Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
304921/09.8YIPRT-B.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ARLINDO OLIVEIRA
Descritores: INJUNÇÃO
EMBARGOS
FUNDAMENTOS
INCONSTITUCIONALIDADE
ACÇÃO ESPECIAL PARA CUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÕES PECUNIÁRIAS
FORÇA EXECUTIVA
OPOSIÇÃO
Data do Acordão: 05/13/2014
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: 2.º JUÍZO DE POMBAL
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 729º E 857.º DO NCPC
Sumário: 1. O artigo 857.º do nCPC é inconstitucional quando interpretado no sentido de que os fundamentos de embargos a execução fundada em requerimento de injunção a que foi aposta fórmula executória se limitam aos fundamentos de embargos previstos no artigo 729º, do que resulta não se poder aplicar tal preceito.

2. Nos embargos deduzidos numa execução baseada na atribuição judicial de força executiva à petição da acção especial para cumprimento de obrigações pecuniárias subsequente à falta de oposição ao requerimento de injunção não se verifica tal inconstitucionalidade.

Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra

           

            A... , veio, através de requerimento entrado em juízo no dia 13 de Setembro de 2013, cf. fl.s 14, deduzir embargos de executado à execução para pagamento de quantia certa, que lhe moveu “B..., SA”, peticionando que, na procedência dos mesmos, se declare a prescrição do crédito exequendo.

Para tal, alegou que por o título dado em execução consistir num requerimento de injunção a que foi aposta fórmula executória, pode ainda deduzir oposição a tal execução, baseando-se para tal nas decisões do Tribunal Constitucional que declararam a inconstitucionalidade do artigo 814.º do CPC, na redacção então vigente, quando interpretado no sentido de limitar a oposição à execução fundada em injunção à qual foi aposta a fórmula executória, como se de uma verdadeira decisão judicial se tratasse.

Como consta da certidão de fl.s 40 a 43, a execução a que a ora recorrente pretende opor-se, teve por base o requerimento de injunção aqui junto a fl.s 43, através do qual, a exequente, pretendia obter a condenação daquela, no pagamento da quantia de 368,07 €, de capital em dívida, acrescida da quantia de 5,13 €, de juros de mora vencidos, 25,50 €, de taxa de justiça paga e 20,00 €, relativa a despesas de diligências para cobrança, com o fundamento em ter prestado à ali requerida, a solicitação desta, serviços de telecomunicações, que ascendem ao peticionado montante e que não foram pagas, não obstante as diligências para tal encetadas.

A aqui recorrente chegou a deduzir oposição a tal requerimento de injunção, a qual foi mandada desentranhar por não ter sido junto documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça devida, em consequência do que, cf. despacho aqui junto a fl.s 41, se conferiu força executiva à petição inicial, em face do que prosseguiram os autos como Acção Especial para Cumprimento de Obrigações Pecuniárias.

Conclusos os autos à M.ma Juiz a quo, para apreciação do requerimento inicial de embargos, foram os mesmos liminarmente indeferidos, com o fundamento em que a oposição deduzida assenta num pressuposto que não se verifica: no facto do título executivo consistir num requerimento de injunção a que foi aposta fórmula executória.

Para tal, considera-se nesta decisão, que a embargante já havia deduzido oposição ao requerimento de injunção, a qual não veio a ser considerada por falta do pagamento da taxa de justiça devida, em consequência do que os autos foram distribuídos como acção especial para cumprimento de obrigações pecuniárias, no âmbito da qual se determinou o referido desentranhamento da oposição e tenha sido conferida força executiva ao requerimento de injunção por um juiz, pelo que se trata de uma verdadeira decisão jurisdicional, pretendendo, agora, a recorrente discutir novamente os fundamentos do procedimento de injunção, o que lhe está vedado face ao trânsito em julgado da decisão judicial condenatória.

            Inconformada com a mesma, interpôs recurso a embargante, recurso, esse, admitido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo (cf. despacho de fl.s 27), rematando as respectivas motivações, com as seguintes conclusões:

De acordo com a recente jurisprudência do Tribunal Constitucional, plasmada no recente acórdão nº 437/2012, publicado no DR 2.ª Série, n.º 211 – Parte D, de 31.10.2012, é inconstitucional a norma contida no artigo 814º do Código do Processo Civil, quando interpretada no sentido de limitar a oposição à execução fundada em injunção à qual foi aposta fórmula executória.

