Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
262/19.0T8FVN.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: CARLOS MOREIRA
Descritores: LIBERDADE DE EXPRESSÃO
LEI DA TELEVISÃO
DIREITO AO BOM NOME
DIREITO DE RESPOSTA
Data do Acordão: 01/21/2020
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA - F.VINHOS - JUÍZO C. GENÉRICA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTS. 26, 37 CRP, LEI Nº 27/2007 DE 30/7, LEI Nº 8/2011 DE 11/4
Sumário: I - Os factos a considerar são apenas os provados, e que tenham ou possam ter relevância para a boa decisão da causa segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito.

II -Tem direito de resposta nos serviços de programas televisivos e nos serviços audiovisuais quem tiver sido objeto de referências, ainda que indiretas, que possam afectar a sua reputação ou bom nome – artº 65º nº1 da Lei nº 27/2007, de 30.07.

III – A avaliação subjetiva do visado, ainda que, no limite, temperada pela perspetivação dos conceitos sociais de reputação e boa fama é, em princípio, suficiente para permitir/exigir a efetivação do direito de resposta.

IV – Destarte, este só pode ser recusado se: i) provierem de pessoas sem legitimidade; ii) carecerem manifestamente de fundamento; iii) inexistir relação directa e útil entre o seu teor e as referências da peça ou reportagem que o tiver provocado; iiii) nele existirem expressões desproporcionadamente desprimorosas ou que envolvam responsabilidade criminal ou civil, ou; iiiii) exceder o número de palavras do texto que lhe deu origem – artºs 67º nºs 4 e 5 e 68º nº1 da cit. Lei.

V – Para aferir da (in)existência destes impedimentos, há que atender não apenas a um certo passo adrede dirigido ao visado/requerente, mas a todo o texto e contexto da peça jornalística e da ratio e teleologia a ela imanente e a este referentes.

VI – Se concluir pela existência de, pelo menos, algum dos impedimentos iii), iiii) e iiiii) do ponto III, o operador deve convidar o interessado a proceder à sua eliminação, e só se esta não se verificar é que fica habilitado a recusar a divulgação da totalidade do texto – artº 68º nº2.

Decisão Texto Integral:

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA

1.

L (…), instaurou contra R (…), S.A., ambos com os sinais dos autos, a presente acção declarativa, de condenação, com processo comum.

Pediu:

A condenação da Requerida a emitir, gratuitamente, e no mesmo programa seguinte à decisão, o texto de Resposta do Requerente, que indica, e acompanhado da menção de que é efectuado por decisão judicial.

Para tanto alegou, em síntese:

No âmbito da emissão do programa “ X (....) ”, no dia 05.07.2019, designadamente, na peça jornalística intitulada “ Y (....) ” e relacionado com os escândalos políticos em torno dos K (....) , a Requerida omitiu por completo os contactos estabelecidos entre a jornalista F (…) e o requerente, antes da emissão da mesma,  na qual negou qualquer envolvimento na entrega dos donativos, nos termos que explicita, factos estes omitidos na peça.

No programa em causa são levantadas suspeições e veiculadas falsidades que colocam em causa o bom nome do Requerente e reputação enquanto Presidente da Direcção da H (....) de Z (....) .

Remeteu, tempestivamente, duas comunicações dirigidas à Requerida com o fito do exercício do seu direito de resposta, sendo que as mesmas foram indeferidas com o argumento de que não cumpriam as disposições legais da Lei da Televisão.

Estava vedado à Requerida a recusa da transmissão da resposta, pois que precludido tal direito de recusa por esta não ter cumprido o prazo de 24 horas; por outro lado, o indeferimento para a sua transmissão encontra-se desprovido de legalidade.

A Requerida  contestou.

Alegando, em suma:

O facto de ter excedido o período de 24 horas para recusar a transmissão da resposta apresentada pelo Requerente é irrelevante, pois que não tem como consequência a transmissão da dita resposta.

No mais, a pretensão do A. carece manifestamente de fundamento, não tem relação directa e útil com a reportagem e excede largamente o número de palavras do texto que alegadamente faz referência ao Requerente e, consequentemente, é legítima a recusa da transmissão de resposta pretendida por este.

 Pediu: a improcedência da acção.

2.

Prosseguiu o processo os seus termos tendo, a final, sido proferida sentença na qual foi decidido:

«julga-se procedente a presente acção e, consequentemente, decide-se:

1 - Condenar a Requerida no pedido;

2 - Determinar à Requerida a transmissão gratuita, no programa « X (....) », do texto de resposta do Requerente, referente à emissão do dia 05 de julho, e à reportagem “ Y (....) ” na primeira emissão do programa referido a contar do trânsito em julgado da presente decisão, acompanhado da menção de que aquela é efectuada por decisão judicial, com seguinte teor:

“No programa “ X (....) ”, titulado “ W (....) . Donativos distribuídos em várias autarquias nas vésperas das eleições”, emitido em 05.07.2019, são levantadas suspeições e veiculadas falsidades que colocam em causa o meu bom nome – L (…) - e reputação enquanto Presidente da Direção da H (....) de Z (....) .

1. Ao contrário do que foi reportado no programa " X (....) ", não tive qualquer intervenção ou participação no processo de entrega de donativos mostrado na reportagem e desconhecia a sua realização.

2. Foi o então comandante dos H (....) de Z (....) , que conduziu este processo tendo previamente solicitado à Câmara Municipal de Z (....) a lista dos beneficiários desses donativos.

3. Foi a associação doadora representada pelo Sr. J (....) que entregou a referida listagem.

4. A listagem apresentada pelo " X (....) " está disponível no sítio da Câmara Municipal de Z (....) .

5. A jornalista da Q (...) que me interpelou conhecia estes factos, omitiu-os na reportagem e apesar de lhe ter transmitido que nada tive a ver com a distribuição dos donativos, também omitiu este meu esclarecimento.

6. Lamento que a Q (...) tenha veiculado uma notícia que coloca em causa o meu bom nome e reputação, mesmo sendo conhecedora de factos que omitiu.” »

3.

Inconformada recorreu a requerida.

Rematando as suas alegações com as seguintes conclusões:

1. A Recorrente vem interpor recurso da sentença proferida no dia 26.09.2019 pelo Tribunal a quo, que julgou totalmente procedente a presente ação, por discordar, em absoluto, da aplicação do direito aos factos dados como provados.

2. Embora os factos dados como provados sejam suficientes para que, ao abrigo da lei, a ação fosse julgada totalmente improcedente, da própria reportagem de 05.07.2019, que se encontra junta aos autos por requerimento da Recorrente de 26.08.2019, resultam outros factos, alegados na contestação da Recorrente, que deveriam ter sido dados como provados.

3. Resulta dos minutos 30:52 a 31:08 da reportagem de 05.07.2019, conforme alegado no artigo 47.º da contestação, que “O Comandante dos H (....) de Z (....) foi identificado na reportagem”, razão pela qual tal facto deve ser dado como provado.

4. Resulta dos minutos 30:52 a 31:08 da reportagem de 05.07.2019, conforme alegado no artigo 50.º da contestação, que “Na reportagem foi ouvido o Comandante dos H (....) de Z (....) ”, razão pela qual tal facto deve ser dado como provado.

5. Resulta dos minutos 30:47 a 30:51 da reportagem de 05.07.2019, conforme alegado no artigo 57.º da contestação, que “Na reportagem é expressamente afirmado que no caso de Z (....) , ao contrário do que sucedeu nos demais concelhos, a lista de beneficiários dos donativos era conhecida”, razão pela qual tal facto deve ser dado como provado.

6. O Recorrido limitou-se a alegar que a reportagem é ofensiva do seu bom nome e reputação, não tendo alegado e, consequentemente, provado qualquer facto que conduzisse à conclusão da verificação de tais ofensas, o que sempre seria necessário para que a sua pretensão fosse julgada procedente.

7. Ao julgar a ação procedente sem terem sido alegados ou provados factos essenciais que demonstrem que a reportagem é ofensiva do bom nome e reputação do Recorrido, o Tribunal a quo violou o disposto no artigo 5.º do Código de Processo Civil.

8. Não existe ao longo da reportagem, não tendo, como tal, sido dado como provado qualquer facto a esse respeito, qualquer relação entre o Recorrido e o processo de entrega de donativos ou com o conhecimento da respetiva lista de beneficiários.

 9. A reportagem já assegura aquilo que o Recorrido pretende repetir em sede de resposta (facto provado 29), isto é, de que não esteve envolvido com a distribuição de donativos no dia de reflexão para as eleições autárquicas.

10. A curta referência feita ao Recorrido na reportagem não contém, conforme o próprio não contesta, qualquer inverdade, o que por si só determina que inexista, também por este motivo, fundamento para a transmissão da resposta.

11. Por manifesta ausência de fundamento da resposta elaborada pelo Recorrido, a sentença proferida pelo Tribunal a quo, ao julgar a presente ação procedente, violou o disposto no artigo 68.º, n.º 1, da Lei da Televisão.

12. A resposta do Recorrido é absolutamente irrelevante para alterar a impressão causada no telespectador, porque em nada muda o teor da própria reportagem.

13. Além do mais, não existem referências na reportagem ao Recorrido relacionadas com a resposta que pretende apresentar, o que afasta o requerido da relação útil entre a resposta e a reportagem.

