € 2.077,14 a juros de mora.

         5-No âmbito dos autos n.º 576/2002 aludidos em a) dos Factos Assentes, a ora Ré foi, ainda, condenada a pagar:

         i) À Autora A (…) (no Processo n.º 996/03.0TBALB, entretanto apenso ao Processo n.º 576/2002) o montante global líquido de €104.779,12, e ainda aquele que se liquidar em execução de sentença, relativo às despesas efectuadas com deslocações, refeições e tratamentos de fisioterapia e ao valor do computador portátil da Autora, acrescidos de juros de mora, à taxa legal de 4%, desde a data da citação até integral pagamento; e

         ii) À Autora A (…) e ao Interveniente S (…) a quantia líquida de € 450,00 e ainda aquela que se liquidar em execução de sentença, relativa ao prejuízo no veículo de matrícula 49-49-LB, acrescidas de juros de mora, à taxa legal de 4%, desde a data da citação até integral pagamento.

         6-No processo que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca de Albergaria-a- Velha (e, depois, no Juízo de Grande Instância Cível de Anadia, na Comarca do Baixo Vouga) sob o n.º 1152/05.9TBALB, a ora Ré foi demandada por C (…) (condutora do veículo de matrícula (...)LM, que provocou as referidas lesões nas pessoas de M (…) e A (…)), a qual peticionou o ressarcimento de todos os danos, patrimoniais e não patrimoniais, por si sofridos no âmbito do mesmo acidente de viação.

         7- Conforme decorre do teor da certidão junta a fls. 219 a 222, nos autos aludidos em f) dos Factos Assentes, Autora e aqui Ré transigiram nos seguintes termos:

         -A Autora reduz o pedido à quantia de €500.000,00 (quinhentos mil euros);

         - A Ré compromete-se a proceder ao pagamento da referida quantia, no prazo de trinta dias, por cheque a enviar, contra recibo, ao Ilustre Mandatário da Autora;

         - Com o recebimento das aludidas verbas, a Autora declara-se integralmente ressarcida de todos os danos patrimoniais e não patrimoniais, presentes e futuros, emergentes do acidente em discussão nos autos, incluindo, designadamente, os danos relegados para liquidação posterior, respeitantes à necessidade de sujeição da Autora a uma ou mais intervenções cirúrgicas, a tratamentos médico-estéticos e a assistência médica, medicamentosa, psiquiátrica e de fisioterapia, nada mais tendo a reclamar da Ré, seja a que título for;

         - As custas ainda em dívida a juízo serão pagas por Autora e Ré, na proporção do decaimento, sem prejuízo do apoio judiciário que a Autora beneficia, prescindindo ambas de custas de parte e procuradoria na parte disponível.”..

         8-…a qual foi homologada, por sentença datada de 7/06/2011, já transitada em julgado.

         9- À data do acidente em discussão, o capital seguro por riscos de circulação do veículo pesado de mercadorias e reboque, com matrículas (...)HR e L-108975; através da apólice nº1607571, era de esc. 250.000.000$00 (€1.246.994,74).

         10- Desde 21.06.2006 até 03/04/2013, a Autora tem continuado a pagar as pensões à viúva e filhos do falecido M (…), no montante global de 30.820,44 €, em regularização do sinistro.

         B) De Direito

         I- Iniciaremos a apreciação das questões suscitadas nas conclusões recursórias pela análise da prescrição do direito da A. pela qual pugna a R. recorrente e sobre a qual a sentença recorrida se pronunciou no sentido da respectiva improcedência.

         A A. ancora o direito a que se arroga nos presentes autos atinente ao pagamento de indemnização por si suportada com base num contrato de seguro de acidentes de trabalho, ao abrigo do qual foi responsabilizada pelo pagamento, com base na Lei de Acidentes de Trabalho, por danos patrimoniais, aos herdeiros da vitima de um acidente simultaneamente de trabalho e de viação, acidente este em relação ao qual se decidiu que era responsável civil pelo risco a aqui Ré, da qual, por isso, pretende obter o reembolso do montante por si pago aos referidos herdeiros do sinistrado em tal acidente.