Pelo que, a norma em apreço, na medida em que limita injustificadamente os fundamentos de oposição à execução baseada em “requerimento de injunção a que foi aposta fórmula executória”, padece do vício de inconstitucionalidade por violar o „princípio da proibição da indefesa, enquanto acepção do direito de acesso ao direito e aos tribunais consagrado no artigo 20.º, n.º 1 da Constituição”.

De resto, a jurisprudência do Tribunal Constitucional é seguida pela jurisprudência mais recente dos tribunais de apelação, como é o caso do acórdão da Relação de Coimbra, de 29.01.2013, processo n.º 197/12.7TBTMRA.C1, que expressamente diz que “ partilhando o entendimento do Tribunal Constitucional de que o artigo 814º, nº 2 do CPC viola os artigos 18º e 20º da CRP, então torna-se admissível à luz do direito defesa que mesmo após a aposição da fórmula executória sempre o executado pode alegar, em sede de oposição à execução, factos impeditivos – artigo 816º do CPC – na medida em que, sublinha-se, a fórmula executória aposta no requerimento de injunção não contém o reconhecimento de um direito já que não foi objecto de análise e decisão jurisdicional, repetindo-se que a opção legislativa apenas teve em vista dotar de maior celeridade e simplificação a reclamação de dívidas até determinado montante e não obstar, limitar os restringir os direitos do executado em deduzir oposição à execução nos termos do artigo 816º do CPC”.

Assim sendo, a sentença recorrida, ao indeferir liminarmente a oposição por embargos de executado, por o fundamento não se ajustar ao disposto nos artigos 729º a 731º, violou as disposições legais em apreço.

Nestes termos e nos melhores de Direito deve o presente recurso ser julgado procedente por provado e, consequentemente, ser revogada a sentença proferida.

Só assim se decidindo se fará a acostumada Justiça!

            Citada a exequente, nos termos e para os efeitos do artigo 641.º, n.º 7, ex vi artigo 853.º, n.º 1, ambos do nCPC, pela mesma não foram apresentadas contra-alegações.

           

            Dispensados os vistos legais, há que decidir.  

Tendo em linha de conta que nos termos do preceituado no artigo 635, n.º 4 do nCPC, as conclusões da alegação de recurso delimitam os poderes de cognição deste Tribunal e considerando a natureza jurídica da matéria versada, a questão a decidir é a de saber se em caso de execução baseada em requerimento de injunção a que tenha sido aposta fórmula executória, a oposição/embargos que lhe seja deduzida está ou não limitada aos fundamentos que são mencionados no artigo 857.º do nCPC.

            A matéria de facto a considerar para a decisão do presente recurso é a que consta do relatório que antecede.

            Se em caso de execução baseada em requerimento de injunção a que tenha sido aposta fórmula executória, a oposição/embargos que lhe seja deduzida está ou não limitada aos fundamentos que são mencionados no artigo 857.º do nCPC.

            Alega a recorrente que é inconstitucional a norma contida no artigo 814.º do CPC, na redacção então em vigor, quando interpretada no sentido de limitar a oposição à execução fundada em injunção à qual foi aposta fórmula executória, fundamentando-se, para tal, em diversas decisões do Tribunal Constitucional que assim consideraram.

            Isto porque, a assim se entender, se viola o “princípio da proibição da indefesa”, enquanto acepção do direito de acesso ao direito e aos tribunais consagrado no artigo 20.º, n.º 1 da CRP, dado que a aposição da fórmula executória ao requerimento de injunção não contém o reconhecimento de um direito, por não ter sido objecto de decisão jurisdicional, apenas sendo o resultado de uma opção legislativa que visou metas de celeridade e simplificação na reclamação de alegadas dívidas até certo montante.

            Em face do que, conclui, lhe assiste o direito de deduzir oposição à execução que contra si foi deduzida com base no mencionado requerimento de injunção.

            Como já referido, na decisão recorrida, que indeferiu liminarmente os deduzidos embargos, em que a ora recorrente veio alegar a prescrição do crédito exequendo, considerou-se não se tratar de caso de execução baseada em injunção a que foi conferida a fórmula executória, pelo que se está perante decisão jurisdicional, em consequência do que não se verifica a invocada inconstitucionalidade.

            Efectivamente, como resulta dos autos, a execução que deu causa à oposição aqui ajuizada tem origem no requerimento de injunção apresentado pela exequente, com vista a obter o pagamento dos serviços de comunicações que referiu ter prestado à executada, a pedido desta.

