Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
2817/09.1TBFIG.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: SÍLVIA PIRES
Descritores: EMPREITADA
EMPREITADA DE CONSUMO
RESPONSABILIDADE
EMPREITEIRO
PRAZO
DENÚNCIA
DEFEITOS
OBRAS
Data do Acordão: 02/18/2014
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA FIGUEIRA DA FOZ – 2º JUÍZO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE REVOGADA
Legislação Nacional: ARTºS 1154º, 1207º E 1220º, Nº 1, DO C. CIVIL; DECRETO-LEI N.º 67/2003, DE 8 DE ABRIL.
Sumário: I – No nosso Código Civil o contrato de empreitada é uma espécie autónoma dos contratos de prestação de serviço, os quais se caracterizam pela circunstância de uma das partes (o prestador de serviço) proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem retribuição – art.º 1154º.

II - O que individualiza os contratos de empreitada do âmbito da figura mais vasta dos contratos de prestação de serviço é o de que o resultado a que se obriga o empreiteiro é o de realização de uma obra – art.º 1207º do C. Civil –, devendo esta traduzir-se por uma alteração física de coisa corpórea.

III - Verificando-se a existência de defeitos na obra realizada, a responsabilidade do empreiteiro numa empreitada de consumo é objectiva, dispensando a existência de um nexo de imputação das faltas de conformidade a um comportamento censurável daquele, como se depreende do art.º 3º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 67/2003, presumindo-se que as faltas de conformidade já existiam no momento em que a obra foi entregue ao seu dono – art.º 3º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 67/2003.

IV - Mas o art.º 2º, n.º 3 do Decreto-Lei n.º 67/2003, in fine, dispõe que quando os defeitos têm origem em materiais fornecidos pelo dono da obra já não se aplica o regime da empreitada de consumo.

V - À hipótese do defeito com origem nos materiais fornecidos pelo dono da obra consumidor, devem equiparar-se – art.º 10º do C. Civil – as situações em que o defeito tem origem em projectos, estudos, previsões, máquinas, edifícios ou terrenos fornecidos pelo dono da obra, por identidade de razão, pelo que também a estes casos não é aplicável o regime do Decreto-Lei n.º 67/2003, mesmo que se tratem de contratos qualificáveis como empreitadas de consumo.

VI - Nestas situações, caso se demonstre a responsabilidade do empreiteiro, apesar do defeito ter a sua origem em coisa fornecida pelo dono da obra consumidor, por recair sobre aquele um dever de advertir o dono da obra da probabilidade da obra ser defeituosa, as suas consequências são definidas pelo regime previsto no C. Civil e pelas regras da L.D.C., aplicáveis aos contratos de consumo de empreitada (sobretudo art.º 4.º, 7.º, n.º 5, e 12.º, n.º 1), estando excluída a aplicação do Decreto-Lei n.º 67/2003.

VII - Nas empreitadas de consumo em obras realizadas em imóveis o prazo para a denúncia dos defeitos é de 1 ano após o conhecimento dos mesmos – art.º 5º-A, n.ºs 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 67/2003 –, não funcionando aqui a presunção de conhecimento dos defeitos aparentes constante do art.º 1219º, n.º 2 do C. Civil, uma vez que esta se encontra estabelecida com vista à exclusão da responsabilidade do empreiteiro em resultado da aceitação da obra com defeitos conhecidos, a qual não tem aplicação nos contratos de empreitada de consumo, por contrariar a cominação com nulidade dos pactos que excluam a responsabilidade civil do empreiteiro antes da denúncia dos defeitos, consagrada no art.º 10º do Decreto-Lei n.º 67/2003.

VIII - Relativamente aos defeitos a que não se aplique o regime da empreitada de consumo, por resultarem de deficiências estruturais da casa fornecida pela Ré, onde foram realizadas as obras de reconstrução, não se revelando que os mesmos fossem aparentes tinha a Ré o mesmo prazo de um ano para os denunciar após o seu descobrimento – art.º 1220º, n.º 2, do C. Civil.

Decisão Texto Integral: Acordam na 3ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra

