Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
913/09.4TBCBR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ANABELA LUNA DE CARVALHO
Descritores: TRÂNSITO EM JULGADO
PRAZO
RECURSO DA MATÉRIA DE FACTO
PRAZO ADICIONAL
Data do Acordão: 09/23/2014
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COIMBRA - VARA DE COMPETÊNCIA MISTA 1ª S
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTS. 628 E 638 CPC
Sumário: 1.- Só com a efectiva interposição do recurso e com a incidência do mesmo sobre o julgamento de facto, se pode considerar que o recorrente beneficia do prazo adicional de 10 dias previsto no nº 7 do art. 638º do Código Processo Civil.

2.- Desse modo, esse prazo de 10 dias nunca entra no cálculo do trânsito em julgado, pois que, o mesmo pressupõe sempre a interposição de recurso ao julgamento de facto.

Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

                                                            I

Na presente ação declarativa de condenação vieram os Autores requerer “… que fosse determinado à secção a passagem de certidão da sentença e que a certidão tenha menção especificada de que a data do seu trânsito em julgado como sendo o dia 10 de Outubro de 2013 (e não qualquer outra data anterior, designadamente 30 de Setembro ou qualquer outra) uma vez que a notificação da sentença ao R. J (…) (imposta pelo disposto no art. 255º nº 4 do CPC na red. anterior) foi enviada em 18/07/2003 e presuntivamente efetuada em 22/07/2013, que até 31-08-2013 os prazos estiveram suspensos por motivo de férias judiciais, que nos termos dos nºs 1 e 7 do art. 685º do CPC na redação anterior, correu prazo de 40 dias de recurso com fundamento na impugnação da prova gravada, a findar em 10 de Outubro, e que a noção de trânsito em julgado significa, não outra coisa qualquer, mas, a impossibilidade de impugnação da decisão judicial pelos meios ordinários previstos na lei (reclamações e recursos ordinários), o que não se verificou antes de 10.10.2013 – cfr., neste mesmo sentido, o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, em 12-09-2011, proferido no processo 800/08.3PBVCT-A.G1 em que foi relator o Excelentíssimo Senhor Desembargador Fernando Monterroso, in www.dgsi.pt”.

O Mmº Juiz da 1ª instância proferiu então o seguinte despacho:

«O pedido ora apresentado pelos autores atém-se no seu essencial ao prazo atendível para considerar o trânsito da sentença. Se se deverá considerar o prazo de 30 dias ou, pelo contrário, o prazo de 40 dias, previsto quando “o recurso tiver por objeto a reapreciação da prova gravada.”

 Na situação em apreço não foi interposto recurso da sentença que foi proferida.

 Ora, para que as partes se possam aproveitar do prazo de recurso ampliado impõe-se que nas respetivas alegações impugnem efetivamente a matéria de facto com base na prova que foi gravada (neste sentido cfr. ac. da RC de 29.11.2007, CJ V, pág. 63 e ac. da RE de 15.11.2007, CJ V, 242, ac. STJ de 25.3.2010, in www.dgsi.pt).

 Nesta medida, se quando o recorrente não impugna a matéria de facto não pode beneficiar do acréscimo de 10 dias, quando não é interposto recurso, como foi o caso, o prazo do trânsito será o prazo de 30 dias.

 Em face do exposto, não merece qualquer reparo a data que a secção fez consignar na certidão que já emitiu.

 Quanto ao demais passe certidão da qual deverão constar os elementos que não se consignaram na que já foi emitida».

Inconformados com tal decisão vieram os AA. recorrer concluindo do seguinte modo as suas alegações de recurso:

A ) O despacho recorrido incorreu em erro de julgamento e de violação das normas legais referidas no artigo 628º do CPC, na redação resultante da Lei nº 41/2013 de 26-06 e antes no artigo 677º do CPC na redação anterior à Lei nº 41/2013 e dos nºs 1 e 7 do art. 685 do CPC na redação anterior – em que a sentença foi proferida e notificada – ao considerar e pressupor um prazo de 30 dias na determinação da data do trânsito em julgado da sentença proferida nos autos e que esta transitou em julgado em 30-09-2013. De facto,

B) A sentença proferida nos presentes autos foi notificada ao réu J (…)(imposto pelo disposto no art. 255º nº 4 do CPC na redação anterior) em 22-07-2013 já que a carta foi expedida em 18-07-2013 sendo 22-07-2013 o 3º dia útil seguinte, até 31-08-2013 os prazos estiveram suspensos por motivo de férias judiciais, e nos termos dos nºs 1 e 7 do art. 685 do CPC na redação anterior, correu prazo, não apenas de 30, mas de 40 dias de recurso com fundamento de impugnação da prova gravada, uma vez que tal possibilidade existia já que a prova foi efetivamente gravada: ou seja, quando há prova gravada, a decisão é suscetível de recurso até ao 40º dia, tendo o prazo de recurso com fundamento na impugnação da prova gravada e a possibilidade de interpor tal recurso findado assim, não em 30-09-2013, mas em 10-10-2013. Com efeito,

