Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1866/16.8T8FIG.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: JORGE MANUEL LOUREIRO
Descritores: PROCESSO DE TRABALHO
DISPENSA DE AUDIÊNCIA PRELIMINAR
EXTINÇÃO DE DIREITOS E DE CRÉDITOS DO TRABALHADOR
DECLARAÇÃO
RECIBO
Data do Acordão: 02/21/2018
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE COIMBRA – JUÍZO DO TRABALHO DA FIGUEIRA DA FOZ
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTº 62º, Nº 1 DO CPT.
Sumário: I – Em processo do trabalho não tem de existir decisão fundamentada a dispensar a realização da audiência preliminar.

II – Extinguem-se por remissão abdicativa todos os direitos que poderiam emergir para o trabalhador de um contrato de trabalho, da sua cessação e da declaração de ilicitude da forma como essa cessação foi decidida pelo empregador, incluindo o direito à reintegração, no caso de o trabalhador assinar e entregar ao empregador uma ‘declaração/recibo’ emitida pelo empregador em que consta que ‘… o empregador efetuou o pagamento ao declarante do montante de €1.678,00 a título de compensação’, sendo que ‘a compensação referida no artigo antecedente constitui uma compensação pecuniária global que engloba todos os créditos vencidos à data da cessação do contrato de trabalho ou exigíveis em virtude dessa cessação, já recebida pelo declarante’ e que ‘o declarante dá plena quitação do montante referido no nº 3, que esse montante integra todos os créditos vencidos ou exigíveis em virtude da cessação do contrato de trabalho, não tendo o declarante qualquer outro valor a receber ou a reclamar da entidade empregadora’.

Decisão Texto Integral:





Acordam na 6.ª secção social do Tribunal da Relação de Coimbra

I – Relatório


A autora propôs contra a ré a presente acção com a forma de processo comum e emergente de contrato de trabalho, tendo deduzido os pedidos seguidamente transcritos:
A – Da natureza do contrato de trabalho e da ilicitude do despedimento
a) O contrato de trabalho dado aos autos, assinado pela ré e pela autora, tinha a duração de 5 (cinco) meses e 3 (três) dias, cessando no dia 6 de dezembro de 2014;
b) O mesmo contrato continha a cláusula de não renovação e, por isso, caducou tacitamente no dia 6 de dezembro de 2014, sem necessidade de qualquer das partes comunicar à outra parte a sua vontade de o fazer cessar e assim se opor à sua renovação;
c) Atenta esta caducidade, o referido contrato converteu-se em contrato de trabalho sem termo, a contar do dia 7 de dezembro de 2014, inclusive, uma vez que a autora continuou a trabalhar para a ré e inclusivamente e também porque nessa data já havia cessado o facto que fundamentou a sua celebração por a trabalhadora A... ter anteriormente regressado ao trabalho para a ré;
d) Nestas circunstâncias, a ré despediu ilicitamente a autora a contar do dia 6 de dezembro de 2015;

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Quando assim não se entender, o que só por mera cautela jurídica hipoteticamente é admissível, então deve julgar-se e a ré deve ser condenada a reconhecer que:
e) O contrato de trabalho dado aos autos, assinado pela ré e pela autora, tinha a duração de 5 (cinco) meses e 3 (três) dias, cessando no dia 6 de dezembro de 2014;
f) O mesmo contrato continha a cláusula de não renovação e por isso não era necessário que uma das partes comunicasse à outra parte a sua vontade de não o renovar;
g) A contar do dia 7 de dezembro de 2014, a autora continuou a prestar trabalho para a ré até ao dia 6 de dezembro de 2015 inclusive, dia em que cessou o contrato de trabalho por iniciativa da ré por carta que esta enviou àquela, datada de 20 de novembro, mas registada nos Correios no dia 26 do mesmo mês de 2015;
h) O contrato de trabalho iniciou-se em 3 de julho de 2014 e cessou impreterivelmente no dia 6 de dezembro de 2014 e as suas primeira, segunda e terceira renovações aconteceram respetivamente em 7 de dezembro de 2014, 11 de maio e 14 de novembro de 2015, ocorrendo a cessação desta em 18 de março de 2016;
i) A cessação do contrato de trabalho existente entre a autora e a ré operada por esta na carta que remeteu à autora, datada de 20 de novembro de 2015 e registada nos Correios em 26 do mesmo mês, com efeitos a contar do dia 6 de dezembro de 2015, ocorreu antes de aquele terminar, ou seja, 18 de março de 2016;
j) A cessação realizada nestas condições configura um despedimento ilícito por parte da ré;
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B – DOS CRÉDITOS LABORAIS E INDEMNIZAÇÕES/COMPENSAÇÕES A FAVOR DA AUTORA
Condenar a ré a pagar à autora o seguinte:
k) No caso de despedimento ilícito por contrato de trabalho sem termo, na quantia de 10.001,63 €, resultante dos montantes peticionados nos artigos 112.º, 120.º, 121.º, 122.º, 123.º, 124.º e 127.º supramencionados, acrescida das retribuições vincendas a contar da data da propositura da presente ação até ao trânsito em julgado desta, à qual haverá de ser deduzido o valor de 1.678,60 € já entregue, acima indicado, aumentada de juros legais desde a data da citação até efetivo e integral pagamento;
l) A reintegrar a autora no seu posto de trabalho e no mesmo estabelecimento da ré, sem prejuízo de a autora poder requerer tempestivamente a substituição da reintegração por indemnização nos termos legais.
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m) Sem prescindir. Quando assim não se concordar, o que por cuidado jurídico é conjeturável, optando-se pela ilicitude do despedimento por se qualificar o contrato de trabalho a termo certo, na importância de 5.295,81, que resulta dos montantes peticionados nos artigos 152.º, 152.º, 154.º e 155.º acima constantes, acrescida das retribuições vincendas a contar da data da propositura da presente ação até ao trânsito em julgado desta, à qual haverá de ser deduzido o valor de 1.678,60 € já entregue, referido supra, acrescentada de juros legais desde a data da citação até efetivo e integral pagamento.
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n) Sem conceder. Acaso não se entenda desta maneira, o que também por precaução jurídica tem de se admitir, por se julgar estar-se perante um contrato de trabalho a termo certo, não suscetível de enfermar de qualquer invalidade, no valor de 2.243,57 €, ao qual deverá ser deduzido o de 1.678,60 € já recebido, acrescido de juros legais desde a data da citação até efetivo e integral pagamento.”.
Como fundamento da sua pretensão alegou, muito em síntese, que tendo sido trabalhadora subordinada da ré, esta despediu-a ilicitamente, sendo que do contrato de trabalho e da sua cessação emergiram para si os direitos que pretende ver judicialmente reconhecidos, pela ordem de subsidiariedade pela qual os mesmos se encontram deduzidos.
A ré contestou pugnando pela improcedência da acção.
Em resumo, arguiu a extinção, por remissão abdicativa da autora, das obrigações correspondentes aos direitos de que a autora se considera titular, assim como a caducidade desses mesmos direitos.
Respondeu a autora para, muito em síntese e na parte com relevo para esta decisão, pugnar pela improcedência da arguida remissão abdicativa que considera inexistir ou ser violadora da boa fé contratual, tendo em conta as concretas circunstâncias em que a mesma foi emitida e as meras finalidades de quitação de quantias pagas pela ré que lhe estiveram subjacentes, finalidades essas que a ré confessa.
No despacho saneador, o tribunal considerou-se habilitado a conhecer do mérito da acção e, fazendo-o, na procedência da excepção de remissão abdicativa arguida pela ré, julgou a acção totalmente improcedente e absolveu a ré de todos os pedidos.
Não se conformando com o assim decidido, apelou a autora, rematando as suas alegações com as conclusões seguidamente transcritas:
[…]
A ré contra-alegou, pugnando pela improcedência da apelação.
Nesta Relação, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido da anulação da decisão recorrida por violação do princípio do contraditório.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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II - Principais questões a decidir