         Apesar de tal não constituir propriamente dissenso entre as partes no presente recurso, cumpre antes de mais, dilucidar qual o direito que assiste à A. ora recorrida e que está subjacente à pretensão por esta deduzida, no sentido de esclarecer se o mesmo deve ser configurado como um direito de regresso ou, antes, como um direito sub-rogação.

         A distinção, em traços gerais, da sub-rogação e do direito de regresso afere-se, nas palavras de Almeida Costa, in Direito das Obrigações, Almedina, 11ª edição revista e actualizada, p. 826, da seguinte forma: pela sub-rogação, transmite-se um direito de crédito existente, ao passo que o direito de regresso significa o nascimento de um direito novo na titularidade da pessoa que, no todo ou em parte, extinguiu uma anterior relação creditória (art. 524º) ou à custa de quem esta foi extinta (art. 533º ).

         Na sentença recorrida, destrinçou-se a sub-rogação e o direito de regresso, partindo da consideração de que na sub-rogação legal se verifica uma sucessão, uma transmissão do crédito – que mantém a sua identidade e os seus acessórios, apesar da modificação subjectiva operada: o credor sub-rogado continua o direito de crédito anterior, no todo ou em parte, consoante a sub-rogação seja total ou parcial, enquanto que o direito de regresso, por exemplo, no caso paradigmático nas obrigações solidárias, é um direito novo, que nasce ou se constitui na esfera do solvens, em consequência do cumprimento de uma obrigação: é um novo direito de crédito a que corresponde também um novo dever de prestar.

         E, partindo de tal distinção, pelas razões que ali se aduzem, e que sufragamos por inteiro, considerou-se na sentença que o direito que a A. ora recorrida pretende exercer não se configura como um verdadeiro direito de regresso, mas antes como uma sub-rogação legal da seguradora da entidade patronal nos direitos do sinistrado contra o causador do acidente, na medida em que tiver pago a indemnização devida, visto que, do que efectivamente se trata é de a seguradora do acidente de trabalho ser colocada na posição de titular do direito de crédito indemnizatório satisfeito à sinistrada contra o terceiro civilmente responsável pelo evento causador da obrigação de indemnizar o seu segurado, não podendo, por isso configurar um verdadeiro direito de regresso, porquanto este é próprio do regime das obrigações solidárias previsto nos arts. 497.º e 524.º, e a situação que se equaciona nos autos não se enquadra neste regime.

         Embora a A. e ora recorrida o não tenha referido expressamente, apresenta-se isento de dúvidas que a pretensão que a mesma deduz nos autos se alcandora no disposto na Base XXXVII da Lei 2127, de 3 de Agosto de 1965, ou seja no regime legal vigente à data do acidente em apreço dos acidentes de trabalho ( porquanto a Lei nº 100/97, de 13 de Setembro,  que apenas entrou em vigor com a publicação do seu Regulamento aprovado pelo DL nº 143/99, de 30 de Abril cuja entrada em vigor ocorreu apenas em 1 de Janeiro de 2000, ou seja, posteriormente à data do acidente em apreciação nos autos ocorrido em 10.11.1999 ) que regia os acidentes, nos termos da qual “a entidade patronal ou a seguradora que houver pago a indemnização pelo acidente terá o direito de regresso contra os responsáveis referidos no n.º 1 – os terceiros causadores do acidente -, se a vítima não lhes tiver exigido judicialmente a indemnização no prazo de um ano, a contar da data do acidente”.

         Apesar de na letra da lei em vigor à data do acidente se aludir expressamente a direito de regresso nas situações nela contempladas, a doutrina e jurisprudência vêm entendendo que apesar disso, o direito da entidade patronal ou da seguradora que tenha pago a indemnização pelo acidente simultaneamente de trabalho e de viação tem direito, por força da sub-rogação, ao reembolso da indemnização que satisfez do responsável civil pelo acidente de viação -  vide neste sentido Profs. Vaz Serra, in RLJ, ano 111º, pág. 67, e Antunes Varela, in RLJ, ano 103º, pág. 30, e, entre outros, os Acs. do STJ de 17/04/2007,  de 27/06/2002, de 21/09/2006, de 20/10/98, de 17/12/2002 e de 21/01/2003, Acs. da RC de 31/10/2006,  de 03/07/2007, 25/09/2007  e de 17-03-2009 e Ac. R.P. de 16/02/2006, todos disponíveis em www.dgsi.pt.

