Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
551/11.1PBCTB.C2
Nº Convencional: JTRC
Relator: ORLANDO GONÇALVES
Descritores: PENA DE SUBSTITUIÇÃO
PRESTAÇÃO DE TRABALHO A FAVOR DA COMUNIDADE
REGIME DE PERMANÊNCIA NA HABITAÇÃO
PRISÃO POR DIAS LIVRES
Data do Acordão: 07/01/2015
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE CASTELO BRANCO - CASTELO BRANCO - INST. LOCAL - SECÇÃO CRIMINAL - J1
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTS. 44.º, 45.º E 58.º, DO CP
Sumário: I - Por baixo de uma aparente multiplicidade e diversidade de critérios legais na escolha da substituição da pena de prisão, é mais ou menos pacifico que consegue divisar-se um critério ou cláusula geral de substituição da pena de prisão: são finalidades exclusivamente preventivas, de prevenção geral e especial, não de compensação da culpa, que justificam e impõem a preferência por uma pena de substituição e sua efectiva aplicação.

II - Sendo o trabalho a favor da comunidade uma pena de substituição em sentido próprio, em princípio, não será de aplicar a quem vem reiteradamente praticando crimes e já teve contacto com o meio prisional pelo cumprimento de pena de prisão efectiva.

III - Esta pena de substituição [regime de permanência na habitação] está particularmente indicada para as situações em que o arguido esteve sujeito à medida coactiva de obrigação de permanência na habitação.

IV - Sem afastar de todo o conteúdo de sofrimento inerente a toda a prisão e, deste modo, o seu carácter intimidativo, a prisão por dias livres é uma forma de reagir contra os perigos que se contêm nas normais penas de curta duração e de, ao mesmo tempo, manter em grande parte as ligações do condenado à sua família e à sua vida profissional.

Decisão Texto Integral:
Acordam, em Conferência, na 4.ª Secção, Criminal, do Tribunal da Relação de Coimbra.

     Relatório

Pelo 1.º Juízo do Tribunal Judicial de Castelo Branco, sob acusação do Ministério Público, foram submetidos a julgamento, em processo comum, com intervenção do Tribunal Singular, as arguidas

A... , casada, desempregada, filha de (...) e de (...) , nascida a 10 de Outubro de 1960, natural de (...) -Lisboa, titular do Bilhete de Identidade n.º (...) , emitido pelo Estado Português, residente em Rua (...) Lisboa;

B... , ajudante familiar, filha de (...) e de (...) , nascida a 10 de Maio de 1971, natural de (...) Lisboa, titular do Bilhete de Identidade n.º (...) , emitido pelo Estado Português, residente actualmente no Largo (...) Lisboa;

C... , solteira, empregada de balcão, filha de (...) e de (...) , nascida a 28 de Setembro de 1987, natural de (...) Lisboa, titular do Bilhete de Identidade n.º (...) , emitido pelo Estado Português, residente em Rua (...) Lisboa; e

D... , casada, empregada doméstica, filha de (...) e de (...) , nascida a 22 de Maio de 1957, natural de Viana do Castelo, titular do Bilhete de Identidade n.º (...) , emitido pelo Estado Português, residente em Rua (...) Lisboa;

imputando-se-lhes a prática, em co-autoria material e em concurso real, nos termos dos artigos 14.º, nº 1 e 26.º, 30.º, n.º 1 e 77.º, todos do Código Penal, de 3 (três) crimes de furto, previstos e punidos pelo artigo 203.º, n.º 1, do Código Penal.

Atentas as desistências de queixas apresentadas e devidamente homologadas, foi extinto o procedimento criminal quanto às ofendidas K... , Lda. e W... , SA, prosseguindo os autos apenas quanto a um dos crimes, em que é queixosa a empresa Y..., Lda.

            Realizada a audiência de julgamento - no decurso do qual foi efectuada uma comunicação não substancial dos factos da acusação - , o Tribunal Singular, por sentença proferida a 26 de Janeiro de 2015, decidiu: 

- Condenar a arguida A... , como co-autora material de um crime de furto simples, previsto e punido pelo artigo 203.º n.º 1 do Cód. Penal, na pena de 1 ano de prisão;

- Condenar a arguida B... , como co-autora material de um crime de furto simples, previsto e punido pelo artigo 203.º n.º 1 do Cód. Penal, na pena de 4 meses de prisão;

- Condenar a arguida C... , como co-autora material de um crime de furto simples, previsto e punido pelo artigo 203.º n.º 1 do Cód. Penal, na pena de 4 meses de prisão; e

- Condenar a arguida D... , como co-autora material de um crime de furto simples, previsto e punido pelo artigo 203.º n.º 1 do Cód. Penal, na pena de 150 dias de multa à taxa diária de € 6,00, num total de € 900,00.

            Inconformado com a douta sentença dela interpuseram recurso as arguidas A... , B... , C... e D... , concluindo a sua motivação do modo seguinte:

1. A decisão proferida no dia 14 de janeiro de 2014 no âmbito dos presentes autos foi declarada nula pelo vosso Venerando Tribunal da Relação por entender ter sido violado o disposto no artigo 374 n.º 2 do C.P.P.. Isto porque aquela sentença deveria ter-se pronunciado sobre os factos alegadamente levados a cabo no cometimento dos crimes cujas desistências foram homologadas.

2. Só dando como provados os factos anteriores se pode concluir, como concluiu que “as arguidas agiram de forma deliberada, livre e consciente, mediante plano previamente elaborado e, para sua concretização, vieram a conjugar esforços e intentos, bem sabendo que as suas condutas eram censuradas, proibidas e punidas por lei penal.”

3. Assim, o Venerando Tribunal da Relação de Coimbra entendeu que deveria o Tribunal a quo consignar como provados os factos constantes da acusação respeitante à atuação das arguidas nas lojas K... e W... e abster-se de considerar que ali as quatro arguidas efetuaram vários furtos, uma vez que, em face da homologação de desistência das queixas, não lhe cumpre apreciar se tais factos integram ou não o crime de furto.

4. A decisão que declarou nula a sentença proferida em primeira instância decidiu que a não enumeração de toda a matéria de facto da acusação nem nos factos provados nem nos não provados, impossibilita o adequado conhecimento da factualidade em causa. Foi violado o artigo 374 n.º 2 do C.P.P.

5. Ora, para que esses factos pudessem ser dados como provados, teria de ser reaberta a audiência e analisada a matéria que, por via da homologação das desistências, não foi examinada em audiência de julgamento.

6. Na decisão em crise, o tribunal a quo limitou-se a elaborar nova sentença, a que aqui se coloca em crise, dando como provados factos constantes da acusação sem ter cuidado em deles fazer prova.

7. Só reabrindo a audiência de julgamento e ali analisados todos os elementos de prova respeitantes aos factos alegadamente levados a cabo nos estabelecimentos K... e W..., podia ter sido cumprido o comando dado pelo Venerando Tribunal da Relação de Coimbra.

8. Ao limitar-se a proferir nova sentença tribunal a quo sanou um vício, cometendo outro que gera, igualmente a nulidade da sentença

9. Nos termos do artigo 355.º do Código de Processo Penal “Não valem em julgamento, nomeadamente para o efeito de formação da convicção do tribunal, quaisquer provas que não tiverem sido produzidas ou examinadas em audiência”

10. Estas provas não podem, assim, ser invocadas na fundamentação do acórdão ou sentença. Trata-se de uma proibição de prova.

11. A sentença em crise é nula nos termos artigo 379.º n.º 1 alínea c) do Código de Processo Penal.

Caso assim não se entenda, o que se aceita sem conceder

Da Absolvição das arguidas C... e D...

12. As recorrentes foram condenadas como co-autoras materiais por um crime de furto simples previsto e punido pelo artigo 203 n.º 1 do Código Penal nas penas, respetivamente, de um ano de prisão efetiva, quatro meses de prisão efetiva, quatro meses de prisão efetiva e cento e cinquenta dias de multa à taxa diária de seis euros, num total de novecentos euros

13. Dos três crimes de furto de que vinham acusadas, as ofendidas Decathon e W..., por terem sido indemnizadas pela recorrentes C... e D... , desistiram da queixa, tendo o processo continuado quanto ao furto cometido na loja Srtadivarius.

14. As recorrentes C... e D... nada têm a ver com os factos praticados nesta loja, local onde não entraram temendo serem observadas pelas câmaras. Conscientes de que não tinham praticado qualquer furto nesta loja, nem disso tendo beneficiado, não contactaram a Y... para procederem a qualquer pagamento de indemnização, o que teria levado à desistência da queixa.

15. As recorrentes B... e A... , de modo próprio e por decisão por si tomada, furtaram desta loja peças no valor de 550,45 (quinhentos e cinquenta euros e quarenta e cinco cêntimos)

16. D... e C... , nada têm a ver com o furto cometido pelas suas co-arguidas nesta loja, tendo sim, todas praticado os factos na loja W... e K.... Desconheciam mesmo que estas ali tivessem entrado.

17. A condenação das arguidas C... e D... em co-autoria só fazia sentido em relação às ofendidas que, indemnizadas, desistiram.

18. Poder-se-ia considerar a co-autoria ou cumplicidade caso as arguidas D... e C... tivessem conhecimento de que as arguidas A... e B... se dirigiam àquela loja e lhes tivessem dado qualquer apoio. Mas não!

19. As arguidas D... e C... , tendo praticado furtos em outras lojas conjuntamente com as arguidas A... e B... , recusaram-se a entrar na loja Y...

Como referem Leal-Henriques e Simas Santos, [Cf. Código Penal Anotado, l.º Vol. 3.ª ed., pág. 339] em anotação ao art.26.º do Código Penal, para haver co-autoria são necessários dois requisitos:

- acordo com outro ou outros: esse acordo «tanto pode ser expresso corno tácito; mas sempre exigirá, como sempre parece ser de exigir, pelo menos, uma consciência da colaboração (...), a qual, aliás, terá sempre de assumir carácter bilateral» (BMJ 444-43),

- participação directa na execução do facto juntamente com outro ou outros: um exercício conjunto no domínio do facto, uma contribuição objetiva para a realização (ex. motorista num assalto a um banco.) não significa que todos tenham que cometer todos os atos para serem punidos pelo conjunto de factos ilícitos praticados

20. Por não ter havido qualquer contribuição objetiva, participação direta, um exercício conjunto no domínio do facto, por parte das arguidas D... e C... , impõem-se a sua absolvição

Da medida da pena

21. As arguidas A... e B... , foram condenadas, respetivamente, na pena de um ano e de quatro meses de prisão

22. A sentença em crise não considerou, como devia, porque as arguidas A... e B... reuniam os requisitos para tal, a aplicação dos artigos, 58.º, caso assim não entendesse a aplicação do 44.º e , em última análise a aplicação do artigo 45.º, todos do Código Penal.