14. A sentença proferida pelo Tribunal a quo violou, portanto, o disposto no artigo 68.º, n.º 2, da Lei da Televisão, que exige uma relação útil entre o direito de resposta e o ato que lhe deu causa.

15. A resposta que o Recorrido pretende que seja transmitida não respeita à referência (única, cf. facto provado 17) que lhe é feita, aproveitando para expressar-se sobre outros pontos da reportagem com o qual não é, em momento algum, relacionado.

16. Assim, também por falta de legitimidade do Recorrido para a resposta que apresenta, o Tribunal a quo, ao julgar a presente ação procedente, violou o disposto no artigo 67.º, n.º 1 e 4, da Lei da Televisão.

17. O Recorrido apenas pode exercer o seu direito de resposta naquilo em que foi visado, pelo que a sua resposta, caso fosse admissível, não poderia exceder 65 palavras (facto provado 31).

 18. Considerando que a resposta do Recorrido contém 204 palavras (facto provado 32), a sentença proferida pelo Tribunal a quo violou o disposto no artigo 68.º, n.º 2, da Lei da Televisão, ao julgar que a resposta do Recorrido não era demasiado extensa.

19. Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, ser revogada a sentença proferida pelo Tribunal a quo e substituída por outra que julgue a ação totalmente improcedente e, consequentemente, seja a Recorrente absolvida do pedido contra si formulado.

Contra alegou o requerente pugnando pela manutenção do decidido.

4.

Sendo que, por via de regra: artºs 635º nº4 e 639º  do CPC - de que o presente caso não constitui exceção - o teor das conclusões define o objeto do recurso, as questões essenciais decidendas são as seguintes:

1ª - Alteração da decisão sobre a matéria de facto.

2ª - Improcedência do pedido.

5.

Apreciando.

5.1.

Primeira questão.

5.1.1.

Devem ser considerados e atendidos todos os factos que, provados, tenham interesse para a decisão da causa.

Mas, como é consabido, não a decisão que, liminar, aparente e aprioristicamente, pode advir, mas antes aquela que possa ser possível, considerando as várias soluções plausíveis da questão de direito, máxime se ela não é total e uniformemente perspectivada e sedimentada pela doutrina e jurisprudência.

No caso vertente, e tal como alega a julgadora, a boa decisão da causa impõe  uma análise e dilucidação concatenada do «enquadramento global da reportagem emitida, a qual tem uma sequência lógica, e não apenas (atender-se) a passagem espartilhada…».

Aliás, esta perspectiva é aceite pelo próprio requerente, pois que,  não obstante desde logo se opor a esta pretensão da recorrente, aceita que « teremos de analisar a “noticia” como um todo, para se perceber a razão de ser e fundamento do direito de resposta do Requerente.»

(sublinhado nosso).

E assim é.

Devendo, pois, os factos a considerar serem os possivelmente relevantes para a boa decisão, e, em homenagem aos princípios da substanciação, do dispositivo e da auto responsabilidade, os que tenham sido alegados pelas partes.

Nesta conformidade e quanto aos factos aditandos: «O Comandante dos H (....) de Z (....) foi identificado na reportagem» e «Na reportagem foi ouvido o Comandante dos H (....) de Z (....) »

A requerida entende que estes factos têm interesse para a decisão.

Ainda que, pelo menos  na parte do recurso  em que impugnou a matéria de facto, não tenha explicitado esta sua afirmação, ela intui-se e foi expressada no artº 47º da contestação.

Na verdade, parece que a recorrente entende que, pretendendo o requerente que no seu direito de resposta seja mencionado - naturalmente para frisar a sua não interferência na distribuição dos fundos, e diferenciar/autonomizar, clara e inequivocamente, a sua pessoa da pessoa do então comandante dos H (....) -  que: «Foi o então comandante dos H (....) de Z (....) , que conduziu este processo tendo previamente solicitado à Câmara Municipal de Z (....) a lista dos beneficiários desses donativos», o facto de «o comandante dos H (....) ter sido claramente identificado ( e ouvido) na  reportagem e não suscitar qualquer  confundibilidade com o requerente»  poderá ao menos, contribui para demonstrar aquela autonomização/diferenciação e, assim, a desnecessidade da resposta, máxime com o teor do seu ponto 2.

Porém, e tanto quanto se alcança, o requerente refere-se ao comandante dos H (....) anteriormente em funções, ie,  à data dos factos: «…o então comandante…»; já a recorrente reporta-se ao atual comandante J (…).

Ora apenas este,  que  já não aquele, foi identificado e ouvido na peça.

Logo,  estes pretendidos  factos probandos não podem ser dados como provados

Quer porque efectivamente o não foram.

Quer porque eles, na economia  do objecto do litígio e das pretensões das partes, são irrelevantes.

 No respeitante ao facto probando «Na reportagem é expressamente afirmado que no caso de Z (....) , ao contrário do que sucedeu nos demais concelhos, a lista de beneficiários dos donativos era conhecida.

Esta asserção desdobra-se em dois factos: 1º - que nos outros concelhos aludidos no programa inexistia lista de beneficiários;  2º - que em Z (....) existia,  era conhecida, e tal  existência e conhecimento foiram expressamente mencionados na reportagem.

O primeiro facto não dimana, adrede e inequívovamente ou com a suficiência probatória exigida, pelo menos do trecho do programa citado pela recorrente.

 Ademais, na economia do processualmente em dilucidação, do thema decidendum,  a saber: se o bom nome reputação do requerente, enquanto Presidente da Direção da H (....) de Z (....) , foi afectado pela reportagem, irreleva, ou apenas muito remota e  indirectamente releva; mas, neste caso, sem a força bastante para ser atendível.

O segundo facto não resulta provado nos termos impetrados, ou seja: que na reportagem foi «expressamente afirmado…que a lista de beneficiários… era conhecida

Na reportagem não foi verbalizado, diretamente   que a lista era conhecida; o que se verificou foi a exibição de um documento, o qual, em função do simultaneamente expendido pela apresentadora, a saber: «Em Z (....) , o ex-comandante dos H (....) assegura que pediu a lista à Câmara, mas a autarquia garante que nunca recebeu esse pedido.» faz presumir que tal documento se referia à lista de Z (....) , a qual, assim, existia.

Mas se era conhecida, e, ademais - e o que essencialmente relevaria -, por quem e em que medida e profundidade -, não ficou, não obstante o expendido pelo Sr. Comandante dos H (....) , J (…), provado.

Em todo o caso, e mesmo que assim não fosse ou não se entenda, o real e efetivamente verificado neste particular conspeto no programa,  e que, em boa medida e relevância, se aproxima da  importância que a recorrente parece querer atribuir ao aludido facto na redacção proposta, ficou consignado nos pontos 21 e 22 dos factos provados.

5.1.2.

Por conseguinte, e no indeferimento da presente pretensão, os factos a considerar são os apurados na 1ª instância, a saber:

 

1) Na edição de 5 de julho de 2019 do programa “ X (....) ”, emitido no canal (...) da estação de televisão da Requerida, foi apresentado um trabalho jornalístico intitulado “ S (...) ”.

2) O id. em 1) corresponde ao episódio 23 do aludido programa, com a duração de 32:07 minutos, que foi para o ar em horário nobre, tendo o seu início às 21 horas, logo após o Telejornal.

3) A temática do programa estava relacionada com escândalos políticos em torno dos “ K (....) ”.

4) No referido programa, e na sequência de outra notícia, surge uma peça jornalística, do minuto 21:17 ao minuto 32:07, que foi apresentada sob o título “ Y (....) .

5) A jornalista da Requerida começa por apresentar a peça jornalística id. em 4) da seguinte forma sic: “Afinal não foi só em W (....) que houve distribuição de dinheiro de donativos em pleno dia de reflexão para as últimas eleições autárquicas. Ao todo, 185 mil euros foram distribuídos em três quartéis de H (....) por candidatos às eleições autárquicas. Todos do (...) . Ligados aos H (...) de W (....) , Z (....) e V (....) .”

Seguindo:

6) Tem intervenção na referida peça, J (…), identificado como sendo Presidente da Associação Transparência e Integridade, onde diz sic: “Essa história está muito mal contada e essa explicação eu diria no mínimo carece de desenvolvimento.”

7) Continuando, a jornalista da Requerida faz a seguinte afirmação: “Não aconteceu só em W (....) com o quartel dos H (....) como pano de fundo. No mesmo dia de  reflexão para as últimas eleições autárquicas com poucas horas de diferença os donativos da comunidade luso-americana foram entregues em V (....) .”

8) Seguindo exibição de imagem de uma espécie de conferência de imprensa, onde pessoa não identificada refere: “Tentamos fazer a entrega através dos Municípios, não nos foi possível.”

9) Seguido de Off do Promotor campanha “Todos por Portugal”, onde diz: “Como é que vamos fazer esta lista? (…). Estávamos à espera de uma lista oficial e os H (....) foram a chave para que isto fosse possível.”

10) De seguida, a jornalista da Requerida faz a seguinte afirmação: “E em… Z (....) ”.

11) Continuando a mesma jornalista sic: “O problema do difícil acesso a uma lista oficial foi repetido nos três concelhos. Os promotores da campanha, “Todos por Portugal” asseguram que pediram à Câmara os nomes de quem precisava de ajuda, mas essa lista nunca chegou. Do lado dos municípios a explicação para não a terem recebido, parece simples.”

