Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
41136/17.2YIPRT.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ANTÓNIO CARVALHO MARTINS
Descritores: CONTRATO DE CRÉDITO AO CONSUMO
CONTRATOS DE ADESÃO
CLÚSULAS CONTRATUAIS GERAIS
DEVER DE INFORMAÇÃO
DEVER DE COMUNICAÇÃO
ABUSO DE DIREITO
PRINCÍPIO DO DISPOSITIVO
INEPTIDÃO
CUMULAÇÃO DE PEDIDOS
COMPATIBILIDADE
NULIDADE DA SENTENÇA
Data do Acordão: 05/21/2019
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA - ALCOBAÇA - JL CÍVEL - JUIZ 1 (EXTINTO)
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTS.5, 6, 555, 615 CPC, ART.334 CC, DL Nº 446/85 DE 25/10, DL Nº 269/98 DE 1/9, DL Nº 133/2009 DE 2/6
Sumário: 1.O juiz não está limitado às alegações das partes, no que toca à matéria de direito (art. 664.º do CPC - 5º NCPC), pelo que, ao qualificar juridicamente não incorreu em violação do princípio do dispositivo ou do contraditório, nem, sequer, havendo sido proferida “decisão surpresa”, sendo certo que, mais do que a nomenclatura, releva a interpretação das suas cláusulas.

2.A compatibilidade dos pedidos (art. 555º NCPC), afere-se pela conciliabilidade dos efeitos jurídicos derivados da procedência de cada um dos pedidos, para que não suceda que o reconhecimento de um deles exclua a possibilidade de verificação do outro.

3. A incompatibilidade de pedidos, enquanto vício gerador de ineptidão da petição inicial, só justifica colher tal relevância, determinando a anulação de todo o processo, quando coloque o julgador na impossibilidade de decidir, por confrontado com a ininteligibilidade das razões que determinaram a formulação das pretensões em confronto, irrelevando, para o efeito, o antagonismo que ocorra no plano legal ou do enquadramento jurídico.

4.Interpretar uma lei não é mais do que fixar o seu sentido e o alcance com que ela deve valer, ou seja, determinar o seu sentido e alcance decisivos; o escopo final a que converge todo o processo interpretativo é o de pôr a claro o verdadeiro sentido e alcance da lei. A letra não é só o ponto de partida, é também um elemento irremovível de toda a interpretação. Quer dizer que o texto funciona também como limite de busca do espírito. A apreensão literal do texto, ponto de partida de toda a interpretação, é, já, interpretação, embora incompleta, pois será sempre necessária uma tarefa de interligação e valoração, que escapa ao domínio literal, e a que se procedeu.

5. O cumprimento do dever de comunicação, a que se reporta o citado art. 5º (do regime fixado pelo DL nº 446/85, de 25/10, na redacção introduzida pelos DL nº 220/95, de 31/01, e nº 249/99, de 7/7), basta-se com a entrega de exemplar/minuta do contrato, contendo todas as cláusulas (incluindo as gerais), com a antecedência que seja necessária – em função da extensão e complexidade das cláusulas –, na medida em que, com a entrega dessa minuta, uma pessoa normalmente diligente tem a efectiva e real possibilidade de ler e analisar todas as cláusulas e de pedir os esclarecimentos que entenda necessários para a sua exacta compreensão.

6.Dando como assente que uma pessoa de comum diligência não assinará um documento sem que, primeiro, se certifique do respectivo teor, afigura-se-nos que a entrega da minuta, contendo as cláusulas gerais, é adequada para possibilitar a quem use de comum diligência o conhecimento real e efectivo das referidas cláusulas. Assim, se os Recorrentes não tomaram real e efectivo conhecimento das cláusulas gerais que subscreveram, tal, apenas, se deveu à sua falta de diligência por terem assinado esse documento, sem ter a preocupação de saber qual era o seu conteúdo.

7.No contexto em referência, pois, tendo em conta as cláusulas de que a A. se socorreu, constarem expressamente do contrato (e apesar de não sair demonstrado a explicação verbal do seu teor, que também se não revelou necessária…), tal possibilitou aos Recorrentes o conhecimento real e efectivo de todos os seus termos, uma vez que lhes foi conferida a possibilidade de as ler, previamente à aposição da sua assinatura, impede a consumação da invocada violação do dever de comunicação e de informação.

8.Tal significa que, apesar dos termos e modo contratuais, e das suas possíveis implicações, os recorrentes deram, incontornavelmente, a sua adesão ao contrato e aproveitaram as vantagens, dele emergentes. Neste quadro, agora, nesta outra específica temporalidade, ao pretender prevalecer-se da (pretensa) invalidade apontada, os apelantes adoptam um comportamento abusivo e contrário ao direito e à boa fé, o que lhe é vedado pelo art. 334º do Código Civil.

9. Considerando as reservas que as denominadas inalegabilidades formais têm suscitado, a figura das inalegabilidades não tem margem directa de concretização. Ela postularia a possibilidade de redução teleológica das normas formais, o que não é tecnicamente possível. Em todo o caso, tem-se admitido o bloqueio directo de normas formais e outras em que a mesma solução tem sido atingida, mas por via da invocação do “venire contra factum proprium”, dizendo o seguinte: “As decisões citadas serão justas e adequadas. Possivelmente, só seria possível atingi-las por via da boa fé. Mas, não paralisando, de modo directo, a invocação de nulidades formais, ao mesmo resultado se chegará com invocação da proibição do “venire contra factum proprium”.

10. A discordância quanto ao direito aplicável ou o erro de julgamento não se incluem nas nulidades da decisão cuja enunciação taxativa consta do art. 615.°. n.º 1. do NCPC (2013).

Decisão Texto Integral:

Acordam, em Conferência, na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra:

I - A Causa:

«C (…) , com o NIPC (…)e sede (…)Lisboa, instaurou procedimento de injunção, posteriormente distribuído como acção declarativa especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos (Regime Anexo ao DL n.º 269/98, de 01 de Setembro), contra R (…) e A (…), ambos com domicílio (…), reclamando destes a quantia de €14.125,37 de capital, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, desde 30/11/2016 até efectivo e integral pagamento, à taxa contratual de 15,20% (liquidando os vencidos à data da propositura em €727,69), referente a incumprimento de um contrato de crédito em conta corrente.

Regularmente citados, os réus deduziram oposição, na qual excepcionam o erro na forma do procedimento, bem como o pagamento da quantia global de €26.763,60 por conta do referido contrato, assim considerando cumpridas as obrigações assumidas; sem prescindir, sustentam que o contrato em causa é anulável, por completamente omisso quanto aos elementos do custo e condições de alteração da TAEG, bem como ao período de reflexão ou custo do seguro (artigos 6.º, n.º 2, alíneas b) e c) e 7.º, n.º 2 do DL n.º 359/91, de 21 de Setembro, na versão dada pelo DL n.º 82/2006, de 03 de Maio, ainda em vigor à data da celebração do contrato – 19/03/2008); sem prescindir, adiantam que não lhes foi comunicada prévia e integralmente a possibilidade de variação do valor inicialmente acordado como prestação a pagar durante os 94 meses, nem tal decorre do próprio contrato ou das suas condições gerais, do mesmo modo que não foi cumprido o dever de esclarecimento por parte da requerente, não podendo produzir qualquer efeito e devendo declarar-se não escrita, nos termos do artigo 8.º do DL n.º 446/85, de 25 de Outubro, na redacção dada pelo DL n.º 323/2001, de 17 de Dezembro, ao que acresce o tipo de letra e tamanho utilizados nas condições gerais ser praticamente ininteligível.

Concluem que, estando a totalidade do crédito e juros remuneratórios pagos à requerente, devem ser absolvidos do pedido contra si formulado.

A autora respondeu à matéria de excepção, pugnando pela respectiva improcedência e reiterando o peticionado no requerimento de injunção.

Realizou-se a audiência de julgamento com observância do formalismo legal, como decorre das respectivas actas.

*

Oportunamente, foi proferida decisão onde se consagrou que:

«Nos termos e com os fundamentos expostos, decide este Tribunal julgar a acção parcialmente procedente, por provada em parte e, em consequência:

- Condenar os réus a pagar à autora a quantia que, nos termos dos artigos

609.º, n.º 2 e 358.º e ss do Código do Processo Civil, se apurar em sede de liquidação, correspondente à soma do capital remanescente (do financiamento de €16.000,00, sem o adicional de €608,00, consideradas as taxas de juro contratual de 13,76% até Agosto de 2008 e de 14,76% a partir de Setembro de 2008, e expurgado do valor dos juros remuneratórios e demais encargos originariamente incluídos no montante das prestações objecto de vencimento antecipado), dos juros contratuais e demais encargos vencidos (excepto penalidades devidas pela mora) à data da resolução contratual e de uma penalidade única de 8% sobre todo o saldo em dívida, a título de cláusula penal, a que acrescerão juros de mora à taxa legal (não contratual) sobre toda a dívida vencida, contados da data da sentença que proceder à liquidação até efectivo e integral pagamento;

- Absolver os réus do demais peticionado.

Valor: €14.853,06, correspondente à soma do capital e juros vencidos mencionados no requerimento de injunção (artigo 18.º do Regime Anexo ao DL n.º 269/98, de 01 de Setembro).

Custas por autora e réus, na proporção aritmética do respectivo decaimento, relegando-se para o incidente de liquidação a fixação definitiva das responsabilidades (artigo 527.º, n.º s 1 e 2 do Código de Processo Civil)».

