Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
4871/09.7TJCBR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: MARIA JOSÉ GUERRA
Descritores: COMPRA E VENDA
VEÍCULO AUTOMÓVEL
NULIDADE
REGISTO
TERCEIRO
ACTO PROCESSUAL
FACTOS SUPERVENIENTES
Data do Acordão: 06/25/2013
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COIMBRA - VARA COMP. MISTA E JUÍZOS CRIMINAIS - VARA COMPETÊNCIA MISTA-1ª SECÇÃO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTS. 291, 897 CC, 5 Nº4, 17 Nº2 CRP, 150, 264, 663 CPC
Sumário: 1. O facto relativo ao registo da presente acção e a data da respectiva ocorrência, por se tratar de um facto constitutivo do direito da A. do qual esta desde a propositura da acção deu conta de se querer dele aproveitar e por ter influência sobre o conteúdo da relação controvertida deve ser levado em conta pelo juiz na sentença.

2. A lei processual geral dispensa hoje o interveniente processual, quando pratique o acto processual por via electrónica, de remeter o documento original, bastando-se com uma mera fotocópia que, terá a mesma força probatória do original, podendo, embora, o juiz determinar a exibição do original em suporte de papel do documento assim juntos, por razões de segurança e fiabilidade do sistema.

3. Verificando-se que o mesmo veículo automóvel foi vendido duas vezes, pelo mesma ré, a duas entidades distintas, a primeira venda é válida, por tal contrato não estar sujeito a qualquer formalidade especial.

4. Ao vender de novo o mesmo veículo a outrem, que procedeu ao seu registo antes do primeiro comprador, a dita ré vendeu um bem que já não lhe pertencia, por se tratar de um bem alheio, encontrando-se essa venda ferida de nulidade nas relações entre alienante e adquirente e sendo ineficaz em relação ao primitivo adquirente e seu proprietário.

5. A declaração da nulidade do segundo contrato de compra e venda prejudica os direitos adquiridos sobre o mesmo bem, a título oneroso, por terceiro de boa fé, não obstante ter este registado a sua aquisição antes do registo da acção de nulidade, se tal acção tiver sido proposta e registada dentro dos três anos subsequente à declaração do negócio nulo.

6. Tendo a acção de nulidade sido proposta e registada antes de decorridos três anos sobre a celebração do negócio nulo, não podem ser reconhecidos os direitos do segundo adquirente, prevalecendo a aquisição resultante da primeira venda.

Decisão Texto Integral: Acordam os juízes do Tribunal da Relação de Coimbra

         I – RELATÓRIO

         1. A A. D (…) (PORTUGAL), S.A. intentou a presente acção declarativa de condenação sob a forma de processo sumário, que posteriormente veio a prosseguir sob a forma de processo ordinário, contra as RR.  MC (…)LDA., C (…) e MAZDA (…), LDA, peticionando:

         - que seja declarada a nulidade da operação efectuada entre a 1.ª/3.ª ré e o 2.º réu, nos termos do artigo 892.º do Código Civil;

         - que seja judicialmente reconhecido o direito de propriedade da autora sobre a viatura automóvel, marca MAZDA, modelo MZR-CD, matrícula 81-FE-37;

         - que seja ordenado o cancelamento do registo de propriedade inscrito a favor do 2º réu;

         No caso de se vir a apurar no decurso da presente acção que a 1.ª e a 3.ª rés procederam à venda de um bem alheio, requer:

         - que se ordene que a 1.ª e a 3.ª rés procedam à convalidação do contrato, num prazo de 30 dias, nos termos do artº 897.º do Código Civil;

         - e caso a 1.ª e a 3.ª ré não procedam à convalidação do contrato, num prazo de 30 dias, se declare a nulidade do contrato nos termos do artigo 896.º, n.º1, alínea a) do Código Civil, e consequentemente restituam à ora autora o montante pago à 1.ª ré, no valor de €30.000,00.

            Em qualquer um dos casos, a condenação da 1.ª e a 3.ª rés no pagamento à autora de uma indemnização, nos termos do artigo 898.º do Código Civil, a quantificar em sede de execução de sentença.

         Alega a autora que, no exercício da sua actividade, como locadora, celebrou em 7/8/2008 com a primeira ré, como fornecedora e locatária, um contrato de locação financeira, nos termos do qual a autora veio a adquirir à 1.ª ré o veículo automóvel de marca MAZDA, modelo 6 MZR-CD, matrícula 81-FE-37 facultando a esta a utilização de tal veículo; a autora em 6/8/2008 procedeu ao pagamento do preço referente à aquisição da viatura à 1.a ré, confiando que o registo da viatura seria regularizado por esta que se trata de do stand fornecedor, que é um Stand de Automóveis e representante do importador, a aqui 3.ª ré; sucede que a 1ª ré não diligenciou pelo registo da viatura e posteriormente procedeu à venda da viatura ao 2.º réu, o qual averbou a viatura em seu nome em 20 de Outubro de 2008, em data posterior à venda do veículo pela 1.ª ré fornecedora à autora.

