Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
644/11.5PFAVR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ELISA SALES
Descritores: ROUBO
VIOLÊNCIA
Data do Acordão: 05/30/2012
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: BAIXO VOUGA - JUÍZO DE MÉDIA INSTÂNCIA CRIMINAL DE AVEIRO - JUIZ 3
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: PARCIALMENTE REVOGADA
Legislação Nacional: ART.º 210º, DO C. PENAL
Sumário: A violência típica do crime de roubo é a violência específica do próprio acto apropriativo sob a forma de emprego de força física, maior ou menor, não se impondo que ela vá além do necessário e tendente ao apoderar do bem.

Todo o emprego da força física contra a pessoa ofendida, à luz do escopo de alcançar a apropriação, cai sob a alçada do tipo legal do crime de roubo.

É o que se verifica, ainda que nenhum dos arguidos tenha batido no ofendido, sendo que, com o constrangimento a que este foi submetido, foi posta em causa a sua liberdade, tendo o mesmo ficado tolhido nos seus movimentos.

Decisão Texto Integral: I - RELATÓRIO

No processo comum n.º 644/11.5PFAVR supra identificado, após a realização da audiência de julgamento foi proferido acórdão que decidiu:
a) Considerar que todos os arguidos praticaram, na pessoa de A..., um crime de roubo, p. e p. pelo artigo 210º, nº 1, do Código Penal, e não um crime de furto, p. e p. pelo artigo 203º, nº 1, do mesmo diploma, como da acusação consta;
b) Absolver o arguido B... da prática de um crime de furto, p. e p. pelo artigo 203º, nº 1, do Código Penal;
c) Absolver o arguido B... da prática de um crime de roubo, p. e p. pelo artigo 210º, nº 1, do Código Penal;
d) Absolver o arguido B... da prática de um crime de roubo, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 210º, nº 1, 22º e 23º, do Código Penal;
e) Absolver o arguido C... da prática de um crime de furto, p. e p. pelo artigo 203º, nº 1, do Código Penal;
f) Absolver o arguido C... da prática de dois crimes de roubo, p. e p. pelo artigo 210º, nº 1, do Código Penal;
g) Absolver o arguido D... da prática de um crime de furto, p. e p. pelo artigo 203º, nº 1, do Código Penal;
h) Absolver o arguido D... da prática de um crime de roubo, p. e p. pelo artigo 210º, nº 1, do Código Penal;
i) Absolver o arguido E... da prática de um crime de furto, p. e p. pelo artigo 203º, nº 1, do Código Penal;
j) Absolver o arguido E... da prática de dois crimes de roubo, p. e p. pelo artigo 210º, nº 1, do Código Penal;
k) Condenar o arguido B..., pela prática de um crime de furto, p. e p. pelo artigo 203º, nº 1, do Código Penal, na pena de 1 (um) ano de prisão;
l) Condenar o arguido B..., pela prática de 4 (quatro) crimes de roubo, p. e p. pelo artigo 210º, nº 1, do Código Penal, na pena de 2(dois) anos e 6 (seis) meses de prisão por cada um dos crimes;
m) Em cúmulo jurídico, condenar o arguido B... na pena única de 6 (seis) anos de prisão;
n) Condenar o arguido C..., pela prática de 2 (dois) crimes de roubo, p. e p. pelo artigo 210º, nº 1, do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão por cada um dos crimes;
o) Em cúmulo jurídico, condenar o arguido C... na pena única de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de prisão, não suspensa na sua execução;
p) Condenar o arguido D..., pela prática de 2 (dois) crimes de roubo, p. e p. pelo artigo 210º, nº 1, do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão por cada um dos crimes;
q) Em cúmulo jurídico, condenar o arguido D... na pena única de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de prisão, não suspensa na sua execução;
r) Condenar o arguido E..., pela prática de 2 (dois) crimes de roubo, p. e p. pelo artigo 210º, nº 1, do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão por cada um dos crimes;
s) Em cúmulo jurídico, condenar o arguido E... na pena única de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de prisão, não suspensa na sua execução.


***

Os arguidos C... e B... não se conformaram com a decisão proferida em 1ª instância, e dela interpuseram recurso, tendo extraído das respectivas motivações as seguintes conclusões ([1]):


A- Motivação do arguido C...:  

I - O presente recurso tem como objecto toda a matéria de facto e de direito do Acórdão proferido nos presentes autos.

II - O recorrente vinha acusado de :

1. Ter, no dia  … de 2011, pelas 13h30m, na companhia de B..., E... e um quarto indivíduo não identificado, se aproximado de F..., o rodeado, desferido pontapés nas costas e pernas, retirado dos bolsos a quantia de € 16, umas sapatilhas da marca "Lacoste", um cinto em imitação de pele e uma carteira com documentos pessoais (cfr. ponto 3 da acusação).

2. "No dia  … 2011, pelas 10 horas, os arguidos B..., C..., D... e E... entraram numa Igreja sita na Rua … , em Aveiro, onde ... e A... se encontravam a dormir. Logo depois, os arguidos atiraram o ... para cima da cama e agarraram-no. A seguir, os quatro arguidos colocaram-se em cima do mesmo, tirando-lhe 15€. A seguir, os arguidos meteram as mãos nos bolsos das calças do Vasyl, retirando-lhe um telemóvel, da marca "LG", no valor de 100€, e 15€ em numerário" (cfr. ponto 5 da acusação)

3. De ter no dia  … de 2011, pela 14h30m, em conjunto com B..., D... e E..., se aproximado de ..., tendo-lhe sido retirado um telemóvel e 80€ em numerário. (cfr. ponto 6 da acusação).

4. Pelos factos supra descritos foi acusado de: "um crime de furto, p. e p. pelo art. 203°, n.º 1, do Código Penal e três crimes de roubo, p. e p. pelo art. 210°, n.° 1, do Código Penal"

III - Nos termos do Acórdão, ora objecto de recurso, o recorrente foi condenado:
1. "pela prática de 2 (dois) crimes de roubo, p. e p. pelo artigo 210°, n.° 1, do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão por cada um dos crimes;"
2. "Em cúmulo jurídico, [...] na pena única de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de prisão, não suspensa na sua execução;"

IV - O arguido foi correctamente absolvido da prática de um crime de furto e dois crimes de roubo de que vinha acusado.

V - Quanto aos autos de reconhecimento foi considerado no douto Acórdão que os mesmos se encontravam feridos de invalidade, não valendo por si como meios de prova.

VI - No entanto nas suas motivações o douto acórdão parece querer suprir essa invalidade com os depoimentos dos ofendidos afirmando que "Quanto às testemunhas/ofendidos ... e A..., deve salientar-se que os mesmos referiram que já antes conheciam todos os arguidos, e que se encontravam juntos aquando da abordagem de que foram vitimas por parte de todos os arguidos, os quais em audiência de julgamento identificaram também de forma peremptória, e sendo certo que mostraram mesmo conhecer os nomes dos arguidos B...e E..."

VII - Salvo o devido respeito por opinião contrária, afigura-se-nos não assistir razão ao douto acórdão, tanto quanto aos factos considerados provados supra mencionados, como quanto às motivações que levaram à convicção dos mesmos e à convicção de um reconhecimento peremptório do arguido, agora recorrente, por parte dos ofendidos em sede de audiência de Julgamento.

VIII - Do depoimento do ofendido ... prestado na audiência do dia 22-11-2011 entre as 11:25:34 e as 11:42:27 e do ofendido A... prestado na audiência do dia 21-12-2011 entre as 14:34:38 e as 11:42:55 não se comprovam de forma peremptória os factos supra mencionados, assim como o que foi alegado nas motivações quanto ao reconhecimento dos arguidos conforme se passa a demonstrar.