*

R (…) e A (…), Reús nos autos supra identificados, não se conformando com a sentença de fls. … -  que os veio a condenar a pagar à A. a quantia que se vier a apurar em sede de liquidação de sentença e de uma penalidade única, e juros moratórios -, dela vieram interpor RECURSO de Apelação, alegando e concluindo que:

(…)

*

Legal e tempestivamente, notificada para o efeito, C (…), Autora nos autos à margem referenciados e aí melhor identificada, veio apresentar as suas contra-alegações, por sua  vez, alegando e concluindo que:

(…)

II. Os Fundamentos:

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir:

*

Matéria de Facto assente na 1ª Instância e que consta da sentença recorrida:

«OS FACTOS:

Discutida a causa, com relevo para a decisão, resultaram os seguintes:

FACTOS PROVADOS:

1) Entre a requerente «C (…)» e os requeridos R (…) e A (…) foi celebrado um acordo escrito epigrafado «Contrato de Crédito em Conta Corrente Valor Top», datado de 19/03/2008 e aceite pela autora em 25/03/2008, ao qual foi atribuído o n.º (…) com o teor constante do documento junto a fls. 44-47 (mais legível a fls. 208-211 e 470-473), aqui dado por integralmente reproduzido.

2) Por via desse acordo escrito os réus solicitaram à autora o crédito imediato, por transferência bancária, da totalidade da reserva, no montante de €16.000,00, obrigando-se a reembolsá-lo durante 94 meses, com a mensalidade de €272,00, de acordo com o quadro indicado na cláusula 2.2 das Condições Gerais, montante que não incluía o eventual prémio de seguro, devido caso os réus a ele aderissem – 1.º e 2.º rectângulos na parte superior direita das Condições Particulares.

3) Imediatamente abaixo do espaço correspondente ao 1.º e 2.º rectângulos na parte superior direita das Condições Particulares, consta a menção: «TAN de 12%. TAEG de 13,76%.».

4) Na parte superior esquerda das Condições Particulares constam 2 rectângulos, um com os dizeres «SIM, desejo aderir ao Valor Top com seguro» e outro com os dizeres «SIM, desejo aderir sem seguro», encontrando-se assinalada a quadrícula da primeira opção.

5) Os réus declararam aderir ao seguro, aceite em 25/03/2008.

6) Consta das condições gerais do referido acordo, além do mais aqui dado por integralmente reproduzido (sublinhados da autoria da signatária):

«CONTRATO DE CRÉDITO EM CONTA CORRENTE VALOR TOP Esta proposta de contrato tem por objecto a concessão de crédito em conta corrente pela C (…) (…).

Esta proposta é válida até 31/12/2008 e pode converter-se em contrato, desde que assinada pelo(s) Mutuário(s), nos termos seguintes:

1. ACEITAÇÃO, LIVRE RESOLUÇÃO E CONCLUSÃO DO CONTRATO:

1.1. A adesão ao contrato é feita enviando à C (…)o exemplar que lhe é destinado, devidamente preenchido e assinado pelo(s) Mutuário(s) que, nos 14 dias seguintes à assinatura, pode(m) livremente resolvê-lo, por carta registada com aviso de recepção, a expedir até ao 14.º dia da assinatura para a C (…), Av. (…), sem necessidade de indicação do motivo, e sem que haja lugar a qualquer indemnização ou penalização.

(…)

1.4. A C (…), após recepção do exemplar do contrato que lhe é destinado, bem como análise e comprovação das informações prestadas pelo Mutuário, reserva-se o direito de confirmar ou recusar a concessão do crédito, considerando-se como data da conclusão do contrato a da comunicação pela C (...) da autorização de utilização do crédito.

2. ABERTURA DO CRÉDITO E MOVIMENTAÇÃO DA CONTA:

2.1. A C (..:) autoriza o Mutuário a utilizar o crédito concedido através da conta corrente C (…), até ao limite máximo (Reserva) autorizado no ponto 5. do presente contrato.

2.2. Para o efeito, o Mutuário pedirá à C (…) que disponibilize, por transferência bancária, um montante entre €10.000,00 e €20.000,00 (assinalado nas condições particulares e constante do quadro infra), por sua conta, e em seu benefício ou de terceiros (…).

Quadro indicativo de prazos e prestações de reembolso para os possíveis montantes da RESERVA (“limite máximo do crédito”) para 1.ª utilização da totalidade da sua reserva sem seguro:

(…) Montante - €16.000,00; 94 meses - €272,00 (…).

6. CUSTO DO CRÉDITO:

O custo do crédito varia em função das utilizações, montante e duração do saldo devedor e é composto pelo crédito utilizado, juros diários vencidos, impostos e demais encargos (excepto o selo do contrato), incluindo o seguro, correspondendo a uma Taxa Nominal Anual de 12% e a uma Taxa Anual Efectiva Global (TAEG) de 13,76%, calculada nos termos do DL n.º 101/2000, de 02 de Junho e DL n.º 359/91, de 02 de Setembro. O custo do seguro, que é facultativo, não está incluído na TAEG.

7. MODIFICAÇÃO DO CUSTO DO CRÉDITO:

7.1. A C (…) pode rever e alterar a taxa de juro caso se alterem as condições que determinaram a sua fixação.

7.2. O Mutuário é avisado por escrito, através do extracto de conta referido no ponto 2.5., de qualquer alteração da taxa de juro, encargos com o crédito e reembolso mínimo mensal ou outras condições de pagamento, sendo as novas condições aplicadas ao saldo devedor a partir da data de vencimento da prestação mensal seguinte.

7.3. O Mutuário, discordando da alteração, pode resolver o contrato antecipando o pagamento da totalidade do saldo devedor nas condições anteriores à alteração. A alteração tem-se por aceite caso o Mutuário movimente a conta após ter tido conhecimento da modificação e/ou a recusa não for comunicada por carta registada com AR nos 15 dias seguintes à recepção do extracto de conta.

8. REEMBOLSO MÍNIMO E PRESTAÇÃO MENSAL:

8.1. O valor em dívida deve ser reembolsado à C (…) em prestações mensais por débito na conta bancária do Mutuário (ou outra forma previamente autorizada pela C(…)), sendo o montante dessas prestações em função do montante e duração do crédito autorizado (“plafond”).

8.2. O mutuário obriga-se a manter a sua conta bancária provisionada, ao dia 1 de cada mês, em montante suficiente para permitir o débito das prestações de reembolso.

8.3. As prestações mensais e o prazo de reembolso serão as constantes das Condições Particulares do contrato e no Quadro inserido na cláusula 2.2. supra, desde que não se verifiquem novas utilizações do crédito, não haja adesão ao seguro, ou não haja alteração ao limite máximo do crédito autorizado (“Reserva”), ou ainda da TAEG, motivo pelo qual o quadro tem natureza meramente indicativa.

(…)

8.6. As alterações propostas ao valor das prestações mensais são comunicadas pela C(…) ao Mutuário através do extracto de conta previsto no ponto 2.5.

(…)

8.9. As prestações mensais e antecipações parciais são imputadas ao saldo devedor pela ordem seguinte: prémio de seguro (se houver); impostos e encargos vencidos; penalidades (se existirem); juros vencidos; e, por último, ao remanescente do capital em dívida.

(…)

10. INCUMPRIMENTO E RESOLUÇÃO DO CONTRATO:

10.1. Caso o Mutuário não faça o pagamento de uma prestação na data de vencimento ficará em mora, acrescendo à prestação uma penalidade mensal de 4% sobre cada uma das prestações em mora, sem prejuízo de a C (…) poder aplicar uma penalização adicional de valor correspondente às despesas determinadas pela constituição em mora de acordo com os preçários em vigor.

10.2. Mantendo-se o incumprimento, a C(…) pode resolver o contrato e exigir o pagamento imediato de toda a dívida (incluindo capital remanescente, juros contratuais e demais encargos vencidos), sem prejuízo da incidência de juros de mora à taxa legal sobre toda a dívida vencida. Caso a C(…) resolva o contrato e/ou recorra a juízo para obter o pagamento, as penalidades devidas pela mora são substituídas por uma penalidade única de 8% sobre todo o saldo em dívida, a título de cláusula penal.

(…)

12. SEGURO FACULTATIVO DE VIDA E DE PROTECÇÃO AO CRÉDITO:

12.1. O Mutuário poderá aderir à apólice de seguro de grupo n.º (…). Para aderir a esta apólice terá de preencher as Condições de Adesão previstas nas Condições Particulares (…) e assinar este contrato com a indicação de que opta pela adesão ao seguro, o qual importa o pagamento de um prémio mensal (não incluído na TAEG) indicado na Nota Informativa (0,40% do montante em dívida). O custo do prémio mensal do seguro é imputado na prestação mensal acordada no presente contrato, pelo que o seu pagamento é feito conjuntamente e da mesma forma que a prestação mensal de reembolso do crédito. A adesão ao seguro prolonga o período de reembolso do crédito.

(…)

16. LINHA VALOR TOP:

16.1. A C(…) disponibiliza ao Mutuário a possibilidade de, por via telefónica ou por outras formas de acesso remoto, que venham a ser criadas, aceder a informações sobre o respectivo contrato de crédito.

16.2. O Mutuário autoriza de forma irrevogável a C(…) a, sempre que considere necessário:

a) gravar as conversas telefónicas mantidas entre ambos;

b) utilizar gravações telefónicas ou registos informáticos como meio de prova para qualquer procedimento judicial que venha a existir directa ou indirectamente entre as partes, podendo o Mutuário solicitar à C(…) que lhe forneça cópia ou transcrição escrita do conteúdo das conversações que se tiverem realizado entre ambos;

(…).

7) Ao abrigo do mencionado acordo escrito, a autora disponibilizou aos réus um financiamento de €16.000,00, em 25/03/2008, tendo-lhes comunicado que o pedido de financiamento fora aceite por carta datada de 26/03/2008.

