Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
19/18.5GAFAG.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: MARIA JOSÉ NOGUEIRA
Descritores: INQUÉRITO
INSTRUÇÃO
AUTORIDADE JUDICIÁRIA
DECLARAÇÕES DE CO-ARGUIDO
JULGAMENTO
LEITURA DE DECLARAÇÕES
AUSÊNCIA DO CO-ARGUIDO DECLARANTE
CONTRADITÓRIO
VALIDADE PROBATÓRIA
PROVA PROIBIDA
NOVA SENTENÇA
Data do Acordão: 05/05/2021
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: GUARDA (JUÍZO DE COMPETÊNCIA GENÉRICA DE GOUVEIA)
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTS. 141.º, N.º 4, AL. B), 345.º, N.º 4, E 357.º, N.º 1, AL. B), DO CPP; ART. 32.º, N.º 5, DA CRP
Sumário: I – As declarações de co-arguido feitas, perante a autoridade judiciária, no decurso do inquérito, com a assistência de defensor, tendo aquele sido, então, informado nos termos e para os efeitos do disposto na al. b) do n.º 4 do art. 141.º do CPP, e lidas em sede de audiência de julgamento (art. 357.º, n.ºs 1, al. b), e 2, do CPP), o qual decorreu sem a presença do mesmo, podem, quanto aos factos incriminatórios que sobre si impendem, ser objecto de valoração, sujeita ao princípio da livre apreciação, pelo tribunal.

II – Contudo, por incompatibilidade com o exercício pleno do contraditório, já não podem ser valoradas na parte em que revelem um prejuízo para os demais co-arguidos, ou seja, quando estes ficam privados, pela ausência em julgamento do co-arguido/declarante, do direito de, com as mesmas, o confrontarem.

III – Ao agir assim, o tribunal incorre em valoração proibida de prova, cuja consequência, caso a fundamentação da convicção se funde também noutros meios de prova, é a prolação de nova sentença no tribunal da 1.ª instância, expurgada que seja a referida prova legalmente não permitida.

Decisão Texto Integral:






Acordam em conferência os juízes na 5.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra

I. Relatório

1. No âmbito do processo comum singular n.º 19/18.5GAFAG do Tribunal Judicial da Comarca da Guarda, Gouveia – Juízo de C. Genérica, por sentença proferida em 30.09.2020, o tribunal decidiu [transcrição parcial do dispositivo]:

a) Condenar o arguido A., pela prática, em coautoria material, na forma consumada, e em concurso efetivo, de cinco crimes de furto qualificado, ps. e ps. pelo artigo 204.º, n.º 1, alínea j) do Código Penal, nas penas parcelares de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão por cada um dos crimes;

b) Em cúmulo material pela prática dos ilícitos criminais referidos em a), condeno o arguido A na pena única de 3 (três) anos de prisão;

c) Suspendo a execução da pena de prisão referida em b) pelo período de 3 (três) anos – cf. artigo 50.º, n.ºs 1 e 5 do Código Penal;

d) Condenar o arguido JP, pela prática em coautoria material, na forma consumada, e em concurso efetivo, de cinco crimes de furto qualificado, ps. e ps. pelo artigo 204.º, n.º 1, alínea j) do Código Penal, nas penas parcelares de 2 (dois) anos de prisão por cada um dos crimes;

e) Em cúmulo material pela prática dos ilícitos criminais referidos em d), condeno o arguido J. na pena única de 4 (quatro) anos de prisão;

f) Suspendo a execução da pena de prisão referida em e) pelo período de 4 (quatro) anos – cf. artigo 50.º, n.ºs 1 e 5 do Código Penal;

g) Condenar o arguido JJ pela prática, em coautoria material, na forma consumada e em concurso efetivo, de cinco crimes de furto qualificado, ps. e ps. pelo artigo 204.º, n.º 1, alínea j) do Código Penal nas penas parcelares de 200 (duzentos) dias de multa à taxa diária de 5,00€ (cinco euros), perfazendo o montante global unitário de 1.000,00 (mil euros);

h) Em cúmulo material pela prática dos ilícitos criminais referidos em g) condeno o arguido JJ. na pena única de 500 (quinhentos) dias de multa à taxa diária de 5,00€ (cinco euros), perfazendo o montante global de 2.500,00 (dois mil e quinhentos euros);

[…]


*

Julgo totalmente procedente o pedido de indemnização civil deduzido pela demandante civil M., S.A. – cujo valor fixo em 13.876,00€ (treze mil oitocentos e setenta e seis euros), nos termos do preceituado no artigo 297.º, n.º 1 do Código de Processo Civil – e, em consequência condeno os arguidos/demandados civis A., J. e JA a pagarem à demandante civil MEO – Serviços de Comunicações e Multimédia, S.A. a quantia global de 13.876,00€ (treze mil oitocentos e setenta e seis euros) a título de indemnização pelos danos patrimoniais sofridos, acrescida de juros de mora contados desde a data da notificação dos arguidos/demandados civis realizada em último lugar para contestarem o pedido de indemnização civil contra eles deduzido, calculado à taxa legal fixada para os juros civis, e até efetivo e integral pagamento.

[…]


*

Declaro perdidos a favor do Estado uma cisalha de cor amarela de marca “7FUERTE”, uma serra de madeira de cor laranja, uma serra de metal enferrujada, corda de nylon com cerca de 7,50 metros de comprimento, uma cisalha de cor vermelha e cabos, melhor id. nos autos de apreensão de fls. 13, 113 e 114 e 25 e 26 dos autos apensos respeitantes ao NUIPC 78/18.0GASEI, e determino a sua destruição, devendo ser junto aos autos o competente auto de destruição – cf. artigo 109.º, n.ºs 1 e 4 do Código Penal.

[…].

2. Inconformados com a decisão recorreram os arguidos JP e JJ, formulando as seguintes conclusões:

I) Os recorrentes insurgem-se contra a factualidade dada como provada, nomeadamente nos factos 1 a 28, 31, 32, 33, 54 a 58, por deles não haver prova, porquanto nenhumas das testemunhas os presenciaram.

II) Em boa verdade, o Tribunal recorrido alicerçou a sua decisão apenas nas declarações prestadas pelo coarguido A em sede de inquérito nos termos do art. 141.º n.º 4 al. b) do CPP, sendo as mesmas reproduzidas em audiência de julgamento, sendo que essas declarações não podem constituir meio de prova, em face do disposto no art. 345.º nº 4 do CPP.

III) Se é certo que a Lei 20/2013 de 21 de Fevereiro, na redação que deu ao art. 357.º n.º 1 al. b) do CPP, veio “aceitar” como prova as declarações prestadas em sede de inquérito por arguido, valendo a sua livre apreciação, também é certo que tal realidade tem a limitação imposta pelo art. 345.º do mesmo Código.

IV) Se um arguido prestou declarações em inquérito a desfavor dos demais coarguidos, as mesmas reproduzidas em audiência de julgamento não podem ser valoradas contra esses, se o arguido que as prestou se remeter ao silêncio ou se estiver ausente, uma vez que não existe possibilidade de o contrainterrogar.

V) Para as declarações de um arguido poderem valer contra os demais coarguidos, estes têm de ter a possibilidade e o direito de as contraditar, devendo ser-lhe assegurado o exercício do contraditório, nos termos do art. 327.º n.º 2 e 323º f) do CPP.

VI) No caso dos autos, esse contraditório só poderia ser feito com a inquirição do arguido que prestou declarações, uma vez que foi ele o único alicerce para a decisão, e visto que o conhecimento das testemunhas acerca dos factos foi apenas e tão só indireto.

VII) O silêncio a que os arguidos se remeteram, nos termos do art. 61.º n.º 1 al. d) do CPP, não lhes pode ser desfavorável nem pode prejudica-los:

VIII) Não se revela adequado nem constitucionalmente admissível, defender-se que pelo facto de os arguidos recorrentes se remeterem ao silêncio “perderam a oportunidade” de exercer o contraditório, uma vez que contraditório, in casu, era impossível de ser exercido.

IX) De qualquer forma, mesmo que as declarações prestadas em sede de inquérito pudessem ser admitidas como meio de prova a ser apreciada livremente pelo tribunal, a verdade é que sempre seria necessário que fossem corroboradas por outros meios de prova, o que não aconteceu.

X) O valor das declarações do arguido exigem especiais ponderações pelo julgador, e são um meio particularmente frágil, pelo que só com demais prova adicional se pode fundamentar uma condenação.

XI) Uma vez que mais nenhuma prova existe sobre a ligação dos recorrentes aos factos, não poderia ter o Tribunal a quo decidido pela condenação, violando os princípios da investigação, livre apreciação e in dubio pro reo.

XII) A sentença recorrida violou os artigos 32.º nº 2 e 5 da Constituição da República Portuguesa, 323.º, alínea f), 327.º, n.º 2 e 345.º n.º 4 todos do Código de Processo Penal.

Pelo que deve ser revogada a decisão de que se recorre, absolvendo-se os recorrentes, e fazendo-se dessa forma JUSTIÇA!

3. Foi proferido despacho de admissão do recurso.

4. Em resposta ao recurso, o Ministério Público concluiu:

1. As declarações de coarguido valem como meio de prova, a apreciar livremente pelo Tribunal.

2. O direito ao contraditório não se resume ao direito a exercer o contrainterrogatório.

3. Conjugados os elementos probatórios analisados na motivação da sentença recorrida, resulta que o juízo que o Tribunal a quo formulou sobre a prova produzida assenta em critérios lógicos e racionais e no uso de regras da experiência, não existindo razões que justifiquem a alteração da decisão sobre a matéria de facto.