IX - Desde logo quanto às motivações e ao reconhecimento:

1. No seu depoimento o ofendido ... afirma categoricamente nunca ter visto os arguidos anteriormente (cfr. minutos 2:00);

2. Entre os minutos 6:20 e 7:30 afirma que durante no reconhecimento os arguidos serviam de figurantes uns aos outros.

3. Nunca se refere por nome os arguidos B...e E..., tendo o nome deste último sido referido apenas por uma terceira pessoa aquando da identificação da pessoa que estaria junto ao ofendido A...

4. Do depoimento de A... é difícil entender alguma coisa, sendo claro que este entende extremamente pouco de português, devendo ter sido chamado um intérprete.

5. Tenho uma certa relutância em considerar o pouco que foi balbuciado pela testemunha, na forma de quase monossílabos, existindo sérias dúvidas dele ter entendido verdadeiramente alguma das perguntas que lhe foram feitas, existindo fortes contradições e auto-negações.

6. E tendo dificuldades em entender mesmo as perguntas referentes à sua própria identificação, ou em Jurar dizer a verdade.

7. No entanto também ele nunca referiu o nome de nenhum dos dois arguido, referindo-se ao que lhe tirou o telemóvel como "ele, o primeiro" (cfr. Min 9 do depoimento), tendo o nome B... sido referido por uma terceira pessoa.

8. Ao min 10 diz claramente que foi a primeira vez que os viu.

9. Aquando da audiência de julgamento o reconhecimento já sofria de falta de espontaneidade, pois a sua opinião já estava viciada pelo facto deste mesmo lhe terem sido apresentados anteriormente sem figurantes.

X - Quanto ao facto considerado como provado " (5) No dia  … de 2011, pela 10 horas, os arguidos B…, C..., D... e E... entraram numa Igreja sita na Rua do Carmo, em Aveiro, onde ... e A... se encontrava a dormir.":

1. No seu depoimento o ofendido ... afirma quanto ao facto que estava "eu e um colega meu sentados à beira da cama com a porta aberta", que o local onde estavam "fica num quiosquezinho ao lado da Igreja do Carmo", que se deram "no fim da manhã" algures este ano (2011) (cfr. do minuto 1 ao minuto 2 do seu depoimento);

2. Já o ofendido A... tanto afirma por volta do minuto 5:45 que foi há mais ou menos 2 anos, como ao minuto 12:00 diz dois a 3 meses.

3. Nenhuma das 2 datas corresponde nem de perto, nem de longe à data dos factos considerados provados.

XI - Quanto ao facto considerado como provado " (6) Logo, depois, os arguidos atiraram o ... para cima da cama e agarram-no":

1. No seu depoimento o ofendido ... afirma que "um dos 3 empurrou-me para cima da cama" (por volta do min. 3:40),

2. ficando ao longo de todo os seu depoimento clara a ideia de que apenas um dos arguidos o empurrou e se sentou em cima dele

3. e não todos os arguidos conforme o que se considerou como facto provado no douto acórdão;

4. Apesar de tudo o ofendido não consegue identificar quem o empurrou e se sentou em cima de si;

5. Do depoimento de A... quanto a este facto apenas se retira por volta do minuto 9:00 do mesmo que um lhe tirou o Telemóvel e outros estavam com o  …

XII - Quanto ao facto considerado como provado " (7) A seguir, os quatro arguidos colocaram-se em cima do mesmo, tirando-lhe 15€":

1. No seu depoimento o ofendido ... não diz que foram os 4 arguido que se colocaram em cima de si, tirando-lhe 15€.

2. Ao minuto 2:58, ao lhe ser perguntando quem lhe meteu a mão ao bolso ele respondeu que foi apenas 1

3. Logo a seguir identifica um dos arguidos como quem lhe meteu a mão ao bolso para posteriormente, ao minuto 3:24 afirmar "o colega dele é que me retirou a carteira e depois passou para este atrás"

4. Dizendo ao minuto 3:36 "Este ficou sentado à beira da cama do meu colega e os outros 3 ficaram de pé ... um dos três empurrou-me para cima da cama e um deles meteu-me a mão do bolso e passou para este ... " "e depois devolve-me a carteira sem o dinheiro"

5. Pelo minuto 16:00 volta a referir expressamente "tirou-me a carteira passou-ma para este, este tirou-me os 15€ e depois deu-me novamente a carteira ... " - Referindo-se ao arguido C…quando se refere-a este.

6. Quanto a qual dos outros 3 se sentou em cima de si e lhe retirou a carteira do bolso o ofendido nunca conseguir identificar que foi essa pessoa.

7. O ofendido A...nada refere quanto a este ponto.

XIII - Quanto ao facto considerado como provado " (8) A seguir, os arguidos meteram as mãos nos bolsos das calças do B…, retirando-lhe um telemóvel, no valor de 100€ e 15€ em numerário.":

1. Do depoimento do ofendido ..., não se retira o valor de 100€ do Telemóvel em questão.

2. Desse mesmo depoimento, tanto de expressão já transcritas como de outras resulta a ideia de que apenas um dos arguidos se encontrava junto ao ofendido A....

3. De facto, o mesmo é afirmado no pouco que se entende do depoimento do ofendido A..., com a única diferença de que ... identifica  … como essa pessoa e A... identifica B...

4. Não foi junta qualquer prova material do valor do telemóvel em causa.

XIV - Consequentemente os factos 9), 12), 13), 14) e 15) também devem ser incorrectamente considerados como não provados e assim, os factos pelo qual o arguido foi acusado foram incorrectamente julgados como provados.

XV - Fica claro das gravações da audiência de Julgamento que o ofendido A... tem muito pouco domínio do Idioma português, devendo ter sido nomeado um intérprete para o mesmo nos termos do art. 92°/2 CPP.

XVI - Existem sérias dúvidas de que o mesmo entendeu as questões que lhe foram colocadas, respondendo em algumas situação de forma díspar e até contraditória às mesmas perguntas.

XVII - Tal depoimento não deveria ser valorado devendo ser considerado nulo nos termos do art. 120º do CPP.

XVIII - Sem prescindir e admitindo por mera hipótese académica como provados os factos em que assentou a sentença objecto de recurso, constatamos, claramente, que face à factualidade dada como provada em juízo e ao Direito aplicável, a pena aplicada revela-se pouco criteriosa e desequilibradamente doseada.

XIX - O Tribunal a quo violou, como segundo se demonstrará, o disposto no artigo 71° do Código Penal, por incorrecta e imprecisa aplicação.

XX - Considerando os escassos factos provados sobre as concretas circunstâncias da prática dos crimes, a ausência de quaisquer alusões ou considerações quer aos sentimentos manifestados no seu cometimento e os fins ou motivos que o determinaram - quer sobre a personalidade do agente, a sua integração social, as suas condições pessoais, nomeadamente familiares -, deverão pender a favor do arguido, seja por aplicação do princípio geral "in dubio pro reo", seja pelo facto da falta de fundamentos para penalizar o arguido.

XXI - Afirmar que "o arguido ... actuou com considerável grau de ilicitude e intensidade do dolo» carece de fundamentação e de explicação,

XXII - Tal como não fundamentou, na perspectiva da defesa, a culpa do arguido, também descurou, o Tribunal a quo na determinação das exigências de prevenção, nomeadamente, as exigências de prevenção especial.

XXIII - Desde logo o tribunal a quo considerou que pesou desfavoravelmente contra o arguido o facto do mesmo ter actuado com dolo directo.

XXIV - Mas dos factos considerados provados não resulta que o aqui recorrente, ao apropriar-se de coisa alheia tenha previsto e tido intenção de o fazer, por meio de "violência contra uma pessoa, ou ameaça com perigo iminente para a vida ou integridade física, ou colocando-a na impossibilidade de resistir - artigo 210º  n.º 1 CP"

XXV - No caso do aqui recorrente o dolo seria eventual, nos termos do art. 14º/3CP, situação em que o agente representa, prevê como possível que da sua actuação possa ocorrer um determinado resultado lesivo, um determinado tipo crime. E actua conformando-se com a possibilidade dessa realização, actua conformando-se com a possibilidade de a sua actuação desencadear a ocorrência do facto típico por ele previsto.