12) Continuando, e em relação ao Município de Z (....) , é feita uma transcrição da resposta dada por J (…), Presidente da C. M. Z (....) , lida em voz alta, com o seguinte teor sic: “Não foi solicitada ao município de Z (....) , nem à minha pessoa, enquanto Presidente da U (...) , a identificação ou elaboração de qualquer lista.”

13) Segue entrevista presencial a B (…), exibindo na imagem televisa com nota de rodapé, a legenda “Marido da Presidente da U (...) de V (....) esteve presente na distribuição dos donativos”

14) Nesta sequência, intervém na peça J (…) onde comenta: “É uma promiscuidade inacreditável e inaceitável. Uma pessoa que é candidata a um cargo político tem que ter um mínimo de decoro e não se envolver em distribuição de donativos na altura em que está o dia de reflexão para as eleições, porque obviamente, fica sempre a suspeita e uma suspeita credível de que estes candidatos estão a usar dinheiro de donativos que foram dados de boa fé para ajudar as populações para fazer caciquismo eleitoral. “

15) Continuando, é transmitido um contacto telefónico entre uma jornalista da Requerida e J(…) da Campanha “Todos por Portugal”, onde este refere sic: “Nós decidimos a data e depois coordenámos com eles se era possível que as pessoas fossem ao quartel naquele final de semana que nós fomos aí”.

16) Intervém de seguida na peça o referido J (…) e comenta sic “Mesmo que o doador preferisse aquele dia por alguma razão prática ou sem ser prática. Pessoas com um vínculo político que andaram a fazer campanha que tem ligações partidárias e que são reconhecidos como pessoas com ligações partidárias naqueles concelhos naquela região não podem participar em situações destas. Antes de ser uma questão legal que também é, é uma questão do mais comum bom senso.”

17) Após o comentário id. em 16), ao minuto 29:40 a 30:02, a jornalista da Requerida diz o seguinte sic:

“Mas além de V (....) há outro concelho envolvido. Z (....) .

O Presidente da de H (....) também era candidato do (...) …neste caso …a Presidente da U (...) .

L (…), optou por não estar presente na cerimónia de entrega dos donativos no seu quartel, mas só não foi alvo de uma queixa para a CNE, porque o adversário socialista ganhou as eleições.” (sublinhado nosso)

18) No momento id. em 17), em simultâneo, foram exibidas nas imagens televisivas a fotografia de L (…) [ora Requerente], acompanhada do brazão de Z (....) , com o seu nome por baixo da fotografia, com a informação de Presidente H (....) e Candidato (...) U (...) .

19) Continuando a peça jornalística com a exibição de uma mensagem transcrita de J (…), actual Presidente da U (...) de Z (....) , e lida em alta voz, com o seguinte conteúdo sic: “Sem margem para dúvida foi um ato reprovável, não pelo fim, como é evidente, mas pelos contornos que teve (…) Não nos parece que tenha sido inocente todo o aparato dado à entrega destes donativos (…) Várias foram as reações negativas da  população a este acontecimento, precisamente pela conotação política que foi atribuída pela população em geral, e a qual eu corroboro.”

20) De seguida, é feita uma passagem de um texto como sendo um esclarecimento prestado pela Comissão Nacional de Eleições, lida em alta voz pela jornalista da Requerida, com o seguinte teor sic: “Caso existissem indícios da prática de crime, no presente momento, atendendo ao lapso de tempo decorrido, encontrar-se-ia extinta a responsabilidade criminal.”

21) Continuando a peça com o seguinte comentário por parte da jornalista da Requerida sic:

“Em Z (....) , o ex-comandante dos H (...) assegura que pediu a lista à Câmara, mas a autarquia garante que nunca recebeu esse pedido.

Ainda assim é o único dos 3 concelhos onde se sabe, pelo menos, o critério de seleção dos beneficiários.”

22) De seguida, é exibida entrevista realizada a J (…), Comandante dos H (...) de Z (....) , que quando questionado sobre quantas pessoas tinha na lista, disse sic: “Tinha cerca de 30 pessoas. O critério, pelo o que eles disseram que foi, incidia nas pessoas que tinha ardido grande parte da sua habitação.”

23) Continuando a peça, onde a jornalista da Requerida diz: “Ao todo 3 listas em três municípios com regras pouco ou nada transparentes. O X (....) sabe que há vitimas reais dos incêndios que só foram incluídas nas listas dos donativos depois de terem reclamado.”

24) Concluindo com nova intervenção do referido J (…), o qual comenta sic: “No limite podemos estar a assistir a situações de compra de votos ainda para mais, mais obsceno ainda, compra de votos com dinheiro doado por pessoas que quiseram acudir a uma catástrofe, porque há uma promiscuidade completa...”

25) O programa termina com a intervenção da jornalista da Requerida e onde diz sic: “Os crimes após a tragédia.”

26) Com data de 08.07.2019, o Requerente remeteu à Requerida, ao abrigo de Lei de Imprensa, uma comunicação escrita, dirigida à Directora de Informação da Q (...) , para o direito de resposta e onde se pode ler sic:

“Ao abrigo do Direito de Resposta consagrado na Lei de Imprensa (artigos 24º a 26º) L (…) solicita a publicação do seguinte esclarecimento relativo ao Programa " X (....) " assinado pelas jornalistas F (…) e S (…), emitido na Q (...) 1, de que V. Excia é digna Diretora de Informação, no passado dia 05 de julho de 2019.

No programa " X (....) ", titulado " W (....) . Donativos distribuídos em várias autarquias nas vésperas das eleições", emitido em 05.07.2019, são levantadas suspeições e falsidades ao anterior Presidente da Direção da H (....) de Z (....) , L (…), que procuram atingir a minha dignidade, bom nome e reputação. Impõe-se, nos termos da lei, o exercício do meu direito de resposta.

1. Perante a gravidade das insinuações e suspeitas que foram levantadas repudio veementemente a tentativa de envolver o meu nome em atos e situações a que sou completamente alheio.

2. As insinuações e suspeitas, sobre a minha pessoa, lançadas de forma absurda no Programa " X (....) " são absolutamente falsas. O Programa " X (....) " não informou convenientemente os seus espectadores, pois nada dos alegados atos relatados na peça jornalística passaram por mim ou neles fui parte interveniente.

3. E falsa qualquer intervenção minha no processo da alegada entrega dos donativos referidos na peça jornalística ou de que dela tenha tirado qualquer partido.

4. A associação/grupo de amigos dos EUA, não os conheço nem nunca estive com os seus dirigentes/interlocutores, nem nunca me contactaram; se o fizeram foi com o Comando dos H (...) .

5. Nada do que se afirma na peça jornalística passou por mim ou fui nela parte interveniente.

6. Em face da gravidade das insinuações e suspeições contactei de imediato o Comandante à época, Sr. P (…) que me confirmou:

6.1 Ter sido a associação/grupo de amigos dos EUA a contactar os Comandos dos H (...) de Z (....) , V (....) e W (....) .

6.2 O comandante, à época, Sr. P (…) confirmou-me que pediu uma listagem à Câmara Municipal, mas que acabou por ser a Associação Americana a fornece-la.

7. A referida listagem está no sita do Município de Z (....) em http://www.cm- Z (....) s.pt/index.php/apoio-dp-municipe/incendios-florestais e pode ser acedida no linkhttp://www.cm- Z (....) s.pt/images/Apoio aoMun%C3%Adcipe/incendios2017/Mapa de controle das intervencoes efectuadas nas habitações permanentes – 13-09-2018.pdf.

8.Não se compreende que o Sr. Presidente U (...) que parece saber mais do que eu acerca deste assunto, nada tenha a dizer acerca deste facto.

9. Sou completamente alheio a toda esta situação que terá sido tratada a nível do Comando e não da Direção da Associação. Teria sido, aliás, muito fácil à Sra. Jornalista confirmar isso mesmo com o Sr. J (…) que aparece na peça jornalística e com o comandante à época, Sr P (…).

10. Não estive presente no ato de entrega como é evidente na peça, desconhecia a realização do mesmo nas instalações da Associação e nem tão pouco me cruzei com alguma das pessoas que constam da alegada lista de donativos.

11. Lamento que a Sra. Jornalista F (…) que me contactou telefonicamente antes da emissão da peça jornalística tenha omitido esse contacto e, igualmente, omitido, apesar do lho ter pedido, a minha veemente negação e desconhecimento relativo aos alegados atos referidos na peça jornalística e que me parecem querer imputar.

12. Lamento que uma notícia com esta gravidade tenha sido tratada com superficialidade e procure tratar todos por igual, metendo tudo no mesmo saco. Facto que não posso aceitar.

13. Por se tratar de um assunto sensível que atinge a minha dignidade e porque urge afastar qualquer suspeita relativa a esta matéria, impõe-se o exercício do meu direito de resposta com a necessária ratificação das insinuações e suspeições por não corresponderem à verdade. Não espero dos Srs. Jornalistas nenhum reconhecimento especial a não ser a devida retratação. Todavia, não posso deixar de estranhar que tenham optado por emitir tão graves difamações atentatórias da minha dignidade e do meu bom nome, sem qualquer suporte em factos, mesmo após terem sido por mim desmentidas em contado telefónico anterior.

