Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
424/08.5TBNLS-A.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: FALCÃO DE MAGALHÃES
Descritores: PROVA DOCUMENTAL
ADMISSIBILIDADE
DOCUMENTO
SIGILO BANCÁRIO
SEGREDO PROFISSIONAL
Data do Acordão: 04/20/2010
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: NELAS
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTºS 341º E 362º DO CC, 519º, 523º, Nº 1, E 543º, Nº 1, DO CPC
Sumário: I – Na apreciação da admissibilidade de um documento não deve entrar o juízo sobre a força probatória do mesmo, não havendo que curar, nessa ocasião, de saber se esse documento é suficiente à prova do facto que se alega visar ao requerer-se a respectiva junção.

II – A relevância do documento não se confunde com a sua aptidão para, “per se”, conduzir à prova dos factos a que respeita. Para que essa relevância se surpreenda no documento basta que este seja susceptível de contribuir, de concorrer, para a prova de tais factos.

III – Não são de indeferir, “in limine”, as diligências requeridas para obtenção de documentos na posse de uma instituição bancária ou da administração fiscal, que, embora abarcados pelo sigilo bancário e pelo sigilo fiscal, sejam susceptíveis de vir a ser legitimamente fornecidos por tais entidades, em virtude de levantamento ou de cessação desses sigilos.

Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

I - A) - A... e mulher, B...., intentaram, no Tribunal Judicial da Comarca de Nelas, acção declarativa, de condenação, contra C..... e mulher, D...., E.... e mulher, F...., G.... e mulher, H.... e “CAIXA I.....”, pedindo:

- que fosse declarada a nulidade, por violação da forma legalmente exigida, dos empréstimos que, nos montantes que indicam, haviam efectuado a favor dos 1ºs e dos 2ºs Réus;

- que tais RR fossem condenados a restituírem-lhes esses montantes, bem como a pagarem-lhes os respectivos juros de mora;

- que fosse declarada nula a venda efectuada pelos 2ºs RR aos 3ºs RR da fracção autónoma do prédio que identificam, bem como da hipoteca do mesmo constituída a favor da 4ª Ré, com a consequente restituição do imóvel aos 2ºs RR e cancelamento dos respectivos registos de aquisição e hipoteca;

Subsidiariamente a este último pedido, com base em impugnação pauliana do negócio, pediram os autores que a referida venda fosse declarada ineficaz em relação a eles, restituindo-se o imóvel aos 2ºs RR na medida do seu (deles, AA) interesse.

Sustentam, em síntese, para alicerçar a peticionada declaração de nulidade da venda, que esta foi simulada, não tendo os 3ºs RR pago qualquer preço, até porque sempre foram pessoas de parcos rendimentos, sem possibilidade de aforrar ou de investir, tendo, o mútuo por eles contraído junto da CAIXA I...., o exclusivo propósito de criar a aparência de uma venda, sendo os 2ºs RR quem tem, directa ou indirectamente, vindo a amortizar esse empréstimo.

B) - Tendo a acção sido contestada, veio a ser proferido despacho saneador, foram fixados os factos assentes e elaborou-se a base instrutória, desta constando, entre outros, os seguintes quesitos:

17.°) Não obstante o descrito em A), a verdade é que nem os terceiros réus quiseram adquirir, nem os segundos réus quiseram vender a fracção aí referida, não tendo aqueles liquidado o valor aí mencionado a título de preço, o que já confessaram a terceiros?

19.°) Ao celebrar o acordo descrito em A) os segundos e terceiros réus tiveram como objectivo subtrair o bem aí descrito do alcance dos credores dos segundos réus?

21.°) (...) não sendo conhecidos aos segundos réus mais quaisquer bens que possam responder por tais dívidas?

22) Os terceiros réus foram sempre pessoas de parcos recursos financeiros, nunca auferindo mensalmente e em conjunto quantia superior à correspondente a três, quatro ordenados mínimos mensais, sem possibilidade de realização de aforros ou quaisquer investimentos em qualquer espécie de bens?

24.°)A contracção pelos terceiros réus do empréstimo aludido em A) e B) junto da CAIXA I...., quarta ré, teve como exclusiva intenção criar uma aparência de venda, tentando fazer crer aos credores dos segundos réus que os terceiros réus desconheciam o descrito em 18.°), 19.°), 20.°) e 21.º)?