XXVI - De facto, tudo leva a esta conclusão. Nenhum dos arguidos estava armado, o único acto de violência presente nos factos provados foi o empurrão do Sr. ... para cima da cama por um dos arguidos (nunca chegando este a identificar quem o fez), não foi efectuada qualquer ameaça nem resultou qualquer lesão física para os ofendidos (o que demonstra que o grau de violência foi diminuto) e as quantias subtraídas foram igualmente reduzidas.

XXVII - Nesse mesmo sentido de, em similar situação, considerar que não existiu dolo directo vai o Acórdão do STJ de 04/29/2004 ao afirmar que "1 - Tem o Supremo Tribunal de Justiça reflectido que não é de fazer uso da faculdade de atenuação especial prevista no art. 4° do DL n.° 401/82, de 23 de Setembro, quando é grande o grau de ilicitude dos factos praticados pelo arguido e é grave a sua culpa, na forma de dolo directo. Não é o caso de um crime de roubo não agravado em que não se usou de armas ou de violência física e em que a importância retirada ao ofendido era de diminuto valor e foi depois recuperada,"

XXVIII - O Tribunal a quo também pesou desfavoravelmente contra o arguido uma intensidade do grau da ilicitude da sua conduta acima do médio.

XXIX - Não se entende porém, como se pode considerar que a intensidade do grau de ilicitude da conduta do arguido é acima da média e ao mesmo tempo considerar que não estão presentes nenhumas das condições agravantes do crime de roubo previstas no art. 210º n.º 2 e 3 do CP.

XXX - "Assim, concretizando, o grau de ilicitude dos factos situa-se na mediania, com modo de execução atinente à apropriação visada, sem exceder, em sede de violência, a normalmente necessária ao resultado pretendido mas, de algum modo, sempre mais agravativa perante a mencionada circunstância de localização do ofendido - em estação de metropolitano.

As consequências do crime patrimonialmente, no reduzido valor referido -, foram dissipadas dada a intervenção policial." (cfrs Ac. do STJ supra mencionado)

XXXI - Quanto às exigências de prevenção deveremos ter igualmente em conta o referenciado no acórdão supra mencionado quando remete para Anabela Miranda Rodrigues e afirma e transcreve que "É, pois, o próprio conceito de prevenção geral de que se parte que justifica que se fale aqui de uma «moldura» de pena. Esta terá certamente um limite definido pela medida de pena que a comunidade entende necessária à tutela das suas expectativas na validade das normas jurídicas: o limite máximo da pena. Que constituirá, do mesmo passo, o ponto óptimo de realização das necessidades preventivas da comunidade. Mas, abaixo desta medida de pena, outras haverá que a comunidade entende que são ainda suficientes para proteger as suas expectativas na validade das normas - até ao que considere que é o limite do necessário para assegurar a protecção dessas expectativas. Aqui residirá o limite mínimo da pena que visa assegurar a finalidade de prevenção geral; definido, pois, em concreto, pelo absolutamente imprescindível para se realizar essa finalidade de prevenção geral e que pode entender-se sob a forma de defesa da ordem jurídica (mesma obra, pág. seguinte). A prevenção especial, por seu lado, é encarada como a necessidade de socialização do agente, embora no sentido, modesto mas realista, de o preparar para no futuro não cometer outros crimes. "Resta acrescentar que, também aqui, é chamada a intervir a culpa a desempenhar o papel de limite inultrapassável de todas e quaisquer considerações preventivas ... " (ainda a mesma obra, pág. 575). "Sendo a pena efectivamente medida pela prevenção geral, ela deve respeitar o limite da culpa e, assim, preservar a dignidade humana do condenado" (pág. 558). "

XXXII - Por último o Tribunal a quo apresentar como desfavorável ao arguido falta de arrependimento.

XXXIII - No entanto o arrependimento não pode ser valorado na determinação da pena nos termos dos artigos 70° e 71° do CP como uma agravante da pena, poderá sim ser considerado uma circunstância de atenuação especial da pena nos termos dos artigos 72° e 73° do CP.

XXXIV - O Tribunal ad quo errou ao não considerar a idade do arguido à data dos factos (18 anos) decidindo pela não aplicação do Regime Especial para Jovens entre os 16 e 21 anos de idade.

XXXV - Atendendo que a moldura mínima do crime de roubo é 1 ano, que a violência existente foi mínima e sem lesões aparentes, que não existiu qualquer tipo de arma, e ao valor reduzido dos bens em causa, não se vêm como os factos podem ser considerado de gravidade suficiente para obstar à aplicação deste regime especial e quanto ao arrependimento este não é condição de aplicabilidade desse mesmo regime.

XXXVI - O Tribunal a quo também não toma em favor do arguido o facto de ele mal falar Português, facto que aumenta a severidade da pena de prisão, (pena esta da qual este já cumpriu quase um ano em prisão preventiva e que continua a cumprir).

XXXVII - Também erradamente não considera que apesar das dificuldades de comunicação, o relatório social referido no Acórdão de que agora se recorre indicar que o arguido sente alguma intimidação com a reclusão efectuada até ao momento, demonstrando existir neste caso concreto vantagens para a reinserção através da atenuação especial.

XXXVIII - O arguido apesar da sua baixa educação e pobres condições económicas, sempre trabalhou, e levou uma vida honesta até então, e apesar de condenado por dois roubos estes foram simultâneos, revelando-se este um acto isolado.

XXXIX - Neste sentido vai também o acórdão supra mencionado:

"Ressalvados aqueles casos de grande gravidade, deve fazer-se uso do disposto no art. 4º do DL n.º 401/82, de 23 de Setembro e, por força dessa norma, a pena deve ser especialmente atenuada, em relação a jovens de 16/18 anos de idade que são julgados pela primeira vez em processo-crime, mesmo que o seu passado, antes de atingirem a imputabilidade penal, não seja abonatório."

XL - Ao condenar o arguido em três anos e seis meses de prisão pela prática de 2 crimes de roubo, p. e p. pelo artigo 210º n.° 1 do CP, o Tribunal a quo violou, por conseguinte, o disposto no artigo 71° do Código Penal, traduzindo-se a pena aplicada numa pena demasiado severa, atenta a factualidade considerada e a incorrecta fundamentação da douta decisão.

XLI - As penas parcelares impostas ao ora recorrente são excessivas e devem ser reduzidas para os respectivos limites mínimos, e a pena única resultante do cúmulo jurídico deverá, consequentemente, ser reformada e substancialmente reduzida.

XLII - Por último tendo em conta a personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, já supra mencionados, o Tribunal ad quo deveria ter decidido pela suspensão da pena de prisão.

XLIII - No entanto decidiu não o fazer, tendo em conta por um lado a prevenção geral, e por outro lado tendo o facto de o arguido se deslocar com facilidade entre Portugal e a Roménia dificultando o regime de prova imposto pelo art. 53°/3 do CP

XLIV - Quanto à prevenção geral, critério já valorado ao determinar a duração da pena em concreto, não faz parte dos critérios determinantes da suspensão da pena, nos termos do art. 50° CP.

XLV - Quanto à dificuldade em aplicar o regime de prova do art. 53° / 3 do CP, o Tribunal ad quo, prejudica o arguido pelo facto dos mesmo ser menor de 21 anos, quando todo o Regime de Jovens Delinquentes existe para beneficiar os mesmos e a sua reinserção na sociedade, subvertendo todo o Regime de Jovens Delinquentes e a própria norma plasmada no art. 53°/3 do CP.