8) A autora remeteu aos réus, que os receberam, extractos mensais onde constam as condições em que se encontrava o contrato de crédito.

9) A autora informou os réus, por escrito junto com o extracto de conta referente ao mês de Junho de 2008, que, ao abrigo das cláusulas 7 e 8 das condições gerais do contrato, na sequência da evolução do mercado financeiro ao nível das taxas de referência, decidiu alterar a TAEG para 14,76% e que o valor da mensalidade passaria a ser de €288,00 (documento junto a fls. 485-487).

10) A prestação mensal de Agosto de 2008 foi processada pelo valor de €272,00 e a prestação mensal de Setembro de 2008 foi processada pelo valor de €288,00 (documentos juntos a fls. 490-491 e 492-493).

11) No período compreendido entre 01/05/2008 e 01/04/2016, por conta do contrato em análise, os réus pagaram à autora 93 prestações mensais (nada pagando nos meses de Novembro de 2009 e Dezembro de 2010), de valores variáveis entre €272,00 (4 primeiras prestações), €288,00, €299,52, €320,00, €325,46 e €635,03, no total global de €27.833,62 (conforme extracto financeiro junto a fls. 189, 188 e 190).

12) Os réus nem sempre pagaram as prestações em causa no dia do seu vencimento (confissão – artigo 25.º da oposição).

13) Os réus tentaram accionar o seguro de protecção ao crédito, face à situação de desemprego de ambos (confissão – artigo 33.º da oposição).

14) A partir de Abril de 2016, os réus decidiram deixar de proceder aos pagamentos a que estavam obrigados, apesar de interpelados para o efeito, por entenderem já ter pago à autora tudo o que lhe era devido ao abrigo do contrato em causa (confissão – artigos 36.º e 37.º da oposição – e escrito de interpelação a fls. 193).

15) Face ao incumprimento verificado, a autora procedeu à resolução do contrato em 30/11/2016, tendo comunicado essa resolução aos réus por cartas datadas de 01/12/2016, indicando um montante total em dívida de €14.125,37 (documentos juntos a fls. 192 e 194).

16) A conta de depósitos à ordem titulada pela ré junto da C (…) encontra-se encerrada desde o dia 18/12/2016 (documento junto a fls. 689).

FACTOS NÃO PROVADOS:

Os demais vertidos na petição inicial e na oposição, os irrelevantes, os conclusivos, os que encerram matéria de Direito e os que se encontrem em contradição ou além dos dados como provados, designadamente:

- Ao abrigo do acordo escrito mencionado nos factos provados, a autora disponibilizou aos réus um financiamento subsequente de €608,00.

- A autora informou os réus de um aumento da taxa de juro para 15,20%.

- Na data da celebração do contrato, os réus foram informados por funcionários da autora, agindo em nome desta, que a celebração do contrato de seguro era condição essencial para aceitação do contrato de crédito pela financeira.

- O contrato em causa é completamente omisso quanto aos elementos do custo e condições de alteração da TAEG, bem como ao período de reflexão ou custo do seguro (contradição com os factos dados como provados).

- A possibilidade de variação do valor inicialmente acordado como prestação a pagar pelos réus durante os 94 meses não decorre do próprio contrato ou das suas condições gerais (contradição com os factos dados como provados).

- O tipo de letra e tamanho utilizado nas condições gerais é praticamente ininteligível (contradição com os factos dados como provados).

*

Nos termos do art. 635° NCPC, o objecto do recurso acha-se delimitado pelas conclusões do recorrente, sem prejuízo do disposto no art. 608°, do mesmo Código.

*

Das conclusões de Recurso, circunstancialmente, formuladas, ressaltam as seguintes questões elencadas, na sua formulação originária, de parte, a considerar na sua própria matriz holística:

1.

IX. No caso dos autos, portanto, e salvo melhor opinião, deveria a A. ter sido convidada a especificar qual o montante no seu pedido que respeitava a penalizações – que não juros moratórios – por atrasos de pagamento, ou por resolução contratual, declarando-se, quanto a essa parte, que o presente procedimento era inapropriado, absolvendo-se assim os réus de instância quanto a esse pedido.

X. o que se pretendia e deveria ter sido decidido era uma absolvição parcial da instância quanto a essa parte do pedido.

XI. Ao condenar os Réus no pagamento de uma penalidade, ainda que única, à taxa de 8%, o Tribunal “a quo” viola na sentença de que se recorre os art. 6º e 193º, nºs 1 e 3, art. 555º e 37º, todos do NCPC e o art. 2º, n.º 2, a contrario, do D.L. 32/2013 e o artigo 10º, n.º 2 do DL 269/98, devendo por isso ser anulada e substituída por outra que absolva os réus da instância quanto à penalidade de 8% sobre todo o saldo em dívida, em que vieram condenados.

Cuidando, diga-se - neste específico segmento -, desde logo, em função do disposto no invocado art. 6º NCPC (dever de gestão processual), que o legislador analisa o dever de gestão processual em três vertentes: adoptar a tramitação processual adequada às especificidades da causa e adaptar o conteúdo e a forma dos actos ao fim que visam atingir; não são praticados actos inúteis, recusando o que for impertinente ou meramente dilatório; e, finalmente, adoptar os mecanismos de agilização processual previstos na lei (Cf. Ac. RL, de 17.12.2015: CJ, 2015. 5.º-106).

Por esta forma, a significar que "as medidas de gestão processual distinguem-se, assim, das de adequação formal, porque aquelas são comandadas pela necessidade de obter ajusta composição do litígio em prazo razoável e estas são determinadas pela necessidade de compor esse litígio, independentemente do tempo que esta composição demore, mediante uma tramitação ou um procedimento equitativo adequado às especificidades da mesma. Ambos são, pois, instrumentos ordinários de garantia do due process, mas protegem-no em vertentes diferentes.

Em todo o caso, o legislador não elencou sistematicamente, ainda que de forma exemplificativa e com efeitos meramente pedagógicos, os actos de gestão processual. Os fins de simplificação e de agilização são, contudo, pistas importantes para aferir que tipo de medidas judiciais pode merecer esta classificação, e quais não; distinção que é relevante para efeitos da aferição da recorribilidade das mesmas" (Cf. ELlSABETH FERNANDEZ, Um Novo Código de Processo Civil", 2014, p. 44).

Emissão conceitual que haverá de se concatenar (art. 5º NCPC), com a circunstância de o princípio dispositivo ser, ainda, prevalecente no processo civil e, como seu corolário, caber às partes definir o objecto do litígio (através da dedução das suas pretensões) e alegar os factos que integrem a causa de pedir ou que sirvam de fundamento à dedução de eventuais excepções. De tal modo, que o juiz só pode fundar a decisão nestes, sem prejuízo de poder investigar factos instrumentais e de os poder utilizar quando resultem da instrução e julgamento da causa.

Todavia, o juiz não está limitado às alegações das partes, no que toca à matéria de direito (art. 664.º do CPC - 5º NCPC), pelo que, ao qualificar juridicamente o contrato dos autos, nos termos aí referenciados, não incorreu em violação do princípio do dispositivo ou do contraditório, nem, sequer, havendo sido proferida “decisão surpresa”, sendo certo que, mais do que a nomenclatura, releva a interpretação das suas cláusulas (Cf. Ac. STJ. de 7.5.2015. Proc. 4572/09: Sumários. 2015. p. 275).

Demais, o próprio âmbito da causa de pedir - que é constituída pelos factos necessários para individualizar a pretensão material alegada pela parte -, determina-se através da interpretação do acto postulativo dessa mesma parte - v.g. da petição inicial -, por aplicação dos critérios de interpretação dispostos na lei para os negócios jurídicos, e, até, mesmo, aplicáveis, por extensão de regime, aos actos não negociais (Cf. Ac. RC. de 2.6.2015. Proc. 5202/12: dgsi.Net).

Por seu turno, é pela pretensão que se pretende fazer valer, e, portanto, pelo pedido formulado, que se há-de aquilatar do acerto ou do erro do processo que se empregou (art. 193º CPC - 186º NCPC), questão inteiramente distinta das razões da procedência ou improcedência da acção (Cf. RODRIGUES BASTOS, Notas ao CPC, 3: ed., 1999, pág. 262).

É que a questão do erro na forma do processo decide-se, efectivamente, em face da pretensão formulada pelo autor e pondo em confronto a petição inicial com o fim que a lei estabelece para o processo concretamente escolhido pelo demandante. Por isso, não deve interferir no julgamento dessa excepção dilatória a eventual inconcludência dos factos alegados, na medida em que implique a apreciação de aspectos ligados ao fundo da causa (Cf. Ac. RC, de 14.3.2000: BMJ, 495.°-371). Ou seja, é pela pretensão formulada e pela causa de pedir invocada na petição inicial que se verificam a correcção da forma processual seguida pela acção proposta e a competência material do tribunal a que vai dirigida, sendo, em princípio, irrelevante, para esses efeitos, o que se alegue em contrário na contestação, sobre a matéria de facto, natureza e existência, ou inexistência, do direito invocado, situações que já têm a ver com o mérito da causa (Cf. Ac. STJ, de 12.12.2002. Agr. n.º 3981/02-2: Sumários. 12/2002).

Incontroverso é que a compatibilidade dos pedidos (art. 555º NCPC), se afere pela conciliabilidade dos efeitos jurídicos derivados da procedência de cada um dos pedidos, para que não suceda que o reconhecimento de um deles exclua a possibilidade de verificação do outro (Cf. Castro Mendes, Direito Processual Civil, II, 1972, p. 264; Anselmo de Castro, Processo Civil Declaratório, 1º-157 e Antunes Varela, RLJ, 120º-281, ss.). Daí que a incompatibilidade de pedidos, enquanto vício gerador de ineptidão da petição inicial, só justifica colher tal relevância, determinando a anulação de todo o processo, quando coloque o julgador na impossibilidade de decidir, por confrontado com a ininteligibilidade das razões que determinaram a formulação das pretensões em confronto, irrelevando, para o efeito, o antagonismo que ocorra no plano legal ou do enquadramento jurídico.