14. Não havendo nada a esconder relativamente a esta ou a qualquer outra questão espero assim que a Q (...) , o programa " X (....) " e as Sras. Jornalistas esclareçam cabalmente esta situação repondo a verdade dos factos relativo a um assunto de que, reafirmo, fui e sou completamente alheio. Assim, desde já se requer que as suspeições, insinuações e afirmações inverídicas constantes da V. programa, emitido a 5 de julho de 2019 sejam devidamente retificadas como exposto supra.

Z (....) , 8 de julho de 2019

L (…)”

27) No dia 09.07.2019, o Requerente enviou à Requerida um email a dar conhecimento da comunicação recebida por J (…), com o seguinte teor:

“Exmo Senhor L (…)

Posso confirmar que não encontrei nenhuma comunicação por e-mail entre eu e o senhor, este e-mail que me enviou foi a primeira comunicação.

Também posso confirmar que não me recordo de o ter conhecido em pessoa durante a minha visita em 2017. Conheci muita gente durante essa visita, não me e possível lembrar dois anos depois de todos.

Chegou as nossas mãos uma lista do seu concelho, não consegui ainda confirmar se veio do vosso quartel de H (...) directamente para nós, ou se veio através das outras organizações Luso Americanas que estiveram aí antes de nós. Ainda não consegui confirmar.

Nunca foi mencionado no tal programa, nos somos de New Jersey, mas também houve organizações da Flórida e New York que estiveram aí antes de nós.

Com os melhores cumprimentos

J (…)”

28) A Requerida respondeu através de e-mail enviado no dia 09.07.2019, ao Requerente com o seguinte conteúdo:

“Exmo. Senhor

Em resposta à VI carta relativa ao assunto em título (e ao V/ mail de hoje) na qual solicita o exercício do Direito de Resposta para uma peça emitida no programa X (....) , do dia 05.07.2019 ao abrigo da Lei de Imprensa, a Direção de Informação de Televisão da R (…) gostaria de começar por salientar que o quadro legal aplicável à situação em causa é a Lei n.º 27/2007, de 30 de julho, com as alterações introduzidas pela Lei n. 0 8/2011, de 11 de abril (doravante, Lei da Televisão).

Assim, nos termos do n.º 1, do artigo 65.º, da referida Lei da Televisão, tem direito de resposta nos serviços de programas televisivos (...) qualquer pessoa singular ou colectiva; que neles tiver sido objecto de referências, ainda que indirectas, que possam afectar a sua reputação ou bom nome, acrescentando, no n.º 2, que as pessoas e entidades referidas no número anterior têm direito de rectificação nos serviços de programas televisivos e nos serviços audiovisuais a pedido em que tenham sido feitas referências inverídicas ou erróneas que lhes digam respeito pelo que, a haver lugar ao exercício de um direito desta natureza (o que não se concede, como adiante se esclarece), seria sempre direito de retificação, atentas as correções que foram enviadas por V.Exas

Por outro lado, convém salientar que, sem prejuízo de entender que o direito de resposta é um direito fundamental, previsto constitucionalmente, e que consiste, na sua essência, no poder que assiste a todo aquele que seja pessoalmente afetado (pessoas coletivas incluídas) por notícia, texto, imagens ou sons ou qualquer o qualquer outra referência transmitidos num órgão de comunicação social, de fazer publicar ou transmitir nesse mesmo órgão um texto seu contendo um desmentido, retificação ou defesa, o exercício de tal direito pressupõe o cumprimento de determinados requisitos e pressupostos que, em n/ entender, não se encontram cumpridos. Ora, para além de um conjunto de requisitos de natureza meramente formal (ainda que essenciais) que devem ser cumpridos na solicitação de um Direito desta natureza, no caso, em concreto, existem alguns pressupostos cuja  observância, nos termos do n.º 1, do artigo 68.º da Lei da Televisão, é fundamental para aferir da viabilidade do exercício do direito solicitado.

Desde logo, o cumprimento do n.º 4, do artigo 67.º, da mesma lei, e que se prende com a inexistência de uma relação útil e direta entre as referências que determinaram o pedido para exercício de direito de resposta e o texto fornecido para emissão. Com efeito, analisada a pretensão de V.Exa, bem como a visualização da reportagem, importa salientar o estipulado naquela noma que refere que o conteúdo da resposta ou da rectificação é limitado pela relação directa e útil com as referências que as tiverem provocado, não podendo exceder o número de palavras do texto que lhes deu origem. Ora, a peça referente aos “Donativos" tem cerca de 10 minutos na qual foram abordados factos referentes a três concelhos, sendo que o tempo que é dedicado a Z (....) ocupa pouco mais de 1,30 minuto. A dimensão do texto que nos foi enviado excede, de forma evidente, o tempo (e palavras) que é dedicado a Z (....) ). Para melhor ilustração, transcreve-se o único segmento no qual é referido o nome de V.Exa.

No concelho vizinho de Z (....) , o presidente da H (....) também era candidato do (...) …neste caso a Presidente da U (...) . L (…) optou por não estar presente na cerimónia de entrega dos donativos no seu quartel mas só não foi alvo de uma queixa para a CNE porque o adversário socialista ganhou as eleições.

Off seguido do email do atual presidente da câmara:

"Sem margem para dúvida foi um ato reprovável, não pelo fim como é evidente, mas pelos contornos que teve (...) Não nos parece que tenha sido inocente todo o aparato dado à entrega destes donativos (...) Várias foram as reações negativas da população a este acontecimento, precisamente pela conotação politica que foi atribuída pela população em geral, e a qual eu corroboro”.

Off seguinte refere que:

“Em Z (....) , o ex-comandante dos H (...) assegura que pediu a lista à câmara e câmara garante que nunca recebeu o pedido. Ainda assim, é o único dos 3 concelhos onde se sabe, pelo menos o critério de selecção dos beneficiários.”

Acresce que, de acordo com o n.º 5, do mesmo artigo, a resposta ou a rectificação não podem conter expressões desproporcionadamente desprimorosas (…) o que nos parece ser o caso  tendo em conta que, ao longo do texto, se tecem considerações relacionadas com o cumprimento das normas deontológicas aplicáveis ao exercício da atividade dos jornalistas, bem como aos deveres obrigações que recaem sobre a Q (...) , em especial, são repetidamente usadas expressões como "insinuações", "suspeitas", “omissões, "difamações". Referem-se, como exemplo,

 (…) insinuações e suspeitas, sobre a minha pessoa, lançadas de forma absurda no Programa " X (....) " são absolutamente falsas. O Programa “ X (....) " não informou convenientemente os seus espectadores (.„) (...) lamento que uma notícia com esta gravidade tenha sido tratada com superficialidade e procure tratar todos por igual, metendo tudo no mesmo saco (...) (...) todavia, não posso deixar de estranhar que tenham optado por emitir tão graves difamações atentatórias da minha dignidade e do meu bom nome, sem qualquer suporte em factos, mesmo após terem sido por mim desmentidas em contado telefónico anterior (...)

Por fim, mas não menos relevante, existe ainda uma questão essencial para aferir da viabilidade do exercício do direito e que se prende com o facto de estarmos perante uma resposta que carece manifestamente de fundamento (artigo 68.º, n.º 1 da mesma lei).

Efetivamente, da análise rigorosa da peça (que, aliás, se insere numa investigação jornalística mais vasta sobre o dramático tema dos incêndios de 2017) verifica-se, de forma clara, que não foram feitas afirmações inverídicas ou errôneas, conforme exigido no n.º 1, do artigo 65.º da mesma lei. A peça em causa, meramente factual, aborda todas as questões de forma objetiva, facilmente comprováveis e que correspondem à verdade dos factos, encontrando-se assentes numa investigação rigorosa e exaustiva que permitiu aos jornalistas envolvidos ter um conhecimento profundo quanto ao tema tratado. Foram cumpridos, ao limite, todos os princípios, deveres e obrigações que regem o exercício do jornalismo, designadamente, procurou-se obter junto de V. Exa o contraditório, o que nunca, propositadamente, foi feito de modo adequado, atempado e oportuno, sendo certo que o instituto jurídico do direito de resposta não serve esse propósito a posteriori, que é o que se  pretende com este pedido de direito de resposta/retificação que carece manifestamente de fundamento.

Efetivamente, a figura do Direito de Resposta e de Retificação não se destina a exercer o contraditório mas sim a reparar, de forma expedita, referências que possam afetar a reputação ou bom nome da pessoa visada, bem como a corrigir referências inverídicas ou erróneas, o que não foi o caso. Na verdade, como já se disse, não foram efetuadas afirmações dessa natureza (o mail do Sr. J (…) que nos foi hoje remetido não altera em nada o que atrás ficou dito). Recorda-se que o contraditório (que, em última instância, nunca poderia ser objeto de análise nesta sede) poderia ter sido exercido na sua plenitude, considerando a solicitação que lhe foi feita e à qual manifestou a sua indisponibilidade respondendo que não daria qualquer entrevista.

Deste modo, é entendimento da R (…), pelas razões referidas não haver lugar ao exercício do direito solicitado, por carecer de manifesto fundamento.