         Na Lei 98/2009, de 04 de Setembro, que regulamenta actualmente o regime de reparação de acidentes de trabalho e de doenças profissionais, o legislador alterou no sentido que vinha sendo já entendido pela doutrina e jurisprudência  a alusão que vinha sendo feita ao direito de regresso para sub-rogação, como se colhe do disposto no Art. 17º Nº4 d mesma onde se prevê que:

         « O empregador ou a sua seguradora que houver pago a indemnização pelo acidente pode sub-rogar-se no direito do lesado contra os responsáveis referidos no n.º 1 se o sinistrado não lhes tiver exigido judicialmente a indemnização no prazo de um ano a contar da data do acidente.  »

         Assente, pois, que estamos em presença de uma situação de direito de sub-rogação, que, de acordo com os ensinamentos do Prof. Antunes Varela, in Das Obrigações em Geral, vol. II, 4ª. edição, pág. 324, é uma forma de transmissão de créditos, definindo-se, como sendo “a substituição do credor, na titularidade do direito a uma prestação fungível, pelo terceiro que cumpre em lugar do devedor ou que faculta a este os meios necessários ao cumprimento”, vejamos o que a respeito dela consta da nossa lei.

         Dispõe o Art. 593º do C. Civil:

         “ 1. O sub-rogado adquire, na medida da satisfação dada ao direito do credor, os poderes que a este competiam.

         2. No caso da satisfação parcial, a sub-rogação não prejudica os direitos do credor ou do seu cessionário, quando outra coisa não for estipulada.

         3. Havendo vários sub-rogados, ainda que em momentos sucessivos, por satisfações parciais do crédito, nenhum deles tem preferência sobre os demais “.  

         Da análise de tal preceito legal, retira-se que a sub-rogação supõe o pagamento, e, portanto, o terceiro que paga pelo devedor só se subroga nos direitos do credor com o pagamento, e, enquanto não o faz, não é sub-rogado e não pode por isso exercer o direito do credor, ou, dito de outra forma, para haver sub-rogação é necessário que se mostre efectuado ao pagamento por esse terceiro - vide, neste sentido RLJ 99º, 360 e Ac. do STJ de 10.12.1987, in BMJ 372º, 412.

         Embora a recorrente sustente no seu discurso recursório a configuração como direito de sub-rogação do direito que a A. e ora recorrida pretende fazer valer nos presentes autos, entende aquela, quanto à prescrição desse direito, que o prazo de prescrição que lhe é aplicável é o previsto o Nº 3 da Base XXXVIII do Regime Jurídico dos Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais - que estabelece que as prestações estabelecidas por decisão judicial prescrevem no prazo de um ano a partir da data do seu vencimento, acrescentando o n.º 4 do mesmo preceito que o prazo de prescrição não começa a correr enquanto os beneficiários não tiverem conhecimento pessoal da fixação das prestações – ou seja, o prazo de um ano que se conta a partir da data do vencimento dessas prestações e não do momento em que o pagamento foi efectuado.

         Vejamos se assim é.

         De acordo com os ensinamentos de Carlos Alberto da Mota Pinto, in Teoria Geral do Direito Civil, 3.ª Edição, Coimbra Editora, Coimbra, 1999, pp. 375 e 376, a prescrição “é um instituto endereçado fundamentalmente à realização de objectivos de conveniência ou oportunidade…”, mas “arranca, também, da ponderação de uma inércia negligente do titular do direito em exercitá-lo, o que faz presumir uma renúncia ou, pelo menos, o torna indigno da tutela do Direito, em harmonia com o velho aforismo «dormentibus non succurrit jus»”

         Prescreve-se no Art. 298º Nº1 do CC  que “ estão sujeitos a prescrição, pelo seu não exercício durante o lapso de tempo estabelecido na lei, os direitos que não sejam indisponíveis ou que a lei não declare isentos de prescrição”.