         2. Citados regularmente todos os RR., contestaram os RR. C (…) e Mazda (…), Lda.

            Na sua contestação o réu C (…) alega que adquiriu o veículo automóvel referido nos autos no dia 19 de Julho de 2008, ou seja, em data anterior à data referida pela autora como sendo a da sua “aquisição” e que, aquando da realização do contrato de compra e venda celebrado entre o 2º réu e a 1ª ré, esta procedeu à entrega efectiva de tal veículo, o qual se encontra na sua posse desde essa data, pelo que é o único proprietário do FE e, a existir uma venda de bens alheios, nos termos do art. 892º do C.C., tal não o foi da forma descrita pela autora; nunca a 1ª ou 3ª rés poderiam ter transmitido à autora um direito que já não possuíam: o direito de propriedade.

         Conclui, invocando a nulidade do contrato “celebrado” entre a autora e a 1ª e/ou 3ª ré, devendo ser o 2º réu declarado como verdadeiro proprietário do FE, e deduz reconvenção peticionando que se reconheça o 2º réu como único e legítimo proprietário do veículo 81-FE-37; que seja declarada a nulidade do negócio celebrado entre a autora e a 1ª e/ou 3ª ré; e que seja ordenada a manutenção do registo da sua propriedade tal como consta da Conservatória do Registo Automóvel.

         Por seu turno, a 3ª ré Mazda (…), Lda. contestou, alegando que no âmbito da actividade a que se dedica (importação e comercialização de veículos automóveis) importou o veículo em discussão nos presentes autos, que vendeu à 1ª ré, em 29.2.2008 (três dias após de ter sido originalmente registado a favor da 3ª ré); posteriormente diligenciou pelo registo da viatura a favor do 2º réu, porque de acordo com a informação (e documentos, concretamente do doc. nº 5 junto com a pi) que aquela 1ª R. lhe transmitiu esta tinha vendido tal veículo ao 2º réu.

         Conclui, pugnando pela improcedência da acção no que a si diz respeito.

         3. A autora apresentou articulado de resposta à reconvenção deduzida pelo 2º réu, mantendo que adquiriu o veículo em causa primeiramente que o 2º Réu, sendo a venda ocorrida entre este e 1ª R. nula, nos termos e para os efeitos do art. 892º do Código Civil, uma vez que o 1ª R. não podia dispor de um direito que não possuía, leia-se, o direito de propriedade sobre o veiculo automóvel em causa; mais reitera que facultou a utilização de tal bem à 1.ª Ré (locatária), como consta do “Auto de Recepção de Equipamento”, que a mesma assinou; a autora confiou que o registo da viatura seria regularizado pelo stand fornecedor, aqui 2ª ré, uma vez que essa responsabilidade estava transferida nos termos do disposto na cláusula 8.ª das Condições Gerais do contrato.

       4. Admitida a reconvenção deduzida pelo 2º Réu e determinado o prosseguimento da acção sob a forma de processo ordinário, foi proferido despacho saneador, no qual se afirmou a regularidade dos pressupostos processuais e se procedeu à selecção dos factos assentes e controvertidos.

         5. Procedeu-se ao julgamento, o qual decorreu com observância de todas as formalidades legais.

         6. Proferida sentença veio a decidir-se nela a procedência da acção, e em consequência, a declarar-se a nulidade da operação efectuada entre a 1.ª/3.ª ré e o 2.º réu, nos termos do artigo 892.º do Código Civil e a reconhecer-se o direito de propriedade da autora sobre a viatura automóvel, marca MAZDA, modelo MZR-CD, matrícula 81-FE-37 e a ordenar-se o cancelamento do registo de propriedade inscrito a favor do 2º réu; e, ainda, a improcedência do pedido reconvencional deduzido pelo 2º réu.

         Na mesma sentença, foi ainda considerado que o comportamento processual do 2ª réu era susceptível de ser sancionado em sede de litigância de ma fé, pelo que, foi ordenada a notificação deste para se pronunciar no prazo que para o efeito lhe foi fixado.

         7. No seguimento de tal notificação, veio o 2º réu dizer que não existiu qualquer comportamento por parte do mesmo susceptível de integrar a litigância de má fé, uma vez que nunca existiu qualquer intuito de defraudar a verdade dos factos de forma propositada e consciente, não deverá este douto Tribunal condenar pela litigância de má fé.

            8. Após o que veio a ser proferido despacho no qual se decidiu a condenação do 2ª réu como litigante de má fé em multa correspondente a 5 UC´s.

         9. Inconformado com a sentença proferida nos autos dela veio o 2º réu, C (…) dela interpor recurso de apelação, cujas alegações remata com as seguintes conclusões:

(…)

            10. Contra-alegou a A., formulando nas contra-alegações que apresentou as seguintes conclusões:

         (…)

         Colhidos os vistos legais cumpre apreciar a decidir.

