Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
260/15.2T8GVA-B.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ALBERTO RUÇO
Descritores: ALIMENTOS
MENORES
MEDIDA DOS ALIMENTOS
Data do Acordão: 09/18/2018
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DA GUARDA - GOUVEIA - JUÍZO C. GENÉRICA
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO DE APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTS. 1878, 2004, 2012 CC
Sumário:
A prestação de alimentos devida pelo progenitor ao filho, nos termos dos artigos 1878.º, n.º 1 do Código Civil, deve ser fixada de harmonia com a capacidade do devedor angariar rendimentos e não apenas de acordo com rendimentos efetivamente percebidos no momento em que é proferida a decisão.
Decisão Texto Integral:


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Tribunal da Relação de Coimbra – 2.ª Secção.
Recurso de Apelação.
Processo n.º 260/15.2T8GVA-B Tribunal Judicial da Comarca da Guarda
Juízo de Competência Genérica de Gouveia
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Juiz relator…………....Alberto Augusto Vicente Ruço
1.º Juiz – adjunto…….José Vítor dos Santos Amaral
2.º Juiz – adjunto……..Luís Filipe Dias Cravo
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Sumário:
A prestação de alimentos devida pelo progenitor ao filho, nos termos dos artigos 1878.º, n.º 1 do Código Civil, deve ser fixada de harmonia com a capacidade do devedor angariar rendimentos e não apenas de acordo com rendimentos efetivamente percebidos no momento em que é proferida a decisão.
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Recorrente…………………...P (…)
Recorrida…………………… T (…)
I. Relatório
a) O recorrente P (…) requereu a alteração da pensão de alimentos referentes aos menores G (…) e V (…), seus filhos.
Alegou, no essencial, que não tinham condições para suportar a pensão de alimentos fixada em EUR 100,00 para cada um dos filhos, por se ter alterado a sua situação financeira.
Pediu a redução para EUR 50,00.
Teve lugar a realização de conferências de pais, foram produzidas alegações e provas e após audiência de julgamento foi proferida sentença a julgar a ação improcedente, mantendo-se as pensões nos mesmos montantes.
b) É desta sentença que vem interposto o recurso, cujas conclusões são as seguintes:
(…)
c) A recorrida não contra-alegou.
II. Objeto do recurso
De acordo com a sequência lógica das matérias, o recurso, em geral, deve cumpre começar pelas questões processuais, se as houver, prosseguindo depois com as questões relativas à matéria de facto e eventual repercussão destas na análise de exceções processuais e, por fim, com as atinentes ao mérito da causa.
Tendo em consideração que o âmbito objetivo dos recursos é balizado pelas conclusões apresentadas pelos recorrentes (artigos 639.º, n.º 1, e 635.º, n.º 4, ambos do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, o presente recurso coloca apenas duas questões:
Em primeiro lugar, verificar se a sentença é nula por contradição entre os factos provados e a fundamentação de facto apresentada e por ser omissa quanto à fundamentação de direito – artigo 615.º, n.º 1, al. a) do CPC.
Em segundo lugar, verificar se a pensão de alimentos para cada menor deve ser fixada 50,00 euros ou, pelo menos, em quantia inferior aos 100,000 euros atuais.
III. Fundamentação
a) Nulidade de sentença
Não ocorre a nulidade ou nulidades apontadas.
Nos termos da al. c), do n.º 2, do artigo 615.º do Código de Processo Civil a sentença é nula quando «Os fundamentos estejam em oposição com a decisão…».
Como referiu o Prof. Alberto dos Reis, «Quando os fundamentos estão em oposição com a decisão, a sentença enferma de vício lógico que a compromete. A lei quer que o juiz justifique a sua decisão. Como pode considerar-se justificada uma decisão que colide com os fundamentos em que ostensivamente se apoia?» e acrescenta, «Há contradição entre os fundamentos e a decisão quando «…os fundamentos invocados pelo juiz conduziriam logicamente, não ao resultado expresso na decisão, mas a resultado oposto» ( Código de processo Civil Anotado, Vol. V (reimpressão). Coimbra Editora, 1984. pág. 141.).
Repetindo, esta nulidade ocorre quando o juiz conduz a argumentação que consta da fundamentação da sentença num certo sentido e, depois, no dispositivo da sentença, tira uma conclusão inesperada, isto é, contraditória com a argumentação anterior.
É nisto que consiste a contradição apontada nesta norma.
Ora, tal contradição não ocorre no caso dos autos.
Nem ao nível da decisão sobre a matéria de facto, nem da fundamentação de direito.