         Decorre de tal preceito legal que o decurso do prazo prescricional confere ao beneficiário a faculdade de se opor, por qualquer modo, ao exercício do direito prescrito (  Art. 304º Nº1 CC ),  iniciando-se aquele prazo a partir do momento em que o direito puder ser exercido ( Art. 306º Nº 1 do mesmo CC ), constituindo  a prescrição um excepção peremptória, implicando a absolvição do réu do pedido ( Art. 576º Nº3 do NCPC ).

         A apreciação que nos merece o entendimento da recorrente no sentido de que é o prazo prescricional previsto no Nº 3 da Base XXXVIII do RJATDP - que estabelece que as prestações estabelecidas por decisão judicial prescrevem no prazo de um ano a partir da data do seu vencimento, acrescentando o n.º 4 do mesmo preceito que o prazo de prescrição não começa a correr enquanto os beneficiários não tiverem conhecimento pessoal da fixação das prestações – que se aplica, com preterição do regime geral plasmado no Art. 498º Nº 1 do CC ao caso em vertente, é de manifesta rejeição do mesmo, por entendermos que o referido prazo prescricional de um ano não se aplica às situações em que, como a dos autos, a entidade obrigada por esses pagamento no âmbito da relação laboral se adianta a fazer o pagamento de tais pensões aos respectivos beneficiários e que depois pretende exigir os respectivo reembolso aos responsáveis em termos civis pelo evento lesivo gerador dessas pensões.

         E, tal assim é, porque o direito que a A. pretende exercer na presente acção, assentando na sub-rogação que se operou em relação ao direito do lesado contra os causadores do acidente de que advieram os danos que determinaram a obrigação de reparação a cargo daquela, tem por fundamento a responsabilidade civil extracontratual por facto ilícito, pelo que o prazo que da prescrição é o previsto no Artº 498º do CC.

         Na verdade, o disposto no Art. 498º Nº1 do CC é aplicável exclusivamente à responsabilidade extracontratual, ainda que baseada no risco funcionando as regras gerais da prescrição para a responsabilidade civil contratual cujo prazo geral se encontra fixado no Art. 309ºdo CC e os especiais nos demais preceitos desse e de outros diploma legais – neste sentido, vide Acs. do STJ, de 22-04-1986 e de 25-06.1986,in BMJ 356, pag. 349 e BMJ 358, pag. 570, respectivamente, e Ac. a Rel. do Porto, de 16-02-2006.

         Aqui chegados, e estando em causa nos autos a responsabilidade da devedora pelo risco, importa, então, equacionar a partir de que momento deverá contar-se o prazo de 3 anos previsto no citado Art. 498º Nº1 do CC por ser este o que lhe corresponde.

         Relembrando que a sub-rogação da A. e ora recorrida nos direitos dos lesados é a legal, operando-se por isso a investidura do solvens na posição até então ocupada pelo credor ope legis (Art. 592º Nº 1do CC) e que, por assim ser, o sub-rogado adquire, na medida da satisfação dada ao direito do credor, os poderes que a este competiam, querendo isto dizer que a sub-rogação coloca o sub-rogado na titularidade do mesmo direito de crédito, se bem que limitado pelos termos do cumprimento, que pertencia ao credor primitivo de acordo com o nº 1 do artigo 593º, convém também realçar-se que o crédito que a A. e ora recorrida pretende fazer valer nos presentes autos, porque de direito de sub-rogação se trata, apenas nasceu na esfera jurídica da mesma com o pagamento por ela efectuado, pelo que só a partir desse momento se poderá contar o prazo prescricional.

         Uma primeira, mas seguramente superficial, abordagem da questão poderia levar a considerar que o prazo prescricional de 3 anos previsto no Art. 498º Nº1 do CC deveria contar-se da data do evento lesivo – no caso o acidente – porque, sendo o crédito da A. sub-rogada o mesmo que pertencia ao antigo credor, e não um crédito novo, o devedor deveria poder opor à sub-rogado os mesmos meios de defesa que lhe seria lícito invocar contra o credor primitivo, pelo que o prazo continuaria a correr contra o sub-rogado, como se do primitivo credor se tratasse.