A Autora intentou a presente acção com processo ordinário, pedindo a condenação da Ré a:
- pagar-lhe a quantia de € 193.681,55, acrescida de juros de mora vencidos e não pagos, calculados, segundo as taxas legais, e à data de 12 de Outubro de 2009, no valor de € 35.163,97;
- pagar-lhe uma sanção pecuniária compulsória, à razão de € 500 por dia de atraso no cumprimento da prestação devida, desde 31 de Dezembro de 2007, data do vencimento da segunda das facturas aludidas nos autos, e ainda no pagamento de juros, à taxa de 5% ao ano, desde a data em que a sentença condenatória transitar em julgado, os quais acrescerão aos juros de mora acima aludidos.
Para fundamentar a sua pretensão alegou, em síntese:
Ø    É uma sociedade comercial que se dedica à construção civil, obras públicas e empreitadas gerais, tendo sido contactada pela Ré, no início do ano de 2006, para que realizasse uma obra de reconstrução de uma sua moradia composta de casa de habitação de rés-do-chão sita em ...
Ø    Após a elaboração de um orçamento prévio da obra a realizar, a Autora apresentou à Ré o mapa de preços, que acabou por sofrer revisões até se tornar definitivo, sendo-lhe então a obra adjudicada, que a começou em Maio de 2006, ascendendo o respectivo preço ao valor global de € 152.974,12, acrescido do inerente imposto sobre o valor acrescentado (I.V.A.), ou seja, à quantia total de € 185.098,78.
Ø    Porém, no decorrer da execução da obra a Ré propôs diversas alterações ao contrato as quais, na sua globalidade, fizeram ascender o valor final da obra a € 290.653,84.
Ø    Em 19 de Outubro de 2006, após a realização das obras indicadas no auto de medição anexo à petição inicial, foi emitida uma factura no valor de € 98.939,97, que, entregue à Ré, foi pela mesma satisfeita integralmente.
Ø    Em 31 de Dezembro de 2007 foi emitida outra factura no valor de € 139.150, correspondente aos trabalhos até então executados, a qual, porém, e apesar de não impugnada pela Ré, não foi por esta paga até à data de hoje.
Ø    Tendo a Autora procedido à conclusão da obra, encontra-se ainda por facturar a quantia de € 54.531,55 (I.V.A. já incluído) para perfazer a totalidade do montante acordado.
Ø         A dívida da Ré para com a Autora é de € 193.681,55.
Citada, a Ré contestou a acção, alegando, em síntese:
Ø    Não são devidos os juros reclamados pois não se encontra em mora, dado não estar a obra ainda concluída,
Ø    A Ré reclamou a existência de diversos defeitos, tendo a Autora assumido e tentando corrigir alguns deles, o que não logrou fazer, e protelado a eliminação de outros.
Reconvindo, disse a Ré não ter aceitado a obra, dados os inúmeros defeitos ostentados pela mesma, defeitos cuja eliminação importa em montante não inferior a € 100.000,00
Conclui, pedindo a improcedência da acção e a procedência da reconvenção e, em consequência, a condenação da Autora a eliminar os defeitos apontados pela reconvinte, ou, quando tal não seja possível, a efectuar nova construção, em ambos os casos dentro de um prazo justo a fixar pelo Tribunal, de acordo com os parâmetros legais, ou, em alternativa, ser considerado que a eliminação dos defeitos orça em quantia nunca inferior a € 100.000,00 reduzindo-se o preço final neste mesmo valor, não se contabilizando também quaisquer juros; acrescerá ainda a condenação da reconvinda a pagar à reconvinte, a título de compensação pelos danos morais a esta causados, uma quantia nunca inferior a € 10.000,00
A Autora apresentou réplica, excepcionando a caducidade dos pedidos formulados pela reconvinte, porquanto tendo a mesma denunciado os defeitos em Junho de 2009, tinha o prazo de seis meses para propor a competente acção, ou seja, até ao final do mês de Dezembro de 2009, porém, a reconvenção só foi deduzida em 18 de Janeiro de 2010, para além dos seis meses legalmente estabelecidos na lei de defesa do consumidor.
Alegou ainda que a caducidade sempre terá ocorrido, porquanto é a própria reconvinte que alega existirem os defeitos desde 31 de Dezembro de 2007 e a denúncia só veio a ocorrer ano e meio depois.
Por impugnação, alegou não corresponder à verdade a existência de defeitos na obra, pois que os mesmos, para além de nunca terem sido invocados aquando da entrega da obra, e até depois, pura e simplesmente não existem, pois foram sempre estudadas e conseguidas diversas soluções tendentes à debelação dos pequenos problemas que surgiram no decurso da realização da obra.
Conclui pela procedência da excepção de caducidade ou improcedência da reconvenção apresentada pela Ré.
A Ré apresentou tréplica, mantendo a sua posição.
Proferido despacho saneador foi o conhecimento da excepção de caducidade relegado para final.
Veio a ser proferida sentença que julgou a acção nos seguintes termos:
Por todo o exposto, julgando-se a acção parcialmente provada e procedente:
- Condena-se a Ré M… a pagar à A. “C… & Cª. Lda.” a quantia de € 193.681,55 (cento e noventa e três mil, seiscentos e oitenta e um euros e cinquenta e cinco cêntimos), a que acrescerão juros de mora, contados à taxa legal, desde o momento em que a A. cumpra o que lhe vai ser imposto em sede decisória de reconvenção, até efectivo e integral pagamento;
- Todavia, a aludida Ré M… só estará obrigada a efectuar o pagamento da quantia acabada de referir à A. “C… & Cª. Lda.” depois que esta última proceda à reparação a que será condenada infra, em sede decisória de reconvenção;
- Absolve-se a Ré M… do demais contra si peticionado nos autos pela A. “C… & Cª. Lda.”.

No mais, julgando-se a reconvenção parcialmente provada e procedente:
- Condena-se a reconvinda “C… & Cª. Lda.” a reparar e eliminar de forma permanente, a expensas suas, no prazo de 120 (cento e vinte) dias a contar do trânsito em julgado da presente decisão, os defeitos e anomalias (supra referidos nos pontos 30 a 43, 45 e 49 a 52 dos factos assentes desta sentença) da obra pela reconvinda levada a cabo no prédio (melhor identificado no ponto 3 da factualidade provada desta mesma sentença) da reconvinte M…;
- Condena-se a reconvinda “C… & Cª. Lda.” a pagar à reconvinte M… o montante compensatório por danos não patrimoniais de € 3.500 (três mil e quinhentos euros);
- Absolve-se a reconvinda “C… & Cª. Lda.” do demais contra si peticionado nos autos pela reconvinte M...
A Autora inconformada interpôs recurso, formulando as seguintes conclusões:
...
Conclui pela procedência do recurso.
A Ré apresentou resposta, defendendo a confirmação da decisão proferida.
1. Do objecto do recurso
Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações cumpre decidir as seguintes questões:
a) Devem ser alteradas as respostas dadas aos quesitos 1º, 2º, 3º, 32º e 33º?
b) O contrato celebrado deve ser qualificado como contrato de prestação de serviços para consumo?
c) A Autora não é responsável pelos defeitos referidos nos pontos 30º, 31º, 33º, 34º, 37º, 39º, 40º e 50º da sentença recorrida?
d) O direito à eliminação dos defeitos caducou devido aos mesmos não terem sido denunciados atempadamente?
e) O direito à eliminação dos defeitos caducou devido à respectiva demanda judicial ter sido deduzida para além do prazo legal?
f) A excepção do cumprimento defeituoso por parte da Autora é desproporcionada tendo em consideração o custo da eliminação dos defeitos perante o montante do preço da obra ainda em dívida?
g) A Ré deve ser condenada a pagar juros de mora desde a constituição da dívida ou, pelo menos, desde a sua citação para a presente acção?
g) Não são indemnizáveis os danos não patrimoniais invocados pela Ré?
2. Dos factos