Sendo pelas conclusões que se delimita o objecto do recurso, integrado também pelas que são de conhecimento oficioso e que ainda não tenham sido decididas com trânsito em julgado, são as seguintes as questões a decidir:

1ª) se o tribunal recorrido incorreu em vício de nulidade por dispensar a realização de audiência preliminar sem fundamentar a decisão de dispensa;
2ª) se o tribunal recorrido violou o princípio do contraditório ao conhecer do mérito da acção, julgando-a totalmente improcedente, sem anunciar previamente às partes o propósito de assim decidir;
3ª) se a decisão recorrida incorreu no vício de nulidade por omissão de pronúncia;
4ª) se o tribunal recorrido incorreu em qualquer vício invalidante da decisão recorrida por não se ter pronunciado sobre o requerimento da apelante com a referência Citius 24928593 e datado de 16/2/2017;
5ª) se se extinguiram, por remissão abdicativa, todos os direitos que a autora pretende fazer valer através desta acção.
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III – Fundamentação

A) De facto

Factos provados

O tribunal recorrido deu como provados os factos seguidamente transcritos:

1º A A. e a R. assinaram o documento junto aos autos, intitulado “Contrato de trabalho a tempo parcial com termo resolutivo certo” e datado de 3 de julho de 2014 (aqui dado por integralmente reproduzido), em que consta que a R. admite a A. ao seu serviço, com a categoria de auxiliar de limpeza, mediante o pagamento da retribuição ilíquida mensal de € 424,38, a que acrescia a quantia de € 6,17 de subsídio de refeição por cada dia de trabalho efetivo, sendo que a A. começou a trabalhar para a R. no dia 3 de julho de 2014.

2º Com data de 20 de novembro de 2016, mas registada nos Correios a 27 do mesmo mês, a R. enviou à A. a carta junta ao processo (igualmente dada por totalmente reproduzida), em que consta que comunica à A. a “caducidade de contrato de trabalho a termo resolutivo certo”, referindo-se que "Serve o presente para comunicar a vossa excelência, ao abrigo da cláusula 59.ª da CCT do setor da construção civil e obras públicas, celebrada entre a AECOPS e o SETACOOP, bem como do art. 344º do CT, que o contrato de trabalho a termo resolutivo certo, celebrado em 3 de julho de 2014 para o exercício da categoria profissional de auxiliar de limpeza, caduca em 6 de dezembro de 2015, não tendo esta empresa intenção de proceder à sua renovação”, “Mais se declara que foi dado cumprimento ao aviso prévio de 15 dias necessário para o efeito” e "Nessa medida, deverá V. Ex.ª considerar que o referido contrato cessa a partir do dia supra referido, cessando, a partir da referida data, qualquer vínculo contratual com esta Empresa”, sendo que “Em virtude da cessação do contrato de trabalho será creditado na conta de vossa excelência com o IBAN PT 50003300004543612191705, o montante de € 363,55 referente a compensação pecuniária global, nos termos da cláusula 60.ª da CCT supra referida, bem como o montante de €1038,32 referente a todos os créditos salariais e subsídios vencidos em virtude da referida cessação”.

3º Em 16 de dezembro de 2015, a A. assinou o documento elaborado pela R. e junto aos autos (igualmente dado por reproduzido na sua totalidade), intitulado “Declaração/Recibo”, em que consta que a R. “efetuou o pagamento ao Declarante do montante de € 1.678,60 a título de compensação”, sendo que “A compensação referida no artigo antecedente constitui uma compensação pecuniária global que engloba todos os créditos vencidos à data da cessação do contrato de trabalho ou exigíveis em virtude dessa cessação, já recebida pelo Declarante” e que “O Declarante dá plena quitação do montante referido no número 3, que esse montante integra todos créditos vencidos ou exigíveis em virtude da cessação do contrato de trabalho, não tendo o Declarante qualquer outro valor a receber ou a reclamar da entidade empregadora.”.

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B) De Direito

Primeira questão: se o tribunal recorrido incorreu em vício de nulidade por dispensar a realização de audiência preliminar sem fundamentar a decisão de dispensa.

O tribunal recorrido proferiu o seguinte despacho: “Dispensa-se, nos termos do Art. 62º, n.º 1 do Código de Processo do Trabalho, sempre na redação em vigor aquando do início destes autos, a realização de audiência preliminar/prévia, por não se ver que a complexidade destes autos justifique e torne necessária a sua realização e também por razões de celeridade e economia processual.”.

Considera a apelante que tal decisão é nula por falta de fundamentação e que, a não se entender assim, é inconstitucional, por violação do princípio do acesso ao direito (art. 20º da CRP), o disposto naquele art. 62º/1, na interpretação de que é suficiente a motivação invocada no transcrito despacho.

Não acompanhamos a apelante.

Nos termos do art. 62º/1 do CPT, “Concluídas as diligências resultantes do preceituado no n.º 1 do artigo anterior, se a elas houver lugar, é convocada uma audiência preliminar quando a complexidade da causa o justifique.”.

Decorre da norma acabada de transcrever que em processo de trabalho a regra é a de que não há lugar à audiência preliminar; só haverá lugar à mesma se e quando a complexidade do processo o justificar.