II – ÂMBITO DO RECURSO

Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões do recorrente não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, sem prejuízo das de conhecimento oficioso ( Arts. 684º, nº 3, 685º-A e 660º, nº 2, do CPC ), são as seguintes as questões a decidir:

        I- saber se poderia ser atendido na sentença o facto assente nela sob nº 19, referente ao registo da acção ocorrido em 5.3.2010 com base no doc. junto a fls. 256, uma vez que esse facto nunca foi alegado pelo A. em nenhum articulado, não consta do despacho saneador nem como matéria provada nem a provar e não foi apresentado um articulado superveniente, e se pelo facto de ter sido atendido tal facto se mostra violado  o estatuído no Artº 264º do CPC;

         II- saber se foi mal valorada a factualidade vertida dos artigos 17º a 19º e 21º da BI;

          III- saber se deve o R. ser absolvido de ambos os pedidos feitos, seja por inoponibilidade da nulidade decorrente da venda de bens alheios por aplicação das regras registrais, seja por ser uma venda pelo legítimo proprietário em caso de inversão das respostas aos quesitos que vem impugnada.

III – FUNDAMENTAÇÃO

A) De Facto

Na decisão recorrida foi considerada assente pela 1ª instância a seguinte a factualidade:

         1. A 3ª ré (MAZDA (…), LDA) dedica-se à actividade de importação de produtos da marca Mazda, designadamente viaturas, peças e acessórios (artº 9º).

         2. Os quais são comercializados por uma rede de concessionários sediados em diversas zonas do país, a quem cabe em exclusivo a responsabilidade de proceder à venda ao público de veículos da marca (artº 10º).

         3. As viaturas automóveis da marca “Mazda” são inicialmente registadas a favor da 3ª ré e posteriormente vendidos por esta aos seus diversos concessionários (artº 11º).

         4. Não chegando a ser registados a favor destes últimos de modo a evitar uma desvalorização comercial daí decorrente (artº 12º).

         5. Subsequentemente as viaturas são vendidas ao público pelos referidos concessionários e o registo da propriedade é feito em nome do cliente final (artº 13º).

         6. Em 30.9.2003 entre a 1º e 3ª ré foi celebrado um acordo denominado “Contrato de Concessionário, cujo teor consta de fls. 86 e ss, que foi objecto de resolução por carta datada de 27.10.2009, com efeitos imediatos (artº 14º).

         7. Em 30.9.2003 entre a 1ª e 3ª ré foi celebrado um acordo denominado “Contrato de Reparador Autorizado”, cujo teor consta de fls. 152 e ss, que foi objecto de resolução por carta datada de 12.11.2009, com efeitos no prazo de 3 meses a contar da data da respectiva recepção (artº 15º).

         8. A 3ª ré vendeu o veículo referido em A) à 1ª ré em 29.2.2008 (artº 16º).

         9. A autora, no exercício da sua actividade, como locadora, celebrou em 7/8/2008 com a 1ª ré (stand de automóveis representante do importador), como fornecedora e locatária, o contrato de locação financeira mobiliária nº 14221, junto a fls. 16, do qual fazem composto de “ Condições Gerais” e de “Condições Particulares” de fls. 16 a 19 (artº 1º e 8º).

         10. Nos termos do qual a autora adquiriu à 1.ª ré o veículo automóvel de marca MAZDA, modelo 6 MZR-CD, matrícula 81-FE-37 (artº 2º).

         11. E facultou a utilização de tal veículo à 1.ª Ré (artº 3º).

         12. Nos termos do contrato referido em 1º a 1.ª ré (locatário) estava obrigada ao pagamento de 72 rendas mensais de € 400,16 cada, vencendo-se a primeira em 5/8/2008 e a última em 5/8/2014, a que acresceria o I.V.A. em vigor à datado pagamento de cada um das rendas acordadas (artº 4º).

         13. A 1.ª ré não cumpriu o pagamento dessas rendas, tendo sido interpelada pela autora para proceder ao pagamento, através da carta junta a fls. 23 e 24 (artº 5º).

         14. A autora em 6/8/2008 procedeu ao pagamento do preço referente à aquisição da viatura à 1.ª ré (artº 6º).

         15. Confiando que o registo da viatura seria regularizado pelo stand fornecedor (artº 7º).

         16. O 2º réu acordou com a 1ª ré adquirir-lhe o veículo referido em A) em data posterior a 7.8.2008 (artºs 17º, 18º, 19º e 21º).

         17. A 3ª ré, a pedido da 1ª ré, requereu o registo da propriedade a favor do 2º réu, através do preenchimento e entrega, em 20.10.2008, do documento junto a fls. 25 (artº 20º).

         18. Sobre o veículo automóvel de marca MAZDA, modelo 6 MZR-CD, matrícula 81-FE-37 recaíram os seguintes registos (al. A):

         - em 27 de Fevereiro de 2008 a 3.ª Ré MAZDA (…), Lda. (importador do veículo) procedeu ao registo inicial da propriedade a seu favor;

         - em 20 de Outubro de 2008 foi registada a propriedade da viatura a favor do 2.º Réu, C (…), por aquisição ao anterior titular.