De resto, em função do que se consagra, por sua vez, no art. 37º NCPC (obstáculos à coligação), a cumulação exige também, mas agora apenas como regra geral, que a forma de processo seja idêntica para todos os pedidos cumulados (1ª parte do n.º 1 deste art. 31º CPC (37º. NCPC), o que torna, em princípio, inadmissível a coligação quando a um ou a alguns dos pedidos corresponder processo comum e a outro ou outros desses pedidos processo especial, ou se aos pedidos cumulados corresponderem diferentes processos especiais.

A apontada regra sofre, no entanto, duas ordens de excepções, uma imperativa e outra dependente do critério do juiz: se a diversidade da forma de processo resultar unicamente do valor, tal não obsta à coligação (art. 31.º-1. parte final - 37º NCPC) (vid., porém, as dúvidas suscitadas por CASTRO MENDES, Direito Processual Civil, 2.º - 261 e ss.); se a diversidade da forma de processo resultar dos próprios pedidos cumulados, o n.º 2 deste artigo, na sua redacção actual, faculta ao juiz autorizar a cumulação desde que, por um lado, as formas de processo correspondentes aos pedidos, sendo embora diversas, «não sigam uma tramitação absolutamente incompatível», e, por outro lado, haja interesse relevante na apreciação conjunta das acções, ou demandas cumuladas, ou quando esta apreciação conjunta se configure como indispensável para a realização do verdadeiro fim de todo o processo, qual é o de operar ajusta composição do litígio (Cf. (MIGUEL TEIXElRA DE SOUSA, As Partes, o Objecto e a Prova na Acção Declarativa, 1995. pág. 91).

Nesta conformidade, por aplicação do art. 31.º. n.º 2. do CPC (37º NCPC), que é um afloramento do principio geral da adequação formal, a cumulação de pedidos a que corresponde a mera diversidade formal de tramitações processuais, pode ser permitida se houver um efectivo interesse na apreciação conjunta das pretensões, por razões de economia processual, ou por a sua apreciação conjunta se revelar indispensável a um correcto entendimento e julgamento do litígio (Cf. Ac. RL, de 7.11.2006: CJ, 2006, 5.º - 77).

Não obstante, também não poderia deixar de relevar como elemento impediente a tais objecções recursivas, aquele outro que, como argumento de parte, se ancora - reconhecendo-o como adequado e, por isso, válido -, em que, vindo, agora:

«os Recorrentes alegar que a Recorrida, deveria ter interposto acção comum e não o procedimento de injunção, uma vez que “os juros relativos a outros pagamentos que não os efetuados para remunerar transacções comerciais e aos pagamentos efetuados a título de indemnização por responsabilidade civil, encontra-se expressamente excluída, nos termos do disposto no artigo 2.º n.º 2, als. b) e c) do DL n.º 32/2003, de 17 de Fevereiro.

E, entendendo:

 

D. os Recorrentes que a cláusula penal peticionada não poderia ser objeto do procedimento de injunção.

A verdade é que:

E. O negócio celebrado entre Recorrida e Recorrentes não se trata de uma transação comercial, pelo que não se lhe aplica aquele diploma!

F. Sem margem para dúvida, a legislação aplicável é o DL n.º 269/98 de 01 de Setembro cujo regime se destina a exigir no cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior a 15.000€, aplicando-se assim, todo o regime ali estabelecido».

Nesta conformidade, não há , no caso sub judice , como contrariar o que - vollens, nollens -, emana de inferência e elemento descritivo/narrativo, nos factos provados, a que se procede, depois de tudo, em decisório. A saber:

«(…) Em resumo, nenhuma cláusula deve declarar-se não escrita, nos termos do artigo 8.º do DL n.º 446/85, de 25 de Outubro.

Por conseguinte, o contrato em causa é válido, eficaz e vinculativo.

Provou-se que, em execução desse contrato, a autora concedeu aos réus um crédito imediato, por transferência bancária, no montante de €16.000,00.

Os réus, por seu turno, obrigaram-se a reembolsar tal valor em 94 prestações mensais, no valor inicial de €272,00, de acordo com o quadro indicado na cláusula 2.2 das Condições Gerais (quadro indicativo de prazos e prestações de reembolso para os possíveis montantes da RESERVA (“limite máximo do crédito”) para 1.ª utilização da totalidade da sua reserva sem seguro), montante que não incluía o eventual prémio de seguro, devido caso os réus a ele aderissem, como aderiram.

Como decorre do teor expresso e literal da cláusula 8.3. das Condições Gerais, «as prestações mensais e o prazo de reembolso serão as constantes das Condições Particulares do contrato e no Quadro inserido na cláusula 2.2. supra, desde que não se verifiquem novas utilizações do crédito, não haja adesão ao seguro, ou não haja alteração ao limite máximo do crédito autorizado (“Reserva”), ou ainda da TAEG, motivo pelo qual o quadro tem natureza meramente indicativa».

A data acordada de vencimento das prestações era o dia 01 de cada mês.

E o modo de pagamento estipulado era por débito na conta bancária (ou outra forma previamente autorizada pela autora).

Nesse contrato, além de clausuladas várias obrigações, foram também previstas consequências para o incumprimento por parte dos réus, nomeadamente pelo não pagamento atempado das prestações acordadas.

Caso os réus não fizessem o pagamento de uma prestação na data de vencimento, ficariam em mora, acrescendo à prestação uma penalidade mensal de 4% sobre cada uma das prestações em mora – cláusula 10.1 das Condições Gerais.

E mantendo-se o incumprimento, a autora poderia resolver o contrato (como fez) e exigir o pagamento imediato de toda a dívida (incluindo capital remanescente, juros contratuais e demais encargos vencidos), sem prejuízo da incidência de juros de mora à taxa legal sobre toda a dívida vencida - cláusula 10.2 das Condições Gerais.

Caso a autora resolvesse o contrato e recorresse a juízo para obter o pagamento (como sucedeu), as penalidades devidas pela mora são substituídas por uma penalidade única de 8% sobre todo o saldo em dívida, a título de cláusula penal - cláusula 10.2 das Condições Gerais.

Em face da matéria de facto dada como provada, está igualmente demonstrado o incumprimento contratual dos réus, por falta de pagamento das prestações acordadas a partir de Abril de 2016.

E como se apurou, não assistia razão aos réus ao pensarem que o podiam fazer por já terem pago tudo o que deviam à autora, pois mercê dos reiterados atrasos no dia em que efectuavam os pagamentos (o que implicava necessariamente a contabilização de juros de mora e a cobrança de uma penalização pela mora, num crescendo acumulado, fazendo com que cada pagamento amortizasse menos capital), associados à alteração da TAEG logo no 1.º semestre da vigência contratual, que sofreu um aumento de 1% (como lhes foi regularmente comunicado) e à subscrição do contrato de seguro facultativo (que gratuito não era), os valores pagos, no total global de €27.833,62, que foram sendo imputados nos termos contratualmente previstos, são insuficientes para cobrir a totalidade das obrigações assumidas.

Face ao incumprimento verificado, a autora procedeu à resolução do contrato em 30/11/2016, tendo comunicado essa resolução aos réus por cartas datadas de 01/12/2016, indicando um montante total em dívida de €14.125,37, o mesmo que é peticionado nos autos a título de capital, acrescido de juros moratórios vencidos e vincendos, à taxa contratual de 15,20%, desde a data da resolução contratual (30/11/2016) até efectivo e integral pagamento».

Consequentemente, desde logo, com esta motivação e alcance, não há - no circunstancialismo intraprocessual em revelação -, como « revogar e substituir (a decisão) por outra que absolva os Réus do pedido formulado pela Autora». Tão pouco, «se assim não se entender, absolver os RR parcialmente da instância, quanto à parte que constitui penalidade por incumprimento», mesmo, em função do elemento restritivo patenteado na decisão, quanto ao “incumprimento de correspondência ao peticionado pela Autora”, expresso na própria condenação dos RR. (fls. 710-712 dos Autos).

Uma vez que, aqui, precisamente aqui, se projecta desde logo, alcance vinculador, segundo o qual interpretar uma lei não é mais do que fixar o seu sentido e o alcance com que ela deve valer, ou seja, determinar o seu sentido e alcance decisivos; o escopo final a que converge todo o processo interpretativo é o de pôr a claro o verdadeiro sentido e alcance da lei (Manuel de Andrade, Ensaio sobre a Teoria da Interpretação das Leis, págs. 21 e 26).

Interpretar, em matéria de leis, quer dizer não só descobrir o sentido que está por detrás da expressão, como também, dentro das várias significações que estão cobertas pela expressão, eleger a verdadeira e decisiva (P. de Lima e A. Varela, Noções Fundamentais, 11,5.' ed., pág. 130).

Resumindo, Pires de Lima e Antunes Varela dizem que o sentido decisivo da lei coincidirá com a vontade real do legislador, sempre que esta seja clara e inequivocamente demonstrada através do texto legal, do relatório de diplomas ou dos próprios trabalhos preparatórios da lei (Cód. Civ. Anot., 1,4.ª ed., págs. 58 e s.).

A letra da lei é, naturalmente, o ponto de partida da interpretação, cabendo-lhe, desde logo, como assinala Baptista Machado, uma função negativa: eliminar aqueles sentidos que não tenham qualquer apoio ou, pelo menos, qualquer correspondência ou ressonância nas palavras da lei (Introdução ao Direito, 1987, págs. 187 e ss.).