23. Estas recorrentes são o apoio de sua família, vivendo a arguida B... em casa com dois filhos e dois netos, estando a recorrente A... a viver a dor da perda de um filho. À data da primeira sentença, a arguida tinha a filha de 33 anos em fase terminal de vida, sendo esta arguida o seu único apoio.

24. As recorrentes A... e B... nunca sofreram penas de reclusão efetiva e optar pela aplicação das medidas contempladas nos citados artigos 58.º e, ou 44.º ou, em última análise, 45.º, é de elementar justiça

25. Caso não proceda a pretensão da arguida C... , ou seja caso veja confirmada a decisão de ser condenada como co-autora material, o que seria enorme injustiça, resta-lhe, porque preenche os requisitos, requerer que lhe seja aplicado do art.58.º, 44.º e mesmo 45.º do Código Penal.

Foram, concretamente violadas, as normas constantes dos arts. 26.º 40.º n.º1, 58.º, 44.º e 45.º do Código Penal; 355.º e 379.º n.º 1 alínea c) do CPP

Termos em que, sempre com suprimento de V. Exas., concedendo-se provimento ao presente recurso, requer-se

I - seja declarada nula a sentença proferida

     Caso assim não se entenda o que se aceita sem conceder, requer-se revogação da sentença condenatória recorrida, substituindo-se a mesma por outra, que:

II - Absolva as arguidas C... e D... da prática do crime de furto

III - Mantendo o tempo de condenação das arguidas B... e A... , substitua a pena de prisão por trabalho a favor da comunidade

     Caso assim não se entenda, porque reúnem os requisitos para tal,

IV - cumpram a sua pena sujeitas ao regime de permanência na habitação, para o que expressamente dão o seu consentimento

     Se ainda assim não se entender, porque as arguidas nunca sofreram uma pena de prisão efetiva,

V - sejam sujeitas ao regime de prisão por dias livres, o que lhes permitiria manter o apoio à família.

VI - Caso não proceda a pretensão da arguida C... , ser-lhe aplicado o regime requerido para as arguidas B... e A... e contemplado nos artigos 58.º, 44.º, para o que dá o seu expresso consentimento, ou 45.º do Código Penal.

O Ministério Público na Comarca de Castelo Branco respondeu ao recurso interposto pelas arguidas, pugnando pelo não provimento do recurso e manutenção integral da douta sentença recorrida.

            O Ex.mo Procurador-geral adjunto neste Tribunal da Relação emitiu parecer no sentido de que os recursos não merecem provimento, devendo contudo as penas aplicadas serem cumpridas por dias livres.

           

Foi dado cumprimento ao disposto no art.417.º, n.º 2 do C.P.P., não tendo havido resposta.

           

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

     Fundamentação

            A matéria de facto apurada e respectiva motivação constantes da sentença recorrida é  a seguinte:

Factos Provados

1. Em momento e local não concretamente apurados, as arguidas conceberam o plano de praticarem furtos em estabelecimentos comerciais.

2. Em obediência ao plano previamente elaborado e em conjugação de esforços, no dia 16 de Setembro de 2011, por volta das 12 horas e 30 minutos, as arguidas dirigiram-se à loja da “ K...” pertencente à “ K..., Lda - ”, sita na Rua (...) , nesta cidade de Castelo Branco, fazendo-se transportar no veículo ligeiro de passageiros, de marca Opel, modelo Astra e matrícula (...) KA, propriedade da arguida A... e por esta conduzido, com o intuito de daquela loja retirarem e levarem consigo objectos e valores que nela viessem a encontrar.

3. Aí chegadas, as arguidas entraram ao mesmo tempo na referida loja e dirigiram-se, em separado, aos vários expositores e, de entre os objectos que aí se encontravam expostos para venda, retiraram para os sacos a tiracolo que cada uma trazia consigo, os seguintes objectos:

    - 3 (três) pares de calçado de marca Merrel com a referência n.º 8169376, castanho escuro, com um valor global de € 153,00;

    - 2 (dois) pares de sandálias de marca Merrel, com a referência n.º 8088598, castanho claro, com um valor global de € 179, 90;

    - 2 (dois) fatos de treino de marca Adidas, para menina, rosa, com a referência 8183603, com um valor global de € 75, 90;

    - 2 (dois) fatos de treino de marca Adidas, para menino, azul, com a referência n.º 81883604, com um valor global de € 75, 90;

    - 1 (um) fato de treino de marca Adidas, para menino, azul escuro, com a referência n.º 8183764, no valor de € 35,00;

    - 1 (um) fato de treino de marca Adidas, preto, com a referência n.º 8182147, no valor de €39,00;

    - 1 (um) fato de treino de marca Puma, preto, com a referência N.W. 8182161, no valor de € 53,95;

    - 1 (uma) mochila de marca Eastpak, com a referência n.° 8188438, no valor de € 49,00:

    - 1 (uma) camisola de marca Adidas para menino, com a referência n.º 8183764, no valor de € 25,00;

    - 2 (duas) camisolas de marca Adidas para menina, rosa violeta, com a referência n.º 8183763, com um valor global de € 63, 90;

    - 7 (sete) pares de ténis de marca Adidas, brancos e azuis, com a referência n.° 8167296, com um valor global de € 168,00;

    - 1 (um) par de ténis de marca Adidas, branco e preto, com a referência n.° 8182420, no valor de € 30, 00;

    - 1 (um) par de ténis de marca Adidas, pretos, com a referência n.° 8099782, no valor de € 59, 90;

    - 1 (um) par de ténis, pretos e vermelhos, com a referência n.° 8165924, no valor de €25,00;

    - 2 (dois) pares de ténis, azuis e brancos, de marca Reebok, com a referência n.° 8183568, no valor de € 117,90;

4. Objectos estes com um valor global de € 1.151,35 (mil cento e cinquenta e um euros e trinta e cinco cêntimos).

5. De seguida, sem terem procedido ao pagamento daqueles objectos, as arguidas saíram daquela loja, dirigiram-se para o veículo referido em 2.°, que se encontrava estacionado na parte exterior daquela loja e ausentaram-se daquele local.

5. Na parte da tarde do dia 16 de Setembro de 2011, por volta das 14 horas e 45 minutos, as arguidas dirigiram-se para o Centro Comercial “Fórum Castelo Branco”, sito nesta cidade de Castelo Branco, fazendo-se transportar no veículo ligeiro de passageiros, de marca Opel, modelo Astra e matrícula (...) KA, propriedade da arguida A... e por esta conduzido, com o intuito de retirarem e levarem objectos e valores das lojas em que viessem a entrar.

6. Aí chegadas, pelas 15 horas, as arguidas dirigiram-se à loja da “ W...”, pertencente à sociedade comercial “ W... - Comércio de Artigos de Desporto, S.A”.

7. As arguidas entraram ao mesmo tempo na referida loja e dirigiram-se, em separado, aos vários expositores e, de entre os objectos que aí se encontravam expostos para venda, retiraram para os sacos a tiracolo que cada uma trazia consigo, os seguintes objectos:

    - 1 (um) par de sapatilhas, de marca Adidas, brancas e rosa, tamanho 32, no valor de € 29, 99;

    - 2 (dois) pares de sapatilhas de marca Adidas, brancas e rosa, tamanho 35, com um valor global de € 59, 98;

    - 1 (um) par de sapatilhas, de marca Adidas, brancas e rosa, tamanho 35, no valor de € 29, 99;

    - 1 (um) par de sapatilhas, de marca Adidas, brancas e rosa, tamanho 29, no valor de € 29, 99;

    - 1 (um) par de sapatilhas, de marca Adidas, vermelhas, pretas e rosa, tamanho 37, no valor de € 45, 99;

    - 1 (um) par de sapatilhas, de marca Nike, brancas e rosa, tamanho 39, no valor de € 49, 99;

    - 1 (um) par de sapatilhas, de marca Skechers, brancas e roxas, tamanho 34, no valor de € 44, 99;

    - 1 (um) par de sapatilhas, de marca Skechers, brancas e roxas, tamanho 30, no valor de € 44, 99;

    - 1 (um) par de sapatilhas, de marca Skechers, brancas e roxas, tamanho 27, no valor de € 44, 99;

8. Objectos estes com um valor global de € 350,91 (trezentos e cinquenta euros e noventa e um cêntimos).

9. De seguida, sem terem procedido ao pagamento daqueles objectos, as arguidas saíram daquela loja e foram depositá-los no veículo referido em 2.°, que se encontrava estacionado no parque de estacionamento do Centro Comercial “Fórum Castelo Branco”.

10. Em acto contínuo e ainda em obediência ao plano previamente elaborado e em conjugação de esforços, no dia 16 de Setembro de 2011, pelas 15 horas e 15 minutos, as arguidas A... e B... voltaram a entrar no Centro Comercial “Fórum Castelo Branco” e dirigiram-se à loja da “ Y...”, pertencente à sociedade comercial “ Y... – Confecções Unipessoal, Lda”.

11. Aí chegadas, as arguidas A... e B... entraram ao mesmo tempo na referida loja e dirigiram-se, em separado, aos vários expositores e, de entre os objectos que aí se encontravam expostos para venda, retiraram para os sacos a tiracolo que cada uma trazia consigo, os seguintes objectos:

    - 20 (vinte) camisas de marca Y... com o valor unitário de € 19, 95 e com um valor global, de € 399,00;

    - 8 (oito) camisas de marca Y... com o valor unitário de € 12, 95 e com um valor global, de € 103, 60;

    - 3 (três) camisas de marca Y... com o valor unitário de € 15, 95 e com um valor global, de € 47, 85.

12. Objectos estes com um valor global de € 550,45 (quinhentos e cinquenta euros e quarenta e cinco cêntimos).

13. E, de imediato, acondicionaram aqueles objectos nos sacos a tiracolo, com o interior forrado a papel de alumínio, que consigo levavam, assim os fazendo seus.

