Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
258/17.6T8FND-A.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: JORGE DIAS
Descritores: CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA
CONTRAORDENAÇÃO
IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
INEXISTÊNCIA DE JUÍZO LOCAL DE PEQUENA CRIMINALIDADE
Data do Acordão: 09/20/2017
Votação: DECISÃO SINGULAR
Tribunal Recurso: CASTELO BRANCO (JL CRIMINAL DO FUNDÃO)
Texto Integral: S
Meio Processual: CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA
Decisão: ATRIBUIÇÃO DE COMPETÊNCIA
Legislação Nacional: ARTS. 81.º, 118.º E 130.º DA LOSJ
Sumário: I - Qualquer matéria da área criminal (seja crime ou contraordenação) que não esteja atribuída por lei a juízo (tribunal) de competência especializada (grande criminalidade da competência do Juízo Central, ou pequena criminalidade da competência do Juízo Local de pequena criminalidade nas comarcas onde existir) é da competência do Juízo Local de competência genérica (que também pode desdobrar-se em juízos de competência especializada, normalmente de natureza cível e criminal).

II - Inexistindo Juízo de pequena criminalidade na comarca (e quando há a sua competência territorial é definida), os processos de contraordenação são tramitados pelo Juízo Local Criminal (ou Juízo Local de competência genérica se não houver especialização) competente (dependendo do município onde os factos são praticados).

Decisão Texto Integral:





A Srª. Juiz do Juízo Local Criminal do Fundão, da Comarca de Castelo Branco veio no âmbito dos autos de processo de Contraordenação, Proc. n.º 258/17.6T8FND-A.C1, declarar-se incompetente e, posteriormente, suscitar a resolução do conflito negativo de competência relativamente ao despacho proferido pelo Srª. Juiz do Juízo Central Criminal - J2, da mesma Comarca de Castelo Branco dado atribuírem-se esses Juízos reciprocamente competência, negando a própria, para tramitar os presentes autos.

Foram notificados os sujeitos processuais nos termos do artº 36º nº 1 CPP, não tendo sido apresentada qualquer resposta.

O Exmº Procurador-Geral Adjunto é de parecer que o Tribunal competente para a tramitação subsequente dos presentes autos é, o Juízo Local Criminal do Fundão, que tem competência para a impugnação em causa nos termos do art. 130, nº 1 al. d) da LOSJ.


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FUNDAMENTAÇÃO:

Historiando verifica-se que está em causa um recurso de impugnação da decisão da autoridade administrativa, em processo de contraordenação.

Em causa coima de valor superior a 15000,00€

A questão é, saber se os autos devem correr no Juízo Central Criminal da Comarca de Castelo Branco ou, no Juízo Local do Fundão, da mesma comarca.


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Vejamos.

A Reforma Judiciária entrada em vigor em 1de Setembro de 2014 alterou não só o Mapa Judiciário como reestruturou competências, Lei nº 62/2013 de 26-08 - LOSJ.

Competências que foram ajustadas com as alterações processadas com a L. 40-A/2016 de 22-12 e a substituição da designação de Instâncias por Juízos.

Refere-se no preâmbulo do Dl. Nº 49/2014 de 27 de Março que:

As instâncias centrais têm, na sua maioria, competência para toda a área geográfica correspondente à comarca e desdobram-se em secções cíveis, que tramitam e julgam, em regra, as questões cíveis de valor superior a (euro) 50 000,00, em secções criminais, destinadas à preparação e julgamento das causas crime da competência do tribunal coletivo ou de júri, e em secções de competência especializada, designadamente, secções de comércio, execução, família e menores, instrução criminal, e do trabalho, que preparam e julgam as matérias cuja competência lhes seja atribuída por lei.

As instâncias locais, que tramitam e julgam as causas não atribuídas à instância central, integram secções de competência genérica e podem desdobrar-se em secções cíveis, secções criminais, secções de pequena criminalidade e secções de proximidade” (sublinhados nossos).

Donde resulta que o Juízo Central tem competência própria e determinada por lei e, os juízos locais que, subsidiariamente têm competência (competência genérica) para toda a matéria não atribuída ao Juízo Central (podendo o Juízo Local desdobrar-se em Juízo Cível, Criminal, de Pequena Criminalidade (este também com competência especificada) ou Juízo de Proximidade.

Por sua vez a Lei nº 62/2013 de 26-08, com as alterações da L. nº 40-A/2016 de 22-12, estatui:

“Artigo 81.º -Desdobramento

1 — Os tribunais de comarca desdobram-se em juízos, a criar por decreto -lei, que podem ser de competência especializada, de competência genérica e de proximidade, nos termos do presente artigo e do artigo 130.º

2  —  Os  juízos  designam-se  pela  competência  e  pelo  nome do município em que estão instalados.