Ou, como diz Oliveira Ascensão, «a letra não é só o ponto de partida, é também um elemento irremovível de toda a interpretação. Quer dizer que o texto funciona também como limite de busca do espírito» (O Direito - Introdução e Teoria Geral, 1978, pág. 350).

Como escreveu Francesco Ferrara, Interpretação e Aplicação das Leis, 3.ª ed., 1978, págs. 127 e ss. e 138 e ss., para apreender o sentido da lei, a interpretação socorre-se de vários meios: Em primeiro lugar busca reconstituir o pensamento legislativo através das palavras da lei, na sua conexão linguística e estilística, procura o sentido literal. Mas este é o grau mais baixo, a forma inicial da actividade interpretativa. As palavras podem ser vagas, equívocas ou deficientes e não oferecerem nenhuma garantia de espelharem com fidelidade e inteireza o pensamento: o sentido literal é apenas o conteúdo possível da lei; para se poder dizer que ele corresponde à mens legis, é preciso sujeitá-lo a crítica e a controlo.

Isto porque «a apreensão literal do texto, ponto de partida de toda a interpretação, é, já, interpretação, embora incompleta, pois será sempre necessária uma tarefa de interligação e valoração, que escapa ao domínio   literal» (Cf. Parecer da PGR:DR, II, de 26-11-1992, pag. 11227). Tal como empreendido na decisão sob escrutínio.

Daí, que se configure como negativa a resposta às questões em 1 (na confluência articulada com o que, em sequência, infra, se desenvolve).

*

2.

XIII. O Tribunal “a quo” não considerou que houve violação do dever de informação por parte da A. uma vez que «o contrato foi reduzido a escrito e os réus ficaram na posse de um exemplar, de conteúdo intocado e inalterado relativamente à proposta contratual que o baseou, que os mesmos preencheram, assinaram e posteriormente remeteram à autora.»

-

XXI. Nunca poderia o Tribunal a quo dar como provado ou concluir que tinha sido observado e cumprido o dever de comunicação que impendia sobre a A., já que nenhuma prova tinha sido ou foi produzida nesse sentido pela A.,

XXII. Fez, na perspetiva dos RR, o Tribunal a quo uma incorreta análise e apreciação da prova, retirando daí conclusões que não correspondem à realidade, o que culminou a final num erro de julgamento,

XXIII. Deve a douta sentença proferida ser revogada, por violação dos preceitos supra referidos, e substituída por outra que absolva os RR do pedido.

Neste segmento, como elemento prodrómico, efective-se - aqui, também -, referência a que, sem lhe serem estranhas a decorrência do tempo discernível e de individualizados hábitos de consumo generalizados, “o Dec. Lei nº 446/85 veio estabelecer alguns mecanismos de controlo das cláusulas contratuais gerais que, com a massificação do comércio jurídico, começaram a ser usadas e impostas pelas grandes empresas, sem que a outra parte contratante tenha qualquer possibilidade de discutir o teor dessas cláusulas.

Constituindo a liberdade contratual um dos princípios básicos do direito privado, o certo é que a introdução de cláusulas contratuais gerais - impostas unilateralmente por um dos outorgantes - determina algumas limitações àqueles que eram os seus parâmetros tradicionais, na medida em que tal liberdade limita-se, nesses casos, à possibilidade de aceitar ou não aceitar celebrar o contrato nos termos impostos.

Daí que o legislador tenha sentido a necessidade de introduzir alguns mecanismos destinados a combater os abusos que aquela técnica de contratação pode fomentar em prejuízo do consumidor.

Um desses mecanismos é precisamente o dever de comunicação dessas cláusulas, que é imposto pelo art. 5º do citado diploma legal.

Dado que a liberdade contratual de um dos outorgantes se limita, na prática, à liberdade de aceitar ou não as cláusulas impostas e a celebração do contrato, impõe-se que esse outorgante tenha, pelo menos, o conhecimento real e efectivo do teor dessas cláusulas, de forma que possa decidir se quer, ou não, contratar nessas condições, destinando-se o dever de comunicação dessas cláusulas a combater o risco de desconhecimento de aspectos significativos do contrato (Cfr. António Pinto Monteiro, “Contratos de Adesão: o Regime Jurídico das Cláusulas Contratuais Gerais Instituído pelo Decreto-Lei Nº 446/85 de 25 de Outubro”, ROA, Ano 46, Vol. III, pág. 749).

Tal como decorre do disposto no nº 2 do citado art. 5º, essa comunicação deve ser efectuada de modo adequado e com a antecedência necessária para que, tendo em conta a importância do contrato e a extensão e complexidade das cláusulas, se torne possível o seu conhecimento completo e efectivo por quem use de comum diligência.

Ou seja, apesar de a lei impor ao contraente que impõe as cláusulas o ónus de as comunicar ao outro contraente, exige-se também que este adopte um comportamento diligente tendo em vista o conhecimento real e efectivo dessas cláusulas.

De facto, não se justificaria que a protecção concedida à parte mais fraca fosse ao ponto de abarcar as situações em que a falta de conhecimento das cláusulas apenas decorreu de um comportamento negligente ou pouco diligente dessa parte que, apesar de ter sido colocado em posição de conhecer essas cláusulas, não teve qualquer preocupação em assegurar-se do seu teor.

Assim, e face ao disposto no citado art. 5º, nº 2, deveremos considerar que aquele dever de comunicação é cumprido quando se proporcione ao outro contraente a possibilidade razoável de, usando de comum diligência, tomar real e efectivo conhecimento do teor das cláusulas.

Importa, desde já, referir que nada impõe que essa comunicação tenha que ser oral, até porque o ónus de assim proceder esbarraria, muitas vezes, com a oposição do contraente que vai aceitar (ou não) as cláusulas e que nem sempre estaria disposto a tolerar uma leitura fastidiosa e, por vezes, demorada do teor das cláusulas.

Deste modo, o cumprimento do dever de comunicação, a que se reporta o citado art. 5º, basta-se com a entrega da minuta/documento do contrato, contendo todas as cláusulas (incluindo as gerais), com a antecedência que seja necessária – em função da extensão e complexidade das cláusulas – na medida em que, com a entrega dessa minuta/documento, uma pessoa normalmente diligente tem a efectiva e real possibilidade de ler e analisar todas as cláusulas e de pedir os esclarecimentos que entenda necessários para a sua exacta compreensão (Cfr. Acórdão do STJ de 24/05/2007, processo 07A1337, disponível em http://www.dgsi.pt.) (Cf. Ac. RP de 16.12.2009, Proc. nº 872/08.0TBCHV.P1, Relatora: MARIA CATARINA, in www.dgsi.pt).

Ora, afigura-se-nos que foi isso, também, que aconteceu no caso “sub-judice”. Com efeito, na sua destacada, em decisório, contextura específica:

«No caso, o contrato foi reduzido a escrito e os réus ficaram na posse de um exemplar, de conteúdo intocado e inalterado relativamente à proposta contratual que o baseou, que os mesmos preencheram, assinaram e posteriormente remeteram à autora.

Vale por dizer que todas as cláusulas contratuais gerais insertas na proposta de contrato, ulteriormente convertida em contrato, foram comunicadas pela autora na íntegra, por escrito e com a antecedência que os réus entenderam conveniente, pois dependia de acto dos próprios definir o momento da devolução à autora da proposta contratual.

Não se verifica, pois, qualquer violação do dever de comunicação.

Quanto ao dever de informação, os réus não identificam – nem o Tribunal descortina – qual ou quais os aspectos compreendidos (e em que cláusulas) cuja aclaração se justificasse, nem tão pouco que esclarecimentos solicitaram à autora que esta não lhes tenha prestado.

Não se vislumbra assim violação do dever de informação.

Bem como inexistem cláusulas que passem despercebidas a um contratante normal, colocado na posição dos réus, contratantes reais, pelo contexto em que surjam, pela epígrafe que as precede ou pela sua apresentação gráfica.

Em resumo, nenhuma cláusula deve declarar-se não escrita, nos termos do artigo 8.º do DL n.º 446/85, de 25 de Outubro.

Por conseguinte, o contrato em causa é válido, eficaz e vinculativo».

Tanto, assim, que, do mesmo modo, se não pode perder de vista a consideração de que "a prova de um facto assenta, em processo civil, num juízo de preponderância em que esse facto provado se apresente, fundamentalmente, como mais provável ter acontecido do que não ter acontecido, como no caso vertente se evidencia (neste sentido, Ac. RC, de 06.03.2012, disponível em www.dgsi.pt; também Ac. RC. 25.02.2014 (Relatora Maria José Guerra), no Processo com o N° 1712.12.1 YIPRT.C1). O que, em conjugação com todos os factos considerados assentes, faz prova, nos termos positivados no art. 376º do Código Civil».

Ou seja, as cláusulas em referência constavam de um exemplar/ minuta, que foi entregue aos recorrentes para estes assinarem, impondo-se, por isso, concluir que o teor das referidas cláusulas lhes foi entregue, antes da respectiva assinatura.

Desse elemento documental e referencial - por eles subscrito -, constavam as condições obrigacionais, pelo que, se tivessem tido o cuidado (básico e elementar) de olhar para o documento que estavam a assinar, não poderiam deixar de se aperceber do que firmavam e, por conseguinte, a aceitar um determinado e específico número de cláusulas.

Por outro lado, não tendo sido alegado e não havendo qualquer razão para supor que os recorrentes tenham sido pressionados ou coagidos a assinar de imediato, os mesmos, se actuassem com a devida diligência, teriam despendido algum tempo a ler as cláusulas que estavam a subscrever, pedindo os esclarecimentos que entendessem necessários. O que significa que estes dispuseram do tempo preciso para, com calma e sem qualquer tipo de pressão, ler e analisar as referidas cláusulas.