14. De seguida, sem terem procedido ao pagamento daqueles objectos, as arguidas saíram daquela loja.

15. Tendo a sua conduta sido detectada, foram as arguidas interceptadas pelo vigilante encarregado da segurança do Centro Comercial “Fórum Castelo Branco”.

16. Acorreu ao local uma brigada da PSP de Castelo Branco que procedeu à apreensão dos mencionados objectos, que vieram a ser restituídos à ofendida.

17. As arguidas bem sabiam que todos os objectos que retiraram e levaram consigo lhes não pertenciam e, mesmo assim, quiseram fazê-los coisas suas, como aliás vieram a conseguir, apesar de saberem que agiam contra a vontade e sem o consentimento das ofendidas “ K..., Lda - ”, “ W... - Comércio de Artigos de Desporto, S.A” e “ Y... – Confecções Unipessoal, Lda”.

18. Agiram as arguidas A... , B... , C... e D... , de forma deliberada, livre e conscientemente, mediante plano previamente elaborado e, para cuja concretização, vieram a conjugar esforços e intentos, bem sabendo que as suas descritas condutas eram censuradas, proibidas e punidas por lei penal.

Das condições pessoais

    Da arguida A...

19. Está actualmente desempregada e acompanha a filha que está em sua casa, acamada, porque sofre de doença oncológica em fase terminal.

20. Tem 3 filhos.

21. Recebe o rendimento social de inserção no valor de € 230,00.

22. Tem a 3ª classe de escolaridade.

23. Do relatório social para eventual determinação de sanção, com data de 16/12/2013, com relevância, consta:

    Que a arguida nasceu numa família modesta, tem a 3ª classe, começou a trabalhar aos 14 anos, com regularidade até aos 27, depois trabalhou em bares e iniciou a prática da prostituição de rua;

    Tem três filhos, maiores, de uma relação que durou 20 anos;

    Que a filha mais velha está de baixa médica por sofrer de cancro, ao que tudo indica, em fase terminal;

    Verbaliza assumir as responsabilidades decorrentes dos seus comportamentos, contextualizando-os numa prática relativamente continuada no tempo; reconhece o dano na sua conduta mas parece desvalorizar a sua prática e parece não ter consciência crítica quanto à gravidade da sua conduta;

    Foi acompanhada pela DGRS, no âmbito do processo 1560/11.6PBAMD, numa suspensão de pena de prisão com regime de prova que terminou em 23/01/2013, e o acompanhamento foi deficitário pois a arguida não compareceu com regularidade às entrevistas agendadas nem aderiu às condições que lhe foram impostas;

    Sendo parecer da DGRS que “consideramos que a mesma tem condições, ainda que limitadas, para cumprir uma medida de caracter probatório.”.

    Vive em habitação social e paga € 70,00 de renda.

    Recebe € 230,00 do rendimento social de inserção e tem a colaboração vinda do ordenado de um dos filhos que recebe € 300,00.

    Encontra-se deprimida e com baixa auto estima, reflectindo um desgaste acentuado por um percurso de vida desviante e marcado pela pobreza, quer económica quer afectiva.

24. Do seu certificado de registo criminal constam as seguintes condenações:

   i) Por sentença transitada em 18/01/06, no processo 1554/02.2PBOER, da Comarca da Grande Lisboa Noroeste, pela prática, em 12/11/02, de um crime de devassa da vida privada, na pena de 120 dias de multa à taxa diária de € 6,00; a pena encontra-se extinta.   ii) Por sentença transitada em 12/01/09, no processo 447/01.5PFLSB, do 6º Juízo Criminal de Lisboa, pela prática, em 05/08/01, de um crime de burla informática e nas comunicações, na pena de 6 meses de prisão suspensa por 3 anos, sob condição.

   iii) Por sentença transitada em 06/05/11, no processo 234/11.2PEOER, do 1º Juízo Criminal de Oeiras, pela prática, em 25/03/11, de um crime de furto simples, na pena de 60 dias de multa à taxa diária de € 6,00; a pena encontra-se extinta.

   iv) Por sentença transitada em 20/09/11, no processo 1026/11.4S6LSB, do 2º Juízo da Pequena Instância Criminal de Lisboa, pela prática, em 03/08/11, de um crime de furto simples, na pena de 4 meses de prisão substituída por 120 dias de multa à taxa de € 5,00.

   v) Por sentença transitada em 23/09/11, no processo 949/11.5GBGMR, do 2º Juízo Criminal de Guimarães, pela prática, em 14/08/11, de um crime de furto simples, na pena de 120 dias de multa à taxa diária de € 6,00.

   vi) Por sentença transitada em 09/12/11, no processo 1389/11.1PBVIS, do 2º Juízo Criminal de Viseu, pela prática, em 08/09/11, de um crime de furto simples, na pena de 140 dias de multa à taxa diária de € 6,00.

   vii) Por sentença transitada em 16/01/12, no processo 794/11.8PYLSB, do 1º Juízo da Pequena Instância Criminal de Lisboa, pela prática, em 03/04/11, de um crime de furto simples, na pena de 150 dias de multa à taxa diária de € 6,00.

   vii) Por sentença transitada em 23/01/12, no processo 1560/11.6PBAMD, da Comarca da Grande Lisboa Noroeste, pela prática, em 30/12/11, de um crime de furto simples, na pena de 1 ano de prisão suspensa por 1 ano.

  viii) Por sentença transitada em 03/02/12, no processo 1907/11.5PAPTM, do 1º Juízo Criminal de Portimão, pela prática, em 31/10/11, de um crime de furto simples, na pena de 6 meses de prisão suspensa por 1 ano.

    Da arguida B...

25. Está desempregada desde Março de 2013; era auxiliar da acção médica no Hospital dos Capuchos.

26. Tem o 9º ano de escolaridade.

27. Tem um companheiro que não trabalha e 4 filhos de 24, 23, 21 e 18 anos, dois dos quais vivem consigo, para além de dois netos de 5 anos e 8 meses.

28. Paga € 250,00 de renda de casa.

29. Do relatório social para eventual determinação de sanção, com data de 17/12/2013, com relevância, consta:

    Vive com o companheiro, de etnia cigana, desde os 16 anos, tendo vivido na comunidade cigana, sendo o companheiro toxicodependente e com dificuldades económicas;

    Há 18 anos a arguida e o companheiro tiveram que abandonar a comunidade cigana e viveram desde então em Lisboa;

    Desde que surgiu o rendimento social de inserção (à data o RMG), tem beneficiado do mesmo, fez vários cursos de formação, e obteve o 9º ano de escolaridade. Foi trabalhando, embora de forma irregular, e para superar dificuldades financeiras acabou por adoptar comportamentos desviantes como os furtos em lojas;

    Tem duas filhas maiores, cada uma com um filho, que vivem consigo; o agregado tem rendimento irregular mas que se cifra numa média de pelo menos € 460; pagam € 250,00 de renda;

    O companheiro da arguida está a fazer terapêutica de substituição de estupefacientes;

    Não demonstra uma atitude pró-ativa no sentido de mudar de estilo de vida e encara os comportamentos desviantes como único recurso para adquirir meios económicos; denota ausência de sentido crítico e reduzida interiorização das normas e valores sociais em vigência; o seu círculo de amizades circunscreve-se a pessoas com atitudes pró-criminais tais como as demais arguidas;

    “Parece-nos existir elevado risco de reincidência por parte da arguida, não se prevendo o sucesso de uma eventual aplicação de medida na comunidade.”.

30. Do seu certificado de registo criminal constam as seguintes condenações:

   i) Por sentença transitada em 07/02/07, no processo 1195/05.2PGMTS, do 3º Juízo Criminal de Matosinhos, pela prática, em 24/11/05, de um crime de furto simples, na pena de 100 dias de multa à taxa diária de € 3,50; a pena encontra-se extinta.

   ii) Por sentença transitada em 09/04/08, no processo 402/05.6PVLSNB, do 2º Juízo da Pequena Instância Criminal de Lisboa, pela prática, em 27/06/06, de um crime de furto simples, na pena de 90 dias de multa à taxa de € 4,00; a pena encontra-se extinta.

   iii) Por sentença transitada em 24/01/12, no processo 22/10.3PEFAR, do 1º Juízo Criminal de Faro, pela prática, em 21/03/10, de um crime de furto simples, na pena de 1 ano e 2 meses de prisão suspensa por igual período; a pena encontra-se extinta.

    Da arguida C...

31. Não tem filhos e tem o 9º ano de escolaridade.

32. Trabalha para uma senhora idosa, que está acamada, 4 horas por semana, e recebe € 360,00.

33. Vive com o namorado em casa da mãe deste.

34. Do relatório social para determinação de sanção, efectuado pela DGRS com data de 16/12/2013, de relevante, consta:

    Vive há 6 anos com um companheiro, em casa da mãe deste, o qual trabalha numa oficina de automóveis e aufere € 650,00 por mês; tem o 8º ano de escolaridade;

    Trabalhou 3 anos no hipermercado Jumbo nas Amoreiras, onde estava efectiva, e saiu por estar “farta do trabalho”; actualmente trabalha para uma senhora idosa, 4 horas por dia, 4 vezes por semana, na prestação de cuidados de higiene e alimentação, e ganha € 360,00;

    Já condenada, por furto simples, em pena suspensa com regime de prova, não cumpriu regularmente o mesmo;

    Revela total ausência de consciência crítica e como preocupação revelou apenas o receio de ser presa;

    Face à inexistência de qualquer impacto sobre a mesma das várias condenações de que foi alvo, as relações de amizade que mantém com raparigas com antecedentes criminais e a inexistência de alterações no seu estilo de vida, “consideramos não existirem condições para cumprimento da medida na comunidade.”.

35. Do seu certificado de registo criminal constam as seguintes condenações:

   i) Por sentença transitada em 02/07/08, no processo 733/04.2SDLSB, do 1º Juízo Criminal de Lisboa, pela prática, em 25/10/04, de um crime de roubo, na pena de 8 meses de prisão, substituída por 240 dias de multa à taxa diária de € 5,00; a pena encontra-se extinta.

   ii) Por sentença transitada em 31/01/12, no processo 2008/11.1GACSC, do 1º Juízo Criminal de Cascais, pela prática, em 07/12/11, de um crime de furto simples, na pena de 190 dias de multa à taxa de € 6,00.

   iii) Por sentença transitada em 09/07/12, no processo 169/12.1POLSB, do 1º Juízo da Pequena Instância Criminal de Lisboa, pela prática, em 02/02/12, de um crime de furto simples, na pena de 6 meses de prisão, suspensa por 1 ano com regime de prova.