E compreende-se que assim seja, uma vez que: i) também por regra, a audiência de julgamento é marcada logo na audiência de partes (art. 56º/c do CPT), sendo que a designação de data para a audiência final fica sem efeito se entretanto for designada data para a audiência preliminar (art. 62º/3 do CPT); ii) assim também se dá resposta a um propósito sempre presente na normatização adjectiva processual laboral de agilização do processo com vista à resolução do litígio tão rápida quanto possível.

Assim, nem sequer tem de existir, a nosso ver, uma decisão a dispensar a realização da audiência preliminar, e muito menos uma decisão fundamentada do jaez pretendido pela apelante – neste sentido, também, acórdão da Relação de Évora de 26/1/2010, proferido no processo 834/08.8TTSTB.E1; no sentido de que em processo de trabalho a audiência preliminar só se realizada no caso de acções complexas, acórdãos da Relação do Porto de 14/6/2004, proferido no processo 0410068, e de 13/10/2014, proferido no processo 1621/13.7TTPRT.P1, acórdão da Relação de Évora de 8/11/2011, proferido no processo 272/09.5TTEVR.E1.

Só quando a complexidade da causa o justifique é que o juiz deve convocar a audiência preliminar e, aí sim, terá de fundamentar tal decisão (art. 154º[1] do NCPC e 205º/1[2] do NCPC).

A significar que o tribunal recorrido nem sequer estava obrigado a proferir o despacho sob censura.

Para além disso, é sabido que o vício de nulidade por falta de fundamentação regista-se, apenas, nos casos de falta absoluta de fundamentação.
Com efeito, socorrendo-nos dos ensinamentos expendidos a respeito do vício de nulidade da sentença por falta de fundamentação[3], cabe recordar a lição de Teixeira de Sousa, segundo o qual “Esta causa de nulidade verifica-se quando o tribunal julga procedente ou improcedente um pedido (e, por isso, não comete, nesse âmbito, qualquer omissão de pronúncia), mas não especifica quais os fundamentos de facto ou de direito que foram relevantes para essa decisão. Nesta hipótese, o tribunal viola o dever de motivação ou fundamentação das decisões judiciais (art. 208º, n.º 1, CRP; art. 158º, n.º 1).”.
E acrescenta o mesmo autor: “O dever de fundamentação restringe-se às decisões proferidas sobre um pedido controvertido ou sobre uma dúvida suscitada no processo (...) e apenas a ausência de qualquer fundamentação conduz à nulidade da decisão (...); a fundamentação insuficiente ou deficiente não constitui causa de nulidade da decisão, embora justifique a sua impugnação mediante recurso, se este for admissível.” - Estudos sobre o Processo Civil, pág. 221.
Ou, como refere Lebre de Freitas, “Há nulidade quando falte em absoluto indicação dos fundamentos de facto da decisão ou a indicação dos fundamentos de direito da decisão, não a constituindo a mera deficiência de fundamentação.” - CPC, pág. 297.
No mesmo sentido diz o Conselheiro Rodrigues Bastos, que “A falta de motivação a que alude a alínea b) do n.º 1 é a total omissão dos fundamentos de facto ou dos fundamentos de direito em que assenta a decisão; uma especificação dessa matéria apenas incompleta ou deficiente não afecta o valor legal da sentença.” - Notas ao Código de Processo Civil", III, pág. 194.
E como advertia o Professor Alberto dos Reis “Há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade.
Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto. Se a sentença especificar os fundamentos de direito, mas não especificar os fundamentos de facto, ou vice-versa, verifica-se a nulidade do n.º 2.° do art. 668.°” - Código de Processo Civil Anotado, V, pág. 140.
Deste modo, face à doutrina exposta, conclui-se que a nulidade por falta de fundamentação não se verifica quando apenas tenha havido uma justificação deficiente ou pouco persuasiva, antes se impondo, para a verificação da nulidade, a ausência de motivação que impossibilite o anúncio das razões que conduziram à decisão proferida.
Não é desse jaez o caso em apreço.
Na verdade, mesmo sem necessidade de o ter feito, o tribunal recorrido aduziu as razões pelas quais entendeu dispensar a realização de audiência preliminar: i) não verificação de uma situação de complexidade dos autos que justificasse e tornasse necessária a sua realização; ii) razões de celeridade e economia processual.
O tribunal recorrido justificou, de forma compreensível e suficiente, as razões pelas quais entendeu não realizar a audiência preliminar, sendo que se a propósito do primeiro desses fundamentos se pode registar alguma generalidade, abstracção e subjectividade a reclamar um maior exigência de concretização fáctica, já o mesmo não ocorre em relação ao segundo, pois que, na verdade e como resulta do já exposto a propósito das implicações que a realização da audiência preliminar tem no tocante à data da audiência final, facilmente se percebe que a decisão de dispensa de audiência preliminar é a que melhor serve o propósito de que o processo chegue à fase da audiência de julgamento o mais rapidamente possível, além de que tal decisão evita um conjunto de actos processuais (v.g. desconvocação da audiência de julgamento e correspondentes notificações; ulterior convocação de nova audiência de julgamento e correspondentes notificações; realização da audiência preliminar propriamente dita) e, nessa medida, contribui para a sempre desejada economia processual.

Acresce dizer que não vislumbramos qualquer violação da garantia constitucional do acesso ao direito na interpretação ora sustentada no sentido de que é suficiente, para efeitos do art. 62º/1 do CPT, a motivação invocada no despacho sob censura.