Factos provados:
São, pois, os seguintes os factos provados nesta acção:

O direito aplicável
1. Qualificação do contrato
Na presente acção a Autora pede o pagamento de parte do preço acordado com a Ré para a realização de obras de demolição, reconstrução e ampliação da casa de habitação desta última.
No nosso Código Civil o contrato de empreitada é uma espécie autónoma dos contratos de prestação de serviço, os quais se caracterizam pela circunstância de uma das partes (o prestador de serviço) proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem retribuição – art.º 1154º.
O que individualiza os contratos de empreitada do âmbito da figura mais vasta dos contratos de prestação de serviço é o de que o resultado a que se obriga o empreiteiro é o de realização de uma obra – art.º 1207º do C. Civil –, devendo esta traduzir-se por uma alteração física de coisa corpórea.
Assim, tendo a Autora se comprometido a realizar obras de alteração a uma casa já existente, estamos perante a outorga de um contrato de empreitada.
Respeitando essas obras à casa de habitação da Ré e sendo a Autora uma empresa que se dedica profissionalmente à construção civil estamos perante uma empreitada de consumo, regulada pelo disposto no Decreto-Lei n.º 67/2003, de 8 de Abril, o qual após a outorga do contrato sub judice sofreu as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 84/2008, de 21 de Maio (alínea a), do art.º 1º - B).
2. Da responsabilidade da Autora pela existência de alguns defeitos apurados
Verificando-se a existência de defeitos na obra realizada, a responsabilidade do empreiteiro numa empreitada de consumo é objectiva [1], dispensando a existência de um nexo de imputação das faltas de conformidade a um comportamento censurável daquele, como se depreende do art.º 3º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 67/2003, presumindo-se que as faltas de conformidade já existiam no momento em que a obra foi entregue ao seu dono – art.º 3º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 67/2003.
Mas o art.º 2º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 67/2003, in fine, dispõe que quando os defeitos têm origem em materiais fornecidos pelo dono da obra já não se aplica o regime da empreitada de consumo. À hipótese do defeito com origem nos materiais fornecidos pelo dono da obra consumidor, devem equiparar-se – art.º 10º do C. Civil – as situações em que o defeito tem origem em projectos, estudos, previsões, máquinas, edifícios ou terrenos fornecidos pelo dono da obra, por identidade de razão, pelo que também a estes casos não é aplicável o regime do Decreto-Lei n.º 67/2003, mesmo que se tratem de contratos qualificáveis como empreitadas de consumo [2].
Nestas situações, caso se demonstre a responsabilidade do empreiteiro, apesar do defeito ter a sua origem em coisa fornecida pelo dono da obra consumidor, por recair sobre aquele um dever de advertir o dono da obra da probabilidade da obra ser defeituosa, as suas consequências são definidas pelo regime previsto no C. Civil e pelas regras da L.D.C., aplicáveis aos contratos de consumo de empreitada (sobretudo art.º 4.º, 7.º, n.º 5, e 12.º, n.º 1), estando excluída a aplicação do Decreto-Lei n.º 67/2003.
Assim, quando o defeito tem origem em materiais, projectos, previsões, estudos, máquinas, edifícios ou terrenos fornecidos pelo dono da obra, já não se lhes aplica o regime da responsabilidade por desconformidades da obra realizada numa empreitada de consumo [3], pelo que nesses casos não haverá uma responsabilidade do empreiteiro que prescinda de um juízo sobre a culpa deste, sendo que esta se presume, por força do disposto no art.º 799º do C. Civil.
A Autora alega que não pode ser responsabilizada pelos defeitos referidos nos pontos 30, 31, 33, 34, 37, 39, 40 e 50 da sentença recorrida.
Nos pontos 30 e 31 diz-se que, quanto ao edifício antigo sujeito a obras de restauro e reconstrução, existem defeitos de construção, nomeadamente ao nível de carpintarias exteriores (portas e janelas) com deficiências na pintura, verificando-se uma deficiente ligação destas com as soleiras e os peitoris, o que permite infiltrações das águas das chuvas, com consequências nefastas para as alvenarias e respectivas pinturas.
Alega a Autora que estes pontos não contêm matéria que tenha sido objecto da sua intervenção, pois como resulta do facto 57º da sentença recorrida a caixilharia exterior não foi por ela reparada conforme solicitação da Ré.
Na verdade, provou-se que foi mantida a caixilharia exterior das janelas, a solicitação da Ré, apesar do plano de obra incluir o fornecimento e assentamento de caixilharias, pelo que os defeitos referidos nos pontos 30 e 31 da matéria de facto provada não respeitam à obra realizada pela Autora, não podendo esta ser responsabilizada pela sua existência.
No ponto 33 da sentença recorrida diz-se que algumas das tábuas dos soalhos (em madeira de pinho) do edifício antigo já não se apresentam na horizontal, encontrando-se também algumas rachadas.
No ponto 34 da sentença recorrida refere-se que as tábuas do soalho apresentam diversos orifícios, uns abertos e outros tapados.
No ponto 37 consta que interiormente, em algumas paredes, a pintura e os rebocos apresentam-se em estado adiantado de desagregação, sintoma de infiltração de água.
E no ponto 40 da sentença recorrida que os soalhos (em madeira de pinho) da ala nova apresentam algumas tábuas desniveladas e com deficiente envernizamento.