Termos em que e nos demais de direito deve ser dado provimento ao presente recurso e, por via dele, ser revogada a sentença recorrida e, em consequência, e subsidiariamente

- Ser o recorrente absolvido dos dois crimes de roubo em que foi condenado,

- Ser substituída por outra sentença com penas coadunadas com a pretensão exposta.


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B- Motivação do arguido B...:  

I - Perante a prova produzida em audiência de julgamento, deve considerar-se que o recorrente cometeu contra a pessoa de A... um crime de furto, ao invés de um crime de roubo.

II - Deve, ainda, ser tida em conta, em favor do recorrente, a diminuta violência levada a cabo pelo recorrente contra ..., na prática do crime de roubo contra este.

III - Ao não considerar esta circunstância, violou o Tribunal a quo o artigo 71º, n.º 2, alínea a), do Código Penal.

IV - Deve ainda o recorrente beneficiar de uma atenuação especial da pena, em razão da idade que apresenta, à data da prática dos factos, bem como, em virtude da situação de desprotecção, de desenraizamento e de desintegração, enquanto imigrante, trabalhador precário e carente de ajuda com vista à sua integração social.

V - Circunstâncias que não foram, devidamente, consideradas pelo Tribunal a quo, violando, assim, o disposto no artigo 4º do Decreto-Lei n.º 401/82, de 23 de Setembro.

Termos em que deve ser dado provimento ao presente recurso e, por via dele, ser revogado o acórdão recorrido, tudo com as legais consequências.


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Respondeu o Magistrado do Ministério Público junto da 1ª instância defendendo a improcedência de ambos os recursos.
Nesta instância o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no mesmo sentido, acompanhando a resposta do colega junto do tribunal recorrido.
Cumprido o disposto no n.º 2 do artigo 417º do CPP, os arguidos não responderam.

Os autos tiveram os vistos legais.


***


II- FUNDAMENTAÇÃO

Consta da decisão recorrida (por transcrição):

A) FACTOS  PROVADOS

1) No dia  … de 2011, pelas 12h30m, o arguido B... e um outro indivíduo de identidade não apurada encontravam-se na Rua … , em Aveiro, a exercer a actividade de “arrumadores” de veículos automóveis, e, ao se aperceberem que  … se dirigia à sua viatura automóvel, aproximaram-se da mesma, pedindo-lhe dinheiro.

  2) Tendo-lhes ela respondido que não possuía dinheiro, o arguido B... retirou-lhe a carteira que a mesma levava consigo e que tinha no seu interior um telemóvel, da marca Sansung, no valor de 253,90€ e cerca de 15€ em numerário, objectos esses que levaram com eles.

  3) Em dia não concretamente apurado do início do mês de Março de 2011, o arguido B... aproximou-se de … , que circulava na Praça Dr. Joaquim de Melo Freitas, em Aveiro e, usando a bicicleta em que se fazia transportar, deu-lhe um empurrão contra a parede ao mesmo tempo que lhe disse: “Dá-me o dinheiro e o telemóvel”.

  4) Perante a atitude do arguido, a  … entregou-lhe a carteira, tendo aquele retirado do seu interior a quantia de 23€, em notas e moedas, que levou consigo.

  5) No dia 27 de Março de 2011, pelas 10 horas, os arguidos B..., C..., D... e E... entraram numa igreja numa igreja sita na Rua do Carmo, em Aveiro, onde ... e A... se encontravam a dormir.

  6) Logo depois, os arguidos atiraram o ... para cima da cama e agarraram-no.

  7) A seguir, os quatro arguidos colocaram-se em cima do mesmo, tirando-lhe 15€.

  8) A seguir, os arguidos meteram as mãos nos bolsos das calças do A… , retirando-lhe um telemóvel, no valor de 100€ e 15€ em numerário.

  9) Logo depois, os arguidos ausentaram-se do local, levando consigo os referidos objectos.

 10) Nesse mesmo dia, por volta das 14H30, o arguido B..., que estava acompanhado dos outros três arguidos, aproximou-se de ..., que circulava apeado na Av. Dr. Lourenço Peixinho, em Aveiro, tendo desferido um murro neste.

 11) Logo depois, o arguido B... retirou, de um bolso do casaco que o ... trazia vestido, um telemóvel de marca e características não apuradas e 80€ em notas, fugindo a seguir.

 12) Os arguidos agiram com o propósito de integrar na sua esfera patrimonial os objectos e quantias monetárias referidas, nos termos descritos, muito embora soubessem que os mesmos não lhes pertenciam e que o faziam contra a vontade dos seus proprietários.

 13) Relativamente ao ... e a A..., os arguidos actuaram de comum acordo e em conjugação de esforços.

 14) Para conseguirem concretizar os seus intentos, os arguidos utilizaram força física contra ... e A..., tendo-a utilizado o arguido B... contra  … e ... .

 15) Os arguidos actuaram sempre de forma voluntária e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas pela lei penal.

MAIS SE PROVOU QUE:

 16) Na situação referida em 10) e 11), os arguidos C..., D... e E..., apesar de estarem por perto, não participaram nos factos nem de algum modo ajudaram o arguido B..., tendo sido apenas por iniciativa deste que ... foi abordado.

 17) O arguido B... é o mais velho de 5 irmãos, é casado e tem uma filha. A situação económica é modesta e precária.

 18) Fixou residência em Portugal em acampamento cigano na antiga Fábrica da cerveja no Porto, em condições sub humanas.

 19) Exime-se a comentar os factos dos autos e os bens jurídicos em causa.

 20) Tem familiares em Portugal e pretende regressar com os mesmos à Roménia logo que possível.

 21) O arguido C... é um dos elementos de uma fratria de 10 irmãos, entre os quais o arguido D..., sendo a família caracterizada por grandes dificuldades económicas, tendo vindo da Roménia cerca de um mês antes dos primeiros factos do presente processo, encontrando-se a maioria dos familiares na Roménia. É visitado com regularidade no EP pela companheira.

 22) Fez o 8º ano de escolaridade, não tendo trabalhado antes de vir para Portugal.

 23) Viveu, junto com familiares e outros cidadãos romenos na abandonada Fábrica da Cerveja do Porto, com a companheira, em condições sub-humanas, tendo sido daí desalojado e tendo vindo para Aveiro.

 24) Não reconhece a sua participação nos factos dos autos, e pretende regressar à Roménia logo que possível.

 25) O arguido D... é irmão do arguido C....

 26) Em Portugal, onde se encontra também a esposa, ajudou ciganos portugueses em feiras, auferindo cerca de 20€ diários.

 27) Tem tido visitas regulares da esposa no EP, pretendendo regressar à Roménia logo que possível.

 28) O arguido E... é o mais velho de 8 irmãos, sendo a família caracterizada por dificuldades económicas, e frequentou a escola até concluir o 6º ano. Casou há 6 anos, tendo 2 filhos, de 2 e 3 anos de idade.

 29) Apenas temporariamente trabalhou na Roménia, em limpeza de ruas, tendo vindo para Portugal na procura de trabalho.

 30) Intercalava períodos de permanência em Portugal com permanências na Roménia. Em Portugal viveu nas instalações da abandonada Fábrica da cerveja no Porto, em condições sub humanas, tendo sido desalojado.

 31) Não apresenta uma atitude de auto-crítica em relação aos factos do presente processo, afirmando o seu desconhecimento.

 32) Pretende regressar à Roménia logo que possível.

 33) Nenhum dos arguidos tem antecedentes criminais.

B) FACTOS NÃO PROVADOS

Não se provaram os restantes factos constantes da acusação, e designadamente:

     - Que o arguido B... tenha retirado um cartão Multibanco da carteira de … .

