Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
593/09.7TBCTB.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: SÍLVIA PIRES
Descritores: PRESCRIÇÃO PRESUNTIVA
HONORÁRIOS
CRÉDITO
Data do Acordão: 01/29/2013
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DE CASTELO BRANCO – 1º JUÍZO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE REVOGADA
Legislação Nacional: ARTº 317º, AL. C) DO C. CIVIL.
Sumário: I – O prazo de prescrição presuntiva de um crédito de honorários relativos a um mandato forense e de reembolso de despesas realizadas na execução desse mandato, inicia a sua contagem quando, por qualquer causa, cessa a prestação do mandatário.

II - A partir desse momento e durante um prazo de dois anos, presume a lei que o credor procurou obter, enviando a nota de honorários, e o devedor pagou a retribuição dos serviços prestados e o reembolso das despesas efectuadas.

III - Tendo o mandato abrangido o patrocínio judiciário em várias causas, para determinar quando se inicia o referido prazo de prescrição há que averiguar, em cada caso, se, pela convenção das partes, pelas circunstâncias ou pelo usos, o credor pode exigir e o devedor deve pagar no fim de cada causa, ou se isso só se dá no fim da última.

Decisão Texto Integral: Acordam na 3ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra
O Autor, advogado em causa própria, intentou a presente acção declara­tiva, de condenação, com processo ordinário, pedindo:
a) a condenação solidária de todos os réus a pagarem-lhe a quantia de € 113.050,43, acrescida de € 21.430,00 de IVA, num total de € 134.480,00, acrescida dos  juros vincendos até efectivo pagamento, e
b) a condenação do 1º e 3º Réus a pagarem-lhe a quantia de € 150,00, acrescida dos juros vincendos até efectivo pagamento.
Para tanto alega, em síntese, ser aquele o valor dos seus honorários pelos serviços profissionais, enquanto advogado, que prestou em representação dos Réus, através de mandato forense, desde o ano de 1996 até que no ano de 2007 veio a saber que os Réus tinham outorgado procuração forense a outros dois advogados – o que foi por si entendido como acto de revogação tácita do mandato que lhe tinha sido conferido – o que levou a que tenha interpelado os dois primeiros Réus, para ser pago pelos serviços prestados até àquela data, apresentando, para tanto, nota de honorários e despesas, não tendo, no entanto, obtido qualquer resposta.
Contestaram os dois primeiros Réus, invocando a excepção peremptória do pagamento das quantias peticionadas e ainda que o mandato cessou, não pelas razões invocada pelo Autor, mas sim pela comunicação escrita, que dirigiu aos Réus, datada de 28 de Julho de 2005, terminando por invocar a excepção da prescrição presuntiva do pagamento, prevista no art.º 317º do C. Civil.
Concluíram pela procedência das excepções e sua consequente absolvição do pedido.
O Autor apresentou réplica, na qual manteve tudo o alegado na p. inicial, alegando que a carta enviada aos Réus só se destinou a pressioná-los, com a fixação de um prazo para que algo lhe dissessem, dando a entender que só lhe restaria concluir que o mandato cessaria, caso o silêncio se mantivesse, manifestando, contudo a sua disponibilidade para prosseguir no exercício do mandato; e ainda que foi posteriormente contactado pelo mandatário da parte contrária no litígio que com os Réus se mantinha e, convicto que continuava a exercer o mandato em representa­ção deles, os informou de ter sido proposta nova acção contra eles, tendo ainda no exercício do mandato, em 25 de Julho de 2006, enviado nova carta, que o 1.º Réu recebeu, informando-o destes contactos e alertando-o para a importância em contestar, renovando novamente a sua disponibilidade para prosseguir no exercício do mandato e fixando prazo para uma resposta pois já corria o prazo para apresentar contestação.
Concluiu, defendendo a improcedência da excepção da prescrição.
 
Veio a ser proferida sentença que julgou a acção nos seguintes termos:
Nos termos e com os fundamentos invocados, decido julgar procedente por provada a pretensão do autor A…, em função do que se condenam,
1. Os réus L…, M… e G… a pagarem-lhe, solidariamente, a quantia de € 113.050,43, acrescida de € 21.430,00 a título de IVA e de juros vincendos até efectivo pagamento e,
2. Os réus L… e G…, ainda, no pagamento da quantia de € 150,00, acrescida dos juros vincendos até efectivo pagamento.