A Autora argumenta que não é a responsável pelo estado das tábuas dos soalhos referido nos pontos 33, 34 e 40 da sentença recorrida, bem como não é a responsável pela variação do teor de humidade nas zonas dos soalhos como consta do ponto 41, pois, como é referido no facto 48, “a construção não dispõe de um material impermeável na transição da parte enterrada para a não enterrada das paredes, por forma a impedir a propagação das águas subterrâneas até à superfície”.
Baseia a alegada irresponsabilidade nas seguintes razões: “Não foi a A. que construiu essas paredes que já existiam e que a R. não incluiu nos trabalhos a realizar no acordo que fez com a A, sendo certo que para evitar tal humidade também seria necessário um dreno a envolver a habitação, como é referido no ponto 48 dos factos provados da sentença e é a própria sentença recorrida que reconhece expressamente que “(não falemos dos defeitos e faltas inerentes aos pontos 47 e 48 dos mesmos factos provados, que não foram incluídos no objecto contratual em causa, nem do problema da porta da rua mencionado no ponto 58 da dita factualidade. Pois que neste aspecto a Ré como que teve o que “quis”).
Todos os problemas do soalho têm em ver com as deficiências na defesa da casa perante a humidade que vem do terreno onde a mesma se insere, pelo que as respectivas consequências não podem ser imputadas à A., que exerceu toda a diligência para resolver esses problemas, pois está provado – facto 61 - que “o soalho foi levantado, a fim de permitir a consecução da ventilação da caixa-de-ar, verificando-se, depois da reparação efectuada, o estado de coisas aludido nos pontos 33 e 41 (ambos destes factos provados)”.
Apesar de criado um sistema de ventilação não é possível controlar a humidade do terreno que passa para cima, por força do facto de a R. só ter contratado com a A. alguns trabalhos, excluindo outros, apesar de necessários e não pode a A. ser condenada a reparar os pontos do soalho referidos nos factos 33, 34, 40 e 41 por não se tratar de deficiência do trabalho realizado pela A., mas de defeito estrutural da casa da R. e que esta não contratou com a A. a sua reparação.”
E estende esta argumentação ao referido no ponto 37.
Em primeiro lugar, convém referir que as objecções colocadas pela Autora apenas têm algum sentido, relativamente à matéria dos pontos 33, 34 e 37 da sentença recorrida, uma vez que quanto aos defeitos do soalho da ala nova (ponto 40), nunca poderiam os mesmos serem imputados à anterior construção.
Em segundo lugar, note-se que a sentença recorrida não aponta à Autora a deficiência da construção onde foram realizadas as obras não dispor de um material impermeável na transição da parte enterrada para a não enterrada das paredes, por forma a impedir a propagação das águas subterrâneas até à superfície, mas sim os defeitos ostentados no soalho colocado pela Autora (desnivelamento, rachas, buracos).
E, relativamente a estes, na matéria de facto provada não se estabelece qualquer nexo de causalidade entre os defeitos e a deficiência apontada à construção onde foram realizadas as obras pela Autora, referindo-se apenas que tal construção não dispõe de um dreno a envolver a habitação, nem de um material impermeável na transição da parte enterrada para a não enterrada das paredes, por forma a impedir a propagação das águas subterrâneas até à superfície, não sendo, por isso, possível imputar-se a origem de tais defeitos ao edifício fornecido pela Ré. 
Mas, mesmo que, por hipótese de raciocínio, fosse possível presumir o referido nexo de causalidade, os factos provados nunca permitiriam excluir a responsabilidade da Autora pela existência de tais defeitos.
Na verdade, como acima se referiu, quando os defeitos resultam de construção anterior fornecida pelo dono da obra, para nela serem efectuadas obras (de remodelação ou reconstrução), não se aplica o regime de responsabilidade objectiva do empreiteiro, próprio das empreitadas de consumo, mas sim o regime geral dos defeitos das empreitadas, constante do C. Civil, em que apenas vigora uma presunção de culpa do empreiteiro pela existência dos defeitos, nos termos do art.º 799º daquele diploma.
Em situações como a presente, a responsabilidade do empreiteiro só se deverá considerar excluída se este demonstrar, ilidindo aquela presunção, que, atendendo aos conhecimentos técnicos de um bom profissional da construção civil, não lhe era exigível que tivesse detectado aquele vício da construção pré-existente, ou que o dono da obra insistiu pela realização da obra nos termos executados, apesar de alertado pelo empreiteiro para as consequências da sua realização naquelas condições [4].
Nestas hipóteses, quando o empreiteiro não cumpre o dever que sobre ele recaía de detectar e informar o dono da obra da existência das deficiências ou insuficiências prévias da construção onde irão ser realizadas as obras contratadas, é ele o responsável pelos defeitos consequenciais que se vierem a verificar nessas obras.
Ora, na presente acção, nem se provou que a apontada deficiência da construção existente não era perceptível por um bom profissional da construção civil, nem que a Autora tenha alertado a Ré para as consequências de se colocar um soalho novo numa construção que não dispunha de um dreno a envolver a habitação, nem de um material impermeável na transição da parte enterrada para a não enterrada das paredes, por forma a impedir a propagação das águas subterrâneas até à superfície.