Estamos em crer, aliás, que essa interpretação é aquela que melhor contribui para a concretização dessa garantia constitucional.
Com efeito, a nossa CRP garante a todos o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legí­timos (n.º 1), impondo ainda que esse direito se efective através de um processo equitativo (n.º 4).
Como se escreveu no acórdão do Tribunal Constitucional n.º 243/2013: “O direito de acesso aos tribunais, enquanto fundamento do direito geral à protecção jurídica, traduz-se na possibilidade de deduzir junto de um órgão independente e imparcial com poderes decisórios uma dada pretensão (o pedido de tutela jurisdicional para um direito ou interesse legalmente protegido), pelo que implica uma série de interacções entre quem pede (autor), quem é afectado pelo pedido (réu) e quem decide (juiz), a que corresponde o processo. E a disciplina deste último – o processo em sentido normativo – encontra-se submetida à exigência do processo equitativo: o procedimento de conformação normativa deve ser justo e a própria conformação deve resultar num “processo materialmente informado pelos princípios materiais da justiça nos vários momentos processuais” (cfr. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, Vol. I, 4.ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, 2007, anot. XVI ao artigo 20.º, p. 415). Se tal exigência não afasta a liberdade de conformação do legislador na concreta estruturação do processo, a mesma “impõe, antes de mais, que as normas processuais proporcionem aos interessados meios efectivos de defesa dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos e paridade entre as partes na dialéctica que elas protagonizam no processo (Ac. n.º 632/99). Um processo equitativo postula, por isso, a efectividade do direito de defesa no processo, bem como dos princípios do contraditório e da igualdade de armas” (cfr. Rui Medeiros in Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Tomo I, 2.ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, 2010, anot. XVIII ao artigo 20.º, p. 441). […]”.
Por outro lado, o mesmo Tribunal deixou escrito a este mesmo respeito, no seu acórdão n.º 778/2014, o seguinte: “O artigo 20.º da Constituição, sob a epígrafe «Acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva», garante a todos o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legí­timos (n.º 1), impondo ainda que esse direito se efective através de um processo equitativo (n.º 4).
A jurisprudência do Tribunal Constitucional tem entendido que o direito de acesso aos tribunais implica a ga­rantia de uma protecção jurisdicional eficaz ou de uma tutela judicial efectiva, cujo âmbito normativo abrange, nomeadamente: (a) o direito de acção, no sen­tido do direito subjectivo de levar determinada pretensão ao conhecimento de um órgão jurisdicional; (b) o direito ao pro­cesso, traduzido na abertura de um processo após a apresentação daquela pretensão, com o consequente dever de o órgão jurisdicional sobre ela se pronunciar mediante decisão funda­mentada; (c) o direito a uma decisão judicial sem dilações indevidas, no sentido de a deci­são haver de ser proferida dentro dos prazos preestabelecidos, ou, no caso de estes não estarem fixados na lei, dentro de um lapso temporal proporcional e adequado à complexidade da causa; (d) o direito a um processo justo baseado nos princípios da prioridade e da sumarie­dade, no caso daqueles direitos cujo exercício pode ser aniquilado pela falta de medidas de defesa expeditas (veja-se, neste sentido, entre outros, o Acórdão n.º 440/94).
Acresce ainda que o direito de ação ou direito de agir em juízo terá de efectivar-se através de um processo equitativo, o qual deve ser entendido não só como um processo justo na sua conformação legislativa, mas também como um processo materialmente informado pelos princípios materiais da justiça nos vários momentos processuais.
A jurisprudência e a doutrina têm procurado densificar o conceito de processo equitativo essencialmente através dos seguintes princípios: (1) direito à igualdade de armas ou igualdade de posição no processo, sendo proibidas todas as diferenças de tratamento arbitrárias; (2) proibição da indefesa e direito ao contraditório, traduzido fundamentalmente na possibilidade de cada uma das partes invocar as razões de facto e direito, oferecer provas, controlar a admissibilidade e a produção das provas da outra parte e pronunciar-se sobre o valor e resultado de umas e outras; (3) direito a prazos razoáveis de acção e de recurso, sendo proibidos os prazos de caducidade demasiados exíguos; (4) direito à fundamentação das decisões; (5) direito à decisão em prazo razoável; (6) direito de conhecimento dos dados do processo (dossier); (7) direito à prova; (8) direito a um processo orientado para a justiça material (Cfr. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Ano­tada, 4.ª Edição Revista, Coimbra Editora, 2007, Volume I, págs. 415 e 416).
Importa ainda salientar que a exigência de um processo equitativo, consagrada no artigo 20.º, n.º 4, da Constituição, não afasta a liberdade de conformação do legislador na concreta modelação do processo. No entanto, no seu núcleo essencial, tal exigência impõe que os regimes adjectivos proporcionem aos interessados meios efectivos de defesa dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos, bem como uma efectiva igualdade de armas entre as partes no processo, não estando o legislador autorizado a criar obstáculos que dificultem ou prejudiquem, arbitrariamente ou de forma desproporcionada, o direito de acesso aos tribunais e a uma tutela jurisdicional efectiva.» (v., também, por exemplo, os Acórdãos n.ºs 235/2011, 350/2012, 839/2013, 204/2015 ou 569/2015).” – sobre esta temática do direito de acesso aos tribunais e a um processo justo e equitativo, nas diferentes valências em que os mesmos devem concretizar-se, pode consultar-se o acórdão do Tribunal Constitucional nº 462/2016.
Visto quanto vem de aduzir-se, não se vislumbra que viole a garantia constitucional que está em apreço, a interpretação do art. 62º/1 do CPT no sentido de que está suficiente fundamentada a decisão, aliás desnecessária, de dispensar a realização de audiência preliminar com o propósito de se conseguir maior celeridade e economia processual e com o fundamento adicional de não se registar uma situação de complexidade que justificasse a realização dessa audiência.
Improcede, pois, a arguição de nulidade que está em apreço.

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Segunda questão: se o tribunal recorrido violou o princípio do contraditório ao conhecer do mérito da acção, julgando-a totalmente improcedente, sem anunciar previamente às partes o propósito de assim decidir.