Com os m/ cumprimentos, (assinatura ilegível)

Directora de Informação de Televisão, M (…)”

 29) No dia 10.07.2019, o Requerente remeteu à Requerida nova comunicação escrita para o exercício de direito de resposta e onde se pode ler:

“Em face da vossa resposta constante da mensagem de correio electrónico abaixo, nos termos do direito de resposta consagrado no artigo 65º e seguintes da Lei da Televisão e Serviços Audiovisuais a Pedido, eu, L (…)(identificação que anexo), venho solicitar que seja tornado público no próximo programa “ X (....) ”, de forma a repor o meu bom nome e reputação, o seguinte texto:

No programa “ X (....) ”, titulado “ W (....) . Donativos distribuídos em várias autarquias nas vésperas das eleições”, emitido em 05.07.2019, são levantadas suspeições e veiculadas falsidades que colocam em causa o meu bom nome – L (…) – e reputação enquanto Presidente da Direção da H (....) de Z (....) .

1. Ao contrário do que foi reportado no programa " X (....) ", não tive qualquer intervenção ou participação no processo de entrega de donativos mostrado na reportagem e desconhecia a sua realização.

2. Foi o então comandante dos H (....) de Z (....) , que conduziu este processo tendo previamente solicitado à Câmara Municipal de Z (....) a lista dos beneficiários desses donativos.

3. Foi a associação doadora representada pelo Sr. J (…) que entregou a referida listagem.

4. A listagem apresentada pelo " X (....) " está disponível no sítio da Câmara Municipal de Z (....) .

5. A jornalista da Q (...) que me interpelou conhecia estes factos, omitiu-os na reportagem e apesar de lhe ter transmitido que nada tive a ver com a distribuição dos donativos, também omitiu este meu esclarecimento.

6. Lamento que a Q (...) tenha veiculado uma notícia que coloca em causa o meu bom nome e reputação, mesmo sendo conhecedora de factos que omitiu.

30) A Requerida respondeu ao Requerente, através de comunicação escrita, datada de 11.07.2019, e recebida por este em 15.07.2019, com o seguinte conteúdo:

“Exmo. Senhor

Em resposta à V/ carta relativa em referência, e sem prejuízo das alterações introduzidas ao texto enviado, subsiste a questão de fundo quanto à inexistência de fundamento, bem como se mantém as expressões desproporcionadamente desprimorosas (...) que põem em causa, como foi dito anteriormente, o cumprimento das nomas deontológicas aplicáveis ao exercício da atividade dos jornalistas, bem como aos deveres obrigações que recaem sobre a Q (...) , como é o caso dos dois últimos parágrafos.

Quanto à inexistência de fundamento, reitera-se o referido na n/ anterior comunicação que, em resumo, se transcreve,

Por fim, mas não menos relevante, existe ainda uma questão essencial para aferir da viabilidade do exercício do direito e que se prende com o facto de estarmos perante uma resposta que carece manifestamente de fundamento (artigo 68.º, n.º 1 da mesma lei).

Efetivamente, da análise rigorosa da peça (que, aliás, se insere numa investigação jornalística mais vasta sobre o dramático tema dos incêndios de 2017) verifica-se, de forma clara, que não foram feitas afirmações inverídicas ou errôneas, conforme exigido no n.º 1, do artigo 65.º da mesma lei. A peça em causa, meramente factual, aborda todas as questões de forma objetiva, facilmente comprováveis e que correspondem à verdade dos factos, encontrando-se assentes numa investigação rigorosa e exaustiva que permitiu aos jornalistas envolvidos ter um conhecimento profundo quanto ao tema tratado. Foram cumpridos, ao limite, todos os princípios, deveres e obrigações que regem o exercício do jornalismo, designadamente, procurou-se obter junto de V. Exa o contraditório, o que nunca, propositadamente, foi feito de modo adequado, atempado e oportuno, sendo certo que o instituto jurídico do direito de resposta não serve esse propósito a posteriori, que é o que se pretende com este pedido de direito de resposta/retificação que carece manifestamente de fundamento.

Efetivamente, a figura do Direito de Resposta e de Retificação não se destina a exercer o contraditório mas sim a reparar, de forma expedita, referências que possam afetar a reputação ou bom nome da pessoa visada, bem como a corrigir referências inverídicas ou erróneas, o que não foi o caso. Na verdade, como já se disse, não foram efectuadas afirmações dessa natureza (…)

Recorda-se que o contraditório (que, em última instância, nunca poderia ser objeto de análise nesta sede) poderia ter sido exercido na sua plenitude, considerando a solicitação que lhe foi feita e à qual manifestou a sua indisponibilidade, respondendo que não daria qualquer entrevista, que, acrescenta-se, V. Exa nunca aqui refutou.

Não obstante o que já ficou dito, salienta-se, a este propósito, e para não restarem dúvidas quanto à inexistência de fundamento para o exercício do direito solicitado, bem  como para o facto de V. Exa insistir na existência de "omissões", "falsidades ou "suspeições", que:

1. Em nenhum momento, ao longo dos cerca de 1,30 minutos referentes a Z (....) , é imputada a V. Exa a responsabilidade pela entrega do dinheiro;

2. Na peça não é referido, em nenhum momento, que V. Exa conhecia, ou teve qualquer contacto, com os membros da associação de doadores, representada pelo Sr. J (…)

3. Também não é referido que V. Exa foi parte interveniente no processo. É dito, sim, que V. Exa é presidente dos H (....) e candidato;

4. Na peça está muito claro que o caso de Z (....) é o único onde se conhece a lista dos beneficiários dos donativos. O único onde o presidente dos H (....) e candidato não quis estar presente na entrega dos donativos. De tal forma o caso é menor que nem sequer foi destaque no pivot nem na síntese do programa.

Assim, a (…) mantém a sua posição, entendendo não haver lugar ao exercício do direito solicitado) por carecer de manifesto fundamento.

Com os m/ cumprimentos, (assinatura ilegível)

Directora de Informação de Televisão, M (…)”.

31) A passagem referida em 17) tem 65 palavras.

32) A resposta id. em 29), contém, excluindo o respectivo introito, 204 palavras.

5.2.

Segunda questão.

5.2.1.

Estatuem, no que para o caso, direta e imediatamente, interessa, os seguintes artigos da Lei da Televisão aprovada pela Lei n.º 27/2007, de 30 de Julho:

Artigo 65.º

Pressupostos dos direitos de resposta e de rectificação

1 - Tem direito de resposta nos serviços de programas televisivos e nos serviços audiovisuais a pedido qualquer pessoa singular ou colectiva, organização, serviço ou organismo público que neles tiver sido objecto de referências, ainda que indirectas, que possam afectar a sua reputação ou bom nome.

2 - As pessoas e entidades referidas no número anterior têm direito de rectificação nos serviços de programas televisivos e nos serviços audiovisuais a pedido em que tenham sido feitas referências inverídicas ou erróneas que lhes digam respeito.

  Artigo 67.º

Exercício dos direitos de resposta e de rectificação

1 - O direito de resposta e o de rectificação devem ser exercidos pelo próprio titular, pelo seu representante legal ou pelos herdeiros, nos 20 dias seguintes à emissão.

2 - O prazo do número anterior suspende-se quando, por motivo de força maior, as pessoas nele referidas estiverem impedidas de fazer valer o direito cujo exercício estiver em causa.

3 - O texto da resposta ou da rectificação deve ser entregue ao operador de televisão ou ao operador de serviços audiovisuais a pedido, com assinatura e identificação do autor, através de procedimento que comprove a sua recepção, invocando expressamente o direito de resposta ou de rectificação ou as competentes disposições legais.

4 - O conteúdo da resposta ou da rectificação é limitado pela relação directa e útil com as referências que as tiverem provocado, não podendo exceder o número de palavras do texto que lhes deu origem.

5 - A resposta ou a rectificação não podem conter expressões desproporcionadamente desprimorosas ou que envolvam responsabilidade criminal ou civil, a qual, neste caso, só ao autor da resposta ou rectificação pode ser exigida.

 

  Artigo 68.º

Decisão sobre a transmissão da resposta ou rectificação

1 - Quando a resposta ou a rectificação forem intempestivas, provierem de pessoas sem legitimidade, carecerem manifestamente de fundamento ou contrariarem o disposto nos n.os 4 ou 5 do artigo anterior, o operador de televisão ou o operador de serviços a pedido pode recusar a sua emissão, informando o interessado, por escrito, acerca da recusa e da sua fundamentação, nas vinte e quatro horas seguintes à recepção da resposta ou rectificação.

2 - Caso a resposta ou a rectificação violem o disposto nos n.os 4 ou 5 do artigo anterior, o operador convida o interessado, no prazo previsto no número anterior, a proceder à eliminação, nas 48 horas seguintes, das passagens ou expressões em questão, sem o que fica habilitado a recusar a divulgação da totalidade do texto.

3 - No caso de o direito de resposta ou de rectificação não terem sido satisfeitos ou terem sido infundadamente recusados, o interessado pode recorrer ao tribunal judicial do seu domicílio, no prazo de 10 dias a contar da recusa ou do termo do prazo legal para a satisfação do direito, e à Entidade Reguladora para a Comunicação Social, nos termos e prazos da legislação especificamente aplicável.

4 - Requerida a notificação judicial do operador que não tenha dado satisfação ao direito de resposta ou de rectificação, é aquele imediatamente notificado por via postal para contestar no prazo de dois dias úteis, após o que será proferida em igual prazo a decisão, da qual há recurso com efeito meramente devolutivo.

5 - Só é admitida prova documental, sendo todos os documentos juntos com o requerimento inicial e com a contestação.