         Tal entendimento esbarra, porém, no facto de, como se deixou já referido, o fulcro da sub-rogação e a media dos direitos do sub-rogado ser o cumprimento e de, porque supõe o cumprimento, não poder deixar de entender-se que antes dele não há sub-rogação.

         De facto, sobre tal questão se pronunciou o então Assento 2/78, hoje Acórdão Uniformizador de Jurisprudência, proferido a 9.11.1977, publicado no D.R., I Série, de 22.3.1978, tirado a propósito de num caso de sub-rogação legal da seguradora de trabalho, idêntico ao dos presentes autos, no qual se decidiu que a “sub-rogação não se verifica em relação a prestações futuras”.

         Sendo hoje pacífico, doutrinal e jurisprudencialmente, que o terceiro que paga pelo devedor só se sub-roga nos direitos do credor com o pagamento - enquanto o não fizer não é sub-rogado e, consequentemente, não pode exercer os direitos do credor, pois que, não pode com razoabilidade aceitar-se que um prazo de prescrição comece a correr ainda antes de o direito se subjectivar, antes ainda de o respectivo titular o poder exercer (sem que possa excluir-se a hipótese de o direito prescrever antes mesmo de poder ser exercido).

         Acompanhamos, pois, o entendimento sufragado na sentença recorrida no sentido de que o prazo de prescrição a ter em conta é de 3 anos, contados do cumprimento da obrigação de indemnização que, por força do contrato de seguro, vincula o segurador.

         Já, porém, não sufragamos o entendimento expendido na mesma sentença recorrida quando nela se envereda por situar o início da contagem desse prazo prescricional de 3 anos no momento em que essa obrigação, por aplicação do princípio da reparação integral do dano, se mostrar cumprida na sua totalidade, com base na argumentação jurídica em que a mesma se sustenta que assenta, basicamente, no carácter unitário da obrigação de indemnização por parte da seguradora, ou seja, “ na retórica argumentativa “ que nela se sintetiza com base nos acórdãos do STJ em que baseia da seguinte forma: “ é apenas de três anos o prazo de prescrição do direito de regresso da seguradora relativamente à indemnização que tenha satisfeito aos lesados em acidente de viação causalmente conexionado com o estado de alcoolemia do condutor do veículo automóvel; esse prazo de prescrição inicia o seu curso com o último acto de pagamento parcelar da indemnização, excepto no tocante à indemnização em renda e, por aplicação de um critério funcional, aos núcleos indemnizatórios autónomos e juridicamente diferenciados e normativamente cindíveis, casos que a prescrição inicia o seu curso no momento em que ocorreu o adiantamento da indemnização; o ónus da prova de que os actos de pagamento parcelares da indemnização, realizados pelo segurador para além dos três anos que precederam a citação do demandado para a acção de regresso, representam núcleos indemnizatórios autónomos e juridicamente diferenciados e normativamente cindíveis, vincula o último.”       

         Entendimento esse que ditou o desfecho dado à causa no sentido de “ considerando que a Autora continuou e continuará a realizar actos de pagamentos parcelares de uma mesma indemnização aos lesados em sede de acidente de trabalho, dúvidas não há de que improcede a arguida excepção peremptória de prescrição, por aplicação de um critério funcional, aos núcleos indemnizatórios autónomos e juridicamente diferenciados e normativamente cindíveis, nos termos assinalados atrás.”

         E, a razão da nossa discordância em relação ao assim decidido, radica no facto da sentença recorrida - apesar de ter considerado na argumentação jurídica em que se estribou que as pensões pagas pela A. cujo reembolso pretende da R. através da presente acção, se tratam de prestações periódicas ainda assim - ter acabado por considerar que o prazo de prescrição para exercer o direito ao reembolso das mesmas inicia o seu curso com o último acto de pagamento parcelar da indemnização, por entendermos que na situação em vertente há distinguir entre o direito unitário e o direito a cada uma das prestações, valendo o disposto no art. 307º, nos termos do qual a prescrição do direito unitário corre desde a exigibilidade da primeira prestação que não for paga.

         Vejamos.