Por estas razões é a Autora responsável pelos defeitos referidos nos pontos 33, 34, 37 e 40 da sentença recorrida.
No ponto 39 da sentença recorrida diz-se que a ala nova apresenta, interiormente, um conjunto de deficiências, designadamente na porta de entrada, cuja parte inferior se encontra em adiantado estado de deterioração.
A Autora alega que não pode ser condenada a reparar aquela porta porquanto provou-se que foi proposto à Ré a sua realização em madeira de qualidade, mas esta preferiu que fosse em contraplacado folheado, para durar dois ou três anos, e depois, mais tarde, substituir, a expensas suas, por outra de melhor qualidade, pelo que a má qualidade da referida porta não resulta de uma má escolha de materiais pela Autora, mas de uma opção consciente da Ré.
O ponto 39 apenas descrimina como defeito o estado de deterioração da porta de entrada da ala nova.
Provou-se que, no que respeita à porta da rua, que foi proposto à Ré a sua realização em madeira de qualidade, mas esta preferiu que fosse em contraplacado folheado, para durar dois ou três anos e depois, mais tarde, substituir (ela, Ré, a suas expensas) por outra de melhor qualidade (ponto 58 da matéria de facto).
Aqui já estamos perante uma imposição pela dona da obra ao empreiteiro de materiais inadequados pelo que, actuando este como um simples nudus minister, a sua responsabilidade está excluída [5].
Esta exclusão é aliás reconhecida pela sentença recorrida que só, por lapso, na parte decisória, incluiu este defeito na lista daqueles que condenou a Ré a eliminar.
No ponto 50 provou-se que as madeiras (pranchas) se encontram deformadas por acção das chuvas e do sol, não estando em condições de serem utilizadas.
A Autora alega que a aplicação de tais madeiras não constam dos trabalhos que contratou, não tendo sido fornecidas nem aplicadas por si, pelo que não pode ser responsabilizada pelos defeitos nelas existentes.
Efectivamente, conforme se verifica da alegação contida na contestação/reconvenção, as referidas pranchas de madeiras encimam cantarias implantadas no pátio interior, não constando tal obra dos trabalhos acordados entre Autora e Ré, pelo que não pode aquela ser responsabilizada pelos defeitos existentes em tais pranchas.
De tudo o exposto, resulta que nesta parte o recurso deve ser julgado parcialmente procedente, excluindo-se a responsabilidade da Ré quanto aos defeitos referidos nos pontos 30, 31, 39 e 50 da matéria de facto e a consequente obrigação da sua eliminação.
3. Da caducidade do direito da Ré à eliminação dos defeitos
A Ré (dona da obra), em reconvenção à acção que a Autora (empreiteira) lhe moveu para dela haver parte do preço da obra, pediu que esta fosse primeiramente condenada a eliminar os defeitos que a obra padece.
A Autora excepcionou a caducidade do invocado direito à eliminação dos defeitos, com dois fundamentos: intempestividade da denúncia dos defeitos, por um lado, exercício tardio do direito à eliminação, por outro.
3.1. Da intempestividade da denúncia
Perante a existência de defeitos na obra realizada pelo empreiteiro, o dono da obra tem o ónus de os denunciar ao empreiteiro, para que este tenha a oportunidade de os eliminar. A denúncia funciona como condição de que depende o exercício dos direitos do dono da obra – art.º 5º-A, n.º 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 67/2003.
Nas empreitadas de consumo em obras realizadas em imóveis o prazo para a denúncia dos defeitos é de 1 ano após o conhecimento dos mesmos – art.º 5º-A, n.ºs 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 67/2003 –, não funcionando aqui a presunção de conhecimento dos defeitos aparentes constante do art.º 1219º, n.º 2, do C. Civil, uma vez que esta se encontra estabelecida com vista à exclusão da responsabilidade do empreiteiro em resultado da aceitação da obra com defeitos conhecidos, a qual não tem aplicação nos contratos de empreitada de consumo, por contrariar a cominação com nulidade dos pactos que excluam a responsabilidade civil do empreiteiro antes da denúncia dos defeitos, consagrada no art.º 10º do Decreto-Lei n.º 67/2003 [6].
E relativamente aos defeitos a que não se aplique o regime da empreitada de consumo, por resultarem de deficiências estruturais da casa fornecida pela Ré, onde foram realizadas as obras de reconstrução, não se revelando que os mesmos fossem aparentes tinha a Ré o mesmo prazo de um ano para os denunciar após o seu descobrimento – art.º 1220º, n.º 2, do C. Civil.
Quanto a esta matéria apenas se provou que em 31 de Dezembro de 2007, a obra já apresentava defeitos de construção e que a Ré reclamou, pela última vez, em finais de Junho de 2009, a eliminação desses defeitos por parte da Autora.
Desconhece-se, por um lado, quando é que a Ré tomou conhecimento da existência dos defeitos e quando os denunciou, pois apenas sabemos que eles já se verificavam em Dezembro de 2007 e que a última vez que a Autora reclamou junto da Ré a sua eliminação antes da dedução da reconvenção foi em Junho de 2009, pelo que não se apurou que tenha decorrido o prazo de 1 ano após o conhecimento pela Ré dos defeitos sem que esta os tenha denunciado à Autora.
Competindo à Autora o ónus de prova do decurso daquele prazo [7], perante a ausência de elementos que permitam determinar a sua ultrapassagem, não é possível concluir pela caducidade do direito da Ré à eliminação dos defeitos com este fundamento.
3.2. Da intempestividade do pedido reconvencional