            Só que e isto é o que releva: - não se trata de execução fundada em requerimento de injunção, a que foi aposta a fórmula executória, sem que lhe tenha sido deduzida qualquer oposição, mas sim de execução que se fundamenta no despacho de fl.s 41, no qual, por falta de oposição, se conferiu, através de despacho judicial, em conformidade com o disposto no artigo 2.º do DL 268/98, de 1/9, força executiva à petição inicial.

            É certo que no caso em apreço, a requerida chegou a deduzir-lhe oposição, mas a mesma foi mandada desentranhar, por falta de comprovativo do pagamento da taxa de justiça devida.

            Ou seja, tudo se passa como se não houvesse oposição, derivando o acto de conferir força executiva à petição da acção que se lhe seguiu, da falta de oposição, sendo a decisão daqui decorrente que serve de base à execução, o que nos reconduz à questão suscitada no presente recurso, repete-se: se, nesta fase, a requerida/executada, pode ou não deduzir oposição a tal execução fundada em requerimento de injunção a que se conferiu fórmula executória e com que âmbito/fundamentos.

            Só que, como acima já se referiu, a decisão exequenda não resulta da injunção propriamente dita mas sim da decisão judicial de fl.s 41, que conferiu força executiva à petição inicial.

            Decisão, esta, que configura uma verdadeira sentença condenatória proferida em acção declarativa de condenação – neste sentido, Salvador da Costa, in A Injunção e as Conexas Acção e Execução, Almedina, Outubro de 2001, a pág.s 82 e 83.

            É certo que em face da omissão do comprovativo da falta de pagamento da taxa de justiça devida, deveria a opoente ter sido notificada para o comprovar, nos termos do disposto no artigo 486.º-A, n.os 3 e 4, do CPC, na redacção então vigente, sendo que não o foi.

            Contra tal omissão poderia e deveria a ora recorrente ter reagido, o que não fez.

            De igual forma, poderia e deveria (na óptica do seu interesse) ter recorrido do despacho que mandou desentranhar a oposição deduzida e, na sequência, do despacho que conferiu força executiva à petição inicial, dada a omissão primeiramente apontada.

            Não o tendo feito, mostram-se aquelas decisões transitadas em julgado, com as consequências previstas no artigo 628,º do nCPC.

            Em suma, a decisão exequenda é a sentença de fl.s 41, que conferiu força executiva e o requerimento de injunção a que tenha sido aposta a fórmula executória.

Efectivamente, no âmbito de vigência do artigo 814º nº 1 do Código de Processo Civil (na redacção anterior à Lei nº 41/2003 de 26 de Junho), fundando-se a execução em sentença, a oposição só podia ter algum dos fundamentos seguintes:

a) inexistência e inexigibilidade do título;

b) falsidade do processo ou do traslado ou infidelidade deste, quando uma ou outra influa nos termos da execução;

c) falta de qualquer pressuposto processual de que dependa a regularidade da instância executiva, sem prejuízo do seu suprimento;

d) falta ou nulidade da citação para a acção declarativa quando o réu não tenha intervindo no processo;

e) incerteza, inexigibilidade ou liquidez da obrigação exequenda, não supridas na fase introdutória da execução;

f) caso julgado anterior à sentença que se executa;

g) qualquer facto extintivo ou modificativo da obrigação, desde que seja posterior ao encerramento da discussão no processo de declaração e se prove por documento;

h) tratando-se de sentença homologatória de confissão ou transacção, qualquer causa de nulidade ou anulabilidade desses actos.

E previa-se no nº 2 do referido preceito legal que os referidos fundamentos de oposição à execução baseada em sentença se aplicavam também às execuções que tinham por base um requerimento de injunção a que fosse aposta fórmula executória, desde que o procedimento de formação desse título admitisse oposição pelo requerido.

Com a entrada em vigor do Novo Código de Processo Civil, aprovado pela Lei nº 41/2003 de 26 de Junho (diploma legal aplicável a estes autos por força do disposto no artigo 6º, n.º 4, da referida Lei, uma vez que a oposição deduzida – que se traduz num incidente de natureza declarativa – deu entrada em juízo no dia 13 de Setembro de 2013 – cf. fl.s 14, sendo que este Código entrou em vigor no dia 01 desse mês) o elenco de fundamentos enunciado foi grosso modo reproduzido no actual artigo 729º do Código de Processo Civil, sendo que os fundamentos relativos a requerimento de injunção passaram a estar elencados no actual artigo 857º do Código de Processo Civil.