4. O Tribunal a quo não violou qualquer norma, designadamente as invocadas pelos recorrentes.

Pelo exposto e pelos fundamentos constantes da decisão recorrida, aos quais se adere, deve a mesma ser confirmada e negar-se provimento ao recurso apresentado por JP e JJ, assim se fazendo justiça!

5. Na Relação o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer, pronunciando-se no sentido de o recurso não merecer provimento.

6. Cumprido o n.º 2, do artigo 417.º do CPP, nenhum dos interessados reagiu.

7. Realizado o exame preliminar e colhidos os vistos foram os autos à conferência, cabendo agora decidir.

II. Fundamentação

1. Delimitação do objeto do recurso

Tendo presente as conclusões, pelas quais se delimita o objeto do recurso, sem prejuízo do conhecimento de eventuais questões de natureza oficiosa, no caso em apreço importa decidir se o tribunal a quo procedeu à valoração proibida de prova, concretamente no que respeita às declarações, prestadas nos termos e para os efeitos do artigo 141.º, n.º 4, alínea b), do CPP, na parte em que o foram em prejuízo dos co-arguidos/recorrentes.

2. A decisão recorrida

Ficou a constar da sentença em crise [transcrição parcial]:

2.1. Factos provados

Da discussão da causa resultaram provados os seguintes factos:

(NUIPC 20/18.9GBGVA)

1) No dia 02 de Fevereiro de 2018, os arguidos A, JJ e JP decidiram que naquela noite iriam apoderar-se de bens ou valores que encontrassem, com o intuito de os fazerem seus.

2) Assim, no decurso do plano previamente elaborado, e em comunhão de esforços e vontades, os arguidos A, JJ e JP, nesse mesmo dia, em hora não concretamente apurada, mas sendo já de noite, no período de fim de tarde/início de noite, fizeram-se transportar no veículo automóvel de matrícula (…), de marca Ford, modelo Transit, conduzido por JP, utilizador habitual do referido veículo, e dirigiram-se à localidade de (…), mais concretamente junto ao traçado aéreo de uma linha de comunicações, destinada à exploração do serviço de comunicações fornecidos pela M. S.A., o que os arguidos bem sabiam, que ali se encontrava junto à EM555.

3) Ali chegados, o arguido A saiu do referido veículo e após os arguidos JJ e JP retiraram-se daquele local, e foram estacionar o veículo em local próximo, onde aguardaram que o arguido A cortasse o cabo de comunicações e o acondicionasse para o transporte.

4) O arguido A dirigiu-se para junto do traçado aéreo de uma linha de comunicações ali situado, e uma vez aí, com recurso a duas zagaias, uma tesoura/cisalha de corte de ferro e uma corda de nylon, instrumentos fornecidos pelos arguidos JJ e JP, procedeu ao corte de dois postes de comunicações que ali se encontravam, de forma a colocar a linha de cobre ao nível do solo, após procedeu à remoção das estruturas que suportam o cabo de comunicações e ao corte do cabo de cobre, sendo 150 metros de cabo TE1HES 150x0,4 e 200 metros de cabo TE1HES 299x0,4, no valor não inferior a 102,00€, propriedade da M. S.A..

5) Após, estando o referido cabo de comunicações já na posse do arguido A, os arguidos comunicaram telefonicamente entre si, e os arguidos JJ e JP deslocaram-se ao local onde o arguido A se encontrava e procederam à recolha do referido cabo de comunicações e do arguido A.

6) De seguida, com o referido metal no interior do veículo acima identificado, abandonaram o local, fazendo seu o acima identificado metal, e dirigiram-se para a residência dos arguidos JJ e JP, sita em Rua do (…), (…), em (…), onde, num dos terrenos próximos procederam à queima dos cabos de comunicações, a fim de limparem e extraírem o cobre.

(NUIPC 18/18.7GBGVA)

7) No dia 13 de fevereiro de 2018, os arguidos A, JJ e JP, decidiram que naquela noite iriam apoderar-se de bens ou valores que encontrassem, com o intuito de os fazerem seus.

8) Assim, no decurso do plano previamente elaborado, e em comunhão de esforços e vontades, os arguidos A, JJ e JP, nesse mesmo dia, em hora não concretamente apurada, mas sendo já de noite, no período de fim de tarde/início de noite, fizeram-se transportar no veículo automóvel de matrícula (…), de marca Ford, modelo Transit, conduzido por JP, utilizador habitual do referido veículo, e dirigiram-se à localidade de (…), mais concretamente junto ao traçado aéreo de uma linha de comunicações, destinada à exploração do serviço de comunicações fornecidos pela M, o que os arguidos bem sabiam, que ali se encontrava junto ao quilómetro 117,5 da Estrada Nacional 17.

9) Ali chegados, o arguido A saiu do referido veículo e após os arguidos JJ e JP retiraram-se daquele local, e foram estacionar o veículo em local próximo, onde aguardaram que o arguido A cortasse o cabo de comunicações e o acondicionasse para o transporte.

10) O arguido A dirigiu-se para junto do traçado aéreo de uma linha de comunicações ali situado, uma vez aí, com recurso a duas zagaias, uma tesoura/cisalha de corte de ferro e uma corda de nylon, instrumentos fornecidos pelos arguidos JJ e JP, procedeu ao corte de quatro postes de comunicações que ali se encontravam, de forma a colocar a linha de cobre ao nível do solo, após procedeu à remoção das estruturas que suportam o cabo de comunicações e ao corte de 700 metros de cabo de cobre (350 metros de cabo TE1HES 100x2x0,9; 350 metros de cabo TE1HES 50x2x0,9), no valor de 102,00€, propriedade da M S.A..

11) Após, estando o referido cabo de comunicações já na posse do arguido A, os arguidos comunicaram telefonicamente entre si, e os arguidos JJ e JP deslocaram-se ao local onde o arguido A se encontrava e procederam à recolha do referido cabo de comunicações e do arguido A.

12) De seguida, com o referido metal no interior do veículo acima identificado, abandonaram o local, fazendo seu o acima identificado metal.

(NUIPC 78/18.0GASEI)

13) Assim, no decurso do plano previamente elaborado, e em comunhão de esforços e vontades, os arguidos A, JJ e JP, nesse mesmo dia, em hora não concretamente apurada, mas em hora posterior à execução da factualidade descrita nos pontos 7) a 11), fizeram-se transportar no veículo automóvel de matrícula (…), de marca Ford, modelo Transit, conduzido por JP, utilizador habitual do referido veículo, e dirigiram-se à localidade de (…), mais concretamente junto ao traçado aéreo de uma linha de comunicações, destinada à exploração do serviço de comunicações fornecidos pela M S.A., o que os arguidos bem sabiam, que ali se encontrava junto à Estrada Municipal 522.

14) Ali chegados, o arguido A saiu do referido veículo e após os arguidos JJ e JP retiraram-se daquele local, e foram estacionar o veículo em local próximo, onde aguardaram que o arguido A cortasse o cabo de comunicações e o acondicionasse para o transporte.

15) O arguido A dirigiu-se para junto do traçado aéreo de uma linha de comunicações ali situado, e uma vez aí chegado, com recurso a duas zagaias, uma tesoura/cisalha de corte de ferro e uma corda de nylon, instrumentos fornecidos pelos arguidos JJ e JP, procedeu ao corte de quatro postes de comunicações que ali se encontravam, de forma a colocar a linha de cobre ao nível do solo, após procedeu à remoção das estruturas que suportam o cabo de comunicações e ao corte de 450 metros de cabo de cobre (150 metros de cabo TE1HES 200x2x0,6; 150 metros de cabo TE1HES 200x2x0,6; 150 metros de cabo TE1HES 100x2x0,4), no valor não inferior a 102,00€, propriedade da M S.A.

16) Após, estando o referido cabo de comunicações já na posse do arguido A, os arguidos comunicaram telefonicamente entre si, e os arguidos JJ e JP deslocaram-se ao local onde o arguido A se encontrava e procederam à recolha de apenas 277 metros do referido cabo de comunicações e do arguido A, em virtude de terem visualizado uma patrulha da Guarda Nacional Republicana em local próximo.

17) De seguida, com o referido metal no interior do veículo acima identificado, abandonaram o local, fazendo seu o acima identificado metal, e dirigiram-se para a residência dos arguidos JJ e JP, sita em Rua do (…), (…), em (…), onde, num dos terrenos próximos, procederam à queima dos cabos de comunicações, a fim de limparem e extraírem o cobre.

(NUIPC 24/18.1GBGVA)

18) Em dia não concretamente apurado do mês de Fevereiro de 2018, mas até ao dia 17, os arguidos A, JJ e JP, decidiram que naquela noite iriam apoderar-se de bens ou valores que encontrassem, com o intuito de os fazerem seus.

19) Assim, no decurso do plano previamente elaborado, e em comunhão de esforços e vontades, os arguidos A, JJ e JP, nesse mesmo dia, em hora não concretamente apurada, mas sendo já de noite, no período de fim de tarde/início de noite, fizeram-se transportar no veículo automóvel de matrícula (…), de marca Ford, modelo Transit, conduzido por JP, utilizador habitual do referido veículo, e dirigiram-se à localidade de (…), mais concretamente junto ao traçado aéreo de uma linha de comunicações, destinada à exploração do serviço de comunicações fornecidos pela M S.A., o que os arguidos bem sabiam, que ali se encontrava entre as localidades de (…) e (…) (coordenadas: Lat-40.520992 e Long-7.548187).

20) Ali chegados, o arguido A saiu do referido veículo e os arguidos JJ e JP retiraram-se daquele local, e foram estacionar o veículo em local próximo onde aguardaram que o arguido A cortasse o cabo de comunicações e o acondicionasse para o transporte.