Comece por dizer-se que o tribunal recorrido conheceu do mérito da acção e julgou-a totalmente improcedente com o fundamento fáctico-jurídico único de que operou remissão abdicativa em relação a todos os direitos que a autora pretendia fazer valer e correspondentes obrigações da ré.
Nos termos do art. 3º/3 do NCPC, aplicável por força do art. 1º/1/2/c do CPT “O juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem.”.
Concretiza-se através desta norma e no âmbito do processo civil o princípio constitucional da proibição da indefesa, associada à regra do contraditório[4] [5], a significar que o juiz não deve proferir nenhuma decisão, ainda que interlocutória, sobre qualquer questão, processual ou substantiva, de facto ou de direito, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que, previamente, tenha sido conferida às partes, especialmente àquela contra quem é ela dirigida, a efectiva possibilidade de a discutir, contestar e valorar[6].
Através da concretização acabada de referir procura-se salvaguardar as partes processuais contra as decisões-surpresa e conferir-lhes efectiva possibilidade de influir activamente no desenvolvimento e no êxito do processo[7].
A inobservância de tal princípio gera, por regra, uma nulidade secundária sujeita ao regime do art. 195º NCPC.
Ora, no que concretamente se reporta à remissão abdicativa que constitui o fundamento único com base no qual a sentença recorrida decretou a improcedência integral da acção e por referência ao qual importava garantir o contraditório, temos que: i) essa excepção peremptória foi arguida, do ponto de vista fáctico e jurídico, nos arts. 1º) a 13º da contestação; ii) a autora foi notificada da contestação da ré, teve oportunidade de responder a tal excepção peremptória e aos factos aduzidos para a fundamentar, tendo-lhe respondido efectivamente, como resulta da leitura dos arts. 18º a 50º da resposta.
Aliás, já na sua petição inicial a autora se tinha pronunciado antecipadamente, pugnando pela sua inverificação, sobre a remissão abdicativa que porventura viesse a sustentar-se com fundamento na declaração escrita que está invocada no ponto 3º) dos factos provados (v.g. arts. 32º a 56º da petição).
Em face de quanto vem de expor-se, foi absolutamente garantido à autora e esta exerceu-o efectivamente, o contraditório em relação aos fundamentos de facto e de direito aduzidos pelo tribunal recorrido para decretar a improcedência da acção.
Num segundo plano, a apelante ancora a sua arguição de violação do princípio do contraditório na seguinte argumentação: “Daqui se infere, irrefutavelmente, que a autora não peticionou apenas créditos laborais mas também a conversão do contrato de trabalho a termo certo em contrato de trabalho sem termo e a ilicitude do despedimento.
Como se constata, a sentença apenas se debruçou sobre os créditos laborais com base na cessação do contrato de trabalho operada por iniciativa da ré, quando esta alegou tratar-se de um contrato de trabalho a termo certo, não se tendo o Tribunal pronunciado sobre o demais peticionado, sem atender aos factos alegados suscetíveis de uma vez discutidos, apreciados e julgados poderem conduzir a uma decisão diversa da proferida, o que constitui uma decisão surpresa para a autora, pois o seu pedido é mais abrangente.
Ora também neste aspeto o Tribunal recorrido olvidou a aplicação do princípio do contraditório, violando-o nos termos já expostos e com as consequências também referidas que aqui não se repetem por uma questão de economia e celeridade processuais, logo, com a nulidade de todos os atos praticados subsequentemente à nulidade decorrente da violação do mesmo princípio, o que acarreta a nulidade da sentença nos termos também já aludidos supra.”.
Assim, se bem percebemos, o tribunal recorrido teria violado o princípio do contraditório por ter decidido do mérito da acção incorrendo em omissão de pronúncia em relação a determinadas questões/pedidos que a apelante tinha suscitado.
Não acompanhamos a apelante.
Em primeiro lugar porque, bem ou mal – não importa agora[8] – o tribunal recorrido considerou que a remissão abdicativa importava a extinção de todas as obrigações correspondentes aos direitos invocados pela autora e, por isso, julgou a acção totalmente improcedente.
Em segundo lugar porque a violação, arguida pela apelante, do dever do juiz resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação (art. 608º/1 do NCPC) não gera nulidade secundária por violação do princípio do contraditório, mas sim nulidade da decisão por omissão de pronúncia (arts. 613º/3 e 615º/1/d do NCPC)
Por isso, não se verifica o outro fundamento aduzido pela apelante para sustentar a violação do princípio do contraditório, qual seja o de ter sido proferida, para surpresa da apelante, uma decisão sobre o mérito da causa em que se omitiu o conhecimento de determinadas questões/pedidos aduzidos pela apelante.
Em face de tudo o exposto, não se verifica a causa de nulidade arguida pela apelante e decorrente de uma alegada – mas não verificada – violação do princípio do contraditório.
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Terceira questão: se a decisão recorrida incorreu no vício de nulidade por omissão de pronúncia.