Na sequência da notificação da decisão veio o Autor pedir a aclaração da mesma, o que veio a ser deferido através de despacho com o seguinte conteúdo:
Antes de mais consigna-se que a sentença proferida nos autos, na parte em questão, se limita a reproduzir o peticionado pelo autor, como, aliás, não podia deixar de ser. Assim, se a sentença, neste ponto concreto, se apresenta menos clara ou padece de alguma obscuridade, tal deve-se única e exclusivamente à falta de clareza com que foi formulado o pedido condenatório.
Não obstante, para evitar futuros equívocos sempre se dirá o seguinte:
Logicamente, ao peticionar a condenação dos réus no pagamento dos juros vincen­dos, está subjacente que existirão juros vencidos e estes terão sido já liquidados aquando da propositura da acção.
Assim sendo, ao falar-se em “juros vincendos” parece-nos evidente que pretendeu o autor a condenação dos réus nos juros que se vencessem a partir daquele momento.
Pelo exposto, a decisão condenatória deverá ser entendida (e assim se aclara a mesma, sem prejuízo do que anteriormente se consignou), no sentido de que os réus são condenados no pagamento de juros vencidos sobre os montantes em causa desde a data da propositura da acção e nos vincendos até efectivo pagamento.

Inconformados com a sentença proferida os Réus L… e G… interpuseram recurso, formulando as seguintes conclusões:
...
Os Réus L… e G…, na sequência da notificação do despacho de aclaração da sentença ampliaram, invocando o disposto no art.º 670º, n.º 3 do C. P. Civil, o objecto do recurso, formulando as seguintes conclusões:
...
O Autor não apresentou resposta.
1. Do objecto do recurso
Encontrando-se o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das ale­gações dos Recorrentes cumpre apreciar as seguintes questões:
a) A redacção do facto constante do ponto 17 da sentença deve ser alte­rada?
b) À data da citação dos Réus para a presente acção já havia decorrido o prazo de dois anos referido no art.º 317º do C. Civil?
c) Sendo julgado procedente o pedido principal os Réus devem ser apenas condenados a pagar juros de mora desde a decisão condenatória?

2. Os factos

Assim, os factos provados são os seguintes:

O direito aplicável
Na presente acção o Autor reclamou o pagamento de honorários e reem­bolso de despesas pelo exercício de mandato a favor dos Réus.
Os Réus L… e G… defenderam-se, limitando-se a invocar o pagamento da dívida reclamada, alegando a sua prescrição presuntiva.
A sentença recorrida, com fundamento em não existirem dados factuais que permitissem determinar quando se iniciou o decurso do prazo de prescrição invocado pelos Réus contestantes, julgou procedente a acção e condenou aqueles a pagar o valor peticionado.
Os Réus recorreram desta decisão, alegando que os factos provados per­mitem situar o início do prazo de prescrição no envio de uma carta pelo Autor aos Réus em 28.7.2005 com a qual teria cessado a relação de mandato estabelecida entre eles.
Estando em causa o decurso de um prazo de prescrição presuntiva de um crédito de honorários relativos a um mandato forense e de reembolso de despesas realizadas na execução desse mandato, quer a decisão recorrida, quer os Recorrentes, entenderam que o início desse prazo ocorria com a cessação do mandato, pois era nessa altura que o respectivo crédito passava a ser exigível pelo mandatário. Diver­gem apenas quanto à possibilidade de determinação desse momento face à factuali­dade provada.
A figura das prescrições presuntivas que já constava de um Édito de 1510 do Rei Luís XII foi consagradas no Código de Napoleão – aquele a quem for oposta alguma das prescrições mencionadas nestes artigos, poderá requerer, que a pessoa que a não opõe declare sob juramento se a dívida foi ou não paga, e neste caso se julgue conforme o juramento, sem que este possa ser referido[1] (art.º 2275º).
Entre estas prescrições, no art.º 2273º previa-se a dos créditos relativos a honorários e gastos dos advogados no prazo de dois anos a partir do julgamento do processo, da conciliação das partes ou da revogação do mandato.
Tal figura foi adoptada em Portugal pelo Código de Seabra, nos art.ºs 538º a 544º, tendo o art.º 540º estabelecido que prescreviam pelo lapso de dois anos as retribuições dos advogados, começando esta prescrição a correr desde o dia em que cessava a procuração[2].
Relativamente ao mandato forense, na vigência deste Código, quando o patrocínio respeitasse a diversas causas, Dias Ferreira[3] e Cunha Gonçalves[4], afastando-se da doutrina e da jurisprudência francesas, defenderam que a prescrição operava relativamente a cada uma das causas e corria desde a data em que cessava o mandato em cada um dos processos.
Aquando dos trabalhos preparatórios do actual Código Civil foi ponderada a manutenção destas prescrições presuntivas.
Escreveu Vaz Serra[5]:
“Deverá continuar a existir entre nós, a figura das prescrições presuntivas?
No caso afirmativo com que regime?
Se não se mantivessem, teriam que subordinar-se os créditos nela incluí­dos a uma prescrição de curto prazo propriamente dita (v.g. de cinco anos, como no Código Suíço, ou de dois anos, como no Código Alemão), o que exporia o devedor à acção do credor durante o prazo da prescrição, sem que ele tenha a possibilidade de provar o pagamento, que porventura tenha feito, mediante quitação que, nestas dívidas, não é usual ser passada. Ora, é precisamente para valer ao devedor de dívidas que costumam ser pagas rapidamente e de cujo pagamento não é habitual cobrar recibo, que as prescrições presuntivas foram criadas. Se o credor pudesse exigir ao devedor o pagamento durante, por exemplo, cinco, três ou dois anos, o devedor, que tenha pago, e a quem o credor exigisse dentro de tal prazo, a prestação, poderia ver-se embaraçado com a prova do pagamento, de que não possui quitação, e ver-se-ia, portanto, na contingência de ter de pagar duas vezes.
A solução de substituir as prescrições presuntivas por uma prescrição propriamente dita de três ou dois anos, poderia entender-se que não teria inconve­niente de maior quanto às prescrições dos art.º 540º e 541º, cujos prazos são já de dois e três anos.
[…]
Mas, quanto à prescrição presuntiva de seis meses (art.º 538º) a substitui­ção por uma prescrição de três, dois ou um ano poderia prejudicar gravemente o devedor.
Estas várias substituições prejudicariam, além, disso, o credor que, pas­sado o prazo de prescrição, ficaria exposto à excepção de prescrição e não poderia, oposta ela, exigir do devedor a prestação. E os prazos de três, dois ou um ano parecem insuficientes para se admitir a prescrição propriamente dita destas dívidas, por não serem bastante longos para poder dizer-se que a inércia do credor justifica a prescrição.
[…]
Afigura-se, pois, dever manter-se a categoria das prescrições presuntivas.”.
E estas efectivamente mantiveram-se nos art.ºs 312º a 317º do C. Civil, estando prevista na alínea c) deste último preceito a prescrição dos créditos pelos serviços prestados no exercício de profissões liberais e pelo reembolso das despesas correspondentes.
A razão de ser das prescrições presuntivas tem a ver com a natureza das obrigações em causa que dizem respeito a créditos gerados pelo exercício de activi­dades profissionais cujos pagamentos são usualmente reclamados pelos credores em prazos curtos, por se tratar de receitas creditícias necessárias à manutenção do giro regular dos mesmos ou até à sua sobrevivência, e em que os devedores, por regra, cumprem a sua obrigação também em prazo curto e sem exigirem recibo de quitação ou não guardando tal recibo durante muito tempo. Daí a presunção de cumprimento, por parte do devedor, quando o credor não o demande judicialmente no prazo legalmente estabelecido.
No que respeita ao inicio do curso deste prazo de prescrição, o Antepro­jecto de Vaz Serra – art.º 18º n.º 4 – propunha que se determinasse que ele começava a correr na data em que por convenção o credor pudesse exigir a prestação ou fosse usual exigi-la[6].
Apesar da 1.ª Revisão Ministerial ter excluído esta previsão específica do texto legal, em termos gerais, resulta da remissão do art.º 315º, para o disposto no art.º 306º do C. Civil, que também nas prescrições presuntivas o prazo de prescrição começa a correr quando o direito puder ser exercido.
No que respeita ao crédito de honorários relativos a um mandato forense e de reembolso de despesas realizadas na execução desse mandato, não se mostrando acordado um outro prazo para a sua satisfação, deve esta ocorrer apenas após ter cessado a prestação do mandatário, devendo para o efeito este apresentar ao mandante a respectiva conta de honorários com descriminação dos serviços prestados (art.º 100º, n.º 2 do Estatuto da Ordem dos Advogados).
Assim, o prazo de prescrição deste tipo de crédito inicia a sua contagem quando, por qualquer causa, cessa a prestação do mandatário[7].
A partir desse momento e durante um prazo de dois anos, presume a lei que o credor procurou obter e o devedor pagou a retribuição dos serviços prestados e o reembolso das despesas efectuadas.
Da matéria de facto provada resulta que se estabeleceu uma relação de mandato forense entre Autor (mandatário) e os Réus (mandantes) que teve por objecto o patrocínio judiciário destes em diversas acções judiciais.