Mas a Autora também alega que o direito à eliminação dos defeitos caducou porque a reconvenção foi deduzida em 18 de Janeiro de 2010 e a Ré reclamou, pela última vez, a eliminação dos defeitos em finais de Junho de 2009, pelo que excedeu o prazo de 6 meses para propor a competente acção, previsto no art.º 5º, nº 4 do Decreto-Lei n.º 67/2003, o qual terminava no final do mês de Dezembro de 2009.
Esta alegação encerra vários equívocos.
Desde logo, o prazo de 6 meses para o exercício dos direitos do dono da obra após a denúncia dos defeitos que efectivamente constava da redacção original do art.º 5º, n.º 4 do Decreto-Lei n.º 63/2003, foi aumentado para 3 anos, no que respeita às obras em imóveis, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 84/2008, sendo certo que este novo prazo se aplica ao exercício do direito aqui em causa, uma vez que, quando ele se teria iniciado na versão da Autora – Junho de 2009 –, já se encontrava em vigor a nova redacção [8].
Em segundo lugar, o modo de exercício dos direitos que deve ser efectuado no prazo constante do art.º 5º, nº 4 do Decreto-Lei n.º 67/2003 não tem que ser necessariamente efectuado em acção judicial, sendo suficiente a interpelação extra-judicial do empreiteiro para esse efeito [9], pelo que a exigência de eliminação dos defeitos efectuada em Junho de 2009, não contemplando apenas uma notícia da existência dos defeitos, mas uma pretensão no sentido dos mesmos serem eliminados é suficiente para se considerar que a mesma já constitui um exercício pelo dono da obra do direito à eliminação dos defeitos.
Estas objecções são também aplicáveis aos defeitos a que não se aplique o regime da empreitada de consumo, por resultarem de deficiências estruturais da casa pertencente à Ré, onde foram realizadas as obras de reconstrução, uma vez que o prazo para o exercício do direito à eliminação dos defeitos após a sua denúncia é de 1 ano e não de 6 meses como pretende a Autora – art.º 1225º, n.º 2 e 3, do C. Civil.
Por estas razões improcede também o segundo fundamento invocado pela Autora para a caducidade do direito invocado pela Ré, em sede de reconvenção.
4. Da excepção de não cumprimento
A sentença recorrida julgou verificada uma situação de excepção de cumprimento defeituoso da prestação da Autora, justificativa da suspensão do cumprimento da obrigação da Ré pagar o preço em falta da empreitada, pelo que condicionou a satisfação dessa obrigação, à eliminação prévia pela Autora dos defeitos da obra.
A Autora discorda desta solução por entender que existe uma desproporção entre o montante do preço em falta e o custo das obras de eliminação dos defeitos.
O dono da obra pode excepcionar o cumprimento defeituoso do empreiteiro para suspender o cumprimento da sua prestação principal – o pagamento do preço - utilizando a faculdade que lhe é proporcionada pelo art.º 428º do C. Civil.
Esta possibilidade legal é concedida aos credores de prestações sinalagmáticas, em que se verificou o cumprimento defeituoso de uma delas – exceptio non rite adimpleti contractus  [10].
Necessário é que a parte do preço, cujo pagamento se recusa, seja proporcional à desvalorização da obra provocada pela existência do defeito [11], como impõe os ditames da boa-fé no cumprimento das obrigações – art.º 762º, n.º 2 do C. Civil.
 Em rigor, a determinação dessa proporcionalidade deve socorrer-se dos critérios que usualmente são utilizados para apurar o valor de redução do preço da obra, por defeitos não supridos [12], sendo o mais aconselhável aquele em que a redução do preço deve ser encontrada numa ponderação equitativa entre o preço acordado, o valor objectivo da obra com defeitos e o valor ideal da obra, à data da sua aceitação [13].
Contudo, não se encontrando, a maior parte das vezes, entre os factos apurados, estes dois últimos elementos e revelando-se de difícil concretização o seu apuramento, como sucede no presente caso, pode o julgador recorrer a um puro juízo de equidade para determinar qual a parte do preço que é proporcional à desvalorização da obra que resulta dos defeitos que apresenta, aplicando-se analogicamente o disposto no art.º 566º, n.º 3 do C. Civil [14].
Apesar de não pretendermos estender a possibilidade de recurso a juízos de equidade a todos os domínios de intervenção dos ditames da boa-fé, este específico juízo de proporcionalidade exige ponderações que se movem no campo da indeterminação e que só podem ser extrapoladas do caso concreto a que só a equidade consegue dar resposta [15], sendo certo que o seu resultado é apenas uma mera suspensão da exigência da prestação acordada.
Assim, tendo em consideração que se provou que para eliminar os defeitos será necessário despender uma quantia a rondar os € 66.318,46, a que acrescerá o montante devido a título de I.V.A., e que já aqui se apurou que a Autora não é responsável pela eliminação de alguns daqueles defeitos (os referidos nos pontos 30, 31, 39 e 50), num juízo de equidade que busque um equilíbrio entre o valor da parte da prestação cuja recusa é legítima e a desvalorização resultante da prestação defeituosamente executada, não deixando de se assegurar uma margem de segurança que acautele o dono da obra das consequências de um agravamento dos defeitos da obra, deve a excepção de cumprimento defeituoso condicionar apenas o pagamento de € 100.000,00 do preço da obra ainda por satisfazer, julgando-se o recurso parcialmente procedente nesta parte.
5. Dos juros de mora