6 - No caso de procedência do pedido, o operador emite a resposta ou a rectificação no prazo fixado no n.º 1 do artigo seguinte, acompanhado da menção de que aquela é efectuada por decisão judicial ou da Entidade Reguladora para a Comunicação Social.

Atentos tais preceitos, e outros citados na sentença, a Srª Juíza decidiu, de jure, alcandorada no seguinte, essencial e sinótico, discurso argumentativo:

«…Consagra a nossa Lei Fundamental o direito de resposta e de rectificação, no contexto da liberdade de expressão e informação - cfr. artigo 37.º, n.º 4 da CRP.

…o direito de resposta…traduz-se num específico direito de expressão frente a outro direito de expressão: garante o direito ao bom nome e reputação contra afirmações ou referências, ainda que indirectas, que o possam afectar…- cfr. artigo 65.º, 1 da LTV - ou seja, tem como objectivo refutar ou apresentar outra versão dos factos ou opiniões que, directa ou indirectamente, ponham em causa o bom nome e reputação do visado, protegendo a dimensão subjectiva da defesa do titular do direito.

…o direito de rectificação…tem como objetivo a correção de referências inverídicas ou erróneas sobre o visado, que lhe digam respeito, ainda que lhe sejam favoráveis  visando assegurar …a verdade dos factos.

Ora, “o direito de resposta compreende-se…instrumento de defesa…dos direitos pessoais mencionados no artigo 26.º da Constituição…os direitos à identidade pessoal, ao bom nome e reputação, à imagem, à palavra e à reserva da intimidade da vida privada e familiar…o direito a que as suas ideias sejam fielmente expostas, a que as suas afirmações não sejam destorcidas, a que não sejam imputados actos que não praticou ou propósitos que não tem, entre outros).

Sendo de realçar que não se afigura necessário que as referências sejam objectivamente atentatórias da reputação e boa fama, bastando que o interessado as considere como tal, não cabendo ao órgão de comunicação social fazer essa avaliação… sendo essa avaliação ponderada por conceitos sociais de reputação e boa fama...

Nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 68.º da LTV… só há lugar a recusa por ausência total de fundamento quando haja uma evidente carência de razoabilidade da pretensão, designadamente, por não existir no texto em causa qualquer fundamento para o respondente se considerar ofendido…

… a apreciação do que pode afectar a reputação e boa fama do visado deve ser vista de uma perspetiva subjetiva, isto é, subjacente à própria óptica do visado, ainda que balizado pelos limites da razoabilidade.

…sendo pacífico o  entendimento que sustenta neste domínio a insindicabilidade, em princípio, quer da apreciação subjectiva dos visados quanto ao carácter das referências de que sejam objecto, quer do conteúdo da resposta que por estes venha a ser apresentada” –  entendimento este seguido pela Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC), designadamente, nas Deliberações do Conselho Regulador nº4/DR-I/2007, de 24/1, e 4/DRI/2009.

É necessário que seja incontestável que a resposta não tem fundamento. (…) É necessário que esteja de todo em todo excluído que o respondente possa sentir-se ofendido (…)

Identicamente, a resposta não pode ser recusada a pretexto de ela não ser verídica. A resposta é a versão alternativa do respondente, é a sua verdade. Fora o caso de total e absoluta inverosimilhança ou de patente falsidade, o sujeito passivo do direito de resposta não pode controlar o conteúdo desta, nem ela é em princípio sindicável no contencioso do direito de resposta.”

A resposta ou a retificação encontram-se também limitadas pela sua relação direta e útil com o texto que lhe deu origem …

…este requisito deve ser entendido em termos hábeis, considerando-se que só não existe relação directa e útil quando a resposta seja de todo alheia ao tema em discussão e se mostre irrelevante para desmentir, contestar ou modificar a impressão causada pelo texto a que se responde…

O que significa, e também na esteira do citado autor e obra, que tal requisito não deve ser entendido em termos demasiado rigorosos, sob pena de se exterminar a função da resposta…

Acresce que, a relação entre os textos – o original e o que se pretende publicar – deve ser avaliada em função da globalidade do texto de resposta e não de apenas uma ou mais passagens isoladas e que o limite referente a essa relação se prende, por isso, com a proibição de resposta a outros textos ou de escolha de tema diverso do versado no texto original.

O texto de resposta ou a retificação não podem exceder o número de palavras do texto que lhe deu origem (art. 67.º, n.º 4 LTV).

Na contagem do número de palavras da resposta ou da retificação devem ser descontadas a identificação, a assinatura e as fórmulas de estilo…. Por sua vez, no que toca à contabilização do número de palavras do texto original, tem sido entendimento, nomeadamente da ERC, de que deve atender-se apenas à parte do texto em que são feitas as referências que motivam a resposta (e não à sua totalidade) quando essa parte seja suficientemente destacável do conjunto…

Entende-se por “expressões desproporcionadamente desprimorosas”, aquelas que revelam uma desproporção entre a linguagem da peça inicial e a do texto de resposta ou entre os visados no texto de resposta e os referidos na peça inicial. O busílis da questão para esta apreciação é, portanto, o de “desproporção”.

…se alguém é ofendido na imprensa, certamente que não pode retaliar ofendendo o ofensor, em jeito de retorsão; mas não é exigível que paute a sua resposta por regras de urbanidade, etiqueta, delicadeza, polidez ou elegância…

Nessa medida, não se impede o uso de expressões objetivamente desprimorosas, nomeadamente, provocatórias ou trocistas, que são consentidas na medida em que correspondam ao tom da peça inicial.

Volvendo ao caso em apreço.

Em sede de contestação, alega ainda a Requerida que a resposta apresentada pelo Requerente (iii) não tem relação directa e útil com a reportagem, (iv) não tendo o mesmo legitimidade para o seu exercício; e bem ainda (v) por exceder largamente o número de palavras do texto que faz referência ao Requerente.

Analisemos.

i - Quanto à manifesta falta de fundamento invocada, … verifica-se que o facto invocado pela Requerida não faz parte do elenco taxativo de motivos de recusa do direito de resposta, referidos supra, não justificando, por isso, a recusa da Requerida em emitir o direito de resposta…

Já quanto ao argumento invocado pela Requerida …que…a única e curta referência relativa ao Requerente na reportagem em discussão de modo algum colide com o seu bom e reputação…dir-se-á que da análise da aludida reportagem, de uma forma global e concertada – e não espartilhada em 1 minuto e 30 segundos, sem qualquer conexão no seu todo, como quer fazer crer a Requerida – conclui-se, efectivamente, que são feitas referências directas e expressas à pessoa do Requerente, sendo perfeitamente identificável através do seu nome, imagem fotográfica, como candidato às eleições autárquicas pelo partido político (...) e com ligação aos H (....) de Z (....) enquanto Presidente da de H (....) , tal como decorre dos factos provados 17) e 18).

E, no final da reportagem, a imagem com que se fica – de qualquer destinatário normal da reportagem – é a mensagem inicial desta mesma reportagem:

A imputação, ainda que indirecta, do Requerente no envolvimento com a entrega dos donativos.

Detalhando.

No que ora releva, designadamente, da factualidade dada como provada em 5), 10), 11), 12), 13), 14), 15), 16), 17) 18), 19), 20), 21), 22), 23), 24) e 25) e respectiva conjugação, a ilação que se retira, com mediana clareza, no que releva ao concelho de Z (....) , e na sequência lógica da dita reportagem, é que foi efectuada uma referência, ainda que indirecta, do nome do Requerente à entrega dos ditos donativos, não colhendo a tese ora apresentada pela Requerida com questões de semântica e interpretação enviesada...

…da análise conjunta e conjugada, mormente do facto 5) com os factos provados em 17) e 18), resulta evidente que, no âmbito da reportagem do “ Y (....) ”, a pessoa visada e relacionada com o concelho de Z (....) foi o aqui Requerente.

Caso fosse intenção da Requerida desmistificar e não gerar qualquer confusão junto do público bastava para tanto ter referido, no âmbito da aludida reportagem que, por exemplo, “segundo informação prestada por L (…) – candidato pelo (...) e Presidente da Direcção da H (....) de Z (....) – o mesmo disse que nenhuma relação / envolvimento teve com a entrega dos ditos donativos.” E simultaneamente exibia através de imagem televisa a sua fotografia e respectiva identificação em legenda.

E aqui resolvia a questão.

Ao invés, a jornalista da Requerida – expressamente – disse que sic:

“Afinal não foi só em W (....) que houve distribuição de dinheiro de donativos em pleno dia de reflexão para as últimas eleições autárquicas. Ao todo, 185 mil euros foram distribuídos em três quartéis de H (....) por candidatos às eleições autárquicas. Todos do (...) . Ligados aos H (...) de W (....) , Z (....) e V (....) .” - Facto provado 5).

“Mas além de V (....) há outro concelho envolvido. Z (....) . O Presidente da de H (....) também era candidato do (...) …neste caso …a Presidente da U (...) .

L (…), optou por não estar presente na cerimónia de entrega dos donativos no seu quartel, mas só não foi alvo de uma queixa para a CNE, porque o adversário socialista ganhou as eleições.” - Facto provado 17).