    Da arguida D...

36. Não trabalha nem tem qualquer rendimento.

37. Vive com o marido, também desempregado, e tem um filho de 21 anos que está a trabalhar.

38. Tem a 4ª classe de escolaridade.

39. Pelo empréstimo para aquisição da casa onde vive paga € 370,00, que neste momento é o filho que suporta.

40. Do relatório social para eventual determinação de sanção, com data de 17/12/2013, com relevância, consta:

    Viveu no Norte até aos seus 16/17 anos, e após passou a residir no Sul do país; vive com o actual marido desde os seus 22 anos, e tem um filho com 22 anos; o marido é jardineiro de profissão e o filho, que também trabalha, ajudam a suportar as despesas do agregado familiar;

    Vive em casa própria e paga ao banco € 376, 00 pelo empréstimo para a sua aquisição;

    Foi trabalhando com regularidade, até por conta própria, mas está desempregada há cerca de 5 anos; está inscrita no IEFP e tem comparecido a algumas entrevistas de trabalho;

    No âmbito do processo 95/11.1PBLRS, pelo crime de furto, foi-lhe aplicada, em Fevereiro de 2011, suspensão provisória do processo, com a injunção de prestar 60 horas de trabalho comunitário, durante o qual “teve um comportamento exemplar, demonstrou pro-actividade nas tarefas em que foi incumbida, teve uma óptima inserção no grupo de trabalho, A sua qualidade de trabalho foi excelente bem como a produtividade do mesmo”;

    Pessoa pró-activa e com espírito de iniciativa;

    Desempregada há alguns anos, sem uma ocupação estruturada desde então e na dependência de um grupo de pares com antecedentes e atitudes criminais, são variáveis que nos surgem como factores dificultadores de um processo de reinserção em consonância com as expectativas sociais;

41. Do seu certificado de registo criminal nada consta.

Factos Não Provados

      Por referência aos factos provados em 2 a 4 que:

a) De seguida, as arguidas, com o uso de um alicate corta-unhas retiraram os alarmes de segurança dos objectos que retiraram dos expositores.

b) E, de imediato, acondicionaram aqueles objectos nos sacos a tiracolo, com o interior forrado a papel de alumínio, que consigo levavam, assim os fazendo seus.

      Por referência aos factos provados de 5. a 8. que,

c) De seguida, as arguidas, com o uso de um alicate corta-unhas retiraram os alarmes de segurança dos objectos que retiraram dos expositores.

d) E, de imediato, acondicionaram aqueles objectos nos sacos a tiracolo, com o interior forrado a papel de alumínio, que consigo levavam, assim os fazendo seus.

      Por referência aos factos provados de 10. a 14. que,

e) Que as arguidas C... e D... tenham entrado na loja da “ Y... ”.

f) Que as arguidas A... e B... , com o uso de um alicate corta-unhas, tenham retirado os alarmes de segurança dos objectos que retiraram dos expositores.

            Convicção do Tribunal

Para a formação da sua convicção, na indicação dos factos provados e não provados, o Tribunal analisou de forma livre, crítica e conjugada, a prova produzida em audiência de discussão e julgamento de acordo com o artigo 127º do Cód. Proc. Penal, respeitando o disposto no artigo 355º do mesmo Código e os critérios da experiência comum e da lógica.

      Deste modo, foram tidos em conta:

• Auto de denúncia e respectivos aditamentos

• Autos de apreensão

• Termos de entrega

• Auto de busca ao veículo (...) KA

• Fotografias

• Autos de visionamento de CD

• Relatórios sociais para determinação de sanção

• Certificado de registo criminal

      E ainda o depoimento das testemunhas ouvidas, sendo que as arguidas apenas prestaram declarações quanto às suas condições pessoais.

      De notar apenas que considerámos exclusivamente os depoimentos relevantes para a queixa ora em causa referentes aos factos ocorridos na loja Y....

      Assim,

      - E... , gerente da loja Y... no Fórum Castelo Branco, de forma isenta e credível, confirmou que no dia dos factos foi chamada ao corredor técnico pela PSP e pelo segurança do Fórum tendo confirmado que todas as roupas que lhe foram exibidas (31 camisas) eram da Y..., e que ainda tinham os alarmes de segurança. Mais disse que a roupa estava em carteiras de mão forradas a alumínio. Todas as roupas lhe foram devolvidas.

      - F... , agente principal da PSP, actualmente aposentado, depôs de forma descomprometida e fiável. Relatou que foi chamado ao Fórum no dia dos factos. Não recorda se no centro comercial viu duas ou as quatro arguidas, mas apreendeu o material que tinham na sua posse, como sejam roupas de várias lojas, que estavam também no veículo em que as arguidas se transportavam no qual procedeu a busca. Transportou as arguidas para a esquadra onde as identificou (as quatro).

      - G... , responsável de operações, segurança e ambiente no Fórum Castelo Branco, confirmou, de forma coerente e credível, que no dia 16/09/11, e alertado pelo colega que está a visualizar as imagens das câmaras de vigilância do Fórum, que abordou as arguidas A... e B... (ainda por referência a fls. 148/149) dentro do centro comercial, sendo que as demais arguidas não foram abordadas porque estavam no exterior no centro, embora também tenham sido vistas a passear no centro pela videovigilância. Os sacos de ambas tinham roupa, forrados a alumínio, e após chamou a PSP. Visualizou depois as imagens, e atentas as viagens que as arguidas fizeram, as quatro, do centro comercial para o carro e do carro para o centro, não teve dúvidas que estavam na companhia umas das outras e que existia uma relação entre todas. Igualmente, e já com a PSP presente, chamou a gerente da loja Sradivarius, por haver roupa dessa marca, que atestou que as peças eram da dita loja.

            Ora, feita esta síntese, não poderíamos deixar de concluir como nos factos dados como provados. Na verdade, os autos de apreensão falam por si, das fotografias e do visionamento das câmaras de videovigilância não restam dúvidas de que estiveram no local, hora e dia dos factos, que efectuaram vários furtos, sendo que apenas não estão a ser julgadas por todos eles atentas as desistências de queixa, que os bens retirados da Y... estavam na posse das arguidas A... e B... , e que as arguidas C... e D... bem sabiam e participaram nos factos, o que decorre da busca efectuada ao veículo onde em conjunto se transportaram e dadas as viagens efectuadas entre o centro e o veículo e o veículo e o centro. Veja-se aliás que a todas foram apreendidos objectos relacionados com a prática do crime – D... (fls. 92), C... (fls. 93), A... (fls. 81, 84, 85 e 86), e B... (fls. 94), e ainda, quanto às duas últimas, fls. 62 verso, e 65/66, todas referentes aos autos de apreensão.

            Não podemos olvidar que os bens ora em causa a propósito do crime que se encontra em julgamento contra a ofendida “ Y...” foram encontrados apenas na posse das arguidas A... e B... , mas a propósito da co-autoria, pronunciar-nos-emos em sede de fundamentação de direito.

            Relevaram ainda os documentos juntos, mormente os autos de apreensão e busca, os de entrega, e os CD´s de visionamento das arguidas no centro comercial em causa, e, bem assim, no que concerne às condições pessoais, as declarações das arguidas, fiáveis, e os relatórios sociais que confirmaram as mesmas, e os certificados de registo criminal.

            No que concerne aos factos não provados diga-se que não foi feita qualquer prova dos mesmos, pelo contrário, no que concerne aos factos não provados em e) e f) a gerente da loja Y... atestou que as camisas ainda tinham os alarmes de segurança colocados.

             *

                                                                        *

                                                  

O âmbito do recurso é dado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação. ( Cfr. entre outros , os acórdãos do STJ de 19-6-96 [1] e de 24-3-1999 [2] e Conselheiros Simas Santos e Leal Henriques , in Recursos em Processo Penal , 6.ª edição, 2007, pág. 103).

São apenas as questões suscitadas pelo recorrente e sumariadas nas respectivas conclusões que o tribunal de recurso tem de apreciar [3], sem prejuízo das de conhecimento oficioso .

No caso dos autos, face às conclusões da motivação das recorrentes A... , B... , C... e D... as questões a decidir são as seguintes:

- se a sentença recorrida é nula nos termos artigo 379.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Penal;

- caso assim não se entenda, se as arguidas C... e D... devem ser absolvidas da prática do crime de furto; e

- caso não proceda a absolvição, se as penas de prisão em que foram condenadas as arguidas B... e A... , bem como a arguida C... , devem ser substituídas por pena de trabalho a favor da comunidade ou, caso assim não se entenda, devem ser cumpridas em regime de permanência na habitação e, não se entendendo ainda assim, se devem sejam sujeitas ao regime de prisão por dias livres, tudo nos termos dos artigos 58.º, 44.º ou 45.º do Código Penal.


-

            Primeira questão: da nulidade da sentença.

            As recorrentes defendem que a sentença recorrida é nula nos termos artigo 379.º n.º 1 alínea c) do Código de Processo Penal.

Em concreto, para fundamentar esta sua pretensão, alegam o seguinte:

- O acórdão de 14 de Janeiro de 2014 do Tribunal da Relação declarou nula a primeira  sentença nos termos do art.374.º, n.º 2, do C.P.P., porquanto deveria ter-se pronunciado sobre os factos alegadamente levados a cabo no cometimento dos crimes cujas desistências foram homologadas, ou seja, os factos constantes da acusação respeitante à actuação das arguidas nas lojas K... e W... e abster-se de considerar que ali as quatro arguidas efectuaram vários furtos, uma vez que, em face da homologação de desistência das queixas, não lhe cumpre apreciar se tais factos integram ou não o crime de furto. Só dando como provados os factos anteriores se pode concluir, como concluiu que “as arguidas agiram de forma deliberada, livre e consciente, mediante plano previamente elaborado e, para sua concretização, vieram a conjugar esforços e intentos, bem sabendo que as suas condutas eram censuradas, proibidas e punidas por lei penal.”

- Ora, para que esses factos pudessem ser dados como provados, teria de ser reaberta a audiência e analisada a matéria que, por via da homologação das desistências, não foi examinada em audiência de julgamento. Na decisão em crise, o Tribunal a quo limitou-se a elaborar nova sentença, dando como provados factos constantes da acusação sem ter cuidado em deles fazer prova.