Considera a apelante que se regista o vício em apreço uma vez que o tribunal recorrido não se pronunciou sobre determinadas questões/pedidos que foram aduzidos pela recorrente.
É o seguinte teor a alegação da recorrente: “Acontece que a ação tem como pedido, com factos alegados, a apreciação e decisão sobre a natureza do contrato de trabalho e a ilicitude do despedimento, e a condenação da ré, em suma, a reconhecer que o contrato de trabalho dado aos autos tinha a duração de 5 meses e 3 dias, cessando no dia 6 de dezembro de 2014; o mesmo contrato continha a cláusula de não renovação e por isso não era necessário que uma das partes comunicasse à outra parte a sua vontade de não o renovar; a contar do dia 7 de dezembro de 2014 a autora continuou a prestar trabalho para a ré até ao dia 6 de dezembro de 2015 inclusive, dia em que cessou o contrato de trabalho por iniciativa da ré por carta que esta enviou àquela, datada de 20 de novembro, mas registada nos Correios no dia 27 do mesmo mês de 2015; o contrato de trabalho iniciou-se em 3 de julho de 2014 e cessou impreterivelmente no dia 6 de dezembro de 2014 e as suas primeira segunda e terceira renovações aconteceram respetivamente em 7 de dezembro de 2014, 11 de maio e 14 de novembro de 2015, ocorrendo a cessação deste em 18 de março de 2016; a cessação do contrato de trabalho, por iniciativa da ré, com efeitos a contar do dia 6 de dezembro de 2015, ocorreu antes de aquele terminar, ou seja antes de18 de março de 2016 e a cessação assim realizada configura um despedimento ilícito por parte da ré; o referido contrato converteu-se em contrato de trabalho sem termo, a contar do dia 7 de dezembro de 2014, inclusive, uma vez que a autora continuou a trabalhar para a ré e inclusivamente e também porque nessa data já havia cessado o facto que fundamentou a sua celebração por a trabalhadora A... ter anteriormente regressado ao trabalho para a ré.
O pedido visa também a apreciação e decisão acerca dos créditos laborais e indemnizações/compensações a favor da autora e a condenação da ré a pagar-lhe, no caso de despedimento ilícito por contrato de trabalho sem termo, as quantias peticionados a esse título, no valor de 10.001,63 €, acrescido das retribuições vincendas até ao trânsito em julgado da ação, deduzido do valor de 1.678,60 € já recebido, aumentado de juros legais desde a data da citação até efetivo e integral pagamento, a reintegrar a autora no seu posto de trabalho e no mesmo estabelecimento, sem prejuízo de poder requerer tempestivamente a substituição da reintegração nos termos legais.
Pediu que quando assim não se concordasse, por se qualificar o contrato de trabalho a termo certo, a condenação da ré no pagamento da importância de 5.295,81 €, resultante dos montantes peticionados nos artigos 152.º, 153.º, 154.º e 155.º da petição inicial, acrescida das retribuições vincendas até ao trânsito em julgado da ação, deduzida da referida quantia de 1.678,60 €, acrescida de juros legais desde a citação até efetivo e integral pagamento.
Sem conceder, peticionou ainda que a julgar-se estar-se perante um contrato de trabalho a termo certo, não suscetível de enfermar de qualquer invalidade, a condenação da ré no valor de 2.243,57 €, deduzido do referido de 1.678,60€, acrescido de juros legais desde a data da citação até efetivo e integral pagamento.
Daqui se infere, irrefutavelmente, que a autora não peticionou apenas créditos laborais mas também a conversão do contrato de trabalho a termo certo em contrato de trabalho sem termo e a ilicitude do despedimento.
Como se constata, a sentença apenas se debruçou sobre os créditos laborais com base na cessação do contrato de trabalho operada por iniciativa da ré, quando esta alegou tratar-se de um contrato de trabalho a termo certo, não se tendo o Tribunal pronunciado sobre o demais peticionado, sem atender aos factos alegados suscetíveis de uma vez discutidos, apreciados e julgados poderem conduzir a uma decisão diversa da proferida, o que constitui uma decisão surpresa para a autora, pois o seu pedido é mais abrangente.
(…)
Como se disse antes, o Tribunal recorrido não se pronunciou sobre a conversão do contrato de trabalho a termo certo em contrato de trabalho sem termo e da ilicitude do despedimento e assim das correspondentes consequências jurídicas, bem como das demais questões submetidas à sua apreciação.
Por questão de economia e celeridade processuais, consideram-se aqui reproduzidas todas as considerações já expendidas antes sobre esta não pronúncia para efeitos de violação do princípio do contraditório.
Nos termos do artigo 608.º n.º 2 do Código de Processo Civil ex vi artigo 1.º do Código de Processo do Trabalho, sobre o juiz impende o dever de na sentença resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.
No caso em apreço, a decisão proferida apenas se debruçou sobre a questão  da remissão abdicativa e deixou de partes as outras questões, distintas desta e, não aparta a decisão acerca das questões colocadas pela autora na sua petição inicial, atrás referidas, que são essenciais e integram o objeto do litígio.”.
Não acompanhamos a recorrente.
Na verdade, como já anteriormente referido, bem ou mal – não importa agora[9] – o tribunal recorrido considerou que a remissão abdicativa importava a extinção de todas as obrigações correspondentes aos direitos invocados pela autora e, por isso, julgou a acção totalmente improcedente.
É particularmente elucidativo o seguinte segmento da decisão recorrida: “…ter-se-á de considerar que qualquer outra dívida que pudesse ainda existir por parte da R. à A. foi objeto de remissão abdicativa pela A. ao assinar o documento aludido, não podendo a A. vir agora exigir à R. o pagamento de qualquer quantia para lá da paga na sequência da assinatura desse documento, já se tendo extinguido, por força desse contrato de remissão, qualquer obrigação adicional que ainda incumbisse à R. em virtude do contrato de trabalho celebrado com a A., improcedendo, por este motivo e in totum, a presente ação.”.
Improcede, pois, a nulidade por omissão de pronúncia arguida pela apelante.
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Quarta questão: se o tribunal recorrido incorreu em qualquer vício invalidante da decisão recorrida por não se ter pronunciado sobre o requerimento da apelante com a referência Citius 24928593 e datado de 16/2/2017
Notificada da resposta da autora, a ré apresentou nos autos, com a referência Citius 24793428 e datado de 3/2/2017, um requerimento do seguinte teor:
1) A A., através do seu Douto Requerimento a fls. Pretende apresentar resposta às excepções invocadas pela R. na sua Contestação.
2) Contudo, tal resposta é meramente genérica e com cáracter não conformador com a tomada de posição definitiva necessária para produzir uma resposta às excepções.
3) Se não vejamos, o art. 60º, n.º 4 do CPT estabelece que a A., na sua resposta deve tomar posição definitiva quanto ao teor concreto de cada uma das excepções invocadas,
4) Isto é, deve a A., de forma específica e concreta, responder aos elementos de facto e de direito invocados em cada excepção, apresentado elementos que afastem o efeito da mesma,
5) Efectivamente, se tal não for feito pela A., verifica-se que as excepções invocadas se consideram confirmadas ou admitidas por acordo, nos termos do art. 574º, n.º 2 do CPC (antigo 490º do CPC).
6) Assim, não basta a A., na sua Douta resposta, referir que as excepções são matéria de direito ou que deverá ser decidido em conformidade com o direito aplicado aos factos, tanto mais que, qualquer excepção traduz-se em matéria de direito,
7) Deste modo, quanto à matéria referente às excepções de caducidade do direito à acção e de créditos peticionados, verifica-se que o teor da Douta Resposta não apresenta qualquer posição definitiva da A. quanto a tais execepções, mas sim uma tentativa de fugir à pronúncia sobre tais matérias,
8) Pelo que, quanto às mesmas, deverá ser aplicado o disposto no art. 60º, n.º 4 do CPT, considerando-se ocorrer uma aceitação das mesmas por parte da A.
9) Por outro lado, quanto à excepção da remissão abdicativa, importa esclarecer que apenas o efeito extintivo de obrigações decorrentes da declaração traduz a matéria de excepção,
10) O mesmo não se podendo dizer quanto aos factos introdutórios à mesma.
11) Assim, o constante nos arts. 1º a 17º da Douta Resposta à Contestação, não tratam de matéria excepcionada, pelo que deverão ser considerados como não escritos.
12) Sendo que, a matéria verdadeiramente de facto e de direito respeitante a tal excepção invocada na Douta Resposta, também é esta apresentada de forma vaga e mesmo contraditória ao que foi invocado quer na Douta PI, quer em vários arts. da Douta Resposta à Contestação, 13) Pois, salvo melhor opinião, é a própria A. que refere que o modelo 5044-DGSS lhe foi remetido com a carta enviada para efeitos de caducidade do contrato (Cfr art. 31 da Douta PI),
14) Nunca constando de tal Douta PI qualquer elemento ou invocação de factos de uma suposta coação física ou moral que tivesse levado à A. a assinar o documento em causa,
15) Resulta mesmo do teor da Douta Resposta que a A. apenas invoca em concreto que desconhecia que não poderia num momento posterior exigir mais dinheiro à R. do que aquele que lhe era devidamente devido.
16) Sendo que, a “ignoratia iuris nemini prodest; nemo consetur ignorare legem; error iuris non excusat” (Manuel de Andrade, Teoria Geral da Relação Jurídica, Vol. II, pág. 243),
17) Isto é, o desconhecimento da lei não justifica a sua não aplicação por parte da A.,
18) Na verdade, a A. sabia, no momento em que assinou tal documento, que este implicava não poder peticionar à R. outros valores, tanto mais que, tal resulta expressamente do art. 48º da Douta Reposta à Contestação, 19) Pode-se mesmo considerar que a A. apenas não pensou quais os expedientes que poderia deitar mão para ainda reclamar valores a que não tinha direito.
20) Pelo que, quer por não ser apresentado qualquer facto que afaste a remissão abdicativa, quer por falta de factos concretos que afastem a validade do documento que a titula, também esta excepção deve ser reconhecida,
21) Tanto mais que, se há alguém que tem ultrapassado os limites da boa-fé é somente a A., que invoca factos ao sabor da corrente ou dos momentos, consoante os mesmos lhe são favoráveis,
22) Bem sabendo que não foi coagida ou impedida por parte da R. de aceder ao subsídio de desemprego a que tinha direito.
23) Assim, devem ser decretadas as excepções invocadas na Contestação, considerando os factos supra expostos.”.
Notificada desse requerimento, com a referência Citius 24928593 e datado de 16/2/2017, a autora apresentou um outro requerimento, no qual se conclui da forma seguidamente transcrita:
Nestas circunstâncias, salva a devida vénia a douta opinião diversa, o requerimento apresentado é legalmente inadmissível. A não ser assim, estaria a permitir-se que as partes passassem o tempo a responderem às respostas uma da outra, o que jamais é consentido processualmente, pois tal conduta violaria os princípios da economia e da celeridade processuais e até as disposições adjetivas concernentes à apresentação do número de articulados. Pelo que deve ser desentranhado e devolvido ao seu apresentante e a ré condenada pelo incidente processual que causou.
Sem prescindir, mas, quando assim não se entender, o que só por mera cautela jurídica e hipotética admissibilidade de raciocínio diferente se admite, por se considerar a paupérrima invocação da litigância de má-fé pela ré, então o requerimento deve ficar no processo, mas, em tudo o que nele é dito a mais concernentemente a esta deve ser reputado de não escrito, sem descurar a condenação pelo incidente processual em causa.
Nestes termos e nos mais e melhores de direito aplicável, sempre com o mui douto suprimento de V. Ex.a, decidindo como se propugna será feita a costumada justiça.
Tanto quanto resulta dos autos, o tribunal recorrido não se pronunciou sobre este último requerimento.
Ainda assim, não se vislumbra que o tribunal recorrido tenha incorrido em qualquer vício invalidante da decisão recorrida.
Com efeito, tal como a apelante reconhece nas suas alegações, mesmo que o requerimento da ré ora em questão devesse qualificar-se como inadmissível processualmente, o mesmo deveria ser considerado como meramente irregular, pois que a lei não o declara como nulo, nem o mesmo influiu no exame ou na decisão da causa, tanto mais que a decisão recorrida em nada se estribou, do ponto de vista fáctico ou jurídico, no alegado pela ré nesse requerimento para decidir nos termos em que o fez.
Assim sendo, toda a actividade que o tribunal recorrido tivesse desenvolvido sobre o requerimento da autora ora em apreço e que viesse a redundar numa declaração de mera irregularidade do requerimento da ré também ora em apreço, sem quaisquer consequências práticas ao nível da decisão final tomada[10], traduziria a prática de actos processualmente inúteis e, por isso, proibidos por lei (art. 130º do NCPC).
Como assim, ao omitir essa actividade processualmente inútil, o tribunal recorrido limitou-se a cumprir o determinado no art. 130º do NCPC, não tendo incorrido em qualquer vício invalidante da decisão recorrida.
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Quinta questão: se se extinguiram, por remissão abdicativa, todos os direitos que a autora pretende fazer valer através desta acção.