25) (...) empréstimo esse que tem vindo a ser liquidado directa ou indirectamente pelos segundos réus?

C) – Notificados para o efeito, vieram os AA. indicar as suas provas, apresentando requerimento nos seguintes termos (fls. 174 e 175), desconsiderado o mais que ora não releva:

«1- Requerem a notificação dos terceiros réus, para, em prazo a determinar, procederem à junção aos autos de cópia da declaração das declarações de impostos sobre rendimentos por si apresentadas nos anos de 1998 até 2003, para prova do quesito n.° 17° e 22° da base instrutória.

2- Requerem a notificação da 4ª ré (CAIXA I....) que interveio na escritura de aquisição mencionada nos factos assentes, para juntar aos presentes autos os seguintes documentos:

a) Documentos do processo de empréstimo referentes à supra citada escritura de compra e venda e mútuo com hipoteca, nomeadamente os rendimentos apresentados pelos compradores, declarações de composição do agregado familiar que apresentaram no momento - para prova dos quesitos n.°s 17°, 19°, 22°, 24° e 25° da base instrutória;

b) A indicação da forma de pagamento e junção dos respectivos meios de pagamento das prestações acordadas no dito mútuo e se se encontram regularizadas todas as prestações vencidas - para prova dos quesitos 17°, 19°, 22°, 24° e 25° da base instrutória;

c) Extracto da conta n.° .... (onde foi creditado o valor mutuado) de que são titulares os terceiros réus, contendo o resumo de todos os movimentos aí realizados desde a data da escritura de compra e venda 17°, 19°, 22°, 24° e 25° da base instrutória;

Por último,

3- Requerem a V. Exa. se digne mandar notificar a Direcção Geral de Contribuições e Impostos para certificar e juntar aos presentes autos, os seguintes documentos:

a) (Caso os terceiros réus não juntem os documentos requeridos no n.º 1 do presente requerimento) Se com referência aos anos civis de 1998 a 2003, os terceiros ser réus, contribuintes fiscais n.°s .... e ....., apresentaram alguma declaração de rendimentos em sede de IRS e, em caso afirmativo, sejam as mesmas juntas aos presentes autos - prova do quesito n.° 22 da base instrutória;

b) Certidão comprovativa do domicílio fiscal dos segundos e terceiros réus, contribuintes fiscais n.°s ..., ..., ... e ..., para prova do quesito n.° 14° e 16º;

c) Certidão da qual constem os bens imóveis inscritos em nome dos segundos e terceiros réus, respectivamente contribuintes fiscais n.° ..., ..., ... e ...., em todo o território nacional, para prova dos quesitos n.°s 21° e 22° da base instrutória;».

D) - Sobre este requerimento dos AA., recaiu o despacho de 20/11/2009 (fls. 191), onde, para além do mais, se consignou o seguinte:

«(…) No que concerne aos documentos requeridos a fls. 174, não se defere a notificação requerida, porquanto os que constam do ponto 1 não se afiguram relevantes, os contantes do ponto 2 encontram-se a coberto do sigilo bancário e os do ponto 3 a coberto do sigilo fiscal, não se justificando no caso concreto o levantamento do mesmo. (…)».

II - Deste despacho apelaram os Autores, que, nas alegações de recurso que veio a ser recebido como apelação, a subir imediatamente, em separado e com efeito meramente devolutivo, apresentaram as seguintes conclusões:

[………………………………………………]

Terminaram defendendo a revogação da decisão impugnada e a substituição dela por uma outra que deferisse a pretensão dos apelantes manifestada a fls. 174 dos autos.

A Mma. Juiz do Tribunal “a quo” proferiu despacho referindo que a decisão impugnada, ainda que sucintamente, fora fundamentada, “não julgando, face à matéria indicada que o levantamento do sigilo bancário e fiscal fosse essencial.”.

III - Em face do disposto nos art.ºs 684º, n.º 3 e 685-Aº, n.º 1, ambos do Código de Processo Civil (CPC)[1], o objecto dos recursos delimita-se, em princípio, pelas conclusões dos recorrentes, sem prejuízo do conhecimento das questões que cumpra apreciar oficiosamente, por imperativo do art.º 660, n.º 2, “ex vi” do art.º 713º, nº 2, do mesmo diploma legal.