21) O arguido A dirigiu-se para junto do traçado aéreo de uma linha de comunicações ali situado, uma vez aí, com recurso a duas zagaias, uma tesoura/cisalha de corte de ferro e uma corda de nylon, instrumentos fornecidos pelos arguidos JJ e JP, procedeu ao corte de dois postes de comunicações que ali se encontravam, de forma a colocar a linha de cobre ao nível do solo, após procedeu à remoção das estruturas que suportam o cabo de comunicações e ao corte do cabo de cobre (cabo TEHVS 12x4x0,9), com cerca de 150 metros de comprimento, no valor não inferior a 102,00€, propriedade da M S.A.

22) Após, estando o referido cabo de comunicações já na posse do arguido A, os arguidos comunicaram telefonicamente entre si, e os arguidos JJ e JP deslocaram-se ao local onde o arguido A se encontrava e procederam à recolha do referido cabo de comunicações, fazendo-o seu, e do arguido A.

(NUIPC 23/18.3GBGVA)

23) Em dia não concretamente apurado do mês de Fevereiro de 2018, mas até ao dia 17, os arguidos A, JJ e JP, decidiram que naquela noite iriam apoderar-se de bens ou valores que encontrassem, com o intuito de os fazerem seus.

24) Assim, no decurso do plano previamente elaborado, e em comunhão de esforços e vontades, os arguidos A, JJ e JP, nesse mesmo dia, em hora não concretamente apurada, mas sendo já de noite, no período de fim de tarde/início de noite, fizeram-se transportar no veículo automóvel de matrícula (…), marca Ford, modelo Transit, conduzido pelo arguido JP, utilizador habitual do veículo, e dirigiram-se à localidade de (…), mais concretamente junto ao traçado aéreo de uma linha de comunicações, destinada à exploração do serviço de comunicações fornecidos pela M S.A., o que os arguidos bem sabiam, que ali se encontrava entre as localidades de (…) e (…).

25) Ali chegados, o arguido A saiu do referido veículo e após os arguidos JJ e JP, retiraram-se daquele local, e foram estacionar o veículo em local próximo, onde aguardaram que o arguido A cortasse o cabo de comunicações e o acondicionasse para o transporte.

26) O arguido A dirigiu-se para junto do traçado aéreo de uma linha de comunicações ali situado, uma vez aí, com recurso a duas zagaias, uma tesoura/cisalha de corte de ferro e uma corda de nylon, instrumentos fornecidos pelos arguidos JJ e JP, procedeu ao corte de um número não determinado de postes de comunicações que ali se encontravam, de forma a colocar a linha de cobre ao nível do solo, após procedeu à remoção das estruturas que suportam o cabo de comunicações e ao corte do cabo de cobre (cabo TE1HES 50x2x0,6), com cerca de 1800 metros de comprimento, no valor não inferior a 102,00€, propriedade da M S.A.

27) Após, estando o referido cabo de comunicações já na posse do arguido A, os arguidos comunicaram telefonicamente entre si, e os arguidos JJ e JP, que se deslocaram ao local onde aquele se encontrava e procederam à recolha do referido cabo de comunicações e do arguido A.

28) De seguida, com o referido metal no interior do veículo acima identificado, abandonaram o local, fazendo seu o acima identificado metal, e dirigiram-se para a residência dos arguidos A, sita em Rua do (…), (…), em (…), onde, num dos terrenos adjacentes procederam à queima dos cabos de comunicações, a fim de limparem e extraírem o cobre.

29) No dia 17/02/2018, pelas 20:45 horas, o arguido A detinha na sua posse duas zagaias, uma tesoura/cisalha de corte de ferro e uma corda de nylon com cerca de 7,50 metros.

30) No dia 26/04/2018, pelas 07:20 horas, o arguido JP detinha na sua residência, sita Rua (…), s/n, (…), uma tesoura de cortar ferro, também denominada por cisalha.

31) Os arguidos A, JJ e JP, em todas as circunstâncias e da forma acima descritas, atuaram de comum acordo e em conjugação de esforços, de forma livre, voluntária e conscientemente, com o propósito conseguido de se apoderarem do metal acima identificado, bem como de impedir e perturbar a exploração do serviço de comunicações fornecido pela M S.A., mais sabendo que o referido metal não lhe pertencia e que atuavam no desconhecimento e contra a vontade da sua legítima proprietária M S.A.

32) Os arguidos agiram sempre estando cientes de que a sua conduta era proibida e punida por lei como crime.

Mais se apurou com interesse para a decisão da causa:

(…).

2.2. Factos não provados

Relativos à matéria criminal

(…).

Relativos ao pedido de indemnização civil

Inexistem.

2.3. Motivação da matéria de facto

No apuramento da factualidade provada e não provada, o tribunal formou a sua convicção com base na valoração crítica e conjunta dos meios de prova produzidos, à luz das regras da experiência comum e da sua livre convicção.

Assim, para a formação da convicção, o Tribunal atendeu à conjugação crítica dos seguintes meios de prova:

- declarações do arguido A, prestadas em primeiro interrogatório não judicial perante Autoridade Judiciária, de fls. 75 a 81;

- depoimentos testemunhais prestados em sede de audiência de discussão e julgamento: (…), (…), (…), (…), (…) e (…).

- documentos juntos aos autos, designadamente, relatório de exame pericial de fls. 176 a 188, 191 a 196, 199 a 205; autos de notícia e respetivos aditamentos de fls. 4 a 5, 16 a 17, 27 a 29, 2 a 5 e 7 do apenso respeitante ao NUIPC 20/18.9GBGVA, 2 e 3 do apenso respeitante ao NUIPC 18/18.9GBGVA, 3 a 10 e 19 a 20 do apenso respeitante ao NUIPC 78/18.0GASEI, 2 a 5 do apenso respeitante ao NUIPC 24/18.1GBGVA e 3 a 6 do apenso respeitante ao NUIPC 23/18.3GBGVA; autos de busca e apreensão a fls. 13, 25, 111 a 112, 113 a 114, 151 a 159, 25 a 26 respeitante ao NUIPC 78/18.0GASEI; relato de diligência externa a fls. 30; relatórios fotográficos de fls. 33 a 34, 116 a 117, 119, 143 a 144; autos de reconstituição dos factos de fls. 36 a 39 (NUIPC 23/18.3GBGVA), 41 a 44 (NUIPC 20/18.9GBGVA), 46 a 49 (NUIPC 24/18.1GBGVA), 51 a 57 (NUIPC 78/18.0GASEI), 59 a 63 (NUIPC 18/18.9GBGVA) e fls. 65 a 67; relatórios de busca de fls. 140 a 141 e 162 a 163; informação relativa a veículos de fls. 90 e 91; documentos juntos a fls. 489 a 493 pela demandante civil M S.A.; informação do sistema de informação do Instituto da Segurança Social de fls. 273 a 275; informação quanto ao preço do cobre a fls. 285 (disponível em https://www.cablesrct.com/pt/os-precosdo-cobre); e prints das bases de dados da Segurança Social e do Registo Automóvel respeitantes aos arguidos, juntos a fls. 554 a 560.

Concretizemos.

Desde logo, atendeu o Tribunal às declarações prestadas pelo arguido A, prestadas a 20/02/2018 perante autoridade judiciária e constantes de fls. 75 a 81 e as quais foram lidas em sede de audiência de discussão e julgamento, nas quais descreveu, de forma coerente e pormenorizada, as circunstâncias em que foram cometidos os factos em discussão nestes autos.

E desde já se diga que, contrariamente ao alegado em sede de alegações orais pela defesa dos arguidos JJ e JP, inexiste qualquer proibição de valoração das declarações prestadas pelo arguido A.

Senão vejamos.

As declarações de coarguido, sendo um meio de prova legal, cuja admissibilidade se inscreve no artigo 125.º do Código de Processo Penal, podem e devem ser valoradas no processo.

Questão diversa é a da credibilidade e valoração desses depoimentos, análise que apenas em concreto, e face às circunstâncias em que os mesmos são produzidos, pode ser realizada.

Por isso, dizer em abstrato e genericamente que o depoimento do coarguido só é válido se for acompanhado de outro meio de prova é uma subversão das regras da produção de prova, sem qualquer apoio na letra ou espírito da lei.

A admissibilidade como meio de prova do depoimento de coarguido, em relação aos demais coarguidos, não colide minimamente com o catálogo de direitos que integram o estatuto inerente àquela situação, mostrando-se adequada à prossecução de legítimos e relevantes objetivos de política criminal, nomeadamente no que toca à luta contra a criminalidade organizada (neste sentido, vide acórdão do Supremo Tribunal de Justiça datado de 12/03/2008, proferido no âmbito do processo n.º 08P694, disponível em www.dgsi.pt).

A alteração introduzida pelo artigo 345.º, n.º 4 do Código de Processo Penal, veio vedar ao Tribunal a valoração das declarações de um coarguido, proferidas em prejuízo de outro, quando, a instâncias deste, o primeiro se recusa a responder às concretas perguntas formuladas nos termos dos n.ºs 1 e 2 daquele preceito legal.

Saliente-se que quando é exercido o direito ao silêncio, as declarações incriminadoras de coarguido continuam a valer como prova quando o incriminado está ausente.

No mesmo sentido, no caso em apreço, apenas poderia existir uma proibição de valoração caso o arguido A, em sede de audiência de discussão e julgamento, se recusasse a responder às concretas perguntas formuladas nos termos dos n.ºs 1 e 2 daquele preceito legal, e já não se se remetesse ao silêncio, tal como o fizeram os arguidos JJ e JP.