A autora pretende através desta acção, em via principal, exercer e ver reconhecidos os seguintes direitos: i) a ver convertido em contrato de trabalho sem termo o contrato de trabalho a termo que foi reduzido ao escrito que constitui o documento nº 1 junto com a petição inicial (alíneas A a C do pedido); ii) a ver declarado que a ré despediu ilicitamente a autora através da carta datada de 20 de Novembro de 2015 e registada nos correios em 26 do mesmo mês, com efeitos a contar do dia 6 de Dezembro de 2015 (alínea D do pedido); iii) a ver declarado que a ré deve pagar-lhe a quantia de 10.001,63 euros referente a indemnização por danos não patrimoniais, diferenças salariais, férias, subsídios de férias e de Natal e correspondentes proporcionais, retribuições intercalares já vencidas, bem assim como as retribuições intercalares vincendas, tudo deduzido do valor de 1.678,60 euros já pagos, e acrescido de juros de mora legais (alínea K do pedido); iv) a ver declarada a sua reintegração no seu posto de trabalho, sem prejuízo de poder requerer tempestivamente a substituição da reintegração por indemnização nos termos legais (alínea L do pedido).
Em via subsidiária, pretende a autora exercer e ver reconhecidos os seguintes direitos: i) a ver declarado que cessava em 18 de Março de 2016 o contrato de trabalho a termo que foi reduzido ao escrito que constitui o documento nº 1 junto com a petição inicial (alíneas E a H do pedido); ii) a ver declarado que a ré despediu ilicitamente a autora através da carta datada de 20 de Novembro de 2015 e registada nos correios em 26 do mesmo mês, com efeitos a contar do dia 6 de Dezembro de 2015 (alíneas I e J do pedido); iii) a ver declarado que a ré deve pagar-lhe a quantia de 5.295,81 euros, referente a indemnização por danos não patrimoniais, diferenças salariais, férias, subsídios de férias e de Natal e correspondentes proporcionais, indemnização pela cessação do contrato antes do seu termo final, compensação pela caducidade do contrato de trabalho a termo, bem assim como as retribuições intercalares vincendas, tudo deduzido do valor de 1.678,60 euros já entregue e acrescido de juros legais (alínea M do pedido).
Em segunda via subsidiária, pretende a autora exercer e ver reconhecido o seguinte direito: i) a ver declarado que tem um crédito sobre a ré, emergente do contrato de trabalho e da sua cessação no valor de 2.243,57 euros, deduzido do valor de 1.678,60 euros já recebidos e acrescido de juros legais (alínea N do pedido).
Identificados os direitos que a autora pretende ver reconhecidos e declarados, importa referir que todos eles são passíveis de extinção por remissão abdicativa.
A conclusão enunciada no antecedente parágrafo é absolutamente incontroversa em relação a créditos estritamente pecuniários do tipo dos enunciados nos pedidos constantes das citadas alíneas K), M) e N), sendo aqui despiciendo desenvolver qualquer esforço adicional de fundamentação (consulte-se, apenas a título de exemplo, os acórdãos do STJ de 25/11/2009, proferido no processo 274/07.6TTBRR.S1, de 31/10/2007, proferido no processo 07S1442, de 25/5/2005, proferido no processo 05S480, o acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 14/4/2016, proferido no processo 569/13.0TTSTR-A.E1, o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 11/1/2007, proferido no processo 355/05.OTTLRA.C1).
A possibilidade de extinção por remissão abdicativa dos direitos subjacentes à pretensão de ver convertido um contrato de trabalho a termo em contrato de trabalho sem termo, com a consequente declaração da ilicitude do despedimento por via da comunicação de caducidade do contrato de trabalho a termo e das consequências a tanto associadas em termos indemnizatórios e de retribuições intercalares, foi afirmada pelo acórdão deste Tribunal da Relação de 20/3/2014, proferido no processo 894/12.7TTCBR.C1, do qual foi relator o aqui segundo adjunto - aplica-se tal entendimento, de forma directa, aos pedidos formulados pela autora sob as alíneas A) a D), e por identidade de razão aos pedidos constantes das alíneas E) a J).
A possibilidade de extinção por remissão abdicativa do direito à reintegração no posto de trabalho decorrente da declaração de ilicitude de um despedimento (cfr. pedido constante da alínea L) foi afirmada, por exemplo, no acórdão do STJ de 5/4/2006, proferido no processo 05S4233, no acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 2/3/2017, proferido no processo 2455/15.0T8VFR.P1, no acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 5/11/2015, proferido no processo 63/14.1T8STB.E1.
Considerando que são passíveis de extinção por remissão abdicativa, sem excepção, todos os direitos emergentes de um contrato de trabalho e da sua cessação, podem consultar-se os acórdãos do STJ de 31/1/2012, proferido no processo 4967/04.1TTLSB.L1.S1, de 10/2/2009, proferido no processo 884/07.1TTSTB.S1.
Tudo para concluir, em face do exposto, que são passíveis de extinção por remissão abdicativa todos os direitos que a autora pretende exercer através da presente acção e correspondentes obrigações da ré.