Resultava, portanto, do disposto naquele artigo 814,º que, estando em causa uma execução baseada em requerimento de injunção ao qual tivesse sido aposta fórmula executória – o que, como vimos, não acontece no presente caso –, a oposição que lhe viesse a ser deduzida não poderia basear-se em qualquer facto ou circunstância que pudesse ser invocado no processo de declaração – como acontece com os demais títulos não judiciais (art. 816º) –, sendo que tal oposição apenas se poderia basear nos fundamentos (bem mais restritos) que podem ser invocados quando o título executivo é uma sentença.

A verdade é que começou a ser suscitada, de forma maioritária – na doutrina e na jurisprudência e, designadamente, na jurisprudência do Tribunal Constitucional – a inconstitucionalidade da referida norma por violar o princípio da proibição da indefesa consagrado no art. 20º da Constituição da República Portuguesa.

Sucede que o recente Acórdão do Tribunal Constitucional nº 388/2013, de 09 de Julho de 2013 (publicado no D.R., I Série de 24/09/2013, ou seja, já depois de ter sido deduzida a oposição que motiva o presente recurso) veio declarar, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade da norma citada (art. 814º, nº 2, do C.P.C., na redacção do Dec. Lei nº 226/2008), quando interpretada no sentido de limitar os fundamentos de oposição à execução instaurada com base em requerimentos de injunção à qual foi aposta a fórmula executória, por violação do princípio da proibição da indefesa, consagrado no art. 20º, nº 1 da Constituição.

Assim, e sendo certo que, em conformidade com o disposto no art. 282º da Constituição da República, a declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral produz efeitos desde a entrada em vigor da norma declarada inconstitucional, parece claro que ela não poderá ser aplicada e, portanto, em conformidade com a posição adoptada no referido Acórdão do Tribunal Constitucional, ter-se-á que considerar que, estando em causa uma execução fundada em requerimento de injunção ao qual tenha sido aposta a fórmula executória, a oposição que lhe seja deduzida não está limitada aos fundamentos enunciados no art. 814º, nº 1, podendo basear-se em quaisquer outros factos ou circunstâncias que possam ser invocados no processo de declaração.

Mas será que com a entrada em vigor do novo Código de Processo Civil, designadamente com a redacção que foi dada ao seu artigo 857º se sanou a questão da inconstitucionalidade determinada pelo Acórdão do Tribunal Constitucional nº 388/2013, acima já referido?

No novo Código de Processo Civil, esta questão está vertida nos seus artigos 729.º, 731.º e 857.º.

Cotejando os artigos 814.º e 729.º, respectivamente do CPC, versão anterior e actual, verifica-se que são de idêntico teor, tendo-se apenas neste último acrescentado a hipótese da alínea h).

Os artigos 816.º e 731.º, têm a mesma redacção, apenas mudando a referência que se faz ao preceito onde se referem os fundamentos de oposição/embargos.

No referido artigo 857.º, n.º1 refere-se o seguinte:

“Se a execução se fundar em requerimento de injunção ao qual tenha sido aposta fórmula executória, apenas podem ser alegados os fundamentos de embargos previstos no artigo 729.º, com as devidas adaptações, sem prejuízo do disposto nos números seguintes.”.

A expressão “com as devidas adaptações”, segundo cremos, apenas tem conteúdo útil para substituir a expressão constante da al. g) do artigo 729.º, quando ali se refere que “desde que seja posterior ao encerramento da discussão no processo de declaração”, por “posterior à aposição da fórmula executória ao requerimento de injunção”.

Ou seja, apenas se veio alargar a possibilidade de dedução de oposição, em tais casos, em situações de justo impedimento ou em que se debatam questões ou excepções dilatórias de conhecimento oficioso, cf. se determina nos n.os 2 e 3 do artigo ora em referência.

Daqui se conclui que esta norma veio dispor – no âmbito do processo sumário (que, por regra, é o aplicável quando a execução se baseia em requerimento de injunção ao qual tenha sido aposta a fórmula executória – art. 550º) – que, além dos fundamentos de oposição à execução baseada em sentença, a oposição deduzida à execução baseada em requerimento de injunção apenas poderá comportar os outros fundamentos previstos nos seus n.os 2 e 3, ou seja, tal oposição poderá sempre basear-se em qualquer questão que, sendo de conhecimento oficioso, pudesse determinar a improcedência, total ou parcial, do requerimento de injunção ou na ocorrência evidente, no procedimento de injunção, de excepções dilatórias de conhecimento oficioso. Mas, além desses fundamentos, tal oposição poderá ainda radicar em qualquer outra questão que pudesse ser invocada no processo de declaração desde que se verifique justo impedimento à dedução de oposição no procedimento de injunção e desde que tal impedimento seja tempestivamente declarado nos termos ali previstos.