Na verdade, a ausência do arguido A não afeta, como se alega, o direito ao contraditório dos arguidos JJ e JP.

Com efeito, em sede de dedução de acusação pública foi requerida a leitura das declarações prestadas pelo arguido A prestadas em primeiro interrogatório não judicial perante autoridade judiciária, pelo que não podem os arguidos JJ e JP ter ficado surpreendidos por ter o Ministério Público requerido a sua leitura em sede de audiência de discussão e julgamento.

Por outra parte, notificados da acusação pública, os arguidos JJ e JP apresentaram contestação, oferecendo o merecimento dos autos.

Em sede de audiência de discussão e julgamento, após a leitura das declarações prestadas pelo coarguido A, ausente na mesma, os arguidos JJ e JP nada disseram nem requereram, designadamente a designação de segunda data para comparência em julgamento do coarguido A – a cujo julgamento na ausência não se opuseram -, continuando a usar da prerrogativa do direito ao silêncio que lhes é legalmente facultada.

E se é certo que tal silêncio não os pode prejudicar, óbvia também é a conclusão que não os pode beneficiar.

Os arguidos JJ e JP não apresentaram qualquer justificação para os factos em discussão nos autos, tendo a possibilidade de os contraditar.

Não se pode concordar com a defesa dos arguidos JJ e JP quando defende que a leitura, em julgamento, de declarações prestadas em fase anterior do processo contraria os princípios da imediação, da oralidade e do contraditório.

Com efeito, tendo em vista a descoberta da verdade material e a boa decisão da causa, um arguido pode ser confrontado com pessoas, documentos ou objetos relacionados com os factos em discussão, bem como com peças do processo.

Quanto a nós, as declarações de um coarguido podem ser suficientes para incriminar os outros coarguidos, desde que sejam credíveis (por inexistir, nas relações entre arguidos, ressentimento, inimizade ou tentativa de exculpação do declarante), sejam verosímeis (havendo corroborações através de factos objetivos), sejam persistentes e idênticas (ao longo do processo), e se apresentem sem ambiguidades ou contradições (cfr. acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça datados de 12/03/2008 e 03/09/2008, disponíveis em www.dgsi.pt).

Em suma, e na esteira do decidido no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15/04/2015, disponível em www.dgsi.pt, não há qualquer impedimento do coarguido a, nessa qualidade, prestar declarações contra os coarguidos no mesmo processo e, consequentemente, de valoração da prova feita por um coarguido contra os seus coarguidos.

Porém, com uma limitação, constante do n.º 4, do artigo 345.º do Código de Processo Penal, de acordo com o qual não podem valer como meio de prova as declarações de um coarguido em prejuízo de outro coarguido quando, a instâncias deste outro coarguido, o primeiro se recusar a responder no exercício do direito ao silêncio.

Do que se trata, aqui, é de retirar valor probatório a declarações totalmente subtraídas ao contraditório.

O que não é o caso dos autos.

Aos arguidos JJ e JP foi dada a possibilidade de contraditarem tais declarações e requererem o que tivessem por conveniente.

Não podem os arguidos JJ e JP, socorridos da ausência física do coarguido A e de uma alegada e aparente inexistência de contraditório, pretender subsumir tal circunstância ao disposto no artigo 345.º, n.º 4 do Código de Processo Penal, o qual apenas tem aplicação no caso de recusa a responder pelo coarguido declarante.

Nem se diga que a ausência do coarguido A pode ser equiparada à expressa recusa a responder às perguntas formuladas nos termos do disposto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 345.º do Código de Processo Penal.

Salienta-se: a proibição de valoração ínsita no artigo 345.º, n.º 4 do Código de Processo Penal apenas tem lugar quando o coarguido de dispuser a prestar declarações, mas recusar a resposta a todas ou algumas perguntas espontaneamente ou a conselho do seu defensor. O que não é o nosso caso.

Tal proibição prevê um regime excecional, aplicável apenas nas circunstâncias aí descritas, pelo que, constitui uma limitação à regra da livre apreciação da prova (cfr. artigo 127.º do Código de Processo Penal).

Não sendo de aplicar ao caso a proibição de valoração prevista no artigo 345.º, n.º 4 do Código de Processo Penal, que constitui um regime excecional expresso e insuscetível de equiparações ou interpretações extensivas, devem as declarações prestadas pelo coarguido A ser apreciadas segundo as regras da experiência e da livre convicção do juiz.

Como já se referiu, uma coisa é a proibição de valoração de uma prova, outra coisa é o valor a atribuir ao meio de prova.

Concorda-se com o entendimento de que as declarações de coarguido desfavoráveis a outro coarguido exigem uma particular ponderação pelo julgador, exigindo-se que tais declarações sejam corroboradas com outro(s) meio(s) de prova.

Este acréscimo de exigência de fundamentação por parte do julgador justifica-se porque as declarações de um coarguido podem ser impulsionadas por razões aparentemente suspeitas, tal como o anseio de obter um trato judicial favorável, o ânimo de vingança, o ódio ou ressentimento, ou o interesse em auto-exculpar-se mediante a incriminação de outro ou outros acusados.

Concluindo este ponto, é admissível como meio de prova contra os demais arguidos o depoimento do coarguido que esteve envolvido na mesma atuação conjunta, devendo este meio probatório ser valorado tal qual como os outros meios de prova, em conformidade com os princípios da legalidade da prova e da sua livre apreciação, desde que esta seja devidamente fundamentada e objetivada, a partir da sua razão de ciência e credibilidade.

Tais declarações lidas não nos mereceram qualquer reserva, pois que, para além de produzidas em condições que salvaguardam a sua espontaneidade e liberdade, mormente com a presença de defensor, não foram de algum modo colocadas em crise por qualquer dos arguidos, os quais, tendo ouvido a sua pública leitura, não lhes apontaram nenhuma objeção.

A salientar, que de tais declarações não resulta qualquer interesse do arguido A na incriminação dos arguidos JJ e JP, apenas se limitando a relatar o que aconteceu.

Não se podendo afirmar que as declarações do coarguido A ficaram totalmente subtraídas ao contraditório, não foi violado o disposto no n.º 4, do artigo 345.º do Código de Processo Penal.

Por outra via ainda tais declarações mostram-se confortadas nos demais elementos probatórios colhidos, nos termos que se passará a explanar.

Assim, para a formação da sua convicção, o tribunal atendeu, desde logo, às declarações prestadas pelo arguido A.

Começa o arguido por declarar que no período compreendido entre Setembro de 2016 e Fevereiro de 2017 trabalhava para os arguidos JJ, de alcunha “Jony”, e JP, de alcunha “Samir”, nas feiras e em trabalhos agrícolas, auferindo 5,00€ diários, bem como géneros alimentícios, tendo regressado em Fevereiro de 2017 a Lisboa, onde permaneceu até 21 de Dezembro do mesmo ano.

Referiu que em Lisboa manteve sempre o contacto telefónico com os arguidos JJ e JP, que lhe diziam que se regressasse para junto destes, em (…) nada lhe faltaria.

Assim, motivado por este convite e pelo facto de ter um filho que reside em (…), concelho de (…), decidiu regressar a (…) onde procurou trabalho, dormida e comida junto daqueles JJ e JP.

No que respeita ao trabalho realizado, descreve o arguido A que, inicialmente, auxiliava os arguidos JJ e JP nas feiras, a troco de comida e dormida em casa destes, sendo que contrariamente ao acordado, nunca recebeu qualquer quantia monetária.

Após, refere que os arguidos JJ e JP lhe disseram para irem ver uns cabos de cobre queimado pertencente às linhas de comunicação da M, S.A., para que o declarante cortasse vários metros, a fim de ser transportado para um terreno dos arguidos JJ e JP, situado junto à residência destes, onde era amontoado e queimado, de forma a retirar o plástico que revestia o cobre.

Explana o arguido A, com pormenor, todo o modus operandi levado a cabo pelos arguidos, o qual se repetiu nas cinco ocasiões em análise nestes autos:

- os arguidos JJ e JP transportavam o arguido A no veículo automóvel de marca Ford, modelo Transit, de cor branca, conduzida habitualmente pelo arguido JP para o local previamente determinado para subtrair os cabos das linhas de comunicações;

- arguidos JJ e JP abandonavam o local na viatura referida e o arguido A ficava no local a proceder ao corte dos cabos que os arguidos lhe ordenavam, fornecendo-o dos materiais e utensílios necessários à sua prossecução;

- o arguido A, após o corte dos cabos, acondicionava-os e transportava-os para junto da estrada para facilitar a sua recolha, sendo que depois os arguidos entravam em contacto entre si e os arguidos JJ e JP iam recolher os cabos cortados bem como o arguido A;

- após, os arguidos transportavam o material cortado para um terreno junto à residência dos arguidos JJ e JP, onde era amontoado e queimado, de forma a retirar os plásticos que envolviam o cobre e, assim, proceder à venda deste.

Nas declarações por si prestadas, o arguido A descreve as circunstâncias de modo, tempo e lugar em que foram efetuados os cinco episódios de subtração de cobre investigados nestes autos, relatando todo o circunstancialismo de forma lógica e minuciosa.

No que respeita à subtração de cobre ocorrido em (…), concelho de (…), que deu origem ao NUIPC 78/18.0GASEI, esclareceu o arguido A que logrou cortar e proceder ao acondicionamento de oito rolos de linha de cobre, sendo que quando os arguidos JJ e JP chegaram ao local para recolher o material e o arguido A, passou no local uma viatura da Guarda Nacional Republicana, tendo os arguidos apenas conseguido carregar três dos oito rolos cortados, pois abandonaram de imediato o local temendo que fossem intercetados.