         19. A presente acção foi registada em 5.3.2010 (doc. de fls. 256).

         B) De Direito

I- Na apreciação das questões suscitadas no presente recurso, balizadas pelas respectivas conclusões, observaremos a ordem porque nestas aquelas vêm equacionadas, iniciando, assim, a respectiva abordagem pela análise da questão relacionada com o facto de ter sido considerado assente na sentença recorrida, com base no doc. junto a fls. 256, o facto eferente ao registo da acção ocorrido em 5.3.2010.

         Entende o recorrente que, ao assim decidir, o tribunal a quo violou o disposto no Art. 264º do CPC na medida em que tal facto nunca foi alegado pelo A. em nenhum articulado, não consta do despacho saneador nem como matéria provada nem a provar e não foi apresentado um articulado superveniente.

         Importa, antes de mais, esclarecer que, ao contrário do que pretende fazer crer o recorrente no seu discurso recursivo, o facto considerado na sentença, sob o ponto 19. do elenco da factualidade provada, não aparece nela reflectido “ caído do céu “.

         Na verdade, logo na P.I. a A. requer ao tribunal que ordene a passagem de certidão da petição inicial, bem como de todos os documentos que a acompanham, a fim de proceder ao respectivo registo junto da Conservatória do Registo Automóvel, pedido esse que surge na esteira da causa de pedir invocada em tal articulado e dos pedidos nele formulados.

         Depois disso, voltou a A., através de requerimento electrónico apresentado em 2010.02.01, a fazer menção ao anterior pedido relativo à passagem da certidão para registo da acção e à não satisfação desse pedido, invocando, ainda, que o atraso na passagem da referida certidão irá por em causa dos seus direitos e interesses, porque, segundo refere, se a supra referida certidão não for registada a tempo pela A., poderá a mesma ser prejudicada ao ser aplicável o disposto no artigo 291º do C.C e 17º nº2 do C.R.P., no que diz respeito a um terceiro adquirente de boa fé.

         No seguimento de tal requerimento, a Secretaria enviou notificação à A., datada 02-02-2010, a informar a mesma de que naquela data foi passada a requerida certidão, aguardando a mesma na secção central do tribunal pelo seu levantamento.

         No despacho saneador elaborado nos autos, mais concretamente no final do mesmo, veio a Mma. Juiz que o prolatou ordenar a notificação da A. para, no prazo de 10 dias, a A. juntar documento atestativo da realização do registo da acção que na petição inicial informou que iria realizar.

            Veio, então, a A. no seu requerimento probatório apresentado electronicamente em 27.05.2011, apresentar a Nota de Registo da acção digitalizada, cuja cópia em papel consta de fls. 256 do processo físico.

         E, foi com base em tal documento que na sentença se considerou, e a nosso ver sem qualquer reparo, o registo da acção ocorrido em 5/3/2010.

         Dispõe o Art. 663.º do CPC, com a epigrafe de Atendibilidade dos factos jurídicos supervenientes, que:

         « 1 - Sem prejuízo das restrições estabelecidas noutras disposições legais, nomeadamente quanto às condições em que pode ser alterada a causa de pedir, deve a sentença tomar em consideração os factos constitutivos, modificativos ou extintivos do direito que se produzam posteriormente à proposição da acção, de modo que a decisão corresponda à situação existente no momento do encerramento da discussão.

         2 - Só são, porém, atendíveis os factos que, segundo o direito substantivo aplicável, tenham influência sobre a existência ou conteúdo da relação controvertida.

         3 - A circunstância de o facto jurídico relevante ter nascido ou se haver extinguido no decurso do processo é levada em conta para o efeito da condenação em custas, de acordo com o disposto no artigo 450.º »

         É, pois, manifesto que ao abrigo de tal normativo legal podia e devia o tribunal recorrido levar em conta o facto relativo ao registo da presente acção e a data da respectiva ocorrência, porquanto, se trata de um facto constitutivo do direito da A. do qual logo desde a propositura da acção a mesma deu conta dele se querer aproveitar e cuja produção ocorreu ( como não podia deixar de ser ) posteriormente à propositura da acção, facto esse que, segundo o direito substantivo aplicável, tem influência sobre o conteúdo da relação controvertida.

         Pretende, ainda, o recorrente que tal documento se trata de uma mera cópia e de apenas dela se comprovar o pedido de registo, não resultando de forma inequívoca se o registo foi efectuado ou não, pelo que para se dar como provado o registo da acção deveria ter sido junta certidão da qual constasse a efectivação do registo do pedido.

         A tal propósito cumpre, desde logo, clarificar que na Nota de Registo, cuja cópia está junta a fls. 256 se mostra atestado, pela entidade oficial competente para o efeito, que a acção foi registada e não apenas, como defende o recorrente, que foi pedido o respectivo registo.      

             Por outro lado, dispõe-se no Art. 150º nº 3 do CPC (redacção do Dec-Lei 303/2007 de 24 de Agosto), que a parte que pratique o acto processual por via electrónica, deve apresentar, electronicamente, “a peça processual e os documentos que a devam acompanhar, ficando dispensada de remeter os respectivos originais”, sendo que nos termos do nº 7 da disposição, “os documentos apresentados nos termos previstos do nº 3 têm força probatória dos originais, nos termos definidos para as certidões”.