É indiscutível que esta norma veio alargar, com o âmbito que ora referimos, os fundamentos de oposição àquela execução, mas nem por isso se poderá afirmar que ela tenha a virtualidade de ultrapassar e sanar totalmente os motivos que levaram à declaração de inconstitucionalidade do anterior art. 814º, nº 2, já que, por via da sua aplicação, ainda subsistem limitações ao exercício do direito de oposição à execução baseada em requerimento de injunção, o que não estará em conformidade com a doutrina do referido Acórdão ao qual está subjacente o entendimento de que tal oposição pode fundamentar-se em qualquer facto ou circunstância que possa ser deduzido no processo de declaração e não apenas nas circunstâncias que estão fixadas no actual art. 857º, designadamente, como em casos como o ora em apreço, em que se pretende invocar a prescrição do crédito exequendo, a qual, como é óbvio já se verificava anteriormente à aposição da fórmula executória no requerimento de injunção e que, à luz do preceituado no artigo 857.º do nCPC, continua a não constituir fundamento de embargo a execução fundada em requerimento de injunção a que foi aposta a fórmula executória, pelo que este preceito, na nossa opinião, continua a padecer do mesmo vício de inconstitucionalidade que foi assacado ao artigo 814.º do CPC, na versão anterior, pelas mesma razões e fundamentos expressos no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 388/2013, acima já referido – violação do princípio da indefesa.

De resto, lendo a exposição de motivos que antecede o Novo Código de Processo Civil, conclui-se que em matéria da injunção se pretendeu manter o regime anterior, pois que, como ali se refere:

“Considerando que, neste momento, funciona adequadamente o procedimento de injunção, entende-se que os pretensos créditos suportados em meros documentos particulares devem passar pelo crivo da injunção, com a dupla vantagem de logo assegurar o contraditório e de, caso não haja oposição do requerido, tornar mais segura a subsequente oposição, instaurada com base no título executivo assim formado.”.

            Ou seja, continuou a dar-se prevalência a critérios de celeridade processual em detrimento do direito a uma efectiva possibilidade de defesa, tal como no domínio do previsto nos anteriores artigos 814.º e 816.º do CPC e daí, cremos, a manutenção de um regime bastante semelhante na regulamentação desta questão, que agora se encontra plasmada nos artigos 729.º, 731.º e 857.º do nCPC.

            Esta similitude de regimes, reitera-se conduz a que o artigo 857.º do nCPC, a nosso ver, padeça do mesmo vício de inconstitucionalidade de que padecia o artigo 814.º, por violação do princípio da proibição da indefesa, consagrado no artigo 20.º, n.º 1, da CRP.

            Consequentemente, por se considerar existir a ora referida inconstitucionalidade do artigo 857.º do nCPC, quando interpretado no sentido de que se limitam os fundamentos de embargos a execução fundada em requerimento de injunção a que foi aposta fórmula executória, apenas aos fundamentos de embargos previstos no artigo 729, do que resulta não se poder aplicar tal preceito, não pode, em tal caso, o requerimento de embargos ser liminarmente indeferido com tal fundamento.

            Mas, reitera-se, a recorrente, parte do pressuposto de que a decisão exequenda se funda em requerimento de injunção a que foi aposta fórmula executória, o que não se verifica in casu, dado que a decisão exequenda, como já referido, consiste na decisão judicial de fl.s 41, em face do que não se verifica o fundamento em que radica a declaração de inconstitucionalidade a que acima se aludiu.

            No caso em apreço, a recorrente deduziu oposição ao requerimento de injunção, o que motivou a intervenção judicial com a consequente atribuição de força executiva à petição, com valor de decisão condenatória – cf. referido no artigo 2.º do DL 269/98.

            Tal decisão não deveria ter sido proferida da forma como o foi, atenta a omissão da notificação acima mencionada, conferindo uma faceta “kafkiana” aos presentes autos, o que só acontece, também, porque a ora recorrente se conformou com tais decisões (desentranhamento da oposição e atribuição de força executiva à petição inicial), quando as mesmas eram susceptíveis de recurso e delas não recorreu.

            Assim, não se verificando os pressupostos em que assentam a declaração de inconstitucionalidade visada pela recorrente, improcede o presente recurso.

Nestes termos se decide:       

Julgar improcedente o presente recurso de apelação, em função do que se mantém a decisão recorrida.

Custas pela apelante, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário que lhe foi concedido.

            Coimbra, 13 de Maio de 2014.

         

Arlindo Oliveira (Relator)

Emídio Francisco Santos

Catarina Gonçalves