Declarou o arguido A que os arguidos JJ e JP lhe ordenavam que aquele fizesse os trabalhos por estes determinados, sendo que o arguido A queria parar de efetuar a subtração do cobre, mas era forçado por aqueles arguidos, fazendo-o com medo dos mesmos.

Afirmou ainda o arguido A que no dia 17 de Fevereiro de 2018, seguindo o modus operandi que sempre levavam a cabo, os arguidos JJ e JP transportaram o arguido A para a localidade de (…), deixando-o junto a uma linha de comunicações para que este procedesse ao corte de cabos de cobre, e abandonaram o local de seguida, ficando a aguardar a conclusão do serviço.

O arguido A decidiu denunciar o sucedido, tendo contactado telefonicamente a Guarda Nacional Republicana que, pouco tempo depois, acorreu ao local e transportou o arguido A para as instalações do Posto Territorial de (…).

Nestas instalações, disse o arguido A que o arguido JJ lhe telefonou, questionando-o se já havia terminado o serviço, ao que o arguido A respondeu que tinha sido intercetado pela Guarda Nacional Republicana, e que aquele lhe ordenou que não abrisse a boca.

Mais disse que inicialmente não teve noção da gravidade das suas condutas, uma vez que no primeiro corte de cabos se tratava de cabos queimados pelos incêndios, mas que posteriormente teve essa consciência e tentou pôr fim a tal atividade, tendo-lhe sido dito pelos arguidos JJ e JP que se não fizesse os serviços não tinha direito a refeição nem a tabaco, o que motivou o arguido A a denunciar os factos, esclarecendo que presenciou por diversas vezes armas de fogo na posse dos arguidos JJ e JP, sentindo-se ameaçado.

E aqui a pergunta impõe-se: porque é que o arguido A não se ausentava do local quando os arguidos JJ e JP o deixavam no destino escolhido?

Não se percebe.

Por fim, esclareceu o arguido A que o cobre após queimado era enrolado e acondicionado em sacas de nylon, sendo transportado para uma sucateira, onde era vendido, esclarecendo que os arguidos JJ e JP ficavam com o dinheiro e nunca lhe deram qualquer quantia proveniente da venda do cobre subtraído.

As declarações do arguido prestadas, perante autoridade judiciárias, e as quais foram lidas em sede de audiência de discussão e julgamento, foram plenamente corroboradas pelos depoimentos dos militares da Guarda Nacional Republicana inquiridos.

(…), militar da Guarda Nacional Republicana de 45 anos, começou por referir que quando estava de serviço, no dia 17 de Fevereiro de 2018, pelas 19h45, foi recebida uma chamada no Posto informando que um indivíduo estava na localidade de (…) e se preparavam para efetuar um furto, tendo a chamada sido efetuada pelo próprio indivíduo.

Disse o militar (…) que de imediato se deslocaram ao local referido e visualizaram o arguido A, com diversos instrumentos, recordando-se de um serrote/serra, um alicate/tesoura e uma corda, o qual se dirigiu a eles espontaneamente e foi conduzido ao Posto Territorial de (…).

No que respeita a estes instrumentos, referiu o militar que foram apreendidos, sendo aptos a derrubar o poste que suportam os cabos e proceder ao corte destes, tendo-lhe o arguido dito que era por esses motivos que os tinha na sua posse.

Já nas instalações do Posto Territorial de (…) o arguido A explanou os episódios de subtração de cobre que levou a efeito, esclarecendo que o fazia porque era obrigado pelos arguidos JJ e JP, tendo apenas nas instalações do Posto dito que tinha medo destes.

A testemunha (…) mencionou que quando o arguido A se encontrava no Posto, já pelas 21h00, este recebeu uma chamada, não se recordando de ouvir o seu teor, tendo-lhe o arguido A dito que era o arguido JJ e que este lhe disse que se falasse já sabia o que lhe acontecia.

Disse ainda a testemunha que o arguido A referiu que se encontrava há uns meses a residir em casa dos arguidos JJ e JP em (…), reconhecendo problemas com o álcool, que inicialmente trabalhava com estes nas feiras mas que depois começou a subtrair cobre, tendo-lhe dito as localidades em que foi efetuada.

Também (…), militar da Guarda Nacional Republicana de 39 anos, a exercer funções no Núcleo de Investigação Criminal de (…), começou por explicar, de forma espontânea e coerente, logrando convencer plenamente o tribunal pela forma assertiva e direta com que depôs, que no início do ano de 2018 ocorreu uma vaga de furtos de cobre das linhas de comunicações, designadamente nas localidades de (…), (…), (…), (…) e (…), os quais deram origem a vários inquéritos, onde se investigava a prática de tais ilícitos, sem que existissem suspeitos dos mesmos.

Referiu o militar que em Fevereiro de 2018 foi-lhe comunicado que havia um indivíduo que afirmava ter feito parte dos furtos descritos e que se encontrava na localidade de (…) prestes a praticar factos idênticos mas que não o queria fazer, sendo obrigado por outros dois indivíduos.

Nessa sequência, explanou a testemunha que se dirigiu ao Posto Territorial de (…) e que aí chegado o arguido A lhe explicou as concretas circunstâncias que rodearam a prática dos factos, pormenorizou o modo como eram levados a cabo, como o cobre era carregado, os concretos locais visados e como eram escolhidos, através do prévio reconhecimento do local pelos arguidos JJ e JP, bem como o local onde o cobre era posteriormente vendido ao peso.

A testemunha (…) relatou em pormenor as circunstâncias em que o arguido A iniciou os “trabalhos” de subtração de cobre com os arguidos JJ e JP, nos termos que lhe foram relatados por aquele arguido em sede de inquirição, coincidindo integralmente com as declarações por este prestadas em sede de interrogatório não judicial perante autoridade judiciária.

Mais referiu o militar que o arguido A lhe relatou que todas as ferramentas utilizadas na prática dos factos lhe foram dadas pelos arguidos JJ e JP, bem como um telemóvel que era utilizado pelo arguido A para contactar com os arguidos JJ e JP quando os cabos de cobre estivessem prontos a ser recolhidos, indo de seguida buscá-lo, bem como ao cobre, deslocando-se sempre os arguidos numa carrinha.

Disse a testemunha que foram realizadas reconstituições dos factos que originaram os NUIPC 20/18.9GBGVA, 18/18.9GBGVA, 78/18.0GASEI, 24/18.1GBGVA e 23/18.3GBGVA, no âmbito dos quais o arguido A objetivamente descreveu ao depoente, de forma simples e minuciosa, todos os movimentos efetuados por si e pelos arguidos JJ e JP, estando os mesmos documentados a fls. 35 a 63 dos autos.

No que respeita aos factos praticados na localidade de (…), esclareceu que no âmbito do NUIPC 78/18.0GASEI haviam sido encontrados no local cinco rolos de cabo, tendo logo concluído – antes do telefonema realizado pelo arguido A para o Posto de (…) - que por alguma circunstância os autores dos factos não procederam ao carregamento de todo o cabo cortado.

O que coincidiu de forma absoluta com a descrição dos factos relatada pelo arguido A, que lhe disse que tiveram de abandonar o local após visualizarem um veículo da Guarda Nacional Republicana e apenas recolheram três dos oito rolos de cabo cortado.

O arguido A relatou assim todos os factos em causa nestes autos, de forma totalmente sincrónica com as diligências investigatórias já levadas a cabo, e de forma prévia às suas declarações, em cada um dos NUIPC’s investigados.

Explanou o militar (…) que realizaram diligências de busca às residências e veículos dos arguidos já em Abril de 2018, tendo sido apreendida uma cisalha – cujas características explicou, e que sujeita a exame pericial foi considerada apta ao corte dos cabos de cobre em questão -, a qual foi encontrada no logradouro das residências dos arguidos JJ e JP, tendo este último afirmado que lhe pertencia, e esclareceu que se destina ao corte de pedaços de metal de grandes dimensões, como os cabos de cobre em questão.

Também no exterior, no terreno adjacente à entrada da residência dos arguidos JJ e JP, e conforme tinha sido relatado pelo arguido A, a cerca de cinco metros da entrada do portão das residências dos arguidos, visualizou vestígios da queima de cabos de comunicações, esclarecendo que pelas suas características não poderiam tratar-se de quaisquer outros vestígios de queima de objetos, mas sim de cabos de cobre, bem como um saco que continha no seu interior o revestimento do alumínio que é encontrado no interior dos cabos da M, S.A. e cujas características descreveu.

No que concerne aos metros de cobre subtraídos, explanou o militar o modo como foram contabilizados, juntamente com um técnico da PT, referindo que eram coincidentes com o número de metros que a M, S.A. indicava nas suas participações criminais, esclarecendo que os factos em causa nestes autos eram praticados ao final da tarde/início da noite.

Questionado, esclareceu que o arguido A não detinha viatura automóvel e que quando realizada a busca às residências dos arguidos JJ e JP o arguido A já não pernoitava nesse local.

Disse também que o arguido A lhe transmitiu que inicialmente não atribuiu importância aos factos, uma vez que no início apenas cortava cabos queimados pelos incêndios, tomando consciência da gravidade dos mesmos quando passou a cortar cabos de linhas de comunicações novos, sendo que havia dito aos arguidos JJ e JP.

Por fim, mencionou que o arguido A referia que nunca recebeu qualquer quantia adveniente da venda do cobre subtraído, nem sequer recebendo os 5,00€ acordados, tendo demonstrando algum receio dos arguidos JJ e JP no dia 17/02/2018, mais tendo regressado a Lisboa pouco tempo depois da prática dos factos aqui em discussão.