     - Que no dia  … de 2011 os arguidos B..., C…e E..., acompanhados de um quarto indivíduo de identidade não apurada se encontrassem num parque de estacionamento sito na Av. Artur Ravara, em Aveiro e se tenham aproximado de F... e o tenham rodeado.

     - Que acto contínuo esses arguidos e o referido indivíduo lhe tenham desferido pontapés nas costas e nas pernas e depois lhe tenham retirado dos bolsos a quantia de 16€ ou arrancado uma mochila que aquele trazia consigo.

     - Que logo a seguir os arguidos e a outra pessoa lhe tivessem retirado da mochila umas sapatilhas da marca “Lacoste”, um cinto em imitação de pele e uma carteira com vários documentos pessoais de F... .

     - Que os arguidos e o outro indivíduo tenham deixado a mochila e se tenham ausentado do local levando consigo os referidos objectos.

     - Que no dia  … 2011, pelas 14H30m os arguidos B... e E... tenham abordado  … e o seu companheiro  … ou que estes circulassem apeados na Rua João Mendonça, em Aveiro.

     - Que o arguido E... tenha encetado conversa com o  … e o arguido B... tenha agarrado a  … ou tenha tentado retirar-lhe o telemóvel ou o dinheiro que ela trazia no bolso do casaco, ou que não o tenha conseguido pelo facto de entretanto o  … se tenha apercebido daquilo que se estava a passar e tenha puxado a mesma para junto de si.

     - Que o telemóvel de A... fosse da marca “LG”.

     - Que os arguidos C..., D... e E... se tenham aproximado de ....

     - Que os arguidos B... e E... não tenham conseguido os seus propósitos quanto à  … por circunstâncias alheias à sua vontade.

     - Que relativamente ao F..., à  … e ... os arguidos tenham actuado de comum acordo e em conjugação de esforços, ou que tenham utilizado a força física contra o F....


***


APRECIANDO

O âmbito do recurso define-se pelas conclusões que os recorrentes extraem das respectivas motivações, de acordo com o estabelecido no art. 412º, n.º 1 do CPP, sem prejuízo, contudo, das questões de conhecimento oficioso.

Perante as conclusões das motivações, as questões submetidas à apreciação deste tribunal, por ambos os recorrentes, são:

- o erro na apreciação da prova;

- a medida das penas parcelares e única.

- a aplicação do regime penal dos jovens previsto no DL n.º 401/82, de 23.09.


*


A- Recurso da matéria de facto do arguido C...

Vem o recorrente questionar a apreciação da prova produzida e examinada em audiência, impugnando parte da matéria de facto que foi dada como assente na decisão recorrida, concretamente, os pontos 5), 6), 7), 8), 9), 12), 13), 14) e 15), os quais considera incorrectamente julgados, porquanto, em seu entender, o depoimento dos ofendidos ... e A... impunha que os invocados factos se tivessem por não provados.

Discorda o recorrente do tribunal a quo quanto a ter formado a sua convicção (relativamente a tais pontos) com base no depoimento das aludidas testemunhas, na medida em que, “tendo o acórdão recorrido considerado que os autos de reconhecimento se encontravam feridos de invalidades, não valendo por si como meios de prova, acabou por atender a um reconhecimento peremptório do arguido, agora recorrente, por parte dos ofendidos em sede de audiência de julgamento”.

Por serem de conhecimento oficioso, desde já se refere que inexiste qualquer insuficiência na matéria de facto provada, qualquer contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão ou, erro notório na apreciação da prova, vícios estes previstos no n.º 2 do artigo 410º do CPP, os quais teriam de resultar do próprio texto da sentença recorrida, por si só, ou conjugados com as regras da experiência comum, não podendo o tribunal ad quem socorrer-se de quaisquer outros elementos constantes do processo.

Este preceito está intimamente ligado aos requisitos da sentença previstos no artigo 374º, n.º 2 do mesmo diploma, concretamente à exigência de fundamentação que consta da enumeração dos factos provados e não provados, bem como uma exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos de facto e de direito que fundamentam a decisão, com indicação das provas que serviram para fundamentar a convicção do Tribunal.

Vejamos como o tribunal recorrido alcançou as conclusões a que chegou:

C) MOTIVAÇÃO

Pelo Exmo. Sr. Dr. … , defensor do arguido D..., foi suscitada a questão da nulidade dos reconhecimentos, pelo facto de as mesmas se terem processado muitas vezes com os mesmos “figurantes” e algumas delas se não encontrarem assinadas pelos reconhecidos.

O Digmo. Procurador admitiu que alguns dos reconhecimentos não obedecem aos requisitos do nº 2 do artigo 147º do CPP.

Efectivamente, os reconhecimentos foram, na sua maioria, efectuados utilizando os mesmos “figurantes”, mudando apenas o arguido, sendo certo que em algumas delas chegaram a figurar outros arguidos para ale daquele que a diligência visava reconhecer. Estão neste caso os autos de fls. 4 e 5 do Apenso 592/11.9PBAVR e o auto de fls. 16 do Apenso 135/11.4PBAVR.

Autos não assinados podem encontrar-se a fls. 19 do Apenso 630/11.5PBAVR, a fls. 10 do Apenso 634/11.8PBAVR, a fls. 5 do Apenso 662/11.3PBAVR e a fls. 17 do Apenso 644/11.5PFAVR, sendo certo que a fls. 15/16 um dos figurantes é o mesmo, para o mesmo reconhecedor (...) e a fls. 18 consta outro dos arguidos como figurante.

Assim, os autos de reconhecimento referidos encontram-se feridos de invalidade, não valendo por si mesmos como meio de prova.

Contudo, no que às testemunhas/ofendidos  …………e ... concerne, os mesmos identificaram de forma cabal, peremptória e inequívoca o arguido B... em audiência, encontrando-se o mesmo junto com os restantes arguidos, pelo que o Tribunal não hesitou na credibilidade de tais identificações no que respeita ao arguido B.... Ademais, as referidas testemunhas relataram os factos tal como vêm narrados na acusação, salientando-se que ...esclareceu que os restantes arguidos, embora estivessem por perto, nada intervieram no que respeita à agressão e subtracção de que foi vítima por parte de B....

Quanto às testemunhas/ofendidos ... e A..., deve salientar-se que os mesmos referiram que já antes conheciam todos os arguidos e que se encontravam juntos aquando da abordagem de que foram vítimas por parte de todos os arguidos, os quais em audiência identificaram também de forma peremptória, e sendo certo que mostraram mesmo conhecer os nomes dos arguidos B...e E....

Não teve assim o Tribunal quaisquer dúvidas de que foram os quatro arguidos a praticar os factos que as referidas testemunhas relataram, ambas no que respeita à abordagem no mesmo local efectuada pelos arguidos, com empurrão de ... para cima da cama e a subtracção do dinheiro, situação que acabou por intimidar também A… , que confirmou também a subtracção do dinheiro e do telemóvel, cuja marca não identificou (e daí ter-se considerado não provada a marca LG).

Já quanto aos factos eventualmente ocorridos com F...,  … e … , os mesmos não prestaram depoimento, e, conforme já foi referido, apenas os já referidos “reconhecimentos” constam dos autos, sendo certo que, atenta a sua invalidade por si sós, os mesmos são manifestamente insuficientes para ter como provados os factos respeitantes a tais ofendidos. E daí tais factos terem sido considerados como não provados.

Foi ainda considerado não provado que o arguido B...tivesse retirado um cartão Multibanco a … , pois esta não referiu tal cartão como tendo sido um dos objectos a si subtraídos.

Quanto às condições pessoais e económicas dos arguidos foram relevantes os Relatórios Sociais de fls. 556 a 570.

Quanto à ausência de antecedentes criminais por parte dos arguidos valeram os CRCs de fls. 333(B...), 334 (C...), 335 (E...) e 336 (D...).  