         Debruçando-nos sobre o caso em vertente, temos que: a A. vem pagando à viúva e aos filhos do falecido M (..), por morte deste, à primeira uma pensão anual no montante de € 2.240,64 e a pensão anual e temporária de cada filho menor no montante de € 1.493,76, ao abrigo do contrato de seguro do ramo trabalho, reclamando nos presentes autos o valor das pensões que a pagou à viúva e filhos do falecido M (…), por morte deste, reportadas ao período compreendido entre 21.06.2006 e 30/06/2012, período esse que na audiência de julgamento que teve lugar nos presentes autos alargou até Abril de 2013, por forma a nele abranger as prestações pagas até essa data, que se veio a apurar cifrarem-se as mesma no montante global de € 30.820,44 €; a presente acção foi instaurada em 13 de Julho de 2012.

            Tais quantias pagas pela A. ora recorrida aos familiares ( cônjuge e filhos ) do sinistrado falecido M (…), por força do contrato de seguro do ramo trabalho, referem-se a pensões que são fixadas em montante anual, devem ser pagas mensalmente e são devidas desde o dia seguinte ao do falecimento do sinistrado e enquanto se mantiverem os requisitos legais para aqueles delas poderem beneficiar, o que no caso do cônjuge viúvo pode ir até ao fim da vida deste e no caso dos filhos pode chegar aos 25 anos de idade – como decorre do disposto no Art. 20º da Lei 100/97, de 13.09, Arts. 49º Nºs 1 e 7 e 51º Nº1 do Regulamento, aprovado do Art. pelo DL 143/99 de 30.4, então em vigor e actualmente pelos Arts.56º Nº1 e 2, 60º e 72º Nº1 da Lei n.º 98/2009, de 04 de Setembro.

         Tratam-se, pois, de prestações periódicas ou reiteradas na terminologia de A. Costa, in Direito das Obrigações, 6ª Ed., pág. 593/594, para o qual  “ ...Quando todavia, em vez de uma única prestação a realizar por partes (prestação fraccionada), existam (…) diversas prestações (isto é prestações repetidas) a satisfazer regularmente (ex: a obrigação do inquilino de pagar a renda mensal ou anula) ou sem regularidade exacta (…), teremos as chamadas prestações reiteradas, repetidas, com trato sucessivo ou periódicas (…). A título exemplificativo, recordemos ainda os juros …, a renda fixada como indemnização (art. 567º), a renda perpétua …, a renda vitalícia. (…) “ ou de prestações permanentes sucessivas, na terminologia de Meneses Cordeiro, in Direito das Obrigações, 1980, edição da AAFDL, 1º vol., p. 357, segundo o qual a prestação é permanente (por confronto com as prestações instantâneas) quando o cumprimento se vai realizando durante certo espaço de tempo, sendo que a prestação permanente pode ainda ser contínua – quando exige uma actividade permanente –, ou sucessiva – quando se verifique com determinados intervalos –, sendo exemplo desta última, a prestação consubstanciada na renda perpétua.

         Sobre as modalidades da prestação e, mais concretamente, da prestação permanente sucessiva, defende também Pessoa Jorge, Direito das Obrigações, 1975/76, edição da AAFDL, 1º vol. p. 85, que a prestação sucessiva é periódica quando o interesse do credor é satisfeito em intervalos regulares.

         Tratando-se, pois, de prestações periódicas, há que distinguir entre o direito unitário e o direito a cada uma das prestações, valendo para estas o disposto no Art. 307º do CC, o prazo corre desde a exigibilidade da primeira prestação que não for paga.

         No caso em vertente, a A. e ora recorrida agindo sub-rogada nos direitos dos lesados, vem pagando a estes desde data que em concreto se não colhe dos autos as pensões de sobrevivência que são devidas aos mesmos desde o dia 11.11.1999, ou seja, desde o dia seguinte ao do falecimento do seu familiar M (…) que ocorreu no dia 10.11.1999, e logrou já obter, no âmbito da referida acção ordinária nº 576/2002, a condenação da ora R. no reembolso das pensões por si já pagas aos referidos beneficiários até 21.02.2006.