Só reabrindo a audiência de julgamento e ali analisados todos os elementos de prova respeitantes aos factos alegadamente levados a cabo nos estabelecimentos K... e W..., podia ter sido cumprido o comando dado pelo Venerando Tribunal da Relação de Coimbra. Deste modo, pergunta-se, como chegou no Tribunal a quo à conclusão de que as quatro arguidas conceberam um plano para praticarem furtos em centros comerciais e que a arguida A... conduzia o veículo.

- Nos termos do artigo 355.º do Código de Processo Penal “Não valem em julgamento, nomeadamente para o efeito de formação da convicção do tribunal, quaisquer provas que não tiverem sido produzidas ou examinadas em audiência”. Estas provas não podem, assim, ser invocadas na fundamentação do acórdão ou sentença. Trata-se de uma proibição de prova.

Vejamos.

O art.379.º, n.º1, alínea c), do Código de Processo Penal, estatui que é nula a sentença « Quando o tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.».  

É fundamental aqui realçar que a nulidade de sentença por omissão de pronúncia refere-se a questões e não a razões ou argumentos invocados pela parte ou pelo sujeito processual em defesa do seu ponto de vista.

Já o Prof. Alberto dos Reis ensinava, a propósito da nulidade de sentença por omissão de pronúncia, que “ São, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzido pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão.”.[4]

É pacífico, também na jurisprudência, que esta nulidade não resulta da omissão de conhecimento de razões, mas sim de questões.[5]

Entrando na apreciação concreta da decisão diremos, antes do mais, que temos como medianamente claro que o Tribunal da Relação, por acórdão de 17 de Setembro de 2014, declarou nula a primitiva sentença condenatória proferida em 14 de Janeiro de 2014, termos do art.379.º, n.º1, alínea a), do C.P.P., porquanto o Tribunal a quo não havia procedido à enumeração de toda a matéria de facto da acusação do Ministério Público, não incluindo alguns dos factos nem na factualidade provada, nem na factualidade dada como não provada, impossibilitando o adequado conhecimento da factualidade em causa relativa à co-autoria do crime de furto na loja “ Y...”. .

Chamou-se a atenção, naquele acórdão, que o Tribunal a quo até apreciara esses factos que não enumerou pois, para concluir que as quatro arguidas agiram em comparticipação, apesar de apenas as arguidas A... e B... haverem entrado na loja “ Y...”, consignara, na fundamentação da matéria de facto da sentença, que resulta dos autos de apreensão, das fotografias e do visionamento das câmaras de videovigilância, que todas as arguidas « …estiveram no local, hora e dia dos factos, que  efectuaram vários furtos, sendo que apenas não estão a ser julgadas por todos eles atentas as desistências de queixa, que os bens retirados da Y... estavam na posse das arguidas A... e B... , e que as arguidas C... e D... bem sabiam e participaram nos factos, o que decorre da busca efectuada ao veículo onde em conjunto se transportaram e dadas as viagens efectuadas entre o centro e o veículo e o veículo e o centro. Veja-se aliás que a todas foram apreendidos objectos relacionados com a prática do crime – D... (fls. 92), C... (fls. 93), A... (fls. 81, 84, 85 e 86), e B... (fls. 94), e ainda, quanto às duas últimas, fls. 62 verso, e 65/66, todas referentes aos autos de apreensão.».

Na sentença ora recorrida, proferida em 26 de Janeiro de 2015, o Tribunal a quo deu integral cumprimento ao acórdão anulatória da anterior sentença, enumerando na factualidade toda a matéria de facto da acusação do Ministério Público, pelo que ficou suprida a nulidade anteriormente declarada.

Questões diferentes, que nada têm que ver com a nulidade de sentença por omissão de pronúncia a que alude o art.379.º, n.º 1, alínea c), do C.P.P., será a necessidade de reabertura da audiência de julgamento para produção de prova respeitante aos factos alegadamente levados a cabo nos estabelecimentos da K... e da W... e, ainda, a ausência de prova sobre esta factualidade.

Ora, quanto à primeira, diremos que em lado algum do acórdão deste Tribunal da Relação, de 17 de Setembro de 2014, se determina que fosse reaberta a audiência de julgamento para, previamente à sanação da nulidade, ser produzida prova respeitante aos factos alegadamente levados a cabo nos estabelecimentos K... e W....

Nem poderíamos fazer tal imposição quando - como acabámos de deixar claro - constava da sentença anulada que em face dos autos de apreensão, das fotografias e do visionamento das câmaras de videovigilância, resultava para o Tribunal a quo que as 4 arguidas haviam retirado dos estabelecimentos K... e W..., sem pagar, produtos pertencentes às donas, e que a actividade desenvolvida pelas arguidas A... e B... na loja “ Y...”, era uma sequência da actividade desenvolvida pelas 4 arguidas nos estabelecimentos K... e W... , em Castelo Branco. 

Na fundamentação da matéria de facto da sentença recorrida o Tribunal a quo apenas menciona provas produzidas em julgamento, pelo que a invocada violação do art.355.º do Código de Processo Penal, por não ter sido produzida nova prova sobre os factos ocorridos nos estabelecimentos K... e W... não tem qualquer razão de ser.

Note-se que as recorrentes não especificam qualquer prova que tenha sido indicada na fundamentação da matéria de facto da sentença ora recorrida e que não tenha sido produzida em audiência de julgamento.

O Tribunal da Relação não vislumbra, por seu lado, do texto da decisão recorrida, das actas de julgamento e das restantes provas inseridas no processo, que as provas indicadas na fundamentação da matéria de facto da sentença ora recorrida não tenham sido produzidas em audiência de julgamento.

Quanto à alegada ausência de prova sobre esta factualidade inserida na nova sentença e que não permitirá saber, designadamente, como concluiu o Tribunal a quo que as quatro arguidas conceberam um plano para praticarem furtos em centros comerciais e que a arguida A... conduzia o veículo, diremos apenas que as recorrentes não impugnaram a matéria de facto nos termos do art.412.º, n.º 3 e 4 do C.P.P..

Assim, na resposta a esta alegada ausência de prova, temos de nos cingir apenas ao texto da decisão recorrida e às regras da experiência comum.

Não é controvertido que a arguida A... é a proprietária do veículo em que todas se deslocaram até Castelo Branco.

De acordo com as regras da experiência comum quando o proprietário se desloca no veículo com amigos quem usualmente conduz o veículo automóvel é o seu proprietário. Por outro lado, consta da fundamentação da matéria de facto provada da sentença ora recorrida que o Tribunal a quo procedeu ao visionamento da videovigilância e de fotografias dessa videovigilância, e verifica-se destas que a videovigilância abrange a parte exterior no centro comercial e o local onde se encontrava estacionado o veículo automóvel. Assim, é plausível que o Tribunal a quo tenha dado como provado que as quatro arguidas se faziam transportar num veículo propriedade da arguida A... e por esta conduzida por tal resultar daquela prova.

Quanto à prova de que as quatro arguidas conceberam “o plano de praticarem furtos em estabelecimentos comerciais” ( ponto n.º1 dos factos dados como provados), ela resulta, no entender do Tribunal da Relação, da actividade objectiva das quatro arguidas, que se deslocam de Lisboa a Castelo Branco, equipadas com material necessário à prática de furtos de peças de roupa e calçado, como sejam alicates, sacos e carteiras forrados a alumínio, para desactivarem alarmes ou não activarem os alarmes colocados na roupa e calçado que pretenderam subtrair e que efectivamente conseguiram retirar da posse dos seus legítimos donos e contra a sua vontade.

Depois das quatro arguidas se terem apropriado de peças de roupa e calçado nas lojas da K... e W..., em Castelo Branco, todas elas se deslocam ao Centro Comercial “Fórum Castelo Branco”.  Aí chegadas, as 4 arguidas entram no Centro Comercial e enquanto as arguidas A... e B... se dirigiram-se à loja da “ Y...”, de onde se apropriaram, com o mesmo modo de execução, de roupa e calçado, as outras duas arguidas circulam no mesmo Centro Comercial.

Deste modo, do texto da sentença, por si só, ou conjugada com as regras da experiência comum, não vemos que o Tribunal a quo, ao decidir a matéria de facto dada como provada no ponto n.º 1 da sentença recorrida tenha seguido um raciocínio ilógico, arbitrário ou contraditório, de onde se possa concluir pela existência de um qualquer erro notório na apreciação da prova. 

Não reconhecendo o Tribunal da Relação a invocada nulidade da sentença por omissão de pronúncia, a violação do disposto no art.355.º, do C.P.P., nem qualquer erro notório na apreciação da prova, improcede esta primeira questão.


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            Segunda questão: da absolvição das arguidas C... e D... da prática do crime de furto.

Alegam as recorrentes C... e D... que nada têm a ver com os factos praticados na loja designada “ Y...”, pertencente à sociedade comercial “ Y... – Confecções Unipessoal, Lda”, pois nela não entraram temendo serem observadas pelas câmaras. Conscientes de que não tinham praticado qualquer furto nesta loja, nem disso tendo beneficiado, não contactaram a Y... para procederem a qualquer pagamento de indemnização, o que teria levado à desistência da queixa.

As recorrentes D... e C... desconheciam mesmo que as arguidas A... e B... estas ali tivessem entrado. A condenação das arguidas C... e D... em co-autoria só fazia sentido em relação às ofendidas que, indemnizadas, desistiram.

Por não ter havido qualquer contribuição objectiva, participação directa, um exercício conjunto no domínio do facto, por parte das arguidas D... e C... , impõem-se a sua absolvição, pois não se mostram preenchidos os elementos constitutivos do crime de furto.

Vejamos

As arguidas, no uso do direito ao silêncio, que o Tribunal a quo respeitou, não prestaram declarações sobre os factos de que vinham acusadas pelo Ministério Público.

Não tendo as quatro arguidas prestados declarações sobre os factos em causa e na ausência de qualquer prova indicada pelas recorrentes, não vislumbramos como poderia o Tribunal a quo concluir que as arguidas C... e D... - que entraram com as co-arguidas A... e B... no Centro Comercial “Fórum Castelo Branco”-,  não se deslocaram à loja “ Y...” porque temeram serem observadas pelas câmaras e até que desconheciam mesmo que as arguidas A... e B... ali tivessem entrado.