          Por evidentes razões de segurança e fiabilidade do sistema, o juiz poderá determinar a exibição dos originais em suporte de papel dos documentos juntos, de harmonia com o disposto no nº 8 do mesmo art. 150º.

             A lei processual geral dispensa hoje o interveniente processual, quando pratique o acto processual por via electrónica, de remeter o documento original, bastando-se com uma mera fotocópia que, porém, terá a mesma força probatória do original.

            No caso vertente a referida Nota de Registo foi entregue por via electrónica, pelo que, face às ditas disposições legais, a cópia digitalizada da mesma que foi apresentada electronicamente tem a força probatória da Nota de Registo da acção original, autenticidade a desta que resulta do disposto nos Arts. 363º Nº2, 369º, 370º e 371º todos do CC.

         Pelo exposto, mostra-se acertada a decisão da Mma. Juiz a quo ao considerar como assente o facto elencado na factualidade provada constante da sentença sob o nº 19 relativo ao registo da acção em 5.3.2010, improcedendo, as conclusões 1ª a  6º do recurso.


*

         II- Por via do presente recurso o apelante impugna a decisão da matéria de facto, insurgindo-se a esse respeito contra o facto de a 1.ª instância ter considerado não provada a matéria vertida nos quesitos 17º a 19º da base instrutória, quando no seu entender deveria ter sido considerada provada, e de ter considerado provada a matéria contida no quesito 21º, quando no seu entender deveria ter sido considerada não provada, ancorando a sua discordância em relação ao decidido pelo tribunal recorrido no facto dos depoimentos prestados na audiência de julgamento pelas testemunhas por si indicadas (…) cujos depoimentos transcreve parcialmente – imporem alteração das respostas dadas a tais factos pelo tribunal recorrido, porque tais depoimentos não foram contrariados por nenhum documento e nenhuma das testemunhas arroladas pela A. e pela co-ré Mazda – (…), Lda. prestaram qualquer declaração sobre tais factos por não terem estado presentes aquando dos mesmos, aduzindo, ainda, que o tribunal recorrido alicerçou a sua convicção em aspectos que não são rigorosos, retirou credibilidade às mencionadas testemunhas por aspectos absolutamente normais, violando a regra imposta pelo Artº 655º do CPC, o dever de julgar segundo o prudente arbítrio.

         (…)

.”

         No que tange à impugnação da decisão de facto proferida em 1.ª instância rege o Art. 712.º do C.P.C.

         Segundo F. Amâncio Ferreira, in Manual dos Recursos em Processo Civil, pág. 127, resulta de tal preceito que «...o direito português segue o modelo de revisão ou reponderação...», ainda que não em toda a sua pureza, pois, segundo o mesmo autor comporta as excepções que refere em tal obra.

         Já sobre os recursos de reponderação, ensina o Prof. Miguel Teixeira de Sousa, in Estudo Sobre o Novo Processo Civil, pág. 374, que os mesmos «...satisfazem-se com o controlo da decisão impugnada e em averiguar se, dentro dos condicionalismos da instância recorrida, essa decisão foi adequada, pelo que esses recursos controlam apenas - pode dizer-se - a “justiça relativa” dessa decisão».

            Tendo ocorrido no caso em análise a gravação dos depoimentos prestados em audiência de julgamento, nos termos do disposto no citado Art.º 712.º n.º 1 al. a) e n.º 2 do C.P.C, pode este tribunal da Relação alterar a decisão do tribunal de 1ª instância sobre a matéria de facto, desde que, em função dos elementos constantes dos autos ( incluindo, obviamente, a gravação ), seja razoável concluir que aquela enferma de erro.

         Do preâmbulo do Dec. Lei 329/95, de 15.12, que instituiu no nosso processo civil a possibilidade de documentação da prova, decorre que esta se destina à correcção de erros grosseiros ou manifestos verificados na decisão da matéria de facto, quanto aos pontos concretos da mesma, ou seja, “a criação de um verdadeiro e efectivo 2º grau de jurisdição na apreciação da matéria de facto, facultando às partes na causa uma maior e mais real possibilidade de reacção contra eventuais – e seguramente excepcionais – erros do julgador na livre apreciação das provas e na fixação da matéria de facto”.

         Desse mesmo preâmbulo consta também que “a garantia do duplo grau de jurisdição em sede da matéria de facto, nunca poderá envolver, pela própria natureza das coisas, a reapreciação sistemática e global de toda a prova produzida em audiência – visando apenas a detecção e correcção de pontuais, concretos e seguramente excepcionais erros de julgamento, incidindo sobre pontos determinados da matéria de facto, que o recorrente sempre terá o ónus de apontar claramente e fundamentar na sua minuta de recurso”.