Concluímos, pois, também, que, ao entregar aos Recorrentes o exemplar/minuta da qual constavam as cláusulas ora em causa (o que, necessariamente, aconteceu antes da respectiva assinatura), a recorrida cumpriu o dever de comunicação a que alude o citado art. 5º, na medida em que a entrega dessa minuta proporcionava aos recorrentes a possibilidade de ler e pedir os esclarecimentos que achassem necessários e de, assim, tomar real e efectivo conhecimento do seu teor.

Dando como assente que uma pessoa de comum diligência não assinará um documento sem que, primeiro, se certifique do respectivo teor, afigura-se-nos que a entrega do exemplar/minuta, contendo as cláusulas gerais, é adequada para possibilitar a quem use de comum diligência o conhecimento real e efectivo das referidas cláusulas.

Assim, se os recorrentes não tomaram real e efectivo conhecimento das cláusulas gerais que subscreveram, tal, apenas, se deveu à sua falta de diligência por terem assinado esse documento, sem ter a preocupação de saber qual era o seu conteúdo (Cf. Ac. RP de 16.12.2009, Proc. nº 872/08.0TBCHV.P1, Relatora: MARIA CATARINA, in www.dgsi.pt)

Afigura-se-nos, pois, em face do exposto, que a recorrida cumpriu o dever de comunicação a que se reporta o citado art. 5º.

O que, assim, do mesmo modo, encontra respaldo na circunstância - que se revela incontroversa e incontrovertível -, de o dever de comunicação que é imposto ao contraente que recorre a cláusulas contratuais gerais configurar “(...) uma obrigação de meios: não se trata de fazer com o aderente conheça efectivamente as cláusulas, mas apenas de desenvolver, para tanto, uma actividade razoável”, criando assim a “possibilidade do conhecimento completo e efectivo das cláusulas por quem use de comum diligência”, o bonus pater familias erigido a padrão médio do nosso ordenamento jurídico (Cf. Almeida Costa e Menezes Cordeiro, anotação ao DL. n.º 446/85, de 25 de Outubro, pág. 25, com as alterações introduzidas pelo DL 220/95).

Deste modo, as cláusulas contratuais gerais, que se encontram submetidas ao regime fixado pelo DL nº 446/85, de 25/10, na redacção introduzida pelos DL nº 220/95, de 31/01, e nº 249/99, de 7/7, “consistem em situações típicas do tráfego negocial de massas em que as declarações negociais de uma das partes se caracterizam pela pré – elaboração, generalidade e rigidez. Efectivamente, está-se nesses casos perante situações em que uma das partes elabora a sua declaração negocial previamente à entrada em negociações (pré – elaboração), a qual aplica genericamente a todos os seus contraentes (generalidade), sem que a estes seja concedida outra possibilidade que não seja a da sua aceitação ou rejeição, estando-lhes por isso vedada a possibilidade de discutir o conteúdo do contrato (rigidez) (Luís Menezes Leitão, Direito das Obrigações, Volume I, 8ª edição, página 32)”.

Para além disso, e como refere Menezes Cordeiro (Manual de Direito Bancário, página 414.), as cláusulas contratuais gerais costumam caracterizar-se pela desigualdade entre as partes, pela complexidade e pela natureza de formulário, ainda que estas características não sejam de verificação necessária.

Nas cláusulas contratuais gerais, é manifesta a impossibilidade fáctica de uma das partes exercer a sua liberdade de estipulação, que fica assim apenas na mão da outra parte. Porém, a limitação, jurídica ou meramente de facto, da liberdade do aderente não constitui óbice ao triunfo da tese contratual, pois não é a liberdade de estipulação que caracteriza o negócio jurídico e portanto o contrato, mas a autonomia de vontade, ou seja, a faculdade de regular por si os próprios interesses, ainda que dentro de esquemas legais preestabelecidos (Inocêncio Galvão Telles, Manual dos Contratos em Geral, página 313).

O conhecimento imperfeito do conteúdo do contrato, facto subjectivo de averiguação difícil, ocorrerá com mais frequência nos contratos deste tipo; mas não é fenómeno que só nelas ocorra. Por isso, também não deve aceitar-se a modalidade da tese contratualista que restringe o acordo às condições particulares, dando como não vinculativas para o aderente as condições gerais (Inocêncio Galvão Telles, Manual dos Contratos em Geral, página 313.).

Para evitar quaisquer efeitos perversos, que podem ocorrer em relação a uma generalidade de contraentes, a lei tem que intervir no sentido de restringir a liberdade de estipulação, procurando, por um lado, evitar a introdução no contrato de cláusulas de que o outro contraente se não apercebeu e visando, por outro, impedir o surgimento de cláusulas iníquas.

Por sua vez, mesmo que ocorra a aceitação, a lei impõe o cumprimento de certas exigências específicas para permitir a inclusão das cláusulas contratuais gerais no contrato singular. Essas exigências constam dos artigos 5º a 7º da LCCG, reconduzindo-se à (i) comunicação das cláusulas contratuais gerais à outra parte (artigo 5º); (ii) à prestação de informação sobre aspectos obscuros nelas compreendidos (artigo 6º) e (iii) à inexistência de estipulações específicas de conteúdo distinto (artigo 7º).

Como exemplos típicos de contratos, contendo cláusulas contratuais gerais, costumam apontar-se os contratos de adesão, aqueles em que um dos contraentes – o cliente, o consumidor – como sucede, por exemplo (…), na generalidade dos contratos bancários, não tendo a menor participação na preparação e redacção das respectivas cláusulas se limita a aceitar o texto que o outro contraente oferece, em massa, ao público interessado (Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Volume I, 1ª edição, página 252/253).

Contratos de adesão são, pois, aqueles cujas cláusulas são elaboradas sem prévia negociação individual e que proponentes ou destinatários indeterminados se limitam a subscrever ou aceitar. Todavia, como resulta do nº 2 do artigo 1º, o regime consagrado no DL nº 446/85 (redacção introduzida pelo DL nº 249/99), também se aplica às cláusulas inseridas em contratos individualizados, mas cujo conteúdo, previamente elaborado, os destinatários não podem influenciar. Assim, relativamente à comunicação à outra parte, especifica a lei que mesma deve ser integral (artigo 5º, n.º 1) e ser realizada de modo adequado e com a antecedência necessária, para que, tendo em conta a importância do contrato e a extensão e complexidade das cláusulas, se torne possível o seu conhecimento efectivo por quem use de comum diligência (artigo 5º, n.º 2).

O grau de diligência postulado por parte do aderente, e que releva para efeitos de calcular o esforço posto na comunicação, é o comum (artigo 5º, n.º 2, in fine). Deve ser apreciado in abstracto, mas de acordo com as circunstâncias típicas de cada caso, como é usual no Direito Civil.

O ónus da prova da comunicação adequada e efectiva cabe à parte que utilize as cláusulas contratuais gerais (artigo 5º, n.º 3). Deste modo, o utilizador que alegue contratos celebrados na base de cláusulas contratuais gerais deve provar, para além da adesão em si, o efectivo cumprimento do dever de comunicar (cf. artigo 342º, n.º 1 CC), sendo que, caso esta exigência de comunicação não seja cumprida, as cláusulas contratuais gerais consideram-se excluídas do contrato singular (artigo 8º, alínea a), considerando ainda a lei não terem sido adequada e efectivamente comunicadas as cláusulas que, pelo contexto em que surjam, pela epígrafe que as precede ou pela apresentação gráfica, passem despercebidas a um contratante normal, colocado na posição do contratante real (artigo 8º, alínea c) e as cláusulas inseridas em formulários, depois da assinatura de uma das partes (artigo 8º, alínea d).

Para além da exigência de comunicação adequada e efectiva, surge ainda a exigência de informar a outra parte, de acordo com as circunstâncias, de todos os aspectos compreendidos nas cláusulas contratuais gerais cuja aclaração se justifique (artigo 6º, n.º 1) e de prestar todos os esclarecimentos razoáveis solicitados (artigo 6º, n.º 2).

Com efeito, “a conclusão esclarecida do contrato, base de uma efectiva autodeterminação, não se contenta com a comunicação das cláusulas. Estas devem ser efectivamente entendidas. Para o efeito, a LCCG prevê um dever de informação. O utilizador das cláusulas contratuais gerais deve conceder a informação necessária ao aderido, prestando-lhe todos os esclarecimentos solicitados, desde que razoáveis” (Cf. Ac. RP, de 24-03-2011, Proc. nº 1582/07.1TBAMT-B.P1.S1, Relator: GRANJA DA FONSECA, in www.dgsi.pt).

Caso não tenha sido cumprida a exigência de informação, em termos de não ser de esperar o conhecimento efectivo pelo aderente, as cláusulas contratuais gerais consideram-se excluídas dos contratos singulares (artigo 8º, alínea b).

Deste modo, pois, sem que se possa olvidar - o que a decisão em apreço, não deixou de assinalar, em termos noemáticos do prolema judiciário a resolver -, que:

«(…) O mútuo bancário é um contrato sinalagmático, com obrigações para ambas as partes e que encontra as figuras próximas no mútuo civil, regulado nos artigos 1142.º e ss do Código Civil e no mútuo comercial, prevenido nos artigos 394.º e ss do Código Comercial.

Revertendo ao caso dos autos, é incontroverso o figurino contratual em análise, pelas partes incontestado e inequivocamente emergente do teor, quer da epígrafe, quer do clausulado, do respectivo contrato escrito – trata-se de um contrato de financiamento bancário, sob a forma de crédito em conta corrente, celebrado entre a autora e os réus, pessoas singulares, na veste de consumidores (assim entendidos por nada vir alegado em contrário à actuação dos réus no negócio com objectivo alheio à sua actividade comercial ou profissional).