De igual modo, (…), militar da Guarda Nacional Republicana de 39 anos, a exercer funções no Núcleo de Investigação Criminal de (…), referiu que a sua equipa se deslocou ao Posto Territorial de (…), após informação de que aí se encontrava um indivíduo que dizia que se estava a preparar para efetuar um furto de cobre, tendo acompanhado a sua inquirição.

Corroborou integralmente as declarações prestadas pelos militares (…) e (…), tendo acompanhado todas as diligências probatórias, designadamente as reconstituições dos factos bem como as diligências de busca, referindo ter sido apreendida uma cisalha pertencente ao arguido (…), bem como visualizado o local onde se realizava uma queima, no qual verificou a existência de vestígios da queima de linhas de cobre (verificando plástico queimado que reveste o cabo multifilar que caracteriza a queima desses objetos).

Disse a testemunha que o arguido referia que arguidos JJ e JP lhe davam as ferramentas necessárias à prática dos factos, deixando-o em locais previamente determinados para que este procedesse ao corte do cobre.

Interrogado, explanou o militar que o arguido A não tinha veículo automóvel nem era titular de carta de condução, sendo que o telemóvel que tinha lhe foi dado pelos arguidos JJ e JP para poderem comunicar entre si.

Questionado quanto às motivações do arguido A, verbalizou o militar (…) que aquele demonstrava ter um pouco de receio dos arguidos JJ e JP, que pretendia deixar de praticar furtos, mas que tinha sido por estes ameaçado.

Mais disse que o A estava desamparado quando regressou a (…) no final do ano de 2017 e por essa circunstância deixou que a situação se arrastasse alguns meses, uma vez que lhe era dado um teto, alimentação e tabaco, esclarecendo que o arguido A estava farto de ser um “pau mandado” dos arguidos JJ e JP e de não ter qualquer benefício direto da venda do cobre.

Ora, como já se deixou antever, não merece qualquer colhimento a justificação dada pelo arguido A de que apenas praticou os furtos porque era obrigado pelos arguidos JJ e JP.

Com efeito, o mesmo admite que inicialmente a subtração dos cabos de comunicações eram feitas em linhas que, embora a funcionar, tinham sido queimadas por incêndios, pelo que não atribuiu gravidade aos factos.

Logo aqui se percebe que nenhuma coação foi feita pelos JJ e JP, praticando o arguido A os factos de livre e espontânea vontade.

Ademais, caso não fosse essa a sua vontade, sempre podia o arguido A abandonar os locais onde era deixado para subtrair os cabos uma vez que aí era deixado sozinho, não se percebendo como afirma o mesmo que era obrigado quando estava sozinho no local.

Nem se diga que o arguido A praticava tais factos por ter medo e ser ameaçado pelos arguidos JJ e JP.

Além de nunca ter referido qualquer concreta ameaça que lhe havia sido dirigida, os comportamentos do arguido A, bem como as circunstâncias que os rodearam, demonstram que o arguido praticava tais factos como contrapartida do tecto, géneros alimentícios e dinheiros que os arguidos JJ e JP se comprometeram a entregar.

Ficou o tribunal plenamente convencido, pelos depoimentos dos militares inquiridos, que o telefonema realizado pelo arguido A no dia 17/02/2018 e o relato cabal dos factos, se deveu ao facto de os arguidos JJ e JP não cumprirem com o acordado, isto é, não lhe darem qualquer quantia monetária da venda do cobre, nem sequer lhe pagarem os 5,00€ diários acordados.

E para tal convicção contribuiu o facto de, após a denúncia dos factos ocorrida a 17/02/2018, o arguido A ter permanecido a residir em (…), tendo-se deslocado, apenas cerca de um mês depois, para Lisboa.

Ora, tendo o arguido A a possibilidade de abandonar os locais onde era deixado pelos arguidos JJ e JP para subtrair os cabos de comunicações, e não o tendo feito, dando notícia a estes arguidos para o irem recolher quando o “serviço” estava terminado, outra não pode ser a conclusão que o fazia porque era essa a sua vontade, participando ativamente no processo.

Refira-se que de forma alguma o arguido A exacerbou os factos praticados ou pretendeu deliberadamente prejudicar os arguidos JJ e JP, conclusão que resultou indiscutível do depoimento dos militares (…), (…), (…), os quais sublinharam tal circunstância.

Por outra parte, para considerar como provados os factos respeitantes aos arguidos JJ e JP o Tribunal não atendeu apenas às declarações prestadas pelo arguido A, aos depoimentos dos militares inquiridos e às reconstituições dos factos levadas a cabo.

Com efeito, nas diligências de busca realizadas às residências dos arguidos JJ e JP, na data de 25/04/2018 (aí não residindo o arguido A há mais de dois meses), foi encontrada uma tesoura de cortar ferro, denominada cisalha no logradouro das residências daqueles arguidos, sendo que, questionado, o arguido JP referiu pertencer-lhe e que, sujeita a exame pericial, concluiu-se ser apta ao corte dos cabos de comunicações em questão (cfr. auto de apreensão de fls. 113 e 114, relatório fotográfico de fls. 116 a 119 e relatório pericial de fls. 176 a 188, 191 a 196 e 199 a 205).

Além disso, na mesma data, no terreno adjacente à residência dos arguidos JJ e JP, foi visualizado vestígios de uma queima dos cabos de comunicações em causa, bem como um saco de plástico que continha no seu interior pedaços de revestimento do cobre existente no interior dos cabos e o qual é queimado com vista à extração dos fios de cobre a sua posterior venda.

Apesar de não ter resultado provado que tal terreno é propriedade dos arguidos JJ e JP, resultou indiscutível, atento o depoimento dos militares (…), (…), que corroboraram as declarações prestadas pelo arguido A, que o terreno em causa era pelos arguidos utilizado.

Assim se esclarece que, se dúvidas restassem quanto ao envolvimento dos arguidos JJ e JP na prática dos factos em discussão nos autos -o que, saliente-se, não era o caso-, as mesmas ficariam dissipadas com os resultados inequívocos das diligências de busca efetuadas às suas residências.

Por outra parte, (…), técnico de telecomunicações da M, S.A., de 59 anos, referiu que dos cinco locais onde foram subtraídos cabos de cobre e em discussão nestes autos deslocou-se a três, (…), (…) e (…), os quais visualizou diretamente, tendo quanto aos outros dois locais consultado o processo, em altura que se recorda ter sido no mês de Fevereiro de 2018.

Mais disse que a M, S.A. apresentou participações criminais de cada um dos furtos em causa nestes autos, as quais tiveram origem na participação à M, S.A. de comunicações de avarias por parte dos utilizadores dos serviços, em virtude do corte dos cabos efetuado nas linhas de comunicações e da consequente interrupção do serviço.

Perguntado, referiu que em consequência do corte dos cabos efetuado nas linhas de comunicações, os serviços foram interrompidos nas cinco situações em causa nestes autos, cabendo-lhe ir ao local onde são subtraídos cabos de cobre para contabilizar os metros em falta e diligenciar junto da M., S.A. pela sua substituição.

Esclareceu que os valores indicados nas participações criminais por parte da M., S.A. foram pela demandante civil calculados em função do custo da reposição da situação, isto é, da substituição de cabos e de postes, tendo em consideração os concretos metros de cabo furtados que foram contabilizados, correspondendo aos efetivos prejuízos sofridos, sendo que a situação em que a M., S.A., teve menos prejuízos foram no montante não inferior a 102,00€.

Por fim, e interrogado, respondeu não ter qualquer noção do valor arrecadado pelos autores dos factos com a venda do cobre subtraído, sabendo apenas que, em regra, um quilograma de cobre é pago à razão de 5,00€, não sendo possível identificar os quilogramas de cobre vendidos pelos arguidos após a queima dos cabos.

Diga-se a este propósito, que do teor da documentação junta aos autos pela M., S.A. a fls. 489 a 493, considerando os locais e datas aí indicadas não é claro que tais informações digam respeito a estes autos.

Contudo, da análise do seu teor, constata-se, à luz das regras da experiência comum, que os prejuízos sofridos pela M., S.A., considerando os metros de cabo subtraídos em cada ocasião e os danos provocados com vista a cada subtração, estão plenamente justificados e revelam-se proporcionais e adequados aos montantes peticionados, razão pela qual resultaram como provados os factos relativos ao pedido de indemnização civil deduzido.

(…), militar reformado da Guarda Nacional Republicana de 61 anos, referiu conhecer os arguidos JJ e JP da sua atividade profissional, referindo que estes são pessoas honestas, trabalhadores e educadas, estando bem integrados socialmente.

Também (…), militar da Guarda Nacional Republicana de 51 anos, disse ser conhecido dos arguidos JJ e JP, os quais os consideram como sendo pessoas educadas, estimadas e prestáveis, que não gostam de conflitos.

No que respeita à concreta linha temporal e espacial dos factos, bem como aos metros de cabos subtraídos e suas concretas características atendeu o Tribunal aos autos de notícia e respetivos aditamentos de fls. 4 a 5, 16 a 17, 27 a 29, 2 a 5 e 7 do apenso respeitante ao NUIPC 20/18.9GBGVA, 2 e 3 do apenso respeitante ao NUIPC 18/18.9GBGVA, 3 a 10 e 19 a 20 do apenso respeitante ao NUIPC 78/18.0GASEI, 2 a 5 do apenso respeitante ao NUIPC 24/18.1GBGVA e 3 a 6 do apenso respeitante ao NUIPC 23/18.3GBGVA.