Inicialmente os Réus mandataram o Autor para os patrocinar em acções que já se encontravam em curso (processo …). Contudo, tendo sido celebrada uma escritura de cessão de quotas, na sequência de transacção lavrada numa daquelas acções, os Réus ampliaram o objecto do mandato inicial, passando este a abranger o patrocínio nas acções que houvesse que instaurar ou contestar em que se questionasse a validade daquela escritura.
Foi no cumprimento dessa prestação que o Autor patrocinou os Réus nos processos n.ºs …, todos do Tribunal da Comarca de Castelo Branco.
O Autor ainda patrocinou os 1º e 3º Réus no processo n.º … em acção estranha ao objecto da relação de mandato anteriormente referida.
São os honorários relativos a todos estes patrocínios e o reembolso das despesas feitas nesse âmbito que o Autor peticionou na presente acção.
Tendo o mandato abrangido o patrocínio judiciário dos Réus em várias causas coloca-se desde logo a questão de saber se o prazo prescricional relativo aos honorários e despesas de todas elas só se inicia com o termo da última a acabar ou se correm prazos distintos relativamente a cada uma delas.
Vaz Serra defendeu que a solução não pode ser uniforme, dependendo das circunstâncias do caso concreto, pois, há que averiguar, em cada caso, se, pela convenção das partes, pelas circunstâncias ou pelo usos, o credor pode exigir e o devedor deve pagar no fim de cada causa, ou se isso só se dá no fim da última[8].
Estando nós perante uma presunção de interpelação e pagamento, para que se inicie a contagem do respectivo prazo de prescrição é necessária a existência de dados que nos permitam verificar o momento em que se tornou exigível o crédito em causa.
Na verdade, baseando-se esta presunção legal, no facto de se reportar a créditos gerados pelo exercício de uma actividade profissional, cujos pagamentos são usualmente reclamados pelos credores em prazos curtos, e em que os devedores, por regra, cumprem a sua obrigação também em prazo curto e sem exigirem recibo de quitação ou não guardando tal recibo durante muito tempo, só deve iniciar-se a contagem do prazo de prescrição quando as circunstâncias do caso revelarem uma conjuntura em que o pagamento de honorários e o reembolso de despesas é exigível.
Ora, respeitando o crédito de honorários e de reembolso de despesas aqui em causa ao patrocínio de diversas acções judiciais conexas que, com excepção da referente ao processo n.º …, respeitam todas ao mesmo litígio, nada permite concluir que tal crédito era divisível e exigível no termo de cada uma das acções cujos serviços abrange. Apenas os honorários e reembolso de despesas relativos ao processo n.º … eram exigíveis separada e imediatamente ao termo deste pro­cesso.
Contudo, provou-se que todas aqueles processos estavam concluídos em Junho de 2004 e que, em consequência do êxito do mandato do Autor e atendendo ao resultado obtido, estavam criadas as condições para que a então família L…(Réus), sendo a única detentora da administração da sociedade de construção e, livre de quaisquer obstáculos de natureza jurídica, pudesse ou concluir a execução – suspensa há mais de 16 anos – da obra de construção do prédio com r/c destinado a espaços comerciais e 6 andares para habitação de que é simultaneamente dona e empreiteira ou, se assim o entendessem os Réus, alienar o prédio no estado em que se encontrava para outra empresa de construção concluir a obra e, por sua vez, vender.
Mais se provou que em 28 de Julho de 2005 o Autor enviou uma carta aos Réus em que, após solicitar provisão para efectuar durante as férias judiciais o registo das cessões de quota que haviam estado em litígio naquelas acções, terminava do seguinte modo:
“Caso nada me diga e terminando desta forma, o que lamento, o meu mandato, afigura-se-me ser o momento próprio para apresentar nota de honorários e despesas por todos os serviços prestados desde 1996, no âmbito dos processos para suprimento do consentimento, processo crime, de anulação da escritura, de nulidade da escritura e de segunda prestação de contas, envolvendo, como se compreende, a cessão de quota de J…”.
Não tendo os Réus correspondido à solicitação do Autor, pelo menos no termo das férias judiciais de verão de 2005, ficou este em condições de proceder à cobrança dos honorários e reembolso das despesas relativas às acções compreendidas no mandato que os Réus lhe haviam conferido, tal como aliás comunicou na carta enviada aos Réus em 28 de Julho de 2005.
Apesar do mandato abranger o patrocínio de todas as acções que houvesse que instaurar ou contestar em que se questionasse a validade duma escritura de cessão de quotas em que os Réus tinham participado, isso não permitia que os honorários relativos aos serviços já prestados e o reembolso das despesas já realizadas não pudessem então ser cobrados, perante o termo de todas as acções pendentes, não havendo na altura qualquer motivo para se aguardar a instauração de novas acções.
Assim, tendo cessado pelo cumprimento, pelo menos nessa altura (fim das férias judiciais de verão do ano de 2005), o mandato do Autor, passou a ser exigível o pagamento dos honorários e reembolso das despesas relativas às acções em que este havia patrocinado os Réus relacionadas com a referida cessão de quotas, pelo que o prazo de prescrição presuntiva dos respectivos créditos se iniciou, pelo menos, nessa data.
O facto dos Réus terem sido citados em Julho de 2006 para nova acção de anulação da referida escritura não obsta a esta conclusão, uma vez que o lapso temporal que mediou entre esta acção e a pendência das anteriores não permitia incluía-la, sem uma manifestação consensual das partes nesse sentido, na relação de mandato anteriormente estabelecida.
Aliás, conforme se verifica da factualidade provada, o Autor, nesse sen­tido, procurou obter o acordo dos Réus para estender o seu mandato a esta nova acção, não o tendo conseguido relativamente aos Réus contestantes.
Assim, o prazo de prescrição presuntiva cuja contagem se havia iniciado no termo das férias judiciais de verão de 2005 acabou por se completar em data anterior à propositura e citação dos Réus na presente acção, pelo que, nos termos do art.º 317º, c) do C. Civil, se presume que nesse período ocorreu a interpelação e pagamento dos honorários e reembolso de despesas aqui peticionado, por parte dos Réus contestantes.
Não se revelando ilidida esta presunção pelos meios admitidos no art.º 313º do C. Civil, deveriam os Réus contestantes terem sido absolvidos do pedido deduzido pelo Autor, pelo que o recurso deve ser julgado procedente, revogando-se a sentença na parte em que os condenou.
Tendo procedido este fundamento do recurso, fica prejudicada a aprecia­ção da última questão subsidiariamente colocada pelos Recorrentes que respeitava à sua condenação em juros de mora.
Decisão
Pelo exposto julga-se procedente o recurso e, em consequência, revoga-se a decisão recorrida na parte em que condenou os Réus L… e G…, passando-se a julgar improcedente a acção quanto a eles e absolvendo-se os mesmos do pedido formulado pelo Autor.
Custas da acção na proporção de 2/3 pelo Autor e 1/3 pela Ré G...
Custas do recurso pelo Autor.
                      