Encontra-se a decisão recorrida devidamente fundamentada, tendo o Tribunal a quo indicado quais os meios probatórios em que se baseou e explicado a credibilidade que os mesmos lhe mereceram. Assim, atendeu o tribunal à prova produzida e examinada em audiência, conjugada com a prova documental junta aos autos, e com as regras da experiência.

Em audiência de julgamento, os arguidos remeteram-se ao silêncio; mas, se tal direito não os pode prejudicar (artigo 343º, n.º 1 do CPP), o terem optado por não relatar ao tribunal a sua versão sobre os factos que lhes eram imputados, não lhes confere qualquer benefício.

Efectivamente, como resulta da Motivação, os reconhecimentos efectuados em sede de inquérito não observaram os requisitos exigidos pelo n.º 2 do artigo 147º do CPP pelo que não puderam ser valorados como meio de prova. Todavia, não estavam as testemunhas ... e A...t impedidas de, em julgamento, procederem à identificação do arguido (ora recorrente) como co-autor dos factos de que eram ofendidos.

Ora, decorre do depoimento destas testemunhas que fizeram uma identificação cabal do arguido, ou seja, esclarecedora e sem margem para dúvidas de que, o ora recorrente, foi um dos quatro arguidos que actuaram nas circunstâncias dadas como assentes. Assim sendo, no caso vertente, o “reconhecimento” efectuado em audiência de julgamento não estando sujeito às exigências formais previstas no n.º 2 do citado artigo 147º insere-se no âmbito da prova testemunhal, portanto, a valorar de acordo com o princípio da livre apreciação da prova.

Como sabemos, a gravação das declarações e dos depoimentos orais prestados em audiência destinam-se a habilitar o tribunal de recurso a apreciar se a matéria de facto foi julgada em conformidade com a prova produzida.

E, mostrando-se documentadas as declarações prestadas oralmente em audiência (art. 363º CPP), da audição da prova a que este Tribunal procedeu, conjugada com os demais elementos atendíveis, constatou-se que a fundamentação da decisão de facto está conforme com a prova produzida em julgamento, se bem que se possam assinalar pequenas diferenças na redacção da factualidade impugnada, diferenças que em nada alteram a subsunção jurídica efectuada.

Assim, em audiência:

a)- referiu a testemunha ...:

conhece todos os arguidos”;

a primeira vez que os viu, foi no dia dos factos”;

era de manhã, estava a dormir num quiosquezinho nas traseiras da Igreja do Carmo, por favor do Sr. Padre, não trabalhava”; “numa outra cama, dormia o seu colega A… , que é coreano”;

eles eram quatro”;

foi um que lhe meteu a mão ao bolso, tirou-lhe a carteira, e os € 15 que lá estavam, passou o dinheiro ao outro e devolveram-lhe a carteira (em audiência apontou para o arguido que lhe meteu a mão no bolso)”;

empurraram-no, eles entraram com ar violento, teve medo; dos quatro não consegue identificar quem o empurrou; um deles sentou-se em cima de si”;

o outro colega (o A…) também lá estava, eles mandaram ele levantar-se e tiraram-lhe o dinheiro e o telemóvel”;

o colega não se mexeu para nada, com medo”.

b)- referiu a testemunha A...:

agora não trabalha, há 2 anos que não trabalha, a profissão é mecânico”;

conhece os quatro que estão sentados (referindo-se aos arguidos)”;

dormia junto à igreja”;

foram os quatro que roubaram, o telemóvel LG que custou €100 e € 15 em moedas, que tinha no bolso das calças”;

não lhe bateram”;

ele tirou o telemóvel (apontando para o arguido B...)”;

ao  … empurraram para a cama”;

lembra-se de todos”.

Da conjugação do depoimento dos ofendidos resulta que:

- ambos dormiam num anexo da Igreja da Rua do Carmo, nas traseiras da Igreja,

- o ofendido ..., dos quatro arguidos, não consegue identificar quem o empurrou e quem se sentou em cima de si,

- e, embora em audiência tenha apontado para o arguido que lhe meteu a mão no bolso e retirou a carteira, não referiu o seu nome,

- que os quatro arguidos entraram no local onde dormiam os ofendidos, e praticaram os factos de forma concertada.

No caso vertente, o recorrente impugnou a decisão da matéria de facto de acordo com o disposto nos n.ºs 3 e 4 do artigo 412º do CPP, pelo que os poderes de cognição deste tribunal de recurso abrangem a reapreciação da prova produzida e examinada em audiência (artigo 428º do CPP).
Em consequência, julgando-se procedente o recurso nesta parte, se bem que sem qualquer relevância quanto à condenação dos arguidos, (por terem praticado estes dois crimes de roubo em co-autoria), ao abrigo do disposto no artigo 431º, alínea b), do CPP procede-se à modificação da decisão recorrida, passando os pontos 5), 6), 7) e 8) dos factos dados como provados a ter a seguinte redacção:

  5) No dia 27 de Março de 2011, pelas 10 horas, os arguidos B..., C..., D... e E... entraram num anexo da igreja sita na Rua do Carmo, em Aveiro, onde ... e A... se encontravam a dormir.

  6) Logo depois, um dos arguidos atirou o ... para cima da cama, agarrando-o.

  7) A seguir, um dos quatro arguidos colocou-se em cima do mesmo, tirando-lhe 15€.

  8) A seguir, um dos arguidos meteu as mãos nos bolsos das calças do A… retirando-lhe um telemóvel, no valor de 100€ e 15€ em numerário.


*

Quanto ao depoimento da testemunha A..., relativamente ao qual se reconhece que não é muito explícito (apesar da testemunha cá residir há 11 anos, como declarou em audiência), argumenta o recorrente que, não lhe tendo sido nomeado intérprete (art. 92º, n.º 2 CPP), se verifica a nulidade relativa prevista no artigo 120º, n.º 2, al. c) do mesmo diploma.

Ainda que se nos suscitem dúvidas sobre a necessidade de nomeação de intérprete à testemunha, porquanto a situação de facto em causa ficou suficientemente esclarecida (não só pelo depoimento desta testemunha, mas sobretudo pelo depoimento da testemunha ... que presenciou e relatou os factos), tratando-se de nulidade sanável, não foi a mesma tempestivamente arguida.

Na verdade, estabelece o artigo 120º, n.º 3, al. a) que tratando-se de nulidade de acto a que o interessado assista, deve a mesma ser arguida antes que o acto esteja terminado.

Ora, contrariamente ao que parece sugerido pelo recorrente, em audiência não foi requerida a nomeação de intérprete à testemunha, pelo que a sua arguição neste momento é extemporânea.

Deste modo, tendo sido apurados todos os elementos típicos dos crimes de roubo, em que foram ofendidos ... e A...., impunha-se a condenação do arguido pela prática dos mesmos.


*

B- Recurso da matéria de facto do arguido B...

Por considerar que não resultou da prova testemunhal, produzida em audiência, que tenha usado força física contra A...., conclui o recorrente que praticou um crime de furto p. e p. pelo artigo 203º, n.º 1 do CP, ao invés de um crime de roubo p. e p. pelo artigo 210º, n.º 1, conforme entendeu o tribunal a quo, tendo impugnado os factos dados como provados nos pontos 5), 6), 7), 8) e 14), os quais considera incorrectamente julgados.

De certo modo, foi a questão suscitada já apreciada em A, no recurso da matéria de facto do arguido C....

Foi dado como assente que 13) Relativamente ao ... e a A..., os arguidos actuaram de comum acordo e em conjugação de esforços, e que 14) Para conseguirem concretizar os seus intentos, os arguidos utilizaram força física contra aqueles.

Quanto a tais factos apurados, e que integram a prática, em co-autoria, de dois crimes de roubo, pelos quais os quatro arguidos foram condenados, há que atender ao circunstancialismo fáctico em que os mesmos ocorreram.