3 — Podem ser criados os seguintes juízos de competência especializada:

a) Central cível;

b) Local cível;

c) Central criminal;

d) Local criminal;

e) Local de pequena criminalidade;

f) Instrução criminal;

g) Família e menores;

h) Trabalho;

i) Comércio;

j) Execução.

4)-…

5)-…

6)-…

“Artigo 118.º - Competência

1 - Compete aos juízos centrais criminais proferir despachos nos termos dos artigos 311.º a 313.º do Código do Processo Penal, aprovado pelo Decreto -Lei n.º 78/87, de 17 de fevereiro, e proceder ao julgamento e aos termos subsequentes nos processos de natureza criminal da competência do tribunal coletivo ou do júri.

2 - …”.

“Artigo 130.º - Competência

1- Os juízos locais cíveis, locais criminais e de competência genérica possuem competência na respetiva área territorial, tal como definida em decreto-lei, quando as causas não sejam atribuídas a outros juízos ou tribunal de competência territorial alargada.

2 - Os juízos locais cíveis, locais criminais e de competência genérica possuem ainda competência para:

            a) -…

            b) -…

            c) -…

            d) -  Julgar os recursos das decisões das autoridades administrativas em processos de contraordenação, salvo os recursos expressamente atribuídos a juízos de competência  especializada  ou  a  tribunal  de  competência  territorial alargada;

            e)-…

            f)-…

            3-…

            4 - Os juízos de pequena criminalidade, possuem competência para:

a) -…

b) - Recursos das decisões das autoridades administrativas em processo de contraordenação a que se refere a alínea d) do n.º 2, quando o valor da coima aplicável seja igual ou inferior a € 15 000,00, independentemente da sanção acessória”.

Donde resulta que o Juízo Local tem competência genérica, mas residual.

            A questão a decidir é simples e desde logo se diz que a competência para tramitar o recurso de impugnação é o Juízo Local do Fundão.

            Se a competência do Juízo Central Criminal é a de “proceder ao julgamento e aos termos subsequentes nos processos de natureza criminal da competência do tribunal coletivo ou do júri”, isto em processos qualificados os factos juridicamente como crime, não faria qualquer sentido atribui-lhe, indiretamente, competência para processar contraordenações.

            Qualquer matéria da área criminal (seja crime ou contraordenação) que não esteja atribuída por lei a juízo (tribunal) de competência especializada (grande criminalidade da competência do Juízo Central, ou pequena criminalidade da competência do Juízo Local de pequena criminalidade nas comarcas onde existir) é da competência do Juízo Local de competência genérica (que também pode desdobrar-se em juízos de competência especializada, normalmente de natureza cível e criminal).

            Mas cada Juízo Local tem a sua área de competência definida por lei – mapa III anexo ao Dl. Nº 49/2014 de 27 de março.

            Sendo que o Juízo Local (Instância Local na anterior terminologia) do Fundão se desdobra em Juízo Cível e Juízo Criminal (Secções na anterior terminologia) com competência nos municípios de Fundão e de Penamacor.

            E na área criminal, toda a matéria que não caiba nas competências do Juízo Central Criminal de Castelo Branco (processos de natureza criminal da competência do tribunal coletivo ou de júri) com competência territorial na área do distrito, compete aos Juízos Locais, Juízo Local Criminal, in casu), tendo o Juízo Local do Fundão competência nos municípios de Fundão e Penamacor.

            Como os factos respeitam, territorialmente falando, à área do município de Penamacor e, não se trata de processo comum coletivo, é competente o (tribunal) Juízo Local Criminal de Fundão, independentemente do valor da contraordenação.

Na sede da comarca de Castelo Branco inexiste Juízo Local de pequena criminalidade (como na generalidade das comarcas), sendo que nos Juízos onde existe tribunal de pequena criminalidade, a área de competência é bem definida.

A título de exemplo, na comarca de Lisboa Oeste, o Juízo Local de Sintra tem Juízo de pequena criminalidade com a competência territorial circunscrita ao município de Sintra e, na comarca de Lisboa Norte o Juízo Local de Loures tem Juízo de pequena criminalidade com a competência territorial circunscrita aos municípios de Loures e Odivelas.

Inexistindo Juízo de pequena criminalidade na comarca (e quando há a sua competência territorial é definida), os processos de contraordenação são tramitados pelo Juízo Local Criminal (ou Juízo Local de competência genérica se não houver especialização) competente (dependendo do município onde os factos são praticados).

Assim, entendemos que competente é o Juízo Local Criminal de Fundão.


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DECISÃO:

Pelo exposto dirime-se o presente conflito negativo:

Julgando-se competente para a tramitação do processo, atento o disposto nos arts. 81, 118 e 130 da LOSJ, o Juízo Local Criminal de Fundão, da Comarca de Castelo Branco.

Sem tributação.

Cumpra-se o disposto no artº 36º nº 3 CPP e, dê-se conhecimento à Ex.mº Juiz Presidente da Comarca de Castelo Branco.

Coimbra, 20 de Setembro de 2017