Sílvia Pires (Relatora)
Henrique Antunes
José Avelino


       [1] Tradução em Tratado de Direito Civil Português, I Parte Geral, Tomo IV, pág. 180, ed.  2005, da Livraria Almedina, de Menezes  Cordeiro.

[2] Anteriormente estava prevista uma prescrição comum de 3 meses para estes créditos (Ordenações Filipinas, Livro I, Títulos LXXIX, § 18, LXXXIV, § 30, XCII, § 18).

[3] Em Código Civil Português Anotado, vol. I, pág. 382, da 2.ª ed. da Imprensa da Universidade.

[4] Em Tratado de direito civil em comentário ao Código Civil Português, vol. II, pág. 738-739, ed. 1930, da Coimbra Editora.

[5] Em Prescrição extintiva e caducidade, no B.M.J. n.º 106, pág. 51-52.
[6] No B.M.J. n.º 107, pág. 288.

[7] Vaz Serra, na ob. cit., pág. 71-72, Pires de Lima/Antunes Varela, em Código Civil Anotado, vol. I, pág. 285, da 4.ª ed., da Coimbra Editora, e os seguintes acórdãos:
- do S.T.J., de 12.3.2009, relatado por Maria dos Prazeres Beleza, acessível em www.dgsi.pt.
- da Relação do Porto, de 28.9.2010, relatado por Anabela Calafate, acessível em www.dgsi.pt.
[8] Ob. cit. na nota 5, pág. 73.