A decisão recorrida condenou a Ré a pagar juros de mora sobre a quantia em dívida apenas contabilizados a partir do momento em que a Autora proceda à eliminação dos defeitos.
A Autora pretende que a Ré seja condenada a pagar juros sobre a parte do preço ainda não satisfeita desde a constituição da dívida ou, pelo menos, desde a citação.
Dos factos provados não resulta qual o momento acordado para o pagamento do preço da empreitada, tendo-se apenas apurado que em Junho/Julho de 2009 a Autora interpelou a Ré para lhe pagar a parte do preço ainda não liquidada.
O art.º 805º do C. Civil dispõe o seguinte:
“1. O devedor só fica constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir.
2. Há, porém, mora do devedor, independentemente de interpelação:
a) Se a obrigação tiver prazo certo;
b) Se a obrigação provier de facto ilícito;
c) Se o próprio devedor impedir a interpelação, considerando-se interpelado, neste caso, na data em que normalmente o teria sido.
3. Se o crédito for ilíquido, não há mora enquanto se não tornar líquido, salvo se a falta de liquidez for imputável ao devedor; tratando-se, porém, de responsabilidade por facto ilícito ou pelo risco, o devedor constitui-se em mora desde a citação, a menos que já haja então mora, nos termos da primeira parte deste número”.
Ora, tendo-se verificado que existia uma razão para a Ré recusar o cumprimento de parte da sua obrigação, nos termos do art.º 428º do C. Civil, face ao cumprimento defeituoso pela Autora da contra-prestação, e não se encontrando liquidada essa parte, o que só se obterá com o desfecho da presente acção, a mora só poderá ocorrer, relativamente à parte que a Ré está já obrigada a satisfazer, com o trânsito em julgado da presente decisão, nos termos do nº 3 do transcrito art.º 805º, enquanto, no que respeita à parte que a Ré pode suspender o pagamento, a mora só se iniciará com a eliminação dos defeitos da obra, conforme decidiu a sentença recorrida.
5. Indemnização dos danos não patrimoniais
A sentença recorrida condenou a Autora a pagar à Ré a quantia de € 3.500,00, compensatória dos danos não patrimoniais que esta sofreu com a existência de defeitos na obra, tendo-se provado que, em virtude dos defeitos da obra, a Ré teve bastantes contrariedades, dissabores, incómodos e perdas de tempo desnecessárias.
Os danos não patrimoniais é um exemplo clássico de efeitos colaterais dos defeitos da obra, os quais são indemnizáveis, se assumirem um grau de gravidade, que justifique uma intervenção compensatória do direito, nos termos do art.º 496º, do C. Civil [16]. Tendo em consideração que alguns dos defeitos existentes afectam o gozo pela Ré da casa onde foram realizadas as obras, as contrariedades, dissabores, incómodos sofridos por esta, assumem uma proporção que justifica a intervenção da ordem jurídica para atribuir àquela uma compensação por esses danos não patrimoniais.
Por este motivo improcede este fundamento do recurso.
6. Conclusão
Por estas razões deve o recurso ser julgado parcialmente procedente, alterando-se parcialmente a decisão recorrida nos seguintes termos:
- exclusão dos defeitos a eliminar pela Autora dos referidos nos pontos 30, 31, 39 e 50 da matéria de facto considerada provada.
- limitação do condicionamento da condenação da Ré ao pagamento de € 193,681,55, à reparação dos defeitos, a € 100.000,00.
- condenação da Ré a pagar juros de mora sobre € 93.681,55, após trânsito da presente decisão.
- as custas da acção devem ser da responsabilidade de Autora e Ré, em igual proporção, atenta a alteração do decidido.
Decisão
Pelo exposto, julga-se parcialmente procedente o recurso e, em consequência, altera-se a decisão recorrida, a qual passará a ter o seguinte conteúdo:
- Condena-se a Ré M… a pagar à Autora “C… & Cª. Lda.” a quantia de € 193.681,55 (cento e noventa e três mil, seiscentos e oitenta e um euros e cinquenta e cinco cêntimos),
- Todavia, a aludida Ré M… só estará obrigada a efectuar o pagamento de € 100.000,00 da quantia acabada de referir à Autora “C… & Cª. Lda.” depois que esta última proceda à reparação a que será condenada infra, em sede decisória de reconvenção;
- Condena-se a Ré M… a pagar à Autora “C… & Cª. Lda.”juros de mora, contados à taxa legal, sobre € 100.000,00 desde o momento em que a Autora cumpra o que lhe vai ser imposto em sede decisória de reconvenção, até efectivo e integral pagamento e sobre € 93.681,55 desde o trânsito em julgado da presente decisão;
- Absolve-se a Ré M… do demais contra si peticionado nos autos pela A. “C… & Cª. Lda.”.
Custas da acção por Autora e Ré em igual proporção.
No mais, julgando-se a reconvenção parcialmente provada e procedente:
- Condena-se a reconvinda “C… & Cª. Lda.” a reparar e eliminar de forma permanente, a expensas suas, no prazo de 120 (cento e vinte) dias a contar do trânsito em julgado da presente decisão, os defeitos e anomalias (supra referidos nos pontos 32 a 38, 40 a 43, 45, 49, 51 e 52 dos factos assentes desta sentença) da obra pela reconvinda levada a cabo no prédio (melhor identificado no ponto 3 da factualidade provada desta mesma sentença) da reconvinte M…;
- Condena-se a reconvinda “C… & Cª. Lda.” a pagar à reconvinte M… o montante compensatório por danos não patrimoniais de € 3.500 (três mil e quinhentos euros);
- Absolve-se a reconvinda “C… & Cª. Lda.” do demais contra si peticionado nos autos pela reconvinte M...
Custas da reconvenção por Autora e Ré nas proporções, respectivamente, de 2/6 e 4/6.
Custas do recurso pela Autora, na proporção de 65%, e pela Ré, na proporção de 35%.