C) A necessidade de cumprir ónus prescritos para o efeito de impugnar a matéria de facto com base na prova gravada não afasta tal consideração, da mesma forma que no recurso sem que tenha havido prova gravada a necessidade de cumprir ónus prescritos (como o da formulação de conclusões e indicação de normas violadas) não afasta a consideração de a decisão ser suscetível de recurso. Como assim,

E) Em remédio da decisão recorrida e por imposição das referidas normas legais, deverão Vossas Excelências, Venerandos Desembargadores, anular a decisão recorrida e substituí-la por outra que considere e pressuponha um prazo de 30 dias acrescido de 10, ou seja, 40 dias na determinação da data do trânsito em julgado da sentença proferida nos autos e que esta transitou em julgado em 10-10-2013, e que determine assim que na certidão a emitir conste como menção à data do trânsito em julgado o dia 10-10-2013 e não qualquer outro – cfr- neste mesmo sentido, o Ac. do TRG de 12-09-2011, proferido no processo 800/08.3 PBVCT-A.G1 em que foi relator o Exº Sr. Desembargador Fernando Monterroso in www.dgsi.pt.

Requer a final a revogação da decisão recorrida.

Não foram apresentadas contra-alegações.

A factualidade a considerar consta do relatório supra.

É a seguinte a questão do recurso: - Se deve ser considerado o prazo adicional de 10 dias no cálculo do trânsito em julgado de sentença proferida na sequência de julgamento com prova gravada, ainda que, não tenha sido interposto qualquer recurso da mesma.

Nos termos do art. 628º do CPC “A decisão considera-se transitada em julgado logo que não seja suscetível de recurso ordinário ou de reclamação”.

Dispõe, por sua vez, o art. 638 do CPC que “O prazo para a interposição do recurso é de 30 dias e conta-se a partir da notificação da decisão, reduzindo-se para 15 dias nos processos urgentes e nos casos previstos no nº 2 do artigo 644º e no artigo 677º.”

Assim, nos processos não urgentes, ou fora dos casos tipificados no nº 2 do art. 644º e 677º do CPC, o trânsito em julgado efetiva-se pelo decurso do prazo de 30 dias.

Dispõe o art. 638 nº 7 do CPC que “Se o recurso tiver por objeto a reapreciação da prova gravada, ao prazo de interposição e de resposta acrescem 10 dias”.

Pretendem os apelantes que, ao trânsito em julgado não é indiferente o facto de o julgamento ter sido gravado, pois que, em tal hipótese, a parte pode recorrer do julgamento de facto, aproveitando-lhe o prazo adicional de 10 dias previsto no art. 638 nº 7 do CPC. E que, assim sendo, independentemente de ter sido ou não interposto recurso, o trânsito em julgado só ocorre esgotado o prazo perentório acrescido do prazo adicional, ou seja, o somatório de 40 dias de prazo.

Interpretação que não concedemos.

Como resulta claro da letra da lei, o legislador ao escrever “se o recurso tiver por objeto a reapreciação da prova gravada”, tal significa que tem de haver manifestação de recorrer e de recorrer para reapreciação da prova gravada, a fim de se preencher este concreto objeto de recurso previsto na norma, pois que, só ele permite beneficiar de um prazo adicional de 10 dias.

Não se basta a norma com a possibilidade de haver recurso de prova gravada, sem exercício do mesmo, pois que, se assim fosse, o prazo do recurso seria sempre acrescido de 10 dias, uma vez que a audiência final, na lei processual atual, é sempre gravada (art. 155 nº 1 do CPC).

Intenção que não foi a do legislador e que inequivocamente não se colhe da letra da lei. Se o legislador tivesse querido estender o prazo adicional de 10 dias a todos os julgamentos gravados, tê-lo-ia dito. Mas não foi o caso.

A mesma exigência de que o prazo adicional de 10 dias só poderia ser concedido se tivesse sido, efetivamente, interposto recurso sobre o julgamento de facto resultava da lei anterior (art.685 nº 7 do anterior CPC) que também previa a gravação da audiência, ainda que a mesma estivesse dependente de requerimento de uma das partes, e não fosse automática (art.522-B do anterior CPC).

Desse modo, esse prazo de 10 dias nunca entra no cálculo do trânsito em julgado, pois que, o mesmo pressupõe sempre a interposição de recurso ao julgamento de facto.

Assim, não é de acolher a posição defendida pelos apelantes, quanto ao momento em que transita em julgado a sentença, ainda que sustentada num acórdão da 2ª instância (criminal).

Em suma:

- Só com a efetiva interposição do recurso e com a incidência do mesmo sobre o julgamento de facto, se pode considerar que o recorrente beneficia do prazo adicional de 10 dias previsto no nº 7 do art. 638º do Código Processo Civil.

- Desse modo, esse prazo de 10 dias nunca entra no cálculo do trânsito em julgado, pois que, o mesmo pressupõe sempre a interposição de recurso ao julgamento de facto.

                                                                        *

Termos em que, acorda-se em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a decisão recorrida.

Custas pelos apelantes.

Coimbra,

Anabela Luna de Carvalho ( Relatora )

 João Moreira do Carmo

 José Fonte Ramos