         Do que se mostra expendido, é, pois, manifesto que actualmente se mostra legalmente consagrada a possibilidade deste tribunal de recurso alterar a decisão de facto proferida em 1ª instância, devendo para tal reapreciar as provas em que assentou a parte impugnada da decisão, tendo ainda em consideração o teor das alegações das partes, para o que terá de ouvir os depoimentos chamados à colação pelas recorrentes. E assim, (re) ponderando livremente essas provas, podendo, ainda, por força do disposto no Art. 712º nº 2 do C.P.C., “oficiosamente atender a quaisquer outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados”, formará a sua própria convicção relativamente a cada um dos factos em causa (não desconsiderando, principalmente, a ausência de imediação na produção dessa prova, e a consequente e natural limitação à formação desta convicção, o que em confronto com o decidido em 1ª instância terá como consequência a alteração ou a manutenção dessa decisão. E isso, por se ter concluído que a decisão de facto em causa, (re) apreciada “ segundo critérios de valoração racional e lógica do julgador, pressupondo o recurso a conhecimentos de ordem geral das pessoas normalmente inseridas na sociedade do seu tempo, a observância das regras da experiência e dos critérios da lógica ” – vide, neste sentido, Ac. STJ de Proc. n.º 3811/05, da 1.ª secção, citado no Ac. do mesmo tribunal de 28.05.2009, in www.dgsi.pt., corresponde, ou não, ao decidido em 1.ª instância.

         Com efeito, não poderá olvidar-se que na reponderação da decisão da matéria de facto, apesar da gravação da audiência de julgamento, esta continua a ser enformada pelo regime da oralidade (ainda que de forma mitigada face à gravação) a que se mostram adstritos, entre outros, o princípios da concentração e da imediação, o que impede que o tribunal de recurso apreenda e possa dispor de todo o circunstancialismo que envolveu a produção e captação da prova, designadamente a testemunhal, quase sempre decisivo para a formação da convicção do juiz; pois que, como referem A. Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, in Manual de Processo Civil, pág. 657, a propósito do “Princípio da Imediação”, «...Esse contacto directo, imediato, principalmente entre o juiz e a testemunha, permite ao responsável pelo julgamento captar uma série valiosa de elementos (através do que pode perguntar, observar e depreender do depoimento, da pessoa e das reacções do inquirido) sobre a realidade dos factos que a mera leitura do relato escrito do depoimento não pode facultar. ...».

            Sem esquecer, ainda, que quanto ao resultado da apreciação da prova testemunhal, de acordo com o disposto no Art. 655º nº 1 do C.P.C., “O tribunal colectivo (ou o juiz singular) aprecia livremente as provas, decidindo os juízes segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto”, mantendo o princípio da liberdade de julgamento. E, quanto à força probatória os depoimentos das testemunhas são apreciados livremente pelo tribunal, como resulta do disposto no Art. 396º do C.C.

            Cumpre, ainda, referir que constituem ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto, os previstos no Artº 685º-B, nºs 1 e 2 do C.P.C., de onde decorre que ao apelante não basta atacar a convicção que o julgador formou sobre cada uma ou a globalidade das provas para provocar uma alteração da decisão da matéria de facto, sendo ainda indispensável, e “sob pena de rejeição”, que cumpra os ónus de especificação aí impostos, isto é:

         a) – Tem de especificar quais os concretos pontos de facto que o recorrente considera incorrectamente julgados;

         b) – Tem de indicar quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impõem decisão diversa da recorrida sobre cada um dos concretos pontos impugnados da matéria de facto, tratando-se de prova gravada, deverá identificar precisa e separadamente, com referência ao que consta da acta, os depoimentos em que se funda, indicando ainda com exactidão as passagens dessa gravação em que se funda;

         c) – E deve desenvolver a análise crítica dessas provas, por forma a demonstrar que a decisão proferida sobre cada um desses concretos pontos de facto não é possível, não é plausível ou não é a mais razoável.

         Vide a este propósito os Acs. do STJ de 10.05.2007 e de 30.10.2007, todos in www.dgsi.pt.

         (…)

         Por tudo quando se deixa dito, conclui-se que, contrariamente ao pretendido pelo recorrente, a valoração feita pelo tribunal recorrido da matéria de facto que através do presente recurso por aquele vem impugnada não merece qualquer censura, sendo, ao invés, sufragada por este tribunal de recurso pelas razões que se deixam expostas, devendo, pois, manter-se sem qualquer alteração a decisão sobre a mesma proferida pelo tribunal da 1ª instância.


*

         III- Decidido que ficou que a matéria de facto tal qual como foi valorada pelo tribunal recorrido se mantém inalterada, resta, então, apreciar se em face da mesma deve o 2º R. ser absolvido dos pedidos formulados nos autos como o mesmo pretende nas conclusões do recurso que interpôs.

         A este propósito, dir-se-á desde logo que se nos afigura correcta a subsunção dos factos às normas jurídicas feita na sentença recorrida, à qual, por isso, aderimos na íntegra.