O facto de a Requerida utilizar a palavra “optar” – e no contexto global da reportagem – a ideia que perpassa – do ponto de vista de qualquer declaratário normal – é a de que, o Requerente preferiu não estar presente na entrega dos donativos no quartel dos H (....) mas, indirectamente, e apesar não ser abordado (directamente) na reportagem, teria eventual conhecimento da alegada lista e conivência com a entrega dos donativos no dia de reflexão para as eleições autárquicas … no quartel de H (....) de Z (....) …

Uma coisa é optar – cujo significado redunda em “preferir; escolher” -, outra coisa é não querer por nenhum envolvimento ter na situação visada.

Circunstância esta que não resulta de modo algum da aludida reportagem, aparentando, ao invés, a probabilidade do pretenso envolvimento do Requerente na entrega dos ditos donativos.

Por outro lado, ao inculcar a ideia, logo de seguida, “mas só não foi alvo de uma queixa para a CNE, porque o adversário socialista ganhou as eleições.”, mais evidente se torna, pois que a interpretação que daqui se retira, indirectamente, é a de que o Requerente, caso tivesse ganho as eleições, teria sido alvo de uma queixa para a CNE – pois que, apesar de não ter estado presente no dia anterior às eleições autárquicas na entrega dos donativos no quartel dos H (....) , tinha conhecimento, sendo conivente com a dita entrega de donativos.

E só também não seria alvo de uma queixa para a CNE, e no caso de existirem indícios da prática de crime, “no presente momento, atendendo ao lapso de tempo decorrido, [pois que] encontrar-se-ia extinta a responsabilidade criminal.” – Facto provado 20).

Quanto ao facto de a resposta do Requerente não ter relação directa e útil com a reportagem…

Da análise do teor da resposta apresentada pelo Requerente [facto provado 29)] e considerando no global a reportagem emitida, verifica-se ser patente que o conteúdo da resposta se relaciona directamente com os factos descritos na aludida reportagem, pretendendo esclarecê-los e visando alterar a impressão que a visualização desta causa no espectador, qual seja o não envolvimento do Requerente na entrega dos donativos.

É, assim, manifesto que a resposta não é de todo alheia ao tema em causa, nem tão pouco irrelevante para desmentir, contestar ou modificar a impressão causada pelo texto inicial (cfr. sup. cit. autor e o Ac. TRL, de 13.10.2009 referido supra).

Para além de que, reitera-se, a relação entre os textos – o original e o que se pretende publicar - deve ser avaliada em função da globalidade do texto de resposta e não de apenas uma ou mais passagens isoladas e que o limite referente a essa relação se prende, por isso, com a proibição de resposta a outros textos ou de escolha de tema diverso do versado no texto original.

In casu, todos os esclarecimentos prestados pelo Requerente no texto da resposta [facto prova 29)] ao incidir numa explicação do que, no seu entender, se passou com o processo de entrega de donativos e da sua não intervenção ou participação no mesmo, têm conexão directa com a reportagem televisiva que lhe deu origem.

Pelo que, se conclui que o conteúdo da resposta tem relação directa e útil com o texto da resposta apresentado pelo Requerente.

Quanto à falta de legitimidade do Requerente.

Alega ainda a Requerida que, não sendo o Requerente o visado pelas referências feitas aos donativos, o mesmo não tem legitimidade para exercer resposta sobre assuntos/questões que são directamente imputadas a outras pessoas.

Carece de razão tal argumento.

Tal como decorre do artigo 67º, n.º 1 da LTV, a legitimidade para o exercício do direito de resposta afere-se pela própria pessoa visada pelas referências que são feitas.

Chamando à colação o conceito de referências, directas e indirectas, expostas supra e considerando, nomeadamente, os factos provados em 5), 10), 17) e 18), é evidente que o visado por tais referências é o aqui Requerente, o que, para tanto, basta concluir pela sua legitimidade para o exercício de direito de resposta.

Quanto ao excesso do número de palavras da resposta versus o texto original.

Ora, atendendo ao enquadramento global da reportagem emitida, a qual tem uma sequência lógica, e não apenas a passagem espartilhada indicada pela Requerida - pois que se entende que essa parte não está suficientemente destacável do conjunto da reportagem – é manifesto que a resposta apresentada não excede o número de palavras do texto que lhe deu origem, pelo que (também) não é motivo de recusa de transmissão da resposta.»

5.2.2.

Esta fundamentação apresenta-se, em tese, curial; e, no caso concreto, perante os factos apurados, adequada e conforme.

Pelo que urge corroborá-la e chancelá-la.

Em seu abono, e, quiçá,  ad abundantiam  e algo pleonásticamente, sempre se  dirá o seguinte.

Prescrevem os artºs 26º e 27º da Lei 27/2007, de 30 de Julho:

Artigo 26.º

Autonomia dos operadores

1 - A liberdade de expressão do pensamento através dos serviços de programas televisivos e dos serviços audiovisuais a pedido integra o direito fundamental dos cidadãos a uma informação livre e pluralista, essencial à democracia e ao desenvolvimento social e económico do País.

2 - Salvo os casos previstos na presente lei, o exercício da actividade de televisão e dos serviços audiovisuais a pedido assenta na liberdade de programação, não podendo a Administração Pública ou qualquer órgão de soberania, com excepção dos tribunais, impedir, condicionar ou impor a difusão de quaisquer programas.

  Artigo 27.º

Limites à liberdade de programação

1 - A programação dos serviços de programas televisivos e dos serviços audiovisuais a pedido deve respeitar a dignidade da pessoa humana e os direitos, liberdades e garantias fundamentais.

A actividade de televisão apresenta-se como uma manifestação da liberdade de expressão e é uma realidade multidimensional, na medida em que, sendo parte da garantia constitucional do pluralismo, desempenha um papel importante ao nível da realização de um conjunto de valores, apresentando-se simultaneamente como actividade espiritual e económica e como manifestação cultural.

A liberdade de programação constitui o núcleo da  actividade de televisão.

Ora tal actividade constitui uma

«…situação jurídica complexa que envolve designadamente: um direito de defesa contra intervenções ou interferências do Estado; um direito a protecção contra intervenções ou ofensas provindas de terceiros; e naturalmente o direito à conformação do conteúdo da programação (Programmgestaltung).

 Além disso, a liberdade de programação surge associada (como decorre claramente do artigo 26.º, n.º 2, da Lei da Televisão) ao dever de neutralidade do Estado e ainda ao princípio da reserva de Parlamento …»

Porém:

«…a liberdade de programação pode eventualmente ser restringida…por uma série de normas que visam proteger certos valores, bens e interesses constitucionalmente relevantes: …limites (negativos e positivos) à liberdade de programação.

(i) Entre os limites negativos (artigo 27.º da Lei da Televisão), avultam: o respeito da dignidade da pessoa humana; o respeito pelos direitos, liberdades e garantias [pessoais]...

Saber em que consiste o respeito pela dignidade da pessoa humana não se afigura tarefa fácil. Segundo a doutrina alemã, que recorre à chamada fórmula do objecto (Objektformel), a dignidade da pessoa humana é violada quando a pessoa for transformada em mero objecto do agir alheio ou for colocada numa situação de total privação de autodeterminação (designadamente quando a pessoa for directamente humilhada, degradada ou discriminada ou quando uma emissão tenha como fim principal provocar uma ofensa ou lesão a bens essencialíssimos da pessoa, como a vida ou a integridade física).

…o operador de televisão não deverá nunca esquecer que a pessoa humana viva e concreta constitui o valor e a referência última do ordenamento…

(ii) Por seu lado, entre os limites positivos, destacam-se: os deveres de anúncio e cumprimento da programação (artigo 29.º); a existência de mensagens de divulgação obrigatória (artigo 30.º); a existência de um conjunto de obrigações gerais dos operadores (artigo 34.º) ou de outras obrigações legais (artigos 37.º, 42.º); a obrigação de difusão, nos serviços de programas nacionais, de certas obras audiovisuais (artigos 44.º e seguintes); enfim, a existência de direitos de antena, de resposta e de rectificação (artigos 59.º a 63.º e 65.º a 69.º)

(iii) Quanto ao serviço público, os deveres de formação e informação devem ser vistos não tanto como limites da liberdade de programação (pois nesse caso não releva semelhante estrutura jus subjectiva), mas sim como uma componente da missão e da tarefa do serviço público. » - JOSÉ DE MELO ALEXANDRINO, A LEI DA TELEVISÃO in,  https://www.icjp.pt/sites/default/files/media/419-461.pdf.

Acrescentemos ainda ao doutamente expendido na sentença mais algumas concretizações ou complementos que, de algum modo, demonstram a importância e a abrangência que a lei confere ao direito de resposta.

Assim.

O direito de resposta e o de retificação podem ser exercidos tanto relativamente a textos como a imagens: art. 65.º nº3 LTV.

No tocante aos serviços de programas radiofónicos, o direito de resposta e o de retificação podem ser exercidos quanto a palavras proferidas ou a sons veiculados numa dada emissão radiofónica, independentemente de umas e outros terem ou não suporte num determinado texto.

Podem ser exercidos o direito de resposta e o de retificação sobre partes do texto que contenham citações de terceiros ou de fontes de informação.

Se determinadas palavras ou expressões conferem a alguém a faculdade de exercer o direito de resposta, não pode o órgão de comunicação social recusá-lo com o argumento de que se limitou a transcrevê-las e de que não é sua a respetiva autoria - ERC pontos 22. e 23.|Delib.9/DR-I/2011.