Não haverá, contudo, que conhecer de questões cuja decisão se veja prejudicada pela solução que tiver sido dada a outra que antecedentemente se haja apreciado, salientando-se que, com as “questões” a resolver se não confundem os argumentos que as partes esgrimam nas respectivas alegações e que, podendo, para benefício da decisão a tomar, ser abordados pelo Tribunal, não constituem verdadeiras questões que a este cumpra solucionar (Cfr., entre outros, Ac. do STJ de 13/09/2007, proc. n.º 07B2113 e Ac. do STJ de 08/11/2007, proc. n.º 07B3586 [2]).

Assim, as questões a solucionar são as de saber se deveria ter sido deferido o requerimento sobre o qual recaiu o despacho impugnado e se este enferma de nulidade, por falta de fundamentação.

IV - A) - O circunstancialismo processual e os factos a considerar na decisão a proferir estão enunciados em I “supra”.

B) - 1 - Nulidade do despacho impugnado:

A falta de fundamentação terá de ser absoluta para que se considere integrar a nulidade de sentença (ou de despacho - art.º 666º, n.º 3, do CPC) prevista na alínea b), do n.º 1.º, do art.º 668º do CPC. Não se pode ter por verificada uma tal omissão nas situações em que, em lugar de estar completamente ausente (ou, o que é equivalente, ser ininteligível), a fundamentação é tão só deficiente, v.g., por ser incompleta, ou por ser medíocre. É o que a nossa Doutrina tem ensinado [3] e os nossos Tribunais têm decidido [4].

O exposto leva-nos a concluir que o despacho em causa, arrimando o indeferimento nele decidido na irrelevância dos documentos indicados sob o nº 1 do requerimento de fls. 174/175, no sigilo bancário, relativamente aos elementos referidos no nº 2 e no sigilo fiscal, quanto ao requerido sob o nº 3, não padece de falta de fundamentação, embora, sem rebuço, se reconheça ser esta escassíssima.

Assim, não se mostra violado o disposto no art.º 158º do CPC, nem, consequentemente, se verifica a nulidade prevista no art.º 668.º, n.º 1, b), do CPC.

2 – Erro de julgamento:

Enquanto meios de prova, os documentos têm por escopo a demonstração da realidade dos factos alegados (art.º 341º do CC e 523.º, n.º 1, do CPC).

Atento tal escopo, bem se compreende a não admissibilidade da junção de documentos sem relevo para esse efeito.

Mas a relevância do documento não se confunde com a sua aptidão para, “per se”, conduzir à prova dos factos a que respeita. Para que essa relevância se surpreenda no documento basta que este seja susceptível de contribuir, de concorrer, para a prova de tais factos.

Efectivamente, na apreciação da admissibilidade de um documento não deve entrar o juízo sobre a força probatória do mesmo, ou seja, não há que curar, nessa ocasião, de saber se esse documento é suficiente à prova do facto que se alega visar ao requerer-se a respectiva junção.

O que importa fazer, ao aferir da apontada admissibilidade, é saber se o facto que se alega pretender provar com o documento está já assente, ou se é indiferente à solução da causa (seja pela sua irrelevância intrínseca, seja pela circunstância de, embora alegadamente conexo com factualidade discutida no pleito, não poder ser tomado em consideração neste), ou se é totalmente estranho à matéria que se discute na acção.

São desnecessários os documentos que digam respeito a factos da causa já assentes, sendo impertinentes os documentos relativos a factos cuja prova seja irrelevante para a sorte desta.

Desnecessários ou impertinentes, a junção de documentos que assim se devam considerar carece de utilidade no processo, pelo que não deve o juiz admiti-la (cfr. art.ºs 543º nº 1).

No caso “sub judice”, quer para demonstrar a alegada simulação da compra e venda do imóvel em causa, quer para evidenciar a má fé que importa verificar-se para que proceda a impugnação pauliana (artº 612º, do CC), nenhum dos documentos indicados pelos AA, se mostra, “ab initio”, irrelevante, sendo evidente, quanto às declarações de impostos sobre rendimentos, apresentadas pelos 3ºs RR, que as mesmas, podendo contribuir para o conhecimento das possibilidades económicas destes, são susceptíveis, embora que conjugadas com outros elementos, de conduzir à prova da factualidade que se indaga nos quesitos 17º e 22º da base instrutória.