Com efeito, se um leitor hipotético fizer o exercício de ocultar o dispositivo da sentença e ler de seguida apenas a respetiva fundamentação, se esse leitor tivesse de escrever a decisão após ter lido a fundamentação, concluiria no mesmo sentido que consta do dispositivo da sentença sob recurso, isto é, a conclusão (decisão) da sentença é a esperada face às premissas que o juiz fez constar da fundamentação.
Quando a parte discorda da fundamentação indicada na sentença, por exemplo, devido a eventual erro na aplicação do direito aos factos, tal discordância insere-se na questão jurídica de fundo, de mérito, mas não respeita a matéria de natureza processual, como é o caso das nulidades de sentença.
O mesmo raciocínio se aplica à parte dos factos declarados provados e à respetiva fundamentação ao nível da convicção.
Aliás, se algum erro houvesse nesta parte a reação adequada seria a impugnação da matéria de facto.
Improcede, por conseguinte, a invocada nulidade de sentença.
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Nos termos da al. b), do n.º 2, do artigo 615.º do Código de Processo Civil a sentença é nula quando «Não especifique os fundamentos de facto e de direitoque justificam a decisão».
Não ocorre esta nulidade.
A falta de fundamentação da sentença é um vício de natureza processual que tem a ver com a forma do ato «sentença» prescrita na lei processual, mas não com a matéria substantiva de que trata o processo.
Como referiram os autores Antunes Varela, J. Miguel Bezerra, Sampaio Nora, «A segunda causa de nulidade contemplada na disposição é a falta de fundamentação da sentença. Para que a sentença careça de fundamentação, não basta que a justificação da decisão seja deficiente, incompleta, não convincente; é preciso que haja falta absoluta, embora esta se possa referir só aos fundamentos de facto ou só aos fundamentos de direito» ( Manual de Processo Civil, 2.ª edição revista e atualizada. Coimbra Editora, 1985, pág. 687.).
Na jurisprudência o entendimento é o mesmo como se vê pelo Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15-12-2005 (Araújo Barros), em www.dgsi.pt, com referência ao n.º 05B2711:
«Para que uma decisão careça de fundamentação (incorrendo na nulidade prevista na alínea b) do nº 1 do artigo 668º do C.Proc.Civil) não basta que a sua justificação seja deficiente, incompleta ou não convincente: é preciso que haja falta absoluta, embora esta se possa referir só aos fundamentos de facto ou só aos fundamentos de direito» (sumário).
No mesmo sentido o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14-1-2014 (Gabriel Catarino), no processo n.º 1032/08.6TBMTA, em www.dgsi.pt:
«III - Só a total falta de fundamentação – e não a fundamentação deficiente, acrática e errática – induz a nulidade da decisão por falta de fundamentação (al. b) do n.º 1 do art. 615.º ex vi dos arts. 666.º e 679.º, todos do CPC)».
Não há qualquer dúvida que a sentença se encontra fundamentada de facto e de direito.
Improcede, por isso, a arguição desta nulidade.
b) Matéria de facto – Factos provados
1- G (…) nasceu em 30/12/2000 e é filho de P (…) e T (…).
2- V (…) nasceu em 30/12/2000 e é filho de P (…) e T (…)
3 - O requerente e a requerida regularam as responsabilidades parentais dos menores acima identificados, em relação aos alimentos, nos termos do acordo de folhas 24 a 29 dos autos principais, que se reproduz:
«Uma vez que ambos os requerentes exercem em conjunto o poder paternal sobre os menores, não haverá qualquer contribuição a título de alimentos.
Os progenitores suportarão em partes iguais as despesas extraordinárias com a saúde dos menores, de carácter médico e medicamentoso e com eventuais intervenções cirúrgicas, próteses, tratamentos de estomatologia e oftalmologia, bem como despesas escolares, mediante a apresentação dos respectivos documentos comprovativos».
4 - O requerente e a requerida alteraram a regulação das responsabilidades parentais dos menores acima identificados, em relação aos alimentos, nos termos do acordo de folhas 87 a 50 dos autos principais, que se reproduz:
«Alimentos e forma de os prestar
O pai pagará a título de alimentos aos menores a quantia mensal de € 50,00 (cinquenta euros) por cada menor, a entregar à mãe até ao dia 08 de cada mês, por transferência bancária (…). Mais acordam em manter as demais cláusulas do acordo junto aos autos».