Com efeito, não coincidindo integralmente as declarações do arguido quanto às datas em que foram praticados os factos com a prova documental junta aos autos (autos de noticia e respetivos aditamentos) – o que se compreende considerando o vasto número de subtração de cabos das linhas de comunicações em cerca de 17 dias, bem como as diversas ocasiões em que o arguido não logrou seu propósito, abandonando os locais sem conseguir perpetrar os factos a que se propunha – atendeu o Tribunal a tal prova documental, totalmente esclarecedora a tal propósito.

A prova produzida e junta aos autos, analisada criticamente a aleadas às regras da experiência comum, que se traduzem na forma como a realidade se vai repetindo, permitindo-nos permite concluir, com certeza, que os arguidos A, JJ e JP, em todas as circunstâncias e da forma que resultou como provada, atuaram de comum acordo e em conjugação de esforços, de forma livre, voluntária e conscientemente, com o propósito conseguido de se apoderarem do metal identificado, bem como de impedir e perturbar a exploração do serviço de comunicações fornecido pela M. S.A., o que conseguiram, mais sabendo que o referido metal não lhe pertencia e que atuavam no desconhecimento e contra a vontade da sua legítima proprietária, a M. S.A..

(…).


*

Quanto à factualidade não provada temos que nenhuma prova foi produzida capaz de a sustentar.

(…).

3. Apreciação

Insurgem-se os recorrentes contra os factos que vem dados por provados sob os itens 1 a 28, 31, 32, 33, 54 a 58 da sentença em crise porquanto mostrar-se-iam apenas sustentados nas declarações prestadas no inquérito [artigo 141.º, n.º 4, alínea b) do CPP] pelo co-arguido A, declarações essas que, embora reproduzidas em sede de audiência de discussão e julgamento, no caso em apreço, à luz do n.º 4, do artigo 345.º do CPP, não poderiam ter sido, contra si, valoradas já que não tiveram a possibilidade de contrainterrogar o co-arguido, seu autor.

Conforme decorre da fundamentação da decisão de facto a questão foi suscitada nas alegações orais produzidas pela defesa dos co-arguidos, ora recorrentes e sobre a mesma não deixou o tribunal a quo de se pronunciar, refutando a argumentação então apresentada, considerando, no essencial, que a ausência no julgamento do co-arguido A «não afeta, como se alega, o direito ao contraditório dos arguidos JJ e JP».

Vejamos.

Do ponto de vista factual, podemos assentar no seguinte:

(i) Os arguidos recorrentes e A foram acusados e condenados em primeira instância pela prática em co-autoria material de cinco crimes de furto qualificado;

(ii) O tribunal a quo na formação da convicção valorou as declarações «prestadas pelo arguido A (…) Barbosa (…) a 20/02/2018 perante autoridade judiciária e constantes de fls. 75 a 81 (…) as quais foram lidas em sede de audiência de discussão e julgamento, nas quais descreveu, de forma coerente e pormenorizada, as circunstâncias em que foram cometidos os factos em discussão nestes autos» - [vide a fundamentação da decisão de facto];

(iii) O co-arguido A, «apesar de regularmente notificado, não compareceu à audiência de discussão e julgamento»; «(…) não foi localizado na morada por si indicada no termo de identidade e residência que prestou»; não foi possível proceder à sua detenção «por não se ter logrado apurar o seu paradeiro» - [cf. os itens 48, 49 e 50 factos provados];

(iv) No âmbito do inquérito, em 20.02.2018, o co-arguido A foi interrogado pelo Ministério Público [artigo 144.º, n.º 1 do CPP], na presença da sua Defensora oficiosa, tendo sido então informado nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 141.º, n.º 4, alínea b), do CPP, prestando declarações – [cf. fls. 75-81];

(v) Declarações, essas, que foram lidas em sede de audiência de julgamento – [cf. ata de fls. 561-573].

Quanto ao direito.

Prescreve o artigo 357.º do CPP, na redação introduzida pela Lei n.º 20/2013, de 21-02:

“1- A reprodução ou leitura de declarações anteriormente feitas pelo arguido no processo só é permitida:

a) A sua própria solicitação e, neste caso, seja qual for a entidade perante a qual tiverem sido prestadas; ou

b) Quando tenham sido feitas perante autoridade judiciária com assistência de defensor e o arguido tenha sido informado nos termos e para os efeitos do disposto na alínea b) do n.º 4 do artigo 141.º.

2 – As declarações anteriormente prestadas pelo arguido reproduzidas ou lidas em audiência não valem como confissão nos termos e para os efeitos do artigo 344.º.

[…]”.

Em consonância, na alínea b), do n.º 4, do artigo 141.º do mesmo diploma o legislador de 2013 antecipou «as garantias profiláticas sobre a voluntariedade e plena consciência do eventual impacto das declarações processuais consagradas no mesmo diploma, tudo o que disser pode ser usado contra si», as quais se desdobram «essencialmente por três vetores que devem ser lidos à luz do princípio da lealdade:

1 – Obrigatoriedade da assistência por defensor (…);

2 – Aprofundamento do direito de advertência e esclarecimento sobre o direito ao silêncio e efeitos da renúncia (…);

3 – Reforço das garantias epistemológicas relativas ao mediador e do escrutínio superveniente do ato (…)» - [cf. Paulo Dá Mesquita, “A UTILIZIBILIDADE PROBATÓRIA NO JULGAMENTO DAS DECLARAÇÕES PROCESSUAIS ANTERIORES DO ARGUIDO E A REVISÃO DE 2013 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL”, in “As Alterações de 2013 aos CÓDIGOS PENAL E DE PROCESSO PENAL: uma Reforma «Cirúrgica»?” Organização de André Lamas Leite, Coimbra Editora, págs. 133-152]. Norma cuja alteração a Exposição de motivos da proposta de Lei n.º 77/XII, que esteve na sua origem, assim justifica: “De maior relevância é a modificação introduzida quanto à possibilidade de utilização das declarações prestadas pelo arguido, na fase de inquérito e de instrução, em sede de audiência de julgamento. A quase total indisponibilidade de utilização superveniente das declarações prestadas pelo arguido nas fases anteriores ao julgamento tem conduzido, em muitos casos, a situações geradoras de indignação social e incompreensão dos cidadãos quanto ao sistema de justiça. Impunha-se, portanto, uma alteração ao nível da disponibilidade, para utilização superveniente, das declarações prestadas pelo arguido nas fases anteriores ao julgamento, devidamente acompanhadas de um reforço das garantias processuais. Assim, esta disponibilidade de utilização, para além de só ser possível quanto a declarações prestadas perante autoridade judiciária, é acompanhada da correspondente consolidação das garantias de defesa do arguido enquanto sujeito processual, designadamente quanto aos procedimentos de interrogatório, por forma a assegurar o efetivo exercício desses direitos, maxime o direito ao silêncio (…). Por outro lado, exige-se a assistência de defensor sempre que as declarações sejam suscetíveis de posterior utilização, e exige-se a expressa advertência do arguido de que, se não exercer o seu direito ao silêncio, as declarações que prestar podem ser futuramente utilizadas no processo embora sujeitas ao princípio da livre apreciação da prova. A falta de assistência por defensor, bem como a omissão ou violação deste dever de informação determinam a impossibilidade de as declarações serem utlizadas, assegurando uma decisão esclarecida do arguido quanto a uma posterior utilização das declarações que, livremente, decide prestar. Preserva-se, assim, a liberdade de declaração do arguido que, apenas, voluntariamente, prescinde do seu controlo sobre o que disse (….)».

Também a propósito da solução concretizada na alteração do artigo 357.º, n.º 1, revelando desconhecer «os suportes técnicos e de direito comparado» que a influenciaram, na obra citada, Paulo Dá Mesquita dá conta da proximidade com o sistema italiano, no qual «as anteriores declarações mesmo que o arguido opte pelo silêncio podem, a pedido de qualquer das partes, ser lidas e utilizadas contra ele», realçando o facto de no código italiano, «depois do reforço da proteção dos direitos de defesa e em particular do contraditório (…), a lealdade [se apresentar] como fator central sendo o respetivo corolário a advertência prévia ao interrogatório, permitindo-se que, satisfeitos os requisitos informacionais, as declarações possam ser utilizadas contra o próprio, mesmo que depois venha a optar pelo silêncio».

Por fim, dispõe o artigo 345.º do CPP [preceito que mantém a redação introduzida pela Reforma de 2007]:

«1 – Se o arguido se dispuser a prestar declarações, cada um dos juízes e dos jurados pode fazer-lhe perguntas sobre os factos que lhe sejam imputados e solicitar-lhe esclarecimentos sobre as declarações prestadas. O arguido pode, espontaneamente ou a recomendação do defensor, recusar a resposta a algumas ou a todas as perguntas, sem que isso o possa desfavorecer.

2 – O Ministério Público, o advogado do assistente e o defensor podem solicitar ao presidente que formule ao arguido perguntas, nos termos do número anterior.

[…]

4 – Não podem valer como meio de prova as declarações de um co-arguido em prejuízo de outro co-arguido quando o declarante se recusar responder às perguntas formuladas nos termos dos n.ºs 1 e 2».