         Pretendendo agora a A. ora recorrida na presente acção obter o reembolso das pensões que continuou a pagar desde 21.02.2006 e até Abril de 2013 ( com a ampliação que deduziu e que foi admitida na audiênbcia de julgamento) impunha-se-lhe que tivesse exercido o seu direito unitário a esse reembolso nos 3 anos seguintes ao pagamento da primeira de tais pensões para evitar a prescrição, seja através da reclamação dentro desse prazo do reembolso das por si já suportadas, seja lançando mão da instauração da competente acção judicial, seja lançando mão de algum dos demais mecanismos legais  dotados de virtualidade para interromper essa prescrição ( Art. 323º do CC ).

            Ora, considerando que só com a instauração da presente acção, em 13 de Julho de 2012, veio a A. ora recorrida exercer contra a R. o direito ao reembolso das prestações por si pagas aos mencionados lesados agora referentes ao período compreendido entre 21.06.2006 e 30.06.2012, a conclusão a retirar só poderá ser a de que esse direito se mostra irremediavelmente prescrito, na totalidade.

         Assim sendo, procedendo nesta parte as conclusões recursórias da R. e ora apelante, não poderá manter-se a sentença recorrida, a qual, por isso, se impõe revogar por forma a julga-se procedente a excepção de prescrição invocada pela R., e em consequência, a absolver a mesma do pedido contra si formulado.

         E, assim sendo, mostra-se prejudicada a apreciação das demais questões suscitadas nas conclusões do recurso, relacionadas com a excepção de exoneração legal da responsabilidade da Recorrente por se mostrar excedido o limite legal até ao qual esta pode ser responsabilizada.

         IV- Sumário ( Art. 713º Nº7 C.P.C.  na anterior redacção)

         1. Na sub-rogação legal verifica-se uma sucessão, uma transmissão do crédito - que mantém a sua identidade e os seus acessórios - apesar da modificação subjectiva operada: o credor sub-rogado continua o direito de crédito anterior, no todo ou em parte, consoante a sub-rogação seja total ou parcial; no direito de regresso, por exemplo, no caso paradigmático nas obrigações solidárias, existe um direito novo, que nasce ou se constitui na esfera do solvens, em consequência do cumprimento de uma obrigação: é um novo direito de crédito a que corresponde também um novo dever de prestar.

         2. Apesar de na letra da lei ( Base XXXVII da Lei 2127, de 3 de Agosto de 1965 e Art. 31º Nº4 Lei nº 100/97, de 13 de Setembro ) se aludir expressamente a direito de regresso nas situações nela contempladas, a doutrina e jurisprudência vêm entendendo que apesar disso, o direito da entidade patronal ou da seguradora que tenha pago a indemnização pelo acidente simultaneamente de trabalho e de viação tem direito, por força da sub-rogação, ao reembolso da indemnização que satisfez do responsável civil pelo acidente de viação.

         3. Tal entendimento veio a obter consagração legal no RJATDP constante da Lei 98/2009, de 04 de Setembro, que actualmente se encontra em vigor.

         4. Para o exercício do direito de sub-rogação que se operou em relação ao direito do lesado contra os causadores do acidente de que advieram os danos que determinaram a obrigação de reparação a cargo da entidade patronal ou da seguradora, o prazo de prescrição é o previstos no Artº 498º do CC.

         5. A contagem de tal prazo inicia-se a partir da satisfação da obrigação de indemnização que, por força do contrato de seguro, vincula a entidade patronal ou a seguradora.

         6. Tratando-se de prestações periódicas, como é o caso das pensões por morte devidas ao cônjuge e aos filhos do sinistrado falecido,  o prazo para o exercício do direito unitário em relação ao reembolso das mesmas conta-se a partir do pagamento da primeira delas.

         V – Decisão

         Pelo exposto, julga-se o recurso procedente, e, consequentemente, revogando-se a sentença proferida, julga-se procedente a excepção de prescrição invocada pela Ré e absolve-se a mesma do pedido contra si formulado.

         Custas, em 1ª instância e nesta Relação, pela A. apelada.

                                               Coimbra, 2013.12.18

                                                        Maria José Guerra ( Relatora)

                                                        Carvalho Martins

                                                        Carlos Moreira