Aliás, não seria racional que tendo as 4 arguidas se deslocado de Lisboa a Castelo Branco para fazerem furtos em estabelecimentos comerciais de Castelo Branco, as arguidas C... e D... não soubessem que as arguidas A... e B... iam entrar na loja “ Y...”, onde as recorrentes C... e D... alegam agora que não entraram porque temeram serem observadas pelas câmaras.

Quanto à desistência da queixa relativamente aos factos praticados na loja “ Y...”  diremos desconhecer se as recorrentes C... e D... contactaram ou não a proprietária da loja, tendo em vista obter a desistência da queixa. 

O que é uma realidade é que as 4 arguidas vinham acusadas da prática em co-autoria de um crime de furto na loja “ Y...”  e que da acta de audiência de julgamento de 18-12-2013 consta um despacho em que foi dilatado o prazo para leitura da sentença designadamente porque há «…forte probabilidade transmitida pelas arguidas de que a sociedade ofendida “ Y... Portugal – Confecções Unipessoal , Lda” venha ainda a desistir da queixa tal como fizeram as outras duas sociedades queixosas…». Nem as arguidas  juntaram aos autos desistência da queixa por parte desta ofendida, nem esta, notificada para o efeito, apresentou qualquer desistência.

A factualidade dada como provada não foi impugnada nos termos do art.412.º, n.º3 e 4 do C.P.P. , nem padece de qualquer vício de conhecimento oficioso, pelo que se tem como fixada nos termos que constam da douta sentença recorrida.

Resultando da factualidade dada como provada que as arguidas A... , B... , C... e D... , têm tudo a ver com os factos praticados na loja designada “ Y...”, pertencente à sociedade comercial “ Y... – Confecções Unipessoal, Lda”, uma vez que agiram de forma deliberada, livre e conscientemente, mediante plano previamente elaborado e, para cuja concretização, vieram a conjugar esforços e intentos, bem sabendo que as suas descritas condutas eram censuradas, proibidas e punidas por lei penal, importa decidir se preencheram em co-autoria os elementos constitutivos do crime de furto pelo qual vêm acusadas.

Os elementos constitutivos do crime de furto encontram-se enunciados no art.203.º, n.º1 do Código Penal, que é o tipo fundamental ou geral, e são os seguintes:

 - a subtracção de coisa móvel alheia;

- a ilegítima intenção de apropriação para si ou para outrem; e

- o conhecimento e vontade de realização do facto antijurídico, com consciência da ilicitude da conduta ( dolo genérico).

Sucintamente, anotamos que a subtracção consiste na violação do poder de facto que tem o detentor de guardar o objecto do crime ou dispor dele e a substituição desse poder pelo do agente. Coisa móvel alheia é um bem propriedade de alguém que não do agente e que é susceptível de apreensão para poder ser subtraída. 

A intenção de apropriação traduz a vontade do agente querer fazer definitivamente sua, ou de outra pessoa, a coisa alheia.[6]

A respeito de comparticipação no crime estatui o art.26.º do Código Penal que é punível como autor quem executar o facto, por si ou por intermédio de outrem, ou tomar parte directa na sua execução, por acordo ou juntamente com outro ou outros, e ainda quem, dolosamente, determinar outra pessoa à prática do facto, desde que haja execução ou começo de execução.

Na comparticipação criminosa sob a forma de co-autoria são essenciais: uma decisão e uma execução conjuntas.

Os casos de comparticipação só são configuráveis mediante acordo prévio dos comparticipantes. A decisão conjunta, pressupondo um acordo que, sendo necessariamente prévio pode ser tácito, pode bastar-se com a existência da consciência e vontade de colaboração dos vários agentes na realização de determinado tipo legal de crime.

Já no que diz respeito à execução, não é indispensável que cada um deles intervenha em todos os actos ou tarefas tendentes ao resultado final, basta que a actuação de cada um, embora parcial, se integre no todo e conduza à produção do resultado [7].

No caso em apreciação e com relação aos factos dados como provados nos pontos n.ºs 10 a 18 da sentença recorrida, conclui-se que na sequência de acordo prévio e em conjugação de esforços entre as arguidas B... , A... C... e D... , todas elas se deslocaram ao Centro Comercial “Fórum Castelo Branco, tendo em vista a subtracção de bens de estabelecimentos comerciais; com este fim, as arguidas B... e A... , entraram na loja designada “ Y...” e de lá retiraram e fizeram suas, contra a vontade da dona, várias peças de roupa e de calçado;  as arguidas agiram todas deliberada, livre e conscientemente, conhecendo e querendo a realização daqueles factos e com consciência da ilicitude das suas condutas.

Preenchendo a conduta das arguidas C... e D... todos os elementos constitutivos do crime de furto, supra mencionados, em co-autoria com as arguidas A... , B... , não merece censura a condenação das mesmas pela prática do crime de furto, p. e p. pelo art.203.º, n.º1, do Código Penal.

Assim, mais não resta que julgar improcedente esta questão.


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            Terceira questão: da substituição das penas de prisão aplicadas às arguidas A... , B... e C... .

As recorrentes A... , B... e C... defendem que penas de prisão que lhes foram aplicadas devem ser substituídas por pena de trabalho a favor da comunidade ou, caso assim não se entenda, devem ser cumpridas em regime de permanência na habitação e, assim não se entendendo ainda, devem ser substituídas em prisão por dias livres, tudo nos termos dos artigos 58.º, 44.º ou 45.º do Código Penal.

Alegam para o efeito, o seguinte:

- As arguidas A... e B... , foram condenadas, respectivamente, na pena de um ano e de quatro meses de prisão. Estas arguidas são o apoio de sua família, vivendo a arguida B... em casa com dois filhos e dois netos. À data da primeira sentença a arguida A... tinha a filha de 33 anos em fase terminal de vida, sendo o seu único apoio, vivenciando hoje a dor da perda da sua filha.

Nunca sofreram penas de reclusão efectiva e optar pela aplicação das medidas contempladas nos citados artigos 58.º e, ou 44.º ou, em última análise, 45.º, é de elementar justiça.

- Também a arguida C... , caso veja confirmada a decisão de condenação como co-autora material do crime de furto, resta-lhe requerer a substituição da pena de 4 meses de prisão por pena de trabalho a favor da comunidade ou, caso assim não se entenda, o seu cumprimento em regime de permanência na habitação, ou por dias livres, porquanto preenche os seus requisitos.

Vejamos se assim é.

Determinada uma concreta medida da pena de prisão, impõe-se ao Juiz verificar se ela pode ser objecto de substituição, em sentido próprio ou impróprio, e respectiva medida.

Dentro das penas de substituição da prisão, em sentido próprio, encontram-se a pena de multa, a que alude o art.43.º do Código Penal e as penas de suspensão de execução da prisão ( art.50.º do C.P.) e de prestação de trabalho a favor da comunidade ( art.58.º do C.P.).

Para além destas penas de substituição, há ainda que contar com penas de substituição detentivas (ou formas especiais de cumprimento da pena de prisão) como o regime de permanência na habitação (art.44.º do C.P.), a prisão por dias livres ( art.45.º do C.P.) e a prisão em regime de semidetenção ( art.46.º do C.P.).

Por baixo de uma aparente multiplicidade e diversidade de critérios legais na escolha da substituição da pena de prisão, é mais ou menos pacifico que consegue divisar-se um critério ou cláusula geral de substituição da pena de prisão: são finalidades exclusivamente preventivas, de prevenção geral e especial, não de compensação da culpa, que justificam e impõem a preferência por uma pena de substituição e sua efectiva aplicação. 

A protecção o mais eficaz possível dos bens jurídicos fundamentais, objectivo último das penas, implica a sua utilização como instrumento de prevenção geral, servindo primordialmente para manter e reforçar a confiança da comunidade na validade e na força de vigência das normas do Estado na tutela de bens jurídicos e, assim, no ordenamento jurídico-penal (prevenção geral positiva ou de integração).

A reintegração do agente na sociedade, como finalidade das penas, está ligada à prevenção especial ou individual, isto é, à ideia de que a pena é um instrumento de actuação preventiva sobre a pessoa do agente, com o fim de evitar que no futuro, ele cometa novos crimes, que reincida.

Sendo distintas as funções das exigências de prevenção geral e especial, nas finalidades da punição enunciadas no art.40.º do Código Penal, impõe-se conhecer como se comportam mutuamente.

A este respeito esclarece, assertivamente, o Prof. Figueiredo Dias, que as exigências de prevenção especial prevalecem sobre as de prevenção geral, « …por serem sobretudo elas que justificam, em perspectiva político-criminal, todo o movimento de luta contra a pena de prisão.», sendo elas «…que devem decidir qual das espécies de penas de substituição abstractamente aplicáveis deve ser eleita.». O papel da prevenção geral como princípio integrante do critério geral de substituição «…deve surgir aqui unicamente sob a forma de conteúdo mínimo de prevenção de integração indispensável à defesa do ordenamento jurídico, como limite à actuação das exigências de prevenção especial de socialização.».[8]

Feitas estas considerações sobre o critério geral de substituição da pena de prisão e pretendendo as recorrentes que as concretas penas de prisão efectiva que lhes foram aplicadas lhes sejam substituídas, sucessivamente, por penas de prestação de trabalho a favor da comunidade, por cumprimento em regime de permanência na habitação e, assim não se entendendo ainda, por penas de prisão por dias livres, exige-se definir agora, embora de modo sucinto, os requisitos da sua admissibilidade.

            Da pena de prestação de trabalho a favor da comunidade.

O art.58.º, n.º1 do Código Penal estatui que « Se ao agente dever ser aplicada pena de prisão em medida não superior a dois anos, o tribunal substitui-a por prestação de trabalho a favor da comunidade sempre que concluir que por este meio se realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.».

A pena de trabalho a favor da comunidade consiste na prestação de serviços gratuitos ao Estado, a outras pessoas colectivas de direito público ou a entidades privadas cujos fins o Tribunal considere de interesse para a comunidade ( art.58.º, n.º 2 do Código Penal ).

Exigindo-se a adesão do arguido a esta pena, ela só pode ser aplicada com aceitação do condenado ( art.58.º, n.º 5 do Código Penal ).

O pressuposto formal desta pena é, deste modo, a aplicação de uma pena de prisão em medida não superior a dois anos e a aceitação pelo condenado da sua substituição pelo trabalho a favor da comunidade.