Assim, encontravam-se os ofendidos no mesmo espaço (o anexo da igreja onde pernoitavam), quando foram surpreendidos pelos quatro arguidos. Os arguidos começaram por atirar o ofendido ... para cima da cama, sentando-se em cima dele para lhe retirarem o dinheiro que com ele trazia, o que conseguiram. E, assistindo a estes factos, encontrava-se o ofendido A...“que não se mexeu para nada, como medo”, a quem os arguidos “mandaram que se levantasse”, tendo um dos arguidos (que o ofendido, em audiência, identificou ser o ora recorrente) retirado do bolso das calças o telemóvel e o dinheiro.

Ainda que nenhum dos arguidos lhe tenha batido, como referiu, com o constrangimento a que o ofendido foi submetido, foi posta em causa a sua liberdade. Ficou tolhido nos seus movimentos.

Como refere Conceição Ferreira da Cunha ([2]) “Em relação ao uso de força física, não se levantam grandes problemas: a intromissão, ainda que indirecta no corpo de uma pessoa deve considerar-se violência, importando, no crime de roubo, a violência que visa quebrar ou impedir a resistência da vítima. Parece, no entanto, que agressões irrelevantes à integridade física – as chamadas “insignificâncias” – ainda devem ser abrangidas por este conceito: tolher os movimentos da vítima, amordaçá-la, certos casos de esticão em que não se provocam lesões, pelo menos significativas”.

A violência típica do crime de roubo é a violência específica do próprio acto apropriativo sob a forma de emprego de força física, maior ou menor, não se impondo que ela vá além do necessário e tendente ao apoderar do bem. Todo o emprego da força física contra a pessoa ofendida, à luz do escopo de alcançar a apropriação, cai sob a alçada do tipo legal do crime de roubo – cfr. Ac. STJ, de 27-2-1992, CJ, XVII, tomo I, 48.

Nenhum reparo nos merece pois, o acórdão recorrido quando considerou provados os factos ora impugnados, mostrando-se correcta a condenação do recorrente pela prática do crime de roubo (e não pela prática de um crime de furto).


*

C- Quanto a ambos os recorrentes:

 Da medida das penas parcelares e da atenuação especial da pena, em razão da idade, ao abrigo do disposto no artigo 4º do DL n.º 401/82, de 23.09

Alega o recorrente C... que:

- a pena aplicada revela-se pouco criteriosa e desequilibradamente doseada;

- foi violado o disposto no artigo 71º do CP, por incorrecta e imprecisa aplicação;

- os dois crimes pelos quais foi condenado reconduzem-se a um acto isolado;

- da factualidade dada como provada não resulta que tenha agido com dolo directo;

- tinha, na altura, 18 anos de idade; tendo o tribunal errado quando não aplicou o Regime Especial para Jovens entre os 16 e os 21 anos, atenuando especialmente a pena.

Pugna o recorrente para que as penas parcelares impostas sejam reduzidas para o respectivos limites mínimos, devendo a pena única ser substancialmente reduzida e, suspensa na sua execução.

E, sustenta o recorrente B... que:

- “na medida da pena parcelar aplicada não foi tida em conta a diminuta violência levada a cabo pelo recorrente contra a pessoa de ..., na prática do crime de roubo”; e que,

- “deve beneficiar de uma atenuação especial da pena, em razão da idade que apresenta, à data da prática dos factos, bem como, em virtude da situação de desprotecção, de desenraizamento e de desintegração, enquanto imigrante, trabalhador precário e carente de ajuda com vista à sua integração social”.


*

Foi o arguido C... condenado pela prática de dois crimes de roubo, nas penas parcelares de 2 anos e 6 meses de prisão e, em cúmulo jurídico, na pena única de 3 anos e 6 meses de prisão.

O arguido B... foi condenado na pena única de 6 anos de prisão, aqui se englobando as penas parcelares de 1 ano de prisão pela prática do crime de furto e, 2 anos e 6 meses de prisão por cada um dos quatro crimes de roubo.


*

De harmonia com o disposto nos artigos 70º e 71º do Código Penal a escolha e a medida da pena, ou seja, a determinação das consequências do facto punível, é feita dentro dos limites da lei, em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, devendo ainda atender-se a todas as circunstâncias que não fazendo parte do tipo de crime deponham a favor ou contra o mesmo.

Ora, dentro da moldura penal abstracta, as circunstâncias que não fazendo parte do tipo de crime depõem a favor ou contra o agente são, designadamente:

- O grau de ilicitude do facto (o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação de deveres impostos ao agente);

- A intensidade do dolo ou negligência;

- Os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram;

- As condições pessoais do agente e a sua situação económica;

- A conduta anterior ao facto e posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do crime;

- A falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena.

Deste modo, o juiz conforme a natureza do facto punível, a sua gravidade e a forma de execução, aplicando o direito, escolhe uma das várias possibilidades legalmente previstas.

Em caso algum, porém, a pena poderá ultrapassar a medida de culpa do agente, concretamente revelada, correspondendo o limite superior da pena ao máximo grau de culpa e, o limite mínimo aquele abaixo do qual se não respeitam as expectativas da comunidade (art. 40º, n.º 2 do C.Penal).

Não pode apenas atender-se à culpa e à sua medida, impôs o legislador que a determinação concreta da pena seja feita também em função da prevenção. O que no entender do Prof. Figueiredo Dias “(…) é perfeitamente compreensível e justificável; através do requisito de que sejam levadas em conta as exigências da prevenção, dá-se lugar à necessidade comunitária de punição do caso concreto e, consequentemente, à realização “in casu” das finalidades da pena. Através do requisito de que seja tomada em consideração a culpa do agente, dá-se tradução à exigência de que a vertente pessoal do crime – ligada ao mandamento incondicional de respeito pela eminente dignidade da pessoa do agente – limita de forma inultrapassável as exigências de prevenção” (cfr. Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime – Notícias editorial – pág. 215).

Quanto ao arguido B..., que para além dos 4 crimes de roubo, praticou um crime de furto simples, punido em alternativa, com pena de prisão ou pena de multa, atendendo ao disposto no artigo 70º do CP, o tribunal de 1ª instância optou pela pena de prisão, por considerar que «da globalidade das suas condutas ressalta uma elevada gravidade dos factos, a reclamar fortes exigências de prevenção, quer geral, quer especial, pelo que a pena de multa não satisfaz minimamente a realização da protecção de bens jurídicos».

Assim, são tais crimes puníveis, em abstracto:

- o de furto, com prisão de 1 mês a 3 anos, e,

- o de roubo, com prisão de 1 a 8 anos.

 O Tribunal “a quo” na determinação da medida concreta das penas aplicadas aos recorrentes (e demais arguidos), considerou serem adequadas e ajustadas as penas de 1 ano de prisão pelo crime de furto e 2 anos e 6 meses de prisão por cada um dos crimes de roubo, tendo ponderado o seguinte:

(…) desfavoravelmente a todos os arguidos tem-se em conta:

- a sua actuação com dolo directo, que é o mais elevado grau de censura jurídico-penal;

- a intensidade do grau de ilicitude da sua conduta, acima do médio.

- as fortes exigências de prevenção que se fazem sentir, atento o actual crescimento desmesurado de actos de violência associados a crimes contra o património, bem como a violação cada vez mais generalizada da paz e tranquilidade públicas.

- A falta de arrependimento manifestada.

Já favoravelmente aos arguidos apenas se vislumbra a ausência de antecedentes criminais e os relativamente baixos valores subtraídos (que, no entanto, eram os efectivamente possuídos pelas vítimas).

Deve aqui referir-se que os arguidos B... e C... tinham respectivamente 20 e 18 anos de idade à data dos factos, o que suscita a questão da aplicabilidade do Regime Especial para Jovens com idade compreendida entre os 16 e os 21 anos, estabelecido pelo Decreto-Lei nº 401/82, de 23 de Setenbro.