O regime jurídico dos contratos de crédito a consumidores encontra-se hoje previsto no DL n.º 133/2009, de 02 de Junho (aplicável, na sua generalidade, aos contratos concluídos após 01 de Julho de 2009, data da sua entrada em vigor – artigos 37.º e 34.º, n.º 1 deste diploma).

Todavia, à data da celebração do contrato em apreço (25/03/2008) encontrava-se em vigor a disciplina do DL n.º 359/91, de 21 de Setembro, que assim é a aplicável aos autos (artigo 34.º, n.º 1 do DL n.º 133/2009).

Nos termos do artigo 2.º, n.º 1, alínea a) do DL n.º 359/91, de 21 de Setembro, o contrato de crédito era definido como o contrato por meio do qual um credor concede ou promete conceder a um consumidor um crédito sob a forma de diferimento de pagamento, mútuo, utilização de cartões de crédito ou qualquer outro acordo de financiamento semelhante, regulando o artigo 13.º a concessão de crédito em conta corrente.

Previa o n.º 1 do artigo 13.º do DL n.º 359/91, de 21 de Setembro que neste tipo de contratos para a concessão de crédito em conta corrente, independentemente da forma que assumam, o consumidor seria informado por escrito, no momento da celebração do contrato ou em momento anterior, dos seguintes elementos:

a) O eventual limite do crédito ou a forma de o determinar;

b) A taxa de juro anual, os encargos aplicáveis aquando da celebração do contrato e as condições em que a taxa de juro e os encargos podem ser alterados;

c) O período de reflexão, caso seja aplicável;

d) Os termos de utilização do crédito e as condições de reembolso;

e) As condições de cessação do contrato.

Adiantava o n.º 2 do mesmo artigo que durante a vigência do contrato, o consumidor será informado por escrito de qualquer alteração da taxa de juro anual ou dos encargos aplicáveis, no momento em que se verificar tal alteração, podendo a informação ser prestada através de extracto de conta.

E prescrevia o n.º 3 que as alterações referidas no número anterior só podiam ser aplicadas a partir da data da comunicação ao consumidor.

Os réus invocam na sua oposição que o contrato em causa é anulável, por completamente omisso quanto aos elementos do custo e condições de alteração da TAEG, bem como ao período de reflexão ou custo do seguro (artigos 6.º, n.º 2, alíneas b) e c) e 7.º, n.º 2 do DL n.º 359/91, de 21 de Setembro, na versão dada pelo DL n.º 82/2006, de 03 de Maio, ainda em vigor à data da celebração do contrato).

Não lhes assiste razão.

Todos os elementos apontados estão expressamente previstos nas Condições Gerais do contrato:

– elementos do custo referidos no artigo 4.º que não tenham sido incluídos no cálculo da TAEG, mas que devam ser suportados pelo consumidor (artigo 6.º, n.º 2, alínea b) do DL n.º 359/91, de 21 de Setembro): Cláusula 6.ª das Condições Gerais (CUSTO DO CRÉDITO) – O custo do crédito varia em função das utilizações, montante e duração do saldo devedor e é composto pelo crédito utilizado, juros diários vencidos, impostos e demais encargos (excepto o selo do contrato), incluindo o seguro, correspondendo a uma Taxa Nominal Anual de 12% e a uma Taxa Anual Efectiva Global (TAEG) de 13,76%, calculada nos termos do DL n.º 101/2000, de 02 de Junho e DL n.º 359/91, de 02 de Setembro. O custo do seguro, que é facultativo, não está incluído na TAEG;

- condições de alteração da TAEG (artigo 6.º, n.º 2, alínea c) do DL n.º 359/91, de 21 de Setembro): Cláusula 7.ª das Condições Gerais (MODIFICAÇÃO DO CUSTO DO CRÉDITO) - 7.1. A C(…)S pode rever e alterar a taxa de juro caso se alterem as condições que determinaram a sua fixação. 7.2. O Mutuário é avisado por escrito, através do extracto de conta referido no ponto 2.5., de qualquer alteração da taxa de juro, encargos com o crédito e reembolso mínimo mensal ou outras condições de pagamento, sendo as novas condições aplicadas ao saldo devedor a partir da data de vencimento da prestação mensal seguinte. 7.3. O Mutuário, discordando da alteração, pode resolver o contrato antecipando o pagamento da totalidade do saldo devedor nas condições anteriores à alteração. A alteração tem-se por aceite caso o Mutuário movimente a conta após ter tido conhecimento da modificação e/ou a recusa não for comunicada por carta registada com AR nos 15 dias seguintes à recepção do extracto de conta;

- período de reflexão (artigo 6.º, n.º 2, alínea f) do DL n.º 359/91, de 21 de Setembro): Cláusula 1.ª das Condições Gerais (ACEITAÇÃO, LIVRE RESOLUÇÃO E CONCLUSÃO DO CONTRATO) - 1.1. A adesão ao contrato é feita enviando à C(…) o exemplar que lhe é destinado, devidamente preenchido e assinado pelo(s) Mutuário(s) que, nos 14 dias seguintes à assinatura, pode(m) livremente resolvê-lo, por carta registada com aviso de recepção, a expedir até ao 14.º dia da assinatura para a C(…), Av. (…), sem necessidade de indicação do motivo, e sem que haja lugar a qualquer indemnização ou penalização;

- custo do seguro (artigo 6.º, n.º 2, alínea h) do DL n.º 359/91, de 21 de Setembro): Cláusula 12.ª das Condições Gerais (SEGURO FACULTATIVO DE VIDA E DE PROTECÇÃO AO CRÉDITO) - 12.1. O Mutuário poderá aderir à apólice de seguro de grupo n.º (…). Para aderir a esta apólice terá de preencher as Condições de Adesão previstas nas Condições Particulares (…) e assinar este contrato com a indicação de que opta pela adesão ao seguro, o qual importa o pagamento de um prémio mensal (não incluído na TAEG) indicado na Nota Informativa (0,40% do montante em dívida). O custo do prémio mensal do seguro é imputado na prestação mensal acordada no presente contrato, pelo que o seu pagamento é feito conjuntamente e da mesma forma que a prestação mensal de reembolso do crédito. A adesão ao seguro prolonga o período de reembolso do crédito.

Pelo que o contrato não enferma do apontado vício de anulabilidade (artigos 6.º, n.º 2, alíneas b), f e h) e 7.º, n.º 2 do DL n.º 359/91, de 21 de Setembro) ou de nulidade (artigos 6.º, n.º 2, alínea c) e 7.º, n.º 1 do mesmo diploma).

Prosseguem os réus arguindo que não lhes foi comunicada prévia e integralmente a possibilidade de variação do valor inicialmente acordado como prestação a pagar durante os 94 meses, nem tal decorre do próprio contrato ou das suas condições gerais, do mesmo modo que não foi cumprido o dever de esclarecimento por parte da requerente, não podendo produzir qualquer efeito e devendo declarar-se não escrita, nos termos do artigo 8.º do DL n.º 446/85, de 25 de Outubro, na redacção dada pelo DL n.º 323/2001, de 17 de Dezembro, ao que acresce o tipo de letra e tamanho utilizados nas condições gerais ser praticamente ininteligível.

De novo, não lhes assiste razão.

São vários os pontos do próprio contrato onde é mencionada tal possibilidade de variação do valor inicialmente acordado como prestação a pagar durante os 94 meses, decorrendo literalmente da menção expressa a «quadro indicativo» da cláusula 2.2. das Condições Gerais e do elenco dos factores de variação previstos na cláusula 8.3. das Condições Gerais – As prestações mensais e o prazo de reembolso serão as constantes das Condições Particulares do contrato e no Quadro inserido na cláusula 2.2. supra, desde que não se verifiquem novas utilizações do crédito, não haja adesão ao seguro, ou não haja alteração ao limite máximo do crédito autorizado (“Reserva”), ou ainda da TAEG, motivo pelo qual o quadro tem natureza meramente indicativa.».

--

Neste caso em apreço, pois, e face ao que os Autos evidenciam, e se deu como assente, em probatório, determina que se evidencie de plena adequação o que, em decisório, se apreciou, convocando, também, para o efeito, precedente judiciário segundo o qual:

«a lei ao impor ao contraente que impõe as cláusulas o ónus de as comunicar ao outro contraente exige-se também que este adote um comportamento diligente tendo em vista o conhecimento real e efetivo dessas cláusulas. De facto, não se justificaria que a proteção concedida à parte mais fraca fosse ao ponto de abarcar as situações em que a falta de conhecimento das cláusulas apenas decorreu de um comportamento negligente ou pouco diligente dessa parte que, apesar de ter sido colocado em posição de conhecer essas cláusulas, não teve qualquer preocupação em assegurar-se do seu teor.

Assim, e face ao disposto no citado artigo 5.º, n.º2 deveremos considerar que aquele dever de comunicação é cumprido quando se proporcione ao outro contraente a possibilidade de, usando de comum diligência, tomar real e efetivo conhecimento do teor das cláusulas. Nada existindo na lei que aponte para o facto, dessa comunicação, ter que ser oral (…) afigura-se-nos que, por regra e sem prejuízo de situações em que se justifique outro procedimento, o cumprimento do dever de comunicação a que se reporta o artigo 5.º se bastará com a entrega da minuta do contrato, contendo todas as cláusulas (incluindo as gerais) (…) na medida em que, com a entrega dessa minuta, uma pessoa normalmente diligente tem a efetiva e real possibilidade de ler e analisar todas as cláusulas e de pedir os esclarecimentos que entenda necessários para a sua exata compreensão”.