Encontrando-se tais elementos na posse dos 3ºs RR, é legítimo que os AA. hajam requerido a notificação destes para fazer a respectiva apresentação (art.º 528º, do CPC), já que, como se viu, não assistia razão para que a Mma. Juiz do Tribunal “a quo”, os considerasse como irrelevantes.

Quanto às restantes provas que o despacho “sub judice” não deferiu, não se podendo considerá-las como irrelevantes em face daquilo que acima se explicitou já, há que dizer que a sua admissibilidade não pode ser negada “ex vi” do sigilo bancário ou do sigilo fiscal.

A bem dizer, a justificação dada pela Mma. Juiz do Tribunal “a quo” para indeferir, no aspecto ora em análise, o requerimento dos AA, não se ancorou na inadmissibilidade legal das provas requeridas, antes se fundando na conclusão tirada quanto à justificação, “in casu”, da quebra do sigilo.

Ora, sendo possível, de forma legítima, facultar documentos ou informações protegidas por sigilo bancário ou fiscal, significa isso que estamos no âmbito da prova lícita, embora que condicionada a determinado circunstancialismo.

Assim, tendo implícita a legalidade daquilo que foi requerido pelos AA, a justificação para o indeferimento das provas indicadas, escorou-se na falta de justificação que encontrou para a quebra do sigilo bancário/fiscal. Só que, indevida e intempestivamente se pronunciou o Tribunal “a quo” quanto à justificação da referida quebra, já que recusa alguma fora deduzida com fundamento em qualquer desses sigilos.

Poderia suceder, até, que as entidades em questão entendessem que a prestação de alguma das informações requeridas não implicava a violação do dever de segredo.

Seja como for, só uma recusa fundamentada no sigilo, bancário ou fiscal, legitimaria a pronúncia sobre a respectiva matéria, com eventual solicitação a este Tribunal, nos termos do artigo 135º, nº 3 do Código de Processo Penal (CPP), aplicável “ex vi” do disposto no artigo 519º, nº 4 CPC.

Assim sendo, não cabe, agora, a esta Relação, decidir da legitimidade ou da justificação de uma recusa que, efectivamente, ainda não ocorreu, mas tão-só, pronunciar-se quanto à admissibilidade legal das provas requeridas, ainda que se perspective que a produção das mesmas, em parte, pelo menos, poderá vir a depender de decisão a proferir em futuro incidente de quebra de segredo.

Não restando dúvidas que os elementos indicados sob o nº 3 do requerimento dos AA, respeitam a dados abarcados pelo dever de confidencialidade imposto aos funcionários e agentes da administração tributária através do instituto do sigilo fiscal, consagrado no artº 64º, da Lei Geral Tributária, (LGT - DL nº 398/98, de 17/12 e respectivas actualizações), também se afigura claro ser perspectivável o afastamento desse sigilo, no cumprimento do dever de colaboração com a justiça, nos termos dos artºs 519º e 519º-A, do CPC, e do artº 64º, nº 2, alínea d)[5], da aludida LGT.

Por outro lado, quanto aos elementos indicados sob o n.º 2 do requerimento de prova dos AA, ainda que se tenha por pacífico encontrarem-se os mesmos abrangidos pelo “dever de segredo” contemplado no art.º 78º, do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo DL n.º 298/92, de 31/12, isso não obsta a que, licitamente, venham a ser fornecidos ao Tribunal.
Na verdade, os membros dos órgãos de administração ou de fiscalização das referidas instituições de crédito, os seus empregados, mandatários, comitidos ou outras pessoas que lhe prestem serviços a título permanente ou ocasional não podem revelar ou utilizar informações sobre factos ou elementos respeitantes à vida da instituição ou às relações dela com os seus clientes, cujo conhecimento lhes advenha exclusivamente do exercício das suas funções ou da prestação dos seus serviços (n.º 1, do referido art.º 78º).
E estão sujeitos a segredo, designadamente, os nomes dos clientes, as contas de depósito e seus movimentos e outras operações bancárias, o qual não cessa com o termo das funções ou serviços (n.ºs 2 e 3, do citado artigo 78º), estando aqui abarcada a matéria em causa.
Interessa, todavia, ter presente o disposto nos art.ºs. 80º, n.º 2 e 84.º do mesmo DL, sendo que, no primeiro deles se preceitua que “Os factos e elementos cobertos pelo dever de segredo só podem ser revelados mediante autorização do interessado, transmitida ao Banco de Portugal, ou nos termos previstos na lei penal e de processo penal”.
O segredo bancário não tem, assim, carácter absoluto, não prevalecendo sempre sobre qualquer outro dever conflituante.
Embora se estabeleça - citado art.º 84º - que “... a violação do dever de segredo é punível nos termos do Código Penal” , haverá que considerar não ser ilícito “…o facto de quem, em caso de conflito no cumprimento de deveres jurídicos ou de ordens legítimas da autoridade, satisfizer dever ou ordem de valor igual ou superior ao do dever ou ordem que sacrificar”, não sendo ilícita, pois, a “violação” do segredo profissional se, em presença de um conflito de deveres, o agente optar pelo dever de valor igual ou superior ao do dever sacrificado (cfr. art.º 36º do CP), designadamente, pelo dever de colaboração com a administração da justiça.