5 - Por sentença proferida em 22/02/2017, transitada em julgado, a pensão de alimentos devida a cada um dos menores foi fixada em € 100,00;
6 - Em 31 de Maio de 2017, o requerente ficou desempregado por extinção do posto de trabalho, dado o encerramento da oficina onde trabalhava;
7 - O requerente passou a auferir o subsídio de desemprego no valor de € 18,96 por dia até ao dia 30/11/2017;
8 - A partir do dia 01/12/2017, este valor passou para € 17,06 por dia;
9 - O requerente qualificou-se como trabalhador independente e, para tal exercício de atividade, pediu em Dezembro de 2017 a suspensão do subsídio de desemprego;
10 - A renda de casa onde o requerente habita é no valor de € 220,00;
11 - O requerente sofreu um A.V.C. e para controlo de epilepsia toma medicação regular no montante de cerca de € 60,00;
12 - No consumo de internet despende a quantia de €71,00;
13 - O requerente mora com a sua companheira, compondo os dois o seu agregado familiar;
14 - A companheira do requerente aufere a quantia mensal de € 557,00;
15 - A requerida aufere a quantia mensal de € 607,00 de salário;
16 - O seu agregado familiar é composto pela mesma e pelos menores identificados nestes autos;
17 - A casa onde moram é arrendada e a renda é no valor de € 175,00 mensais;
18 - A requerida despende a quantia mensal de € 55,00 para pagamento de internet, € 30,00 pelo carregamento de telemóveis. € 14,00 para o passe de transporte escolar, € 140,00 em combustível para deslocação para o trabalho e € 90,00 para pagamento da prestação do recheio da casa e de um computador.
Matéria de facto – Factos não provados
1. No consumo doméstico de água, eletricidade e gás despende a quantia mensal de € 90,00;
2. Pelo seguro associado ao empréstimo para aquisição de habitação, o requerente despende a quantia de € 14,73;
3. O requerente despende mensalmente a quantia de cerca de €130,00 mensais;
4. O requerente paga de prestação de automóvel no valor mensal de € 100,00.
b) Apreciação da restante questão objeto do recurso
Vejamos então se a pensão de alimentos para cada menor deve ser fixada em 50,00 euros ou, pelo menos, em quantia inferior aos 100,000 euros atuais.
O recorrente argumenta que a sua situação económica sofreu uma alteração relevante, pois perdeu o emprego e decidiu prescindir do subsídio de desemprego para criar o seu próprio trabalho como trabalhador independente.
Perante este quadro factual alega que não pode pagar mais de €50,00 a cada filho.
O recorrente diz que «X. O certo é que não existe prova nos autos do que são as necessidades de sustento dos menores, e muito menos do que são as necessidades diárias/correntes dos menores, e qual o custo das mesmas».
Não existe tal prova porque os factos provados mostram existir consenso entre os pais quanto ao volume das necessidades dos filhos.
Este valor foi estabelecido entre o recorrente e a recorrida por acordo e, por isso, se o próprio recorrente chegou a esse acordo é porque sabia que as necessidades de cada filho demandavam da sua parte o pagamento de €100,00 a cada um deles.
O que o recorrente diz é que não pode agora pagar essa quantia, não diz que tal quantia seja excessiva devido ao facto das necessidades dos menores terem diminuído.
Por isso, não se entrará na quantificação das necessidades dos menores, mas apenas na questão de saber se a alteração do montante dos rendimentos angariados pelo recorrente implicam uma redução daquela pensão.
O recorrente argumenta que sim, porque ganhando menos, não pode pagar o mesmo.
Esta argumentação parece ser procedente, mas não o é como se vai procurar mostrar.
Os artigos 2004.º e 2012.º do Código Civil determinam que a obrigação de prestar alimentos deve ser proporcional aos meios daquele que houver de prestá-los e à necessidade daquele que houver de recebê-los.
Não se ignora que o requerente ficou desempregado e renunciou ao subsídio de desemprego para poder criar o seu próprio emprego.
Existiu, por isso, uma redução do seu rendimento mensal (ignorando-se se se mantém atualmente).
Porém, esta factualidade não implica que no contexto dos autos deva ser reduzida a prestação mensal, fundamentalmente pelas razões que determinaram a decisão do processo n.º 615/14.0T8STS-C do Tribunal Judicial da Comarca do Porto – Santo Tirso – Instância Central – 4.ª Secção Família e Menores, que o ora relator relatou, embora o fundo factual fosse aí diverso.
Com efeito, os pais, como é de todos sabido e os progenitores o assumem nos autos, como não podia deixar de ser, estão obrigados a contribuir para os alimentos dos filhos (artigo 1878.º, n.º 1, do Código Civil).