Como, a propósito, escreve Oliveira Mendes, in “Código de Processo Penal Comentado”, 2016 – 2.ª Edição, Almedina, pág. 1059 «As declarações do arguido constituem um meio de prova plenamente válido, pelo que o tribunal as pode e deve valorar, de acordo com a credibilidade que lhes atribuir, com a limitação prevista no n.º 4, segundo a qual não valem como meio de prova as declarações de co-arguido em prejuízo de outro co-arguido quando o primeiro se recusar a responder às perguntas que lhe sejam feitas, quer pelo tribunal quer pelo Ministério Público, advogado do assistente e defensores. Trata-se aqui de retirar valor probatório a declarações totalmente subtraídas ao contraditório.» - [sublinhado nosso]. Reserva esta, afirmada no acórdão do TC n.º 133/2010 [DR. II Série, 10.05.18] quando, não julgando inconstitucional a norma do artigo 345.º, n.º 4, do CPP, conjugado com os artigos 133.º, 126.º e 344.º interpretada no sentido de permitir a valoração das declarações de um arguido em desfavor do co-arguido que entenda não prestar declarações sobre o objeto do processo, realça «Decisivo é que o arguido contra quem tais declarações sejam feitas valer não tenha sido impedido de submetê-las ao contraditório, como resulta do acórdão n.º 194/97 …», doutrina já anteriormente sustentada no acórdão do TC proferido no proc. n.º 524/97 [DR., II Série, de 97.11.27], que julgou inconstitucional por violação do artigo 32.º, n.º 5, da Constituição da República, a norma extraída com referência aos artigos 133.º, 343.º e 345.º do Código de Processo Penal, no sentido em que confere valor de prova às declarações proferidas por um co-arguido, em prejuízo de outro co-arguido quando, a instâncias destoutro co-arguido, o primeiro se recusa a responder, no exercício do direito ao silêncio.

Depois deste breve excurso, retomemos o caso em apreciação.

O tribunal a quo considerou não ocorrer qualquer obstáculo legal à valoração das declarações prestadas pelo co-arguido A no âmbito do inquérito, observadas que resultaram as garantias impostas pela alínea b), do n.º 4, do artigo 141.º do CPP, em prejuízo dos dois co-arguidos, ora recorrentes, lidas que foram em sede de audiência de julgamento, não obstante esta – por não ter sido possível apurar o seu paradeiro – se haja realizado na sua ausência.

Diga-se, desde já, que a questão não tem merecido resposta unívoca por parte da jurisprudência. No sentido perfilhado na sentença recorrida decidiram os acórdãos do TRP de 12.10.2016 (proc. n.º 101/13.5JAAVR.P1), de 12.09.2018 (proc. n.º 4211/16.9JAPRT.P1), do TRC de 21.06.2017 (proc. n.º 320/14.7GASPS.C1); posição diferente foi defendida nos acórdãos do TRP de 08.02.2017 (proc. n.º 918/14.3JAPRT.P1), do TRG de 06.11.2017 (proc. n.º 131/14.0GBVNF.G1), de 12.10.2020 (proc. n.º 539/12.5TABRG.G1).

Na situação em apreço nenhuma reserva nos merece a leitura levada a efeito no decurso da audiência de julgamento das declarações prestadas no decurso do inquérito, pelo co-arguido A, bem como a respetiva valoração quanto áquilo que lhe respeita, pois uma e outra encontram respaldo na alínea b), do n.º 1, do artigo 357.º conjugado com o artigo 141.º, n.º 4, alínea b), ambos do CPP.

Contudo, ressalvado o respeito devido pelo entendimento contrário, divergimos da decisão na parte em que valorou em prejuízo dos co-arguidos, recorrentes, as ditas declarações.

Na verdade, não se vê como, tendo estado os co-arguidos duplamente privados do contraditório: num primeiro momento quando não marcaram, de qualquer forma, presença no ato de interrogatório do co-arguido onde foram produzidas as declarações que os incriminava [não está obviamente em causa diligência que possa ser olhada como antecipação da audiência]; num segundo momento pela impossibilidade de “confrontar” o co-arguido [que não compareceu em julgamento] com as declarações [na parte que os incrimina] em sede de audiência, seja possível defender não encerrar a valoração das mesmas em seu prejuízo violação ao artigo 32.º, n.º 5 da CRP.

Não se encontra razoabilidade, para concluir de modo diferente, na invocada excecionalidade do regime prevenido no n.º 4, do artigo 345.º do CPP, conducente a que apenas quando o co-arguido se recusasse a responder às perguntas formuladas nos termos dos n.ºs 1 e 2 do citado artigo [nestas últimas se incluindo as sugeridas pela defesa] ocorresse proibição de valoração; o mesmo já não acontecendo quando aquele se remetesse ao silêncio [tout court] ou não fosse possível fazê-lo comparecer no julgamento. Na verdade, a regra é a de que não valem em julgamento, “nomeadamente para efeito de formação da convicção do tribunal, quaisquer provas que não tiverem sido produzidas ou examinadas em audiência” – [artigo 355.º do CPP], constituindo – isso, sim - exceção [justificada, com vimos, na Exposição de motivos da proposta de Lei n.º 77/XII] a valoração das declarações prestadas pelo arguido no âmbito do inquérito nos termos consentidos na alínea b), do n.º 4, do artigo 141.º do CPP.

Regressando ao ensinamento de Paulo Dá Mesquita «… o contraditório sendo também um imperativo constitucional ao qual está subordinada a audiência de julgamento marca a proibição relativa a declarações processuais de terceiros (onde se inclui o co-arguido que não é objeto do nosso tema) e o princípio da intransmissibilidade nesse domínio (objeto também de uma alteração em 2013 na revisão do artigo 356.º), mas já não vale para a utilização de declarações do próprio, por faltar o elemento nuclear, a alteridade relativamente à fonte da prova.

Daí que o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem sempre tenha excluído a aplicabilidade do artigo 6.º, n.º 3, da alínea d), da Convenção a declarações do próprio arguido, apenas preconizando a aplicabilidade dessa cláusula à utilização como prova contra o arguido das declarações do co-arguido relativamente ao qual nunca lhe tenha sido facultada a possibilidade de colocar questões» - [ob. cit., pág. 145].

A propósito da alínea d), do n.º 3, do artigo 6.º da CEDH escreve Irineu Cabral Barreto: «Se os elementos de prova devem ser produzidos em audiência pública, tendo em vista um debate contraditório, tal não impede a utilização das provas recolhidas na fase de instrução do processo, desde que as regras do contraditório tenham sido observadas, no momento da produção da prova ou mais tarde.

A produção de prova, nomeadamente a testemunhal, deve revestir um carácter contraditório, concedendo-se à defesa a possibilidade de contestar todo o elemento de prova produzido perante o tribunal e invocado por este para fundamentar a sua decisão, de modo a poder combater eficazmente as acusações que lhe são feitas» - [cf. “A Convenção Europeia dos Direitos do Homem”, 4.ª Edição, 2010, Coimbra Editora, págs. 218-220].

E se é certo, como se diz na sentença recorrida, que o exercício do contraditório não se limita apenas ao direito do co-arguido, em prejuízo do qual foram prestadas – nestes autos, em fase anterior e não contraditória do processo - declarações por outro co-arguido, de o poder confrontar com as mesmas, a verdade é que as ditas declarações, sendo incriminatórias do primeiro e, nessa medida, objeto de valoração pelo tribunal na formação da convicção, não podem ser, elas próprias, subtraídas ao contraditório, tando mais que – embora não o encaremos como argumento definitivo -, não raramente, são, sobretudo, aquelas que surgem a sustentar a convicção no sentido da condenação. Ao co-arguido tem de assistir o direito de fazer “contra-interrogar” (confrontar) o autor as declarações prestadas em seu prejuízo.

Por outro lado, permitindo o direito a um processo equitativo ao acusado guardar silêncio, não contribuindo para a sua própria incriminação, sabido que o exercício de tal direito jamais pode ser interpretado e valorado como um indício ou presunção de culpa, também nesta parte a argumentação desenvolvida na decisão em crise, realçando o facto de os co-arguidos, ora recorrentes, no decurso na audiência de julgamento se haverem remetido ao silêncio se nos afigura carecida de fundamento.

Em síntese:

(i) As declarações do co-arguido A feitas perante a autoridade judiciária no decurso do inquérito, com a assistência de defensor, tendo sido o mesmo, então, informado nos termos e para os efeitos do disposto na alínea b) do n.º 4 do artigo 141.º do CPP, lidas em sede de audiência de julgamento (artigo 357.º, n.º 1, alínea b) e n.º 2, do CPP), que decorreu sem a sua presença, podiam, quanto aos factos incriminatórios que sobre si impendiam, ser objeto de valoração, sujeita ao princípio da livre apreciação, por parte do tribunal;

(ii) Contudo, já não o podiam ter sido, como o foram, na parte em que declarou em prejuízo dos co-arguidos/recorrentes, quando estes se viram privados, pela ausência daquele em julgamento, do direito de, com as mesmas, o confrontarem, por tal não ser compatível com um exercício pleno do contraditório;

(iii) Ao assim ter agido o tribunal a quo procedeu à valoração proibida de prova.


*

Uma vez que da fundamentação da convicção resulta que o tribunal a quo para dar assentes, como provados, os factos enumerados na sentença também quanto às condutas imputadas aos ora recorrentes se ateve a diferentes meios de prova, entre outros às “reconstituições dos factos” e “diligências de busca”, impõe-se que, uma vez reconhecida a valoração proibida de prova, o mesmo tribunal, expurgada que seja esta do processo de convicção, decida em face dos demais elementos probatórios convocados, proferindo, de acordo com o juízo que vier a fazer, nova sentença.

III. Dispositivo

Termos em que acordam ou juízes que compõem este tribunal, na procedência do recurso, em julgar, nos termos sobreditos, verificada a valoração proibida de prova, determinando que pelo mesmo tribunal, expurgada que seja a mesma do processo de convicção, decida em face dos demais elementos probatórios convocados, proferindo, de acordo com o juízo que vier a fazer, nova sentença.

Sem tributação.

[Texto processado e revisto pela relatora]

Maria José Nogueira (relatora)

Frederico Cebola (adjunto)