O pressuposto material é poder concluir-se que pela aplicação dessa pena de substituição se realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

A pena de trabalho a favor da comunidade tem na base a ideia de centrar o conteúdo punitivo na perda, para o condenado, de uma parte substancial dos seus tempos livres, sem por isso o privar de liberdade e permitindo-lhe consequentemente a manutenção íntegra das suas ligações familiares, profissionais e económicas, numa palavra a manutenção com o seu ambiente e a integração social; por outro lado, com não menor importância, o conteúdo socialmente positivo que a esta pena assiste, enquanto se traduz numa prestação activa, com o seu consentimento, a favor da comunidade.       

Como já se consignou, são só considerações preventivas, nomeadamente de prevenção de socialização, que podem ser erigidas em critério de escolha da pena de trabalho a favor da comunidade, posto que a ela não se oponham razões de salvaguarda do mínimo de prevenção de integração, sob a forma de tutela do ordenamento jurídico.[9]

Sendo o trabalho a favor da comunidade uma pena de substituição em sentido próprio, em princípio, não será de aplicar a quem vem reiteradamente praticando crimes e já teve contacto com o meio prisional pelo cumprimento de pena de prisão efectiva.[10] 

             Do regime de permanência na habitação.                                                                                                 

Nos termos do art.44.º, n.º1, do Código Penal, o regime de permanência na habitação deve ser aplicado sempre que a pena de prisão aplicada for em medida não superior a um ano e o tribunal concluir que esta forma de cumprimento realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

O mesmo depende do consentimento do condenado e tem a particularidade de associar ao cumprimento domiciliário a vigilância electrónica.

Excepcionalmente, o n.º 2 do art.44.º do Código Penal, permite que o limite máximo do regime de permanência na habitação seja « elevado para dois anos quando se verifiquem, à data da condenação, circunstâncias de natureza pessoal ou familiar do condenado que desaconselham a privação da liberdade em estabelecimento prisional, nomeadamente: a) Gravidez; b) Idade inferior a 21 anos ou superior a 65 anos; c) Doença ou deficiência graves; d) Existência de menor a seu cargo; e) Existência de familiar exclusivamente ao seu cuidado.».

Esta pena de substituição está particularmente indicada para as situações em que o arguido esteve sujeito à medida coactiva de obrigação de permanência na habitação.

            Da pena de prisão por dias livres

Por fim, consignamos que de acordo com o art.45.º do Código Penal, a pena de prisão aplicada em medida não superior a um ano, que não deva ser substituída por pena de outra espécie, é cumprida em dias livres sempre que o tribunal concluir que, no caso, esta forma de cumprimento realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição ( n.º1).

A prisão por dias livres consiste numa privação da liberdade por períodos correspondentes a fins de semana, não podendo exceder 72 períodos ( n.º2). Cada período tem a duração mínima de trinta e seis horas e a máxima de quarenta e oito, equivalendo a cinco dias de prisão contínua ( n.º 3).

O pressuposto formal requerido pela lei é, portanto, que a pena de prisão seja aplicada em medida não superior a um ano e o pressuposto material coincide com o critério geral de aplicação das penas de substituição: «predomínio absoluto de considerações de prevenção de socialização, eventualmente limitadas por exigências irrenunciáveis de tutela do ordenamento jurídico ( estas em princípio , sempre satisfeitas pelo facto de a pena agora em exame ser ainda , em todo o caso, uma pena de prisão)».[11]

Sem afastar de todo o conteúdo de sofrimento inerente a toda a prisão e, deste modo, o seu carácter intimidativo, a prisão por dias livres é uma forma de reagir contra os perigos que se contêm nas normais penas de curta duração e de, ao mesmo tempo, manter em grande parte as ligações do condenado à sua família e à sua vida profissional.[12]

O Cons. Maia Gonçalves, tomando em consideração o “Parecer da Câmara Corporativa” ( Actas, nº 74, de 23/10/1973, pág. 2672 e 2673), lembra que a prisão por dias livres, enquadrando-se no movimento de política criminal que alertou para os malefícios das penas curtas de prisão, pretendeu dar resposta à necessidade de «… adaptar a pena à vida familiar e profissional do condenado e criar um regime intermédio entre a prisão contínua e o tratamento em meio aberto, mas a ideia apoia -se também em considerações que transcendem o delinquente. É, antes do mais indesejável que se projectem sobre a família do condenado consequências económicas desastrosas, a ponto de se dizer que “une peine de prison clochodise la famille”, sendo ainda indesejável a ruptura prolongada com o meio profissional e social. E além disso, o interesse das vítimas ficará mais garantido, porque a continuidade do trabalho aumenta as possibilidades de reparação. Por seu turno, o fraccionamento da execução da pena, o seu cumprimento em dias geralmente de ócio e a execução em condições que lhe não fazem perder a natureza punitiva, não apagam de modo algum a finalidade de prevenção especial.».[13]

No dizer do Prof. Paulo Pinto de Albuquerque, « a prisão por dias livres é uma verdadeira pena de substituição da pena de prisão, destinada a produzir um efeito de choque (o típico sharp shock effect) no condenado, sem os inconvenientes habituais das penas curtas de prisão).».[14]

Retomando o caso concreto, e começando pelo pressuposto formal de aplicação da pena de trabalho a favor da comunidade, traduzido na aplicação de uma pena de prisão em medida não superior a dois anos, temos como certo que ele se verifica, pois foi aplicada à arguida A... uma pena de 1 ano de prisão e a cada uma das arguidas B... e C... foi aplicada uma pena de 4 meses de prisão.

Já o pressuposto formal desta pena consistente na aceitação pelo condenado da substituição da pena de prisão pela pena de trabalho a favor da comunidade, não se tem como preenchido.

É que não existe aceitação pessoal, pelas arguidas, da substituição da pena de prisão pela pena de trabalho a favor da comunidade, mas apenas declaração por parte da sua Ex.ª Defensora,  sem poderes especiais para o acto, de aceitação dessa substituição.

Entendemos que estando em causa a aplicação de uma pena de substituição da prisão exige-se por parte do arguido uma aceitação pessoal dessa substituição..

Mas este obstáculo seria sempre superável através de notificação das arguidas A... , B... e C... , para virem aos autos apresentarem  declaração de aceitação ou consentimento subscrita por elas próprias.

O problema, adiantamos, desde já, é que não se verifica, em concreto e relativamente a qualquer destas três arguidas, o pressuposto material de aplicação da pena de trabalho a favor da comunidade.

A não aplicação da pena de trabalho a favor da comunidade advém, desde logo e principalmente, de as razões de prevenção especial serem muito elevadas no caso.

Resulta da factualidade dada como provada que a arguida A... vem praticando com regularidade e desde há vários anos, diversos crimes: um crime de devassa da vida privada, um crime de burla informática e nas comunicações e sete crimes de furto simples, pelos quais foi condenada em penas de penas de multa e penas de prisão suspensas na execução.

È de realçar que os crimes mencionados no ponto 24, vii) e viii) foram praticados pela arguida A... já depois ter sido detida nos presentes autos logo após a pratica do crime pelo qual está a ser julgada.

Da factualidade dada como provada, designadamente, do relatório social para eventual determinação de sanção, datado de 16/12/2013, referenciado no ponto n.º 23, consta que a arguida A... parece desvalorizar a prática do crime em causa e não ter consciência crítica quanto à gravidade da sua conduta, reflectindo a sua personalidade um desgaste acentuado por um percurso de vida desviante e marcado pela pobreza, quer económica quer afectiva.

Também a arguida B... vem praticando crimes de furto, tendo sido condenada por 3 crimes de furto, em duas penas de multa e numa pena de prisão suspensa na execução.

No que respeita às exigências de prevenção especial relativamente à arguida B... realçamos ainda que consta do relatório social para eventual determinação de sanção, datado de 17/12/2013, referenciado no ponto n.º 29, que esta não demonstra uma atitude pró-activa no sentido de mudar de estilo de vida e encara os comportamentos desviantes como único recurso para adquirir meios económicos; denota ausência de sentido crítico e reduzida interiorização das normas e valores sociais em vigência; o seu círculo de amizades circunscreve-se a pessoas com atitudes pró-criminais tais como as demais arguidas; e que parece existir elevado risco de reincidência por parte da arguida, não se prevendo o sucesso de uma eventual aplicação de medida na comunidade.

Por fim e no que respeita à arguida C... , anotamos que para além de ter sido já condenada por 2 crimes de furto, em penas de multa e de prisão suspensa na execução com regime de prova, foi ainda condenada em pena de multa pela prática, em 2004, de um crime de roubo.

È de realçar que os crimes mencionados no ponto 35, ii) e iii) foram praticados pela arguida C... já depois da pratica do crime pelo qual está a ser julgada.

Do relatório social para eventual determinação de sanção, datado de 16/12/2013, referenciado no ponto n.º 34, consta, designadamente, que a arguida C... revela total ausência de consciência crítica e como preocupação revelou apenas o receio de ser presa;    face à inexistência de qualquer impacto sobre a mesma das várias condenações de que foi alvo, as relações de amizade que mantém com raparigas com antecedentes criminais e a inexistência de alterações no seu estilo de vida, não existem condições para cumprimento da medida na comunidade.

Em suma, a personalidade das arguidas A... , B... e C... descrita na factualidade dada como provada na sentença recorrida e a prática do crime em apreciação por parte das mesmas demonstram que as anteriores condenações em penas não detentivas, não lograram  surtir o necessário efeito de ressocialização.

Depois de terem sido condenadas várias vezes por crimes de furto simples - que actualmente são de natureza semipública, permitindo que fiquem ocultos inúmeros crimes, quer por falta de queixa quer por desistência de queixa - , substituir-lhes a pena de prisão aplicada, por pena de trabalho a favor da comunidade, seria permitir-lhe acreditar que existe sempre mais uma oportunidade para continuar a delinquir, embora sujeita durante algum tempo aos inconvenientes das penas não detentivas.

Dada a frequência com que se comete este tipo de crimes em estabelecimentos comerciais e o alarme e impacto que não deixam de ter na comunidade e em especial nos ofendidos, entendemos que numa situação como a supra descrita a substituição das penas de prisão por penas de trabalho a favor da comunidade, não deixaria de afectar o sentimento jurídico da sociedade na validade e na força de vigência da norma jurídico-penal violada.