As referências que podem originar direito de resposta são todas aquelas que sejam desprimorosas, ofensivas, que desvalorizem, diminuam ou ridicularizem os valores ou as qualidades de uma pessoa, que, segundo o sentimento geral da comunidade, sejam suscetíveis de ferir o amor-próprio e de prejudicar o conceito favorável de que o visado goza no círculo das suas relações pessoais, sociais ou profissionais e, consequentemente, suscetíveis de causar dano à sua estima, renome e consideração social.

 Incluem-se neste âmbito tanto as referências factuais como juízos de valor ou opiniões. As referências suscetíveis de afetar a reputação e boa fama (ou bom nome) do visado podem ser diretas, procedendo-se, nesse caso, à sua identificação (por exemplo, através do respetivo nome ou imagem/fotografia), ou indiretas (cabendo aqui as que permitam, ainda assim, através da caracterização do visado, o seu reconhecimento ou identificação, mesmo que apenas no círculo restrito em que o mesmo se mova habitualmente).

 Não é necessário que as referências sejam objetivamente atentatórias da reputação e boa fama, bastando que o interessado as considere como tal, não cabendo ao órgão de comunicação social fazer essa avaliação. Assim, a avaliação do caráter ofensivo, inverídico ou erróneo do conteúdo publicado ou emitido e da oportunidade de exercer o direito de resposta ou de retificação cabe ao próprio titular do direito. Essa avaliação é temperada por conceitos sociais de reputação e boa fama -  Ac. TRL, de 13.10.2009, p 576/09.7TBBNV.L1 in dgsi.pt. cit. na sentença.

Relativamente à «relação direta e útil» entre  resposta ou a retificação  e o texto que lhe deu origem entende-se   que ela não existe apenas nos casos em que a resposta seja de todo alheia ao tema em causa e seja irrelevante para desmentir, contestar ou modificar a impressão causada pelo texto inicial - Ac. TRL, de 13.10.2009, cit.

 Também a este propósito a ERC fornece alguma orientação. Assim, explicita que a relação entre os textos deve ser avaliada em função da globalidade do texto de resposta e não de apenas uma ou mais passagens isoladas e que o limite referente a essa relação se prende, por isso, com a proibição de resposta a outros textos ou de escolha de tema diverso do versado no texto original - Diretiva 2/2008, ponto 5.1.

5.2.3.

Nesta conformidade, improcedem os vícios/ilegalidades imputados à sentença, a saber:

i- a manifesta ausência de fundamento para a resposta, pois que inexistem  factos, ou  os provados irrelevam,  já que dos mesmos não emerge qualquer ofensa ao bom nome e reputação do requerente – artº 68.º, n.º 1 da LTV.

ii- a inexistência de relação útil entre o direito de resposta e o ato que lhe deu causa  pois que não  existem referências na reportagem ao Recorrido relacionadas com a resposta que pretende apresentar - artº 68.º, n.º 2 da LTV.

iii- a ilegitimidade do requerente porque  a  pretendida resposta  não respeita à referência (facto provado 17) que lhe é feita,  antes se expressando  sobre outros pontos da reportagem com o qual não é, em momento algum, relacionado – artº 67.º, n.º 1 e 4 da LTV.

iiii- o excesso quantitativo da resposta, pois que, só foi visado em 65 palavras e aquela contém 204 -  artº 67.º, n.º 4 da LTV.

No atinente à falta de fundamento, este argumento revela-se totalmente insubsistente, pois que, dos factos apurados e citados na decisão,  conclui-se que não apenas existe uma alusão direta ao requerente, por palavras – ponto 17 – e por imagens – ponto 18 – como indirecta, a maioria dos restantes pontos citados.

Ora mediante uma  interpretação  concatenada de todos os factos, atento, vg.,  a ratio da reportagem, o iter  que lhe foi dado e a teleologia  que, do princípio ao fim, a perpassa– crítica do aproveitamento para fins eleitorais da distribuição dos fundos  destinados aos lesados dos incêndios – é meridanamente evidente que o ora requerente também é incluído no lote dos que, ainda que, porventura, de um modo menos ostensivo ou frisante, também quis operar e operou tal aproveitamento.

Tanto assim que, verbaliza-se, adrede, na peça, que: «só não foi alvo de uma queixa para a CNE, porque o adversário socialista ganhou as eleições»

É evidente que esta conclusão tem um significado e um sentido, os quais, pelo que antes e depois foi referido no programa, não pode, para o homem médio minimamente sagaz,  deixar de ser outro  do que o aludido.

Destarte, não apenas o teor do programa se apresenta, desde logo na mera perspectiva subjectiva do requerente - o que, como se viu, é o qb, para alicerçar o direito de resposta – indicador da intervenção do requerente na distribuição dos fundos  pelo modo criticamente difundido, como ele, objetivamente, assume tal jaez e finalidade.

A alegada inexistência de relação útil clara e inequívocamente soçobra.

Efetivamente, já se concluiu que a reportagem afeta negativamente os direitos de personalidade do recorrido, quer globalmente considerada, quer por concreta referência ao mesmo em certos passos, e a resposta atêm-se, única simplesmente, a expor factos que infirmam ou podem infirmar tal afectação, não sendo, assim, de todo em todo, alheia o teor da reportagem, muito antes pelo contrário.

E por aqui outrossim se alcança inexistir, pelos motivos invocados pela recorrente, qualquer ilegitimidade do recorrido: já porque a reportagem, na sua globalidade,  a ele se refere, direta ou indiretamente, mediata ou imediatamente, com maior – ponto 17 dos factos  provados - ou menor – vg. pontos 5, 10 a 12, 19 e 21 a 23 -   concretização; já porque o teor da resposta, aliás, escorreita e comedida, limita-se e atém-se ao tema da reportagem na  estrita medida em que esta a ele se dirige.

Aliás este  argumento da falta de legitimidade, se perspectivada esta figura no seu significado/sentido  jurídico formal estrito, menos bem é aduzido.

Efetivamente, a legitimidade afere-se pela posição do sujeito/interessado/parte em relação ao objecto do processo/pedido tal como pelo impetrante é definido, e exprimindo-se o interesse deste (autor) pela utilidade derivada da procedência da sua pretensão – artº 30º do CPC.

Ora, na perspectiva do recorrido,  única a considerar, a  procedência do seu pedido de efetivação do seu direito de resposta tem para si interesse; o que é o bastante para lhe conferir legitimidade.

Finalmente improcede o argumento do excesso do número de palavras da resposta por reporte ao número da reportagem.

Primus porque, como bem se expende na decisão, o recorrido é abrangido noutros pontos na reportagem – ainda que  nalguns passos mediata indiretamente,  que, como se viu é o qb. -,  sendo, pois, por comparação com todo o seu teor, ou, ao menos com a maior quota parte do seu conteúdo e extensão, que a comparação deve ser feita.

Secundus porque, mesmo que tal irregularidade se verificasse, a recorrida sempre estava obrigada a convidar o recorrido a  encurtá-la à medida do legalmente exigível.

Efetivamente, tal dever sobre si impende quanto aos vícios  da falta de relação direta e útil e do uso de expressões desproporcionadamente desprimorosas – artº 68º nº2.

 Pelo que, por igualdade ou, até, quiçá, por maioria de razão (argumento a fortiori), pois que tal excesso quantitativo sempre seria, perante tais vícios  materiais/substantivos, uma irregularidade menor, um minus, outrossim relativamente a esta alegada irregularidade deveria igualmente diligenciar.

Improcede o recurso.

6.

Sumariando – artº 663º nº7 do CPC.

I - Os factos a considerar são apenas os provados, e que tenham ou possam ter relevância para a boa decisão da causa segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito.

II -Tem direito de resposta  nos serviços de programas televisivos e nos serviços audiovisuais quem tiver sido objeto de referências, ainda que indiretas, que possam afectar a sua reputação ou bom nome – artº 65º nº1 da Lei  27/2007, de 30.07.

III – A avaliação subjetiva do visado,  ainda que, no limite, temperada pela perspetivação dos conceitos sociais de reputação e boa fama é, em princípio, suficiente para permitir/exigir a efetivação do direito de resposta.

IV – Destarte, este só pode ser recusado se: i) provierem de pessoas sem legitimidade; ii) carecerem manifestamente de fundamento; iii) inexistir  relação directa e útil  entre o seu teor  e as referências da peça ou reportagem que o tiver provocado; iiii) nele existirem expressões desproporcionadamente desprimorosas ou que envolvam responsabilidade criminal ou civil, ou; iiiii) exceder o número de palavras do texto que lhe deu origem – artºs 67º nºs 4 e 5  e 68º nº1 da cit. Lei.

V – Para aferir da (in)existência destes impedimentos, há que atender não apenas a um certo passo adrede dirigido ao visado/requerente, mas  a todo o texto e contexto da peça jornalística e da ratio e teleologia  a ela  imanente  e a este  referentes.

VI – Se concluir pela existência de, pelo menos, algum dos impedimentos iii), iiii) e iiiii) do ponto III, o operador  deve convidar o interessado a proceder à sua eliminação,  e só se esta não se verificar é que fica habilitado a recusar a divulgação da totalidade do texto – artº 68º nº2.

7.

Deliberação.

Termos em que se acorda negar provimento ao recurso e, consequentemente, confirmar a, aliás douta, sentença.

Custas pela recorrente.

Coimbra, 2020.01.28.

Carlos Moreira ( Relator )

Moreira do Carmo

Fonte Ramos