O sustento não pode ser assegurado unicamente ou principalmente pelo progenitor com o qual vivem os filhos e que, por isso, dada a imperatividade da situação de facto, não pode deixar de prestá-los, ainda que para tanto recorra à boa vontade de terceiros ou deixe de se alimentar a si próprio.
Por conseguinte, cada um dos progenitores tem de contribuir dentro do que lhe for humanamente possível para a alimentação dos filhos e se alguém tiver de fazer sacrifícios ou passar necessidades, tal situação deve onerar, em regra, os progenitores.
Esta oneração colocada a cargo dos progenitores funda-se, entre outras razões, no facto dos menores serem seres humanos em formação e desenvolvimento e na circunstância do seu futuro depender, em regra, desta formação e deste desenvolvimento; em contrapartida, os progenitores já passaram por essa fase e embora possam melhorar as suas vidas e fazer hoje o que não fizeram nessas idades, já nada ou muito pouco podem fazer para «alterar» o passado.
Daí que o interesse dos menores deva prevalecer, por ser atual e prioritário em relação ao interesse dos progenitores.
Por outro lado, a prestação de alimentos deve ser fixada de harmonia com a capacidade do devedor angariar rendimentos e não apenas de acordo com rendimentos efetivamente percebidos e provados no momento em que é proferida a decisão ( Neste sentido ver, entre outros, acórdão do TRL de 26 de Junho de 2007 (Abrantes Geraldes) no processo n.º 5797/2007; acórdão do TRG de 7 de Dezembro de 2010 (A. Costa Fernandes), no processo n.º 383/07.1TMBRG-A; acórdão do TRG de 3 de Março de 2011 (Antero Veiga), no processo n.º 53/08.0TMBRG; acórdão do TRP de 21-06-2011 (M. Pinto dos Santos) no processo n.º 1438/08.0TMPRT; acórdão do TRL de 14 de Julho de 2011 (Jorge Leal), no processo n.º 636/07.0TBAMD; acórdão do TRG de 10 de Outubro de 2011 (Maria Luísa Ramos), no processo n.º 129/06.1TMBRG-B; acórdão do TRL de 25 de Outubro de 2011 (Rui Vouga), no processo n.º 3653/08.8TBAMD; acórdão do TRP de 29-11-2011 (Ondina Carmo Alves) no processo 2213/09.0TMPRT; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29 de Março de 2012 (João Trindade), no processo n.º 2213/09.0TMPRT; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22 de Maio de 2012 (João Camilo), no processo n.º 5168/08.5TBAMD; acórdão do TRP de 15-11-2012 (José Ferraz) no processo 7737/10.4TBVNG; acórdão do TRL de 18 de Dezembro de 2012 (Tomé Gomes), no processo n.º 838/10.0T2AMD; acórdão do TRC de 12-3-2013 (Moreira do Carmo) no processo 648/12.0TBTNV-A; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 8 de Maio de 2013 (Lopes do Rego), no processo n.º 1015/11.9TMPRT; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22 de Maio de 2013 (Gabriel Catarino), no processo n.º 2485/10.8TBGMR; acórdão do TRG de 12 de Novembro de 2013 (Edgar Valente), no processo n.º 3339/12.9TBGMR; acórdão do TRG de 13 de Março de 2014 (António Santos), no processo n.º 251/13.8TBGMR e acórdão do TRG de 29 de Setembro de 2014 (Ana Cristina Duarte), no processo n.º 627/13.7TBGMR, todos em www.dgsi.pt.
Ver ainda o estudo de Maria Amália Pereira dos Santos, «O dever (judicial) de fixação de alimentos a menores», in Revista Julgar, On line 2014, onde se concluiu que «As razões expostas são, em nosso entender, mais do que suficientes para se poder concluir que deverá ser fixada, em regra, uma pensão de alimentos a menores que deles careçam, independentemente da precária ou desconhecida situação económica do progenitor a quem o menor não fique confiado».).
Com efeito, como refere Remédio Marques ( Algumas Notas Sobre Alimentos (Devidos a Menores), 2.ª Edição revista. Coimbra Editora, 2007, pág. 72/73), «…os referidos direitos-deveres dos progenitores para com os menores são sempre devidos, independentemente dos seus recursos económicos e do estado de carência económica dos filhos, posto que se trata de direitos cujo exercício é obrigatório e prioritário em atenção à pessoa e aos interesses do menor. Na nossa opinião, não tem aplicação, nestas eventualidades, o disposto no art. 2004º/1 do CC, de harmonia com o qual, e ao derredor do princípio da proporcionalidade se deve atender às possibilidades económicas do devedor, para o efeito de fixar a obrigação de alimentos. Donde, faz-se mister fixar-se sempre uma prestação de alimentos a cargo de um ou de ambos os progenitores, mesmo que estes estejam desempregados e não tenham meios de subsistência. Não se esqueça que, como iremos ver, a capacidade de trabalho é um elemento atendível na fixação da obrigação, mesmo que se esteja temporariamente sem trabalho».