Bem andou assim, o Tribunal a quo, ao não ter substituído a pena de prisão por pena de trabalho a favor da comunidade

           Passando a conhecer agora da verificação dos pressupostos do cumprimento da pena de prisão em regime de permanência na habitação, também não vislumbramos razões para a sua aplicação a qualquer das três arguidas que a pretendem.

Para além de não se mostrar prestado de modo formalmente exigido o consentimento das arguidas para o cumprimento da prisão em regime de permanência na habitação - obstáculo que seria sempre superável através de notificação das arguidas , como já referido aquando da apreciação da pena de trabalho a favor da comunidade - entendemos, tal como o Tribunal a quo, que não se mostra verificado o pressuposto material desta pena de substituição.

É que o regime de permanência na habitação não realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição relativamente às arguidas A... , B... e C... .

Estas arguidas não estiveram sujeitas à medida coactiva de obrigação de permanência na habitação, caso em que seria adequado, em princípio, o cumprimento da prisão regime de permanência na habitação.

Por outro lado, o elevado risco de reincidência das arguidas, atrás referenciado, conjugado com o círculo de amizades delas que se circunscreve a pessoas com atitudes pró-criminais, não se adequa ao cumprimento das penas de prisão na sua habitação.

Por fim, não encontramos circunstâncias de natureza pessoal ou familiar que desaconselham a privação da liberdade em estabelecimento prisional, nomeadamente, as indicadas no n.º 2 do art.44.º, n.º 2 do Código Penal, ou seja, gravidez, idade inferior a 21 anos ou superior a 65 anos, doença ou deficiência graves, existência de menor a seu cargo, e existência de familiar exclusivamente ao seu cuidado.

Apenas quanto à arguida A... se poderia colocar, prima facie, a possibilidade de haver uma circunstância de familiar que desaconselhava a privação da sua liberdade em estabelecimento prisional, que resultaria de constar do ponto n.º 19 da factualidade dada como provada que acompanha a filha que está em sua casa, acamada, porque sofre de doença oncológica em fase terminal.

Mas, para além de não constar dessa factualidade que a sua filha que sofre de doença oncológica em fase terminal está exclusivamente ao seu cuidado, é a própria que no seu recurso refere que aquela filha já faleceu, vivenciando a dor da sua perda.

Analisando a factualidade dada como provada na douta sentença recorrida dela resulta que as arguidas não beneficiam de circunstâncias relevantes através das quais se possa concluir que com o cumprimento das penas de prisão em regime de permanência na habitação ficariam satisfeitas, de forma adequada e suficiente, quer as exigências de prevenção especial, quer geral, da punição.

Assim, não se mostrando integralmente preenchidos os pressupostos de aplicação desta pena de substituição, não pode proceder esta pretensão das recorrentes.

Passando, por fim, à verificação dos pressupostos de aplicação da pena de prisão por dias livres, começamos por consignar que se mostra preenchido, sem dúvidas, o pressuposto formal de aplicação desta pena uma vez que foram aplicadas às arguidas pena de prisão não superiores a 1 ano.

Quanto ao pressuposto material de aplicação desta pena de substituição, as recorrentes A... , B... e C... fundamentam o seu preenchimento no facto de serem “ o apoio de sua família”, referindo a arguida B... que vive em casa com dois filhos e dois netos, e a arguida A... que à data da primeira sentença a arguida A... tinha a filha de 33 anos em fase terminal de vida, sendo o seu único apoio, vivenciando hoje a dor da perda da sua filha.

O Ex.mo Procurador-geral Adjunto defende que se verificam os pressupostos da sua aplicação, tendo em conta a inserção familiar das recorrentes e as dificuldades que os respectivos agregados apresentam. Mais concretamente, no que respeita à arguida A... , porque a mesma faz o acompanhamento da filha com doença oncológica terminal; a arguida B... porque é o elemento minimamente estruturante da família; e a arguida C... porque contribui minimamente para o agregado.

Salvo o devido respeito, não cremos que a pena de prisão por dias livres seja uma pena adequada a qualquer das arguidas.

Relativamente à arguida A... , se era certo que à data da primeira sentença tinha uma filha a viver consigo, em fase terminal de vida, sofrendo com cancro, é a própria recorrente que refere que esse sofrimento terminou com a infeliz morte da filha. Não consta da factualidade dada como provada que com ela viva ou tenha vida familiar com qualquer outra pessoa.

No que respeita à sua vida profissional, resulta da factualidade dada como provada que a arguida A... está desempregada, recebendo o rendimento social de reinserção. O fraccionamento da execução da pena, com  o seu cumprimento em dias  de ócio, não teria aqui razão de ser.

Em suma, não vislumbramos a existência de substituição da pena de prisão por pena de prisão por dias livres em razão da sua vida familiar e profissional, e não está demonstrado que o cumprimento ininterrupto da pena de prisão trará uma desastrosa ruptura da vida familiar ou profissional da arguida A... .

Quanto à arguida B... , está provado que vive com um companheiro, o qual faz terapêutica de substituição de estupefacientes, e que tem em sua em casa duas filhas maiores e dois netos.

Não resulta, porém, da factualidade dada como provada que a arguida B... seja o apoio da família e sustento por meios legais do agregado familiar. A mesma encontra-se desempregada e beneficia do rendimento social de reinserção desde que foi criado, e “encara os comportamentos desviantes como único recurso para adquirir meios económicos.”.

Não temos, deste modo, elementos que nos permitam concluir que cumprimento ininterrupto da pena de prisão trará uma desastrosa ruptura da vida familiar ou profissional da arguida B... .

Para terminar, o Tribunal da Relação também que reconhece como correcta a afirmação da arguida C... de que sendo ela “ o apoio de sua família” deverá ser-lhe substituída a pena de prisão por prisão por dias livres.

A arguida não tem filhos e vive com o namorado em casa da mãe deste. O namorado trabalha numa oficina de automóveis, onde aufere € 650,00 mensais. A arguida C... , que era trabalhadora efectiva num hipermercado despediu-se por estar “farta do trabalho”, trabalhando agora para uma senhora idosa, apenas 4 horas por dia, 4 vezes por semana, auferindo € 360,00.

Portanto, sem prejuízo das consequências que sempre existem para a família do arguido, com a prisão de um seu elemento, não existem, no caso, particulares necessidades de substituição da pena de prisão por pena de prisão por dias livres para dar resposta à necessidade de adaptar a pena à vida familiar e profissional das arguidas.

Visando a prisão por dias livres produzir um efeito de choque no condenado, sem os inconvenientes habituais das penas curtas de prisão, entendemos que ela não deve ser aplicada, por perda de eficácia, às arguidas A... , B... e C... , pois dos factos provados resulta, designadamente:

- que o comportamento desviante das arguidas não foi uma fase passageira;

- que as mesmas possuem uma personalidade mal formada, demonstrada na ausência de consciência crítica dos factos que vêm praticando, com pouca ou nenhuma interiorização das normas e valores sociais, apesar de já não serem pessoas jovens; e

- que o círculo das suas amizades circunscreve-se a pessoas com atitudes pró-criminais, o que não augura nada de bom a favor da sua ressocialização, contribuindo para a manutenção das  elevadas as necessidades de prevenção especial positivas.

Acrescem a estas razões de prevenção de prevenção especial de reintegração, as de prevenção geral pois o crime em causa é praticado com grande frequência.

A substituição da pena de prisão contínua, em pena de prisão por dias livres, não cumpriria, no presente caso, o objectivo de intimidação e aprofundamento da validade e eficácia das normas penais pelos cidadãos em geral e pelas arguidas em particular, sendo aquela a única que satisfaz as funções da punição e as finalidades da pena.

Não se reconhecendo a violação pelo Tribunal a quo de qualquer das normas indicadas pelas recorrentes nas conclusões da motivação, mais não resta que julgar improcedente esta questão e o respectivo recurso. 

       Decisão

       

             Nestes termos e pelos fundamentos expostos acordam os juízes do Tribunal da Relação de Coimbra em negar provimento ao recurso interposto pelas arguidas A... , B... , C... e D... , e manter a douta sentença recorrida.

             Custas pelas recorrentes, fixando em 3 Ucs a taxa de justiça, a cargo de cada uma delas (art. 513º, nºs 1 e 3, do C. P.P. e art.8.º, n.º 9, do Regulamento das Custas Processuais e Tabela III, anexa).

                                                                         *

(Certifica-se que o acórdão foi elaborado pelo relator e revisto pelos seus signatários, nos termos do art.94.º, n.º 2 do C.P.P.). 

                                                                            *

Coimbra, 01 de julho de 2015

(Orlando Gonçalves – relator)

(Inácio Monteiro - adjunto)

                                                                                                                                                                    

                                                                                                                                                                               

                                                                                                                                                                    

[1]  Cfr. BMJ n.º 458º , pág. 98.

[2]  Cfr. CJ, ASTJ, ano VII, tomo I, pág. 247.

[3]  Cfr. Prof. Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, III, Verbo, 2ª edição, pág. 350.

[4] Código de Processo Civil anotado, vol. V, pág. 143. 

[5] Cfr. entre outros, os acórdão do STJ, de 9-3-2006, proc. n.º 06P461, (in www.stj.pt ) e de 11-1-2000 ( BMJ n.º 493, pág. 385).

[6] Cfr. Prof. Beleza dos Santos, in RLJ, ano 58.º, pá. 252

[7] Cfr. acórdão do STJ de 22 de Fevereiro de 1995 (BMJ n.º444, pág. 209 ).

[8]Direito Penal Português - As consequências Juridicas do crime” ed. Noticias editorial, pág.332 e 333.   

[9] - cfr. Prof. Figueiredo Dias, “Direito Penal Português, as Consequências do Crime”, páginas 371 e 372.

[10] A este propósito, ensina o Prof. Augusto Silva Dias que “ ela é aplicada a crimes que, pela sua pouca gravidade e baixa frequência ( não se trata, portanto, de crimes de massa), não provocam alarme social e a delinquentes que não são habituais ou sequer reincidentes.” – R.O.A., Novembro 2011, pág. 11. 

[11]  cfr. Prof. Figueiredo Dias , in “Direito Penal Português , as Consequências do Crime”, pág- 391.

[12]  cfr. ac. STJ, de 2 de Março de 1988, ir BMJ n.º 375.º, pág. 204. 

[13] cfr. “Código Penal anotado”, Almedina, 8.ª edição, pág. 301.

[14] Comentário do  Código Penal, Univ. Católica Editora, 2.ª edição, pág. 216.