         Na verdade, em face da panóplia fáctica apurada dúvidas não restam de que o negócio celebrado em 7.8.2008 entre a A. e a 1ª R. que teve por objecto o veículo de marca MAZDA, modelo 6 MZR-CD e matrícula 81-FE-37, qualificado correctamente na sentença recorrida como tratando-se de uma compra e venda, é válido, o mesmo já não se podendo dizer em relação ao negócio, igualmente qualificado correctamente nessa mesma decisão como de compra e venda, celebrado após 7.08.2008 entre a 1ª R. e o 2º R. que teve por objecto esse mesmo veículo.

         De facto, esta segunda venda trata-se de uma venda de bem alheio, porquanto, a 1ª R. quando procedeu a essa venda ao 2º R. já não era proprietária do dito veículo mas apenas sua locatária, venda essa que, por isso, está ferida de nulidade, sendo ineficaz em relação à A.

É certo que a A. não procedeu ao registo da aquisição do veículo objecto do referido negócio por si celebrado com a 1ª R. em 7.8.2008, enquanto que o 2º R. procedeu ao registo da aquisição do mesmo veículo objecto do negócio por si celebrado com a 1ª R. depois da referida data.

Todavia, tal não confere ao 2º R. o estatuto de terceiro de boa fé para efeitos de registo.

O registo tem essencialmente por fim dar publicidade aos direitos inerentes às coisas imóveis e móveis sujeitas a registo (artigo 1º do Código do Registo Predial).

Tem, pois, uma função essencialmente declarativa e não constitutiva.

O registo conserva direitos mas não os cria.

Do mesmo modo que não pode suprir a falta do direito nem sanar os vícios que envolvam os direitos transmitidos.

         De acordo com o Ac. do STJ nº 3/99, publicado no D.R. Série I-A de 10.07.99, «terceiros, para efeitos do disposto no art. 5º do Código de Registo Predial, são os adquirentes, de boa fé, de um mesmo transmitente comum, de direitos incompatíveis, sobre a mesma coisa».

         Este acórdão veio uniformizar a jurisprudência, preconizando o chamado conceito restrito de terceiros, para efeitos de registo predial, já preconizado, na Doutrina, por Manuel de Andrade, in Teoria Geral da Relação Jurídica, Vol. II, p. 19 e Orlando de Carvalho, em « Terceiros Para Efeitos de Registo», in Boletim da Faculdade de Direito de Coimbra, LXX, 1994 ) e revogar o Ac do STJ de 20.05.97, também ele de uniformização de jurisprudência que, com o nº 15/97, foi publicado no D.R. Série I-A de 04.07.97, segundo o qual «terceiros, para efeitos de registo predial, são todos os que, tendo obtido registo de um direito sobre determinado prédio, veriam esse direito ser arredado por qualquer facto jurídico anterior não registado ou registado posteriormente».

         Na sequência do Acórdão de Uniformização de Jurisprudência nº 3/99, o Decreto-Lei nº 533/99, de 11 de Dezembro veio aditar um nº 4 ao art. 5º do Código de Registo Predial, segundo o qual, “terceiros, para efeitos de registo, são aqueles que tenham adquirido de um autor comum direitos incompatíveis entre si”.

          No caso vertente, a segunda compra e venda foi celebrada em relação a um veículo que já não estava no património da vendedora, à data da respectiva celebração e também do subsequente registo de aquisição em nome do 2º R., razão pela qual se trata de um compra e venda nula.

          O Art. 17º nº 2 do C.R.P. dispõe que «a declaração de nulidade do registo não prejudica os direitos adquiridos a título oneroso por terceiro de boa fé, se o registo dos correspondentes factos for anterior ao registo da acção de nulidade».

          Por seu turno, o Art. 291º nºs 1 e 3 do CC, também excepciona dos efeitos da declaração de nulidade de um negócio jurídico os direitos adquiridos sobre eles a título oneroso por terceiro de boa fé – desconhecedor do vício sem culpa no momento da aquisição - no caso de o registo da aquisição ser anterior ao registo da acção.

Por outro lado, o nº 2 do mesmo Art. 291º introduz uma limitação a esta excepção, com a previsão de que os direitos de terceiro não serão reconhecidos se a acção for proposta e registada nos três anos posteriores à conclusão do negócio, caso em que prevalecerão os do primeiro adquirente.

Assim, em nome da estabilidade e da segurança nas relações jurídicas, este Art. 291º concede protecção ao último sub-adquirente num contexto de aquisição a «non domino», decorrente da nulidade do primeiro (ou antecedente) contrato, por falta de legitimidade substantiva do vendedor, no conflito com o primeiro transmitente.

Este normativo pressupõe, por conseguinte, uma sucessão de negócios jurídicos nulos.

Diversamente, terceiros de boa fé para efeitos registrais são, como se disse, dois adquirentes, num contexto de validade e eficácia de todos os negócios jurídicos de transmissão em jogo.