                                               ***
Sílvia Pires (Relatora)
Henrique Antunes
José Avelino


[1] Calvão da Silva, em Venda de bens de consumo, pág. 104, 4.ª ed., Almedina, João Cura Mariano, em Responsabilidade contratual do empreiteiro pelos defeitos da obra, pág. 246, 5.ª ed., Almedina, Pedro Albuquerque/Miguel Assis Raimundo, em Direito das Obrigações. Contratos em especial. O contrato de empreitada, pág. 447-448, ed. 2012, Almedina, e o Acórdão da Relação do Porto de 7.2.2005, relatado por Santos Carvalho, em www.dgsi.pt.

[2] Neste sentido, João Cura Mariano, ob. cit., pág. 245-246.

[3] Neste sentido, João Cura Mariano, ob. cit., pág. 248.
 [4] Com igual posição, relativamente a obra realizada em terreno fornecido pelo dono da obra, Pires de Lima e Antunes Varela, em Código Civil anotado, vol. II, pág. 903, 4.ª ed., Coimbra Editora, Lebre de Freitas, em O ónus da denúncia do defeito da empreitada no art.º 1225.º, do Código Civil..., em “O Direito”, Ano 131 (1999), pág. 241, João Cura Mariano, ob. cit., pág. 74, Pedro de Albuquerque/Miguel Assis Raimundo, ob. cit, pág. 385, e o Acórdão do S.T.J. de 22.5.2012, no site www.colectaneadejurisprudência.com, relatado por Gregório Jesus.

[5] João Cura Mariano, ob. cit., pág. 74.
[6] Neste sentido, João Cura Mariano, ob. cit., pág. 251 e 253, e Pedro Romano Martinez, em Empreitada de Consumo, em Themis, Ano II, n.º 4, pág. 167-168.

[7] Pires de Lima/Antunes Varela, ob. cit, pág. 895, João Cura Mariano, ob. cit., pág. 100, Pedro de Albuquerque/Miguel Assis Raimundo, em ob. cit., pág. 408.

[8] Neste sentido João Cura Mariano, ob. cit., pág. 269.

[9] Neste sentido João Cura Mariano, ob. cit., pág. 150-151.

[10] Vaz Serra, em Excepção de contrato não cumprido, pág. 37-41, no B.M.J. n.º 67, Antunes Varela, em parecer publicado na C.J., Ano XII, tomo 4, pág. 32-33, Pessoa Jorge, em Direito das obrigações, pág. 648-649, da ed. policopiada da A.A.F.D.L., 1975/1976, Menezes Cordeiro, em Violação positiva do contrato, em “Estudos de direito civil”, vol. I, pág. 138-139, e José João Abrantes, em A excepção de não cumprimento do contrato no direito civil português, pág. 92-118, ed. de 1986, Almedina, e em Contrato de empreitada e excepção de não cumprimento, em “Cadernos de direito privado”, n.º 18, pág. 53-58.

[11] Vaz Serra, ob. cit., pág. 42-44, Pedro Romano Martinez, em Cumprimento defeituoso. Em especial na compra e venda e na empreitada, pág. 295-296, ed. 2001, Almedina, José João Abrantes, em A excepção de não cumprimento do contrato no direito civil português, pág. 110-115, e em Contrato de empreitada e excepção de não cumprimento, em “Cadernos de direito privado”, n.º 18, pág. 53-58, João Cura Mariano, na ob. cit., pág. 161, e os seguintes Acórdãos:
- da Relação de Coimbra, de 27.10.2005, no site www.dgsi.pt, relatado por Ferreira de Barros.
- da Relação do Porto, de 29.11.2006, no site www.dgsi.pt, relatado por Emídio Costa.

[12] João Cura Mariano, na ob. cit., pág. 161 e o Acórdão da Relação do Porto, de 29.6.2010, no site www.dgsi.pt, relatado por Henrique Araújo.

[13] Sobre os diferentes critérios que podem ser utilizados para a redução do preço, Pedro Romano Martinez em Cumprimento defeituoso. Em especial na compra e venda e na empreitada, pág. 362-365, João Cura Mariano, na ob. cit., pág. 118-120, e Paulo Mota Pinto, em Interesse contratual negativo e interesse contratual positivo, vol. II, pág. 1434-1447, ed. de 2008, Coimbra Editora.

[14] Assim, efectuaram relativamente à redução do preço em virtude da existência de defeitos os seguintes acórdãos:
    - do S.T.J., de 25.3.2003, em C.J. (Ac. do S.T.J.), Ano XXVIII, tomo 1, pág. 142, relatado por Afonso Correia,
    - do S.T.J., de 19.7.2007, em www.dgsi.pt, relatado por Fonseca Ramos.
    - da Relação de Coimbra, de 9.1.2012, em www.dgsi.pt, relatado por Jacinto Meca.

[15] Vide sobre este tema a opinião de Menezes Cordeiro, em Da boa-fé no direito civil, vol. II, pág. 1208, ed. de 1984, da Almedina.

[16] Defendeu-se a ressarcibilidade, nos termos do art.º 1223º, do C.C., de danos não patrimoniais sofrido pelo dono da obra por não poder usufruir desta devido aos defeitos que a mesma padecia, nos seguintes Acórdãos, entre outros:
- do S.T.J., de 8.6.2006, relatado por João Camilo.
- da Relação de Évora de 8.2.2007, relatado por Alexandra Santos.
- da Relação de Guimarães, de 11.10.2007, relatado por Conceição Bucho.
- da Relação de Lisboa, de 2.7.2009, relatado por Nelson Borges Carneiro.
- da Relação de Coimbra, de 6.7.2010, relatado por Teresa Pardal.
- da Relação de Lisboa, de 27.1.2011, relatado por Jorge Leal.
- da Relação de Coimbra, de 29.11.2011, relatado por Carlos Querido.
- do S.T.J., de 24.1.2012, relatado por Martins de Sousa.
- da Relação do Porto, de 31.1.2012, relatado por Cecília Agante.
- da Relação de Coimbra, de 11.12.2012, relatado por Carlos Moreira, todos acessíveis, em www.dgsi.pt.