Todavia, a gravidade dos factos e a falta de arrependimento dos arguidos excluem que o Tribunal possa ter razões para crer que resultem vantagens para a reinserção através da atenuação especial, ou que a pena de prisão não seja, “in casu”, necessária à reinserção, pelo que o Tribunal Colectivo entende não ser de aplicar tal Regime.

Como resulta da transcrição efectuada, o acórdão recorrido sopesou todos aqueles factores com influência na medida concreta das penas.

Com efeito, muito embora os arguidos/recorrentes não tivessem antecedentes criminais, como resulta dos respectivos relatórios sociais elaborados pela Direcção-Geral de Reinserção Social, a fls. 557/559 e 568/570, permaneciam alojados em condições de habitabilidade consideradas pouco dignas, pelas diversas autoridade locais; não tinham modo de vida definido e, assumem um discurso de desresponsabilização face aos factos por que foram condenados nestes autos.

In casu, são elevadas as necessidades de prevenção especial e de ressocialização, salientando-se o facto dos arguidos, pessoas carenciadas, não terem qualquer pejo em “assaltarem” semelhantes em igualdade de circunstâncias, como é o caso dos ofendidos ... e A.... (desempregados e que pernoitavam num anexo da igreja), relativamente aos quais e à sua situação demonstraram total indiferença. Por outro lado, são igualmente fortes as exigências de prevenção geral, atendendo a que este tipo de crime preocupa toda a sociedade, designadamente a frequência com que se vem verificando a prática deste tipo de ilícitos penais, praticados por elementos de comunidades sem qualquer reintegração socio-económica.

Deste modo, face ao circunstancialismo fáctico apurado e à moldura penal abstracta dos crimes em causa, afiguram-se-nos proporcionais e adequadas as penas parcelares fixadas e, bem assim, as penas únicas.


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Da aplicação do regime penal dos jovens previsto no DL n.º 401/82, de 23.09

Consideram os recorrentes que deveriam ter beneficiado de penas especialmente atenuadas de acordo com o determinado no artigo 4º do DL n.º 401/82, de 23 de Setembro, ou seja, em razão da sua idade.

O citado DL n.º 401/82, de 23 de Setembro consagra o regime especial para jovens com idades compreendidas entre os 16 e os 21 anos que tenham cometido um facto qualificado como crime.

Porém, e apesar dos recorrentes contarem à data da prática dos factos, respectivamente 18 e 20 de idade, a questão não pode ser colocada nos termos pretendidos, porque a mencionada atenuação especial não é de aplicação automática, desde que o agente de um crime esteja na faixa etária mencionada, como é o seu caso.

Convém lembrar que o artigo 4º deste diploma refere expressamente que a pena deve ser atenuada quando houver sérias razões para crer que da atenuação especial resultem vantagens para a reinserção social do jovem condenado.

Sucede que muitas vezes o tribunal não vislumbra a existência das mencionadas razões sérias e, por isso, não faz uso da atenuação especial. Tal acontece, designadamente, quando as situações analisadas são daquelas em que se impõe a aplicação de uma pena de prisão necessária “para uma adequada e firme defesa da sociedade e prevenção da criminalidade” como expressamente se refere no preâmbulo do citado DL n.º 401/82.

As aludidas situações são aquelas que se prendem com a frequência e gratuitidade de certo tipo de condutas, pelo grau de violência que comportam, pela instabilidade e insegurança que geram, onde são particularmente actuantes as necessidades de reprovação e de prevenção da criminalidade sendo, por isso, de ponderar cuidadosamente, consoante cada caso, se realmente as ditas razões sérias existem e têm o peso suficiente para justificar a atenuação especial.

No caso vertente, tais razões foram ponderadas na decisão recorrida, nenhum reparo nos merecendo o decidido pelo tribunal a quo quanto à inexistência de razões para a atenuação da pena, uma vez que não se verificam os pressupostos do regime penal especial dos jovens.


*

Da suspensão da execução da pena:

Pretende o recorrente C... que a pena única de prisão imposta seja suspensa na sua execução.

De acordo com o preceituado no artigo 50º do Código Penal, o tribunal afirma a prognose social favorável em que assenta o instituto da suspensão da execução da pena, se conclui que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, devendo, para tal, atender à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste.

E só deve decretar a suspensão da execução quando concluir, face a esses elementos que essa é a medida adequada a afastar o delinquente da criminalidade. O Tribunal deverá correr um risco prudente, uma vez que esperança não é seguramente certeza, mas se tem sérias dúvidas sobre a capacidade do arguido para compreender a oportunidade de ressocialização que lhe é oferecida, a prognose deve ser negativa (neste sentido o Ac. do STJ de 11-01-2001, proc. n.º3095/00-5).

Com as alterações introduzidas pela Lei n.º 59/2007, de 4.9, o art. 50º, n.º 1 do C. Penal passou a prever a possibilidade de suspender a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 5 anos, quando anteriormente a suspensão apenas era permitida relativamente a penas não superiores a 3 anos.

Como se pode observar no acórdão recorrido o tribunal a quo justificou a não suspensão da execução das penas impostas aos arguidos  … (ora recorrente), D... e E...do seguinte modo:

No caso dos autos, as exigências de prevenção, atenta a enorme gravidade dos factos, atentatória dos valores da segurança, paz e tranquilidade públicas, não permite efectuar tal prognose favorável relativamente a estes arguidos, já que as referidas exigências de prevenção em muito sobrelevam o desiderato da reintegração na sociedade, tanto mais que os arguidos apresentam grande mobilidade entre Portugal e a Roménia, fazendo recear seriamente pela impossibilidade de aplicação do regime de prova imposto pelo nº 3 do artigo 53º do Código Penal.

Entende-se assim não ser de aplicar a suspensão da execução da pena.          

Concordando com a ponderação efectuada, também se nos afigura que não pode formular-se quanto ao arguido/recorrente uma prognose favorável, no sentido de que não voltará a delinquir, pelo que não deverá beneficiar da suspensão da execução da pena.


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III- DECISÃO

Face ao exposto, acordam os juízes da secção criminal deste Tribunal da Relação em:

1- Negar provimento ao recurso do arguido B...;

2- Conceder parcial provimento ao recurso do arguido C... e, em consequência:
a) proceder à modificação da decisão recorrida, passando os pontos 5), 6), 7) e 8) dos factos dados como provados a ter a seguinte redacção:

  5) No dia 27 de Março de 2011, pelas 10 horas, os arguidos B..., C..., D... e E... entraram num anexo da igreja sita na Rua do Carmo, em Aveiro, onde ... e A.... se encontravam a dormir.

  6) Logo depois, um dos arguidos atirou o ... para cima da cama, agarrando-o.

  7) A seguir, um dos quatro arguidos colocou-se em cima do mesmo, tirando-lhe 15€.

  8) A seguir, um dos arguidos meteu as mãos nos bolsos das calças do A… , retirando-lhe um telemóvel, no valor de 100€ e 15€ em numerário.

3) Manter, no mais, o acórdão recorrido.  

4) - Quanto às custas a cargo do recorrente B... fixa-se em 3UCs a taxa de justiça;
    - Sem custas quanto ao recorrente C... (artigo 513º, n.º 1 do CPP, na redacção dada pelo DL n.º 34/2008, de 26.02).

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Elisa Sales (Relatora)

Paulo Valério


[1] - O recorrente C... apresentou conclusões, sem qualquer concisão, ao arrepio do que determina o n.º 1 do artigo 412º do CPP, tendo praticamente reproduzido o teor da Motivação.
[2] - in Comentário Conimbricense do Código Penal, Parte Especial, Tomo II, Coimbra Editora 1999, pág. 167.