Do exposto resulta que os elementos indicados sob os nºs 2 e 3 do requerimento de prova dos AA, se bem que abarcados, respectivamente, pelo sigilo bancário e pelo sigilo fiscal, não respeitam a factos da “vida íntima” dos 2ºs e 3ºs RR, pelo que não são tutelados pelo direito à reserva sobre a intimidade da vida privada[6].

Assim, as diligências requeridas e os documentos e informações em causa, não integram meios de prova de obtenção e produção ilícitas, nada havendo, por ora, que obste à admissão do requerido pelos AA sob os n.ºs 2 e 3, no requerimento de fls. 174 e 175.

Em conclusão: O despacho impugnado traduz errada aplicação da lei, pelo que, na procedência da Apelação, terá o mesmo de ser revogado e substituído por um outro que, admitindo o que requerido foi pelos AA quanto à prova documental, sob os n.ºs 1, 2 e 3, do requerimento de fls. 174 e 175, dê seguimento aos ulteriores termos que se revelem necessários à obtenção e produção de tal prova.

Em síntese, dir-se-á, pois:

1 - Na apreciação da admissibilidade de um documento não deve entrar o juízo sobre a força probatória do mesmo, não havendo que curar, nessa ocasião, de saber se esse documento é suficiente à prova do facto que se alega visar ao requerer-se a respectiva junção.

2 - A relevância do documento não se confunde com a sua aptidão para, “per se”, conduzir à prova dos factos a que respeita. Para que essa relevância se surpreenda no documento basta que este seja susceptível de contribuir, de concorrer, para a prova de tais factos.

3 – Não são de indeferir “in limine” as diligências requeridas para obtenção de documentos na posse de uma instituição bancária ou da administração fiscal, que, embora abarcados pelo sigilo bancário e pelo sigilo fiscal, sejam susceptíveis de vir a ser legitimamente fornecidos por tais entidades, em virtude de levantamento ou de cessação desses sigilos.

V - Em face de tudo o exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar procedente a Apelação e, revogando o despacho recorrido, determinar a respectiva substituição por um outro que, admitindo o que requerido foi pelos AA quanto à prova documental, sob os n.ºs 1, 2 e 3, do requerimento de fls. 174 e 175, dê seguimento aos ulteriores termos que se revelem necessários à obtenção e produção de tal prova.

Custas pela parte vencida a final.


[1] Os preceitos que deste Código forem citados, reportam-se, salvo indicação em contrário, à redacção introduzida pelo DL n.º 304/07, de 24/08.
[2] Consultáveis na Internet, através do endereço http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/.
[3] Cfr. Prof. Antunes Varela, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 1984, pág. 669; Prof. Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Coimbra Editora, 1984,Volume V, págs. 139 e 140.
[4] Cfr. Acórdão do STJ de 14/06/1995, Processo n.º 47 940, “in” BMJ n.º 448, págs. 255 e ss. e Acórdão do STJ de 19/06/2007, Revista n.º 07A1830.
[5] Segundo a qual o dever de sigilo cessa em caso de “Colaboração com a justiça nos termos do Código de Processo Civil e do Código de Processo Penal.”.
[6] Cfr., quanto ao sigilo bancário, o Acórdão do STJ de 17/12/2009, na Col Jur - STJ -3/2009, pág. 174 e ss...