Acrescentando o autor que o nascimento da obrigação de alimentos é, sobretudo, condicionado pela situação de necessidade do menor, e não pelas possibilidades do progenitor, pelo que, diz, «Mesmo que os progenitores ou algum deles não tenha possibilidades económicas actuais de prover ao sustento do menor – por se encontrar, por exemplo, desempregado ou a cumprir uma pena privativa de liberdade –, deve decretar-se essa obrigação, ainda que os montantes fixados sejam reduzidos» ( Ob. cit., pág. 191.).
E deve ser sempre fixada porque a respetiva fixação é condição indispensável para, em caso de incumprimento, poder ser colmatada pelo FGADM, nos termos do artigo 1.º da Lei 75/98 de 19 de Novembro ( Neste sentido, acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 28-04-2010, no processo n.º 1810/05.8TBTNV-A.
).
Por conseguinte, o tribunal deve realizar uma ponderação com base no passado conhecido dos progenitores, neste caso do pai relativamente à capacidade que mostrou ter para realizar rendimentos; no presente, face aos factos apurados nos autos; no futuro, tanto quanto os factos do passado e do presente o permitem prever.
Provou-se que «6 - Em 31 de Maio de 2017, o requerente ficou desempregado por extinção do posto de trabalho, dado o encerramento da oficina onde trabalhava;
«7 - O requerente passou a auferir o subsídio de desemprego no valor de € 18,96 por dia até ao dia 30/11/2017;
«8 - A partir do dia 01/12/2017, este valor passou para € 17,06 por dia;
9 - O requerente qualificou-se como trabalhador independente e, para tal exercício de atividade, pediu em Dezembro de 2017 a suspensão do subsídio de desemprego».
«14 - A companheira do requerente aufere a quantia mensal de € 557,00;
15 - A requerida aufere a quantia mensal de € 607,00 de salário».
Estes factos mostram, afortunadamente, que o recorrente é uma pessoa com iniciativa, empreendedora e que tem capacidade de trabalho, a qual lhe trará rendimentos.
Prova isto o facto de ter optado por prescindir do subsídio de desemprego, porquanto certamente verificou que lhe era possível singrar profissionalmente como trabalhador independente (o requerente tinha a profissão de pintor de automóveis – fls.9).
Acresce que estamos apenas perante uma fase de transição na vida laboral do Recorrente, que pode, inclusive (é uma das hipóteses possíveis), estar superada neste momento, não sendo apropriado solicitar uma alteração da prestação alimentar cada vez que haja alguma flutuação nos rendimentos.
Por fim, dir-se-á que o Recorrente também beneficia do facto de viver em união de facto e muito embora se concorde com o Recorrente, no sentido do outro membro da união de facto não ter o dever de contribuir para os alimentos dos filhos do outro membro, na prática isso não acontece porque a dinâmica doméstica acaba sempre por beneficiar o elemento da união de facto mais carecido e indiretamente os filhos deste beneficiarão da proteção dada ao primeiro.
Concluindo.
As necessidades dos menores mantêm-se as mesmas que existiam à data em que foi fixada, por acordo, a prestação de 100 euros mensais para cada menor.
A prestação de alimentos deve ser fixada de harmonia com a capacidade do devedor angariar rendimentos e não apenas de acordo com rendimentos efetivamente percebidos e provados no momento em que é proferida a decisão.
O Recorrente perdeu o emprego em maio de 2017, começou a receber o respetivo subsídio de desemprego e em dezembro do mesmo ano prescindiu desta verba para iniciar uma atividade como trabalhador independente, sendo desconhecidos os seus proventos.
Trata-se de uma situação de transição que na perspetiva do requerente é a adequada ao restabelecimento da sua atividade profissional de pintor de automóveis, a qual pode até já estar concluída com êxito neste momento (é uma das hipóteses possíveis).
Por estas razões, não há fundamento para alterar a prestação que estava a seu cargo.
IV. Decisão
Considerando o exposto, julga-se o recurso improcedente e mantém-se a sentença recorrida
Custas pelo recorrente.
*
Coimbra, 18 de setembro de 2018
Alberto Ruço ( Relator )
Vítor Amaral
Luís Cravo