Dado que as cláusulas que a Autora se socorreu constam expressamente do contrato e que, apesar de não ter explicado verbalmente o teor das cláusulas, possibilitou aos Recorrentes o conhecimento efetivo de todos os seus termos, conferindo-lhe a possibilidade de as ler antes de o assinar, improcede, assim, a invocada violação do dever de comunicação e de informação (Cf., entre muitos outros, o Ac. RC, de 06.10.2015 (in CJ n.º265, 2015, Tomo IV).

Tal significa que, apesar dos termos e modo contratuais, e das suas possíveis implicações, os recorrentes deram, incontornavelmente, a sua adesão ao contrato e aproveitaram as vantagens, dele, emergentes.

Neste quadro, agora, em outra específica temporalidade, ao pretenderem prevalecer-se da (pretensa) invalidade apontada, os apelantes adoptam um comportamento que se revela abusivo e contrário ao direito e à boa fé, o que lhes é vedado, desde logo, pelo art. 334º do Código Civil.

Perante situações como a que se controverte, «tem vindo a ser defendido na dominante doutrina civilística (cf. a exposição feita por Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil, I - Parte Geral, Tomo IV, 2005, Almedina, Coimbra (págs. 203-205) que, em determinados casos, em nome da boa fé, se possa bloquear a invocação de invalidades formais, quando as mesmas foram determinadas por um contraente que, depois de aproveitar as vantagens do contrato, vem invocar a nulidade delas emergente. O reconhecimento de que este comportamento traduz abuso do direito funciona, então, através da chamada figura das inalegabilidades formais.

Embora não sendo verdadeiramente um vício de forma, tem natureza muito próxima o vício ocorrido no caso dos autos, visto respeitar, não à substância do convencionado, mas ao processo de elaboração do contrato; e a solução apontada justificar-se-á sempre que a nulidade seja invocada por um contraente que, embora para ela não tenha contribuído de forma exclusiva, concorde com o contrato, aproveite das vantagens dele emergentes, mas depois pretenda eximir-se ao cumprimento das correspondentes obrigações.

Porém, considerando as reservas que as denominadas inalegabilidades formais têm suscitado  - cf. Autor e obra acabados de citar -, “a figura das inalegabilidades não tem margem directa de concretização. Ela postularia a possibilidade de redução teleológica das normas formais, o que não é tecnicamente possível”. E, comentando decisões jurisprudenciais que cita e nas quais se tem admitido o bloqueio directo de normas formais e outras em que a mesma solução tem sido atingida, mas por via da invocação do “venire contra factum proprium”, diz o seguinte: “As decisões citadas serão justas e adequadas. Possivelmente, só seria possível atingi-las por via da boa fé. Mas, não paralisando, de modo directo, a invocação de nulidades formais, ao mesmo resultado se chegará com invocação da proibição do “venire contra factum proprium”, o que tem sido feito pela nossa jurisprudência, disso sendo exemplo, entre outros, os acórdãos do STJ de 5.2.98, publicado no BMJ nº 474, pág. 431 e da Relação do Porto de 11.5.89, publicado na Col. Jur., XIV, tomo III, pág. 192» (Cf. Ac. RL de 09-05-2006, Proc. nº 12155/2005-7, Relatora: ROSA MARIA RIBEIRO COELHO; também, o Ac. RC, Proc. nº 6563/14.6T8CBR-A.C1, subscrito por Unanimidade pelo mesmo Colectivo de Juízes, aqui decisor - António Carvalho Martins - Relator, Carlos moreira - 1º Adjunto e João Moreira do Carmo - 2º Adjunto).

Desta arte, valendo, também, por dizer que a discordância quanto ao direito aplicável ou o erro de julgamento não se incluem nas nulidades da decisão cuja enunciação taxativa consta do art. 615.°. n.º 1. do NCPC (2013). A reforma da decisão por erro de julgamento, apenas se verifica quando tenha ocorrido manifesto lapso na determinação do quadro normativo ou da qualificação jurídica dos factos (art. 616.°. n.º 2, do NCPC). O que - como no caso -, sem demonstração e revelação, não ocorre (Cf. Ac. STJ, de 5.11.2015. Proc. 565/05: Sumários. 2015. p. 614).

O que determina atribuir, também, resposta negativa às questões em 2.

Podendo, deste modo, também, concluir-se, sumariando (art. 663º, nº7 NCPC), que:

1.

O juiz não está limitado às alegações das partes, no que toca à matéria de direito (art. 664.º do CPC - 5º NCPC), pelo que, ao qualificar juridicamente o contrato dos autos, nos termos aí referenciados, não incorreu em violação do princípio do dispositivo ou do contraditório, nem, sequer, havendo sido proferida “decisão surpresa”, sendo certo que, mais do que a nomenclatura, releva a interpretação das suas cláusulas.

2.

A compatibilidade dos pedidos (art. 555º NCPC), afere-se pela conciliabilidade dos efeitos jurídicos derivados da procedência de cada um dos pedidos, para que não suceda que o reconhecimento de um deles exclua a possibilidade de verificação do outro. A incompatibilidade de pedidos, enquanto vício gerador de ineptidão da petição inicial, só justifica colher tal relevância, determinando a anulação de todo o processo, quando coloque o julgador na impossibilidade de decidir, por confrontado com a ininteligibilidade das razões que determinaram a formulação das pretensões em confronto, irrelevando, para o efeito, o antagonismo que ocorra no plano legal ou do enquadramento jurídico.

3.

Interpretar uma lei não é mais do que fixar o seu sentido e o alcance com que ela deve valer, ou seja, determinar o seu sentido e alcance decisivos; o escopo final a que converge todo o processo interpretativo é o de pôr a claro o verdadeiro sentido e alcance da lei. A letra não é só o ponto de partida, é também um elemento irremovível de toda a interpretação. Quer dizer que o texto funciona também como limite de busca do espírito. A apreensão literal do texto, ponto de partida de toda a interpretação, é, já, interpretação, embora incompleta, pois será sempre necessária uma tarefa de interligação e valoração, que escapa ao domínio literal, e a que se procedeu.

---

4.

O cumprimento do dever de comunicação, a que se reporta o citado art. 5º (do regime fixado pelo DL nº 446/85, de 25/10, na redacção introduzida pelos DL nº 220/95, de 31/01, e nº 249/99, de 7/7), basta-se com a entrega de exemplar/minuta do contrato, contendo todas as cláusulas (incluindo as gerais), com a antecedência que seja necessária – em função da extensão e complexidade das cláusulas –, na medida em que, com a entrega dessa minuta, uma pessoa normalmente diligente tem a efectiva e real possibilidade de ler e analisar todas as cláusulas e de pedir os esclarecimentos que entenda necessários para a sua exacta compreensão.

5.

Dando como assente que uma pessoa de comum diligência não assinará um documento sem que, primeiro, se certifique do respectivo teor, afigura-se-nos que a entrega da minuta, contendo as cláusulas gerais, é adequada para possibilitar a quem use de comum diligência o conhecimento real e efectivo das referidas cláusulas. Assim, se os Recorrentes não tomaram real e efectivo conhecimento das cláusulas gerais que subscreveram, tal, apenas, se deveu à sua falta de diligência por terem assinado esse documento, sem ter a preocupação de saber qual era o seu conteúdo.

6.

No contexto em referência, pois, tendo em conta as cláusulas de que a A. se socorreu, constarem expressamente do contrato (e apesar de não sair demonstrado a explicação verbal do seu teor, que também se não revelou necessária…), tal possibilitou aos Recorrentes o conhecimento real e efectivo de todos os seus termos, uma vez que lhes foi conferida a possibilidade de as ler, previamente à aposição da sua assinatura, impede a consumação da invocada violação do dever de comunicação e de informação.

7.

Tal significa que, apesar dos termos e modo contratuais, e das suas possíveis implicações, os recorrentes deram, incontornavelmente, a sua adesão ao contrato e aproveitaram as vantagens, dele emergentes. Neste quadro, agora, nesta outra específica temporalidade, ao pretender prevalecer-se da (pretensa) invalidade apontada, os apelantes adoptam um comportamento abusivo e contrário ao direito e à boa fé, o que lhe é vedado pelo art. 334º do Código Civil.

8.

Considerando as reservas que as denominadas inalegabilidades formais têm suscitado, a figura das inalegabilidades não tem margem directa de concretização. Ela postularia a possibilidade de redução teleológica das normas formais, o que não é tecnicamente possível. Em todo o caso, tem-se admitido o bloqueio directo de normas formais e outras em que a mesma solução tem sido atingida, mas por via da invocação do “venire contra factum proprium”, dizendo o seguinte: “As decisões citadas serão justas e adequadas. Possivelmente, só seria possível atingi-las por via da boa fé. Mas, não paralisando, de modo directo, a invocação de nulidades formais, ao mesmo resultado se chegará com invocação da proibição do “venire contra factum proprium”.

9.

A discordância quanto ao direito aplicável ou o erro de julgamento não se incluem nas nulidades da decisão cuja enunciação taxativa consta do art. 615.°. n.º 1. do NCPC (2013).

10.

A reforma da decisão por erro de julgamento, apenas se verifica quando tenha ocorrido manifesto lapso na determinação do quadro normativo ou da qualificação jurídica dos factos (art. 616.°. n.º 2, do NCPC). O que - como no caso -, sem demonstração e revelação, não ocorre.

*

III. A Decisão:

Pelas razões expostas, nega-se provimento ao recurso interposto, confirmando a decisão recorrida.

Custas pelos recorrentes, fixando-se a taxa de justiça em 3 UC..

*

Coimbra, 21 de Maio, de 2019.

António Carvalho Martins ( Relator )

Carlos Moreira

Moreira do Carmo