Com efeito, conforme se defende nos Acs. do STJ de 21.06.2007, de 19.02.2004, de 27.04.2005, de 05.07.2007 de 11.09.2008, todos disponíveis em www.dgsi.pt, o que subjaz à previsão contida no citado art. 5º nº 4 do Código de Registo Predial, « são situações de conflito entre dois adquirentes, é válido o primeiro negócio de transmissão e não o segundo, mas o primeiro adquirente não pode opor ao segundo a sua aquisição, porque ela não constava no registo, e o último não podia, dada a fé pública derivada do registo, conhecer que o alienante já não era o titular do direito em causa.»

«Mas este conceito de terceiro para efeito do registo, tal como acima se referiu, não coincide com o conceito de terceiro a que se reporta o artigo 291º do Código Civil, porque na primeira situação o conflito é entre dois adquirentes e, na segunda, o conflito ocorre entre o primeiro transmitente e o último sub-adquirente.»

«Na primeira situação é pressuposta a validade do primeiro negócio de transmissão e na segunda a sua invalidade, ali é protegida a confiança do adquirente nos dados constantes no registo, e aqui é protegida a estabilidade dos negócios jurídicos em termos de excepção ao disposto no artigo 289º nº 1 do Código Civil»

          No caso vertente, nem o Art. 17º nº 2 do CRP, nem o Art. 291º do CC são aplicáveis à ineficácia que inquina, em relação à A., a compra e venda celebrada entre 1ª R. e o 2º R. após 7.8.2008,  a qual, por isso, é inoponível à A., o que implica que o 2º R. não goza da protecção que, em geral, é concedida pelo registo, até porque a inscrição do direito de propriedade em seu nome sobre o veículo em discussão nos autos tem de ser cancelada, já que foi feita com base num título nulo.

         Assim, porque a presente acção foi instaurada em 29.12.2009 pela A. para declaração da nulidade da compra e venda celebrada após 7.8.2008 e foi registada em 5.3.2010, ou seja, antes de decorridos três anos sobre a data da conclusão daquele negócio, por aplicação do disposto no aludido Art. 291º, nº2, do C.C., os direitos do 2º réu não podem ser reconhecidos, prevalecendo a anterior aquisição do veículo que foi feita pela A. em 7.8.2008, uma vez que à data da propositura e do registo da presente acção ainda não tinham decorrido os 3 anos a que se reporta Artº 291°, nº 2, do C.Civil.

         Assim sendo, nenhum reparo há a fazer à sentença recorrida que, - declarando a nulidade do negócio efectuado entre a 1ª R. e o 2º R., reconhecendo à A. o direito de propriedade sobre a viatura automóvel, marca MAZDA, modelo MZR-CD, matrícula 81-FE-37 e ordenando o cancelamento do registo de propriedade inscrito a favor do 2º R. em 20.10.2008 - julgou a acção procedente e improcedente o pedido reconvencional deduzido pelo 2º R., a qual, por isso, se mantém na íntegra.

        

         IV- SUMÁRIO ( Art. 713º Nº7 C.P.C. )

         1. O facto relativo ao registo da presente acção e a data da respectiva ocorrência, por se tratar de um facto constitutivo do direito da A. do qual esta desde a propositura da acção deu conta de se querer dele aproveitar e por ter influência sobre o conteúdo da relação controvertida deve ser levado em conta pelo juiz na sentença.

         2. A lei processual geral dispensa hoje o interveniente processual, quando pratique o acto processual por via electrónica, de remeter o documento original, bastando-se com uma mera fotocópia que, terá a mesma força probatória do original, podendo, embora, o juiz determinar a exibição do original em suporte de papel do documento assim juntos, por razões de segurança e fiabilidade do sistema.

         3. Verificando-se que o mesmo veículo automóvel foi vendido duas vezes, pelo mesma ré, a duas entidades distintas, a primeira venda é válida, por tal contrato não estar sujeito a qualquer formalidade especial.

         4. Ao vender de novo o mesmo veículo a outrem, que procedeu ao seu registo antes do primeiro comprador, a dita ré vendeu um bem que já não lhe pertencia, por se tratar de um bem alheio, encontrando-se essa venda ferida de nulidade nas relações entre alienante e adquirente e sendo ineficaz em relação ao primitivo adquirente e seu proprietário.

         5. A declaração da nulidade do segundo contrato de compra e venda prejudica os direitos adquiridos sobre o mesmo bem, a título oneroso, por terceiro de boa fé, não obstante ter este registado a sua aquisição antes do registo da acção de nulidade, se tal acção tiver sido proposta e registada dentro dos três anos subsequente à declaração do negócio nulo.

         6. Tendo a acção de nulidade sido proposta e registada antes de decorridos três anos sobre a celebração do negócio nulo, não podem ser reconhecidos os direitos do segundo adquirente, prevalecendo a aquisição resultante da primeira venda.

         V- DECISÃO

         Assim, em face do exposto, acorda-se em julgar totalmente improcedente o recurso interposto pelo apelante 2º R., confirmando-se na íntegra a decisão recorrida

         Custas pelo apelante.

                                                

 

                                                        Maria José Guerra ( Relatora)

                                                        Albertina Pedroso

                                                        Carvalho Martins