Importa agora determinar se da emissão e assinatura da “Declaração/Recibo” referida no ponto 3º) dos factos descritos como provados resultou ou não tal renúncia abdicativa em relação a todos os referenciados direitos.

Cumpre ter em atenção, antes de mais, que a relação de trabalho entre a autora e a ré cessou por decisão unilateral da segunda e com efeitos reportados a 6/12/2015 – ponto 2º) dos factos descritos como provados.

Por outro lado, em 16/12/2015, já depois da cessação do contrato, a autora assinou um documento elaborado pela ré, intitulado “Declaração/Recibo”, em que consta que a ré “efetuou o pagamento ao Declarante do montante de € 1.678,60 a título de compensação”, que “A compensação referida no artigo antecedente constitui uma compensação pecuniária global que engloba todos os créditos vencidos à data da cessação do contrato de trabalho ou exigíveis em virtude dessa cessação, já recebida pelo Declarante” e que “O Declarante dá plena quitação do montante referido no número 3, que esse montante integra todos créditos vencidos ou exigíveis em virtude da cessação do contrato de trabalho, não tendo o Declarante qualquer outro valor a receber ou a reclamar da entidade empregadora”.
Comece por dizer-se que não acompanhamos a apelante quando sustenta que a própria ré confessou no artigo 6.º da sua contestação que a autora assinou tal "Declaração/Recibo" apenas para efeitos de quitação dos valores entretanto pagos pela ré, dela não podendo extrair-se qualquer manifestação abdicativa em relação a outros direitos que assistissem à autora por via do contrato de trabalho e da sua cessação.
É que a ré não se limitou a alegar que a "Declaração/Recibo" foi emitida para “… efeito de quitação de todos os valores pagos pela R. até à cessação do contrato de trabalho.” (art, 6º da contestação).
Também alegou, para lá disso, que: i) tal “…declaração/recibo foi assinada pela A. de forma livre e esclarecida, tanto mais que não invoca qualquer vício de vontade na assinatura da mesma, por confissão judicial que se aceita e se torna irretractável.” (art. 7º); ii) da mesma declaração consta, designadamente, a “Aceitação do pagamento por parte da A. do montante de €1.678,60 a título de compensação pecuniária global”, a “Aceitação por parte da A. que tal valor inclui todos os créditos vencidos à data da cessação do contrato ou exigíveis em virtude dessa cessação”, a “Aceitação por parte da A. que o montante que lhe foi entregue implica que a R. nada mais lhe deve a título de créditos laborais, e que não poderá exigir quaisquer outros valores a essa R.” (art. 8º da contestação); iii) a declaração foi assinada após ocorrer a cessação do contrato de trabalho (art. 9º); iv) “…a declaração assinada pela A. traduz-se numa situação de remissão abdicativa…” (art. 10º).
Como assim, não é exacto o alegado pela apelante no sentido de que a ré tenha confessado que a autora assinou a "Declaração/Recibo" em causa com exclusivos propósitos de dar quitação dos valores entretanto pagos pela ré.
Por outro lado, em caso com contornos semelhantes ao destes autos, escreveu-se no acórdão deste Tribunal da Relação de 20/3/2014, proferido no processo 894/12.7TTCBR.C1[11], do qual foi relator o aqui segundo adjunto, o seguinte: “A remissão constitui uma causa de extinção das obrigações a par das inseridas no capítulo VIII do título I do livro II do Código Civil, sendo configurada no artº 863º do Cod. Civil, “como a renúncia do credor ao direito de exigir a prestação, feita com a aquiescência da contraparte, necessitando de revestir a forma de contrato (embora a aceitação da proposta contratual do remitente se possa considera especialmente facilitada pelo disposto no artº 234º do Cod. Civil), quer se trate de remissão donativa quer remissão puramente abdicativa” - Antunes Varela, Das Obrigações Em Geral,  II Vol., 7ª ed., pgs. 247 e ss.
            A remissão é, assim, um contrato, não bastando uma simples renúncia unilateral, pois necessita do consentimento do devedor, ainda que este não tenha de se manifestar de forma expressa, estando sujeito às regras gerais sobre declarações judiciais – artºs 217º e 218º do Cod. Civil.
            A jurisprudência tem-se pronunciado no sentido da admissibilidade da remissão abdicativa por parte dos trabalhadores, quando não exista subordinação jurídica por parte do credor ao devedor - a remissão abdicativa celebrada após a ruptura do vínculo laboral e, portanto, no âmbito de direitos inteiramente disponíveis, importa a extinção da relação creditória, obstando à procedência da pretensão de tutela jurídica pelo trabalhador - cfr. os Acórdãos do STJ de 6 de Julho de 1994, in BMJ 439º, 379, de 12/5/99, in Col. Jur.- Ac. STJ, Ano 1999, II, 281, de 24/11/2004, in www.dgsi.pt, processo 04S2846, e de 25/5/2005, in www.dgsi.pt, processo 05S480, da Rel. de Lisboa de 28/9/2005, in www.dgsi.pt, processo 1693/2004-04, da Rel. de Coimbra de 2/3/2006, in www.dgsi.pt, processo 3900/05, da Rel. do Porto de 8/5/2006, in www.dgsi.pt, processo 0542317, e da Rel. de Coimbra de 11/1/2007, in www.dgsi.pt, processo 355/05.0TTLRA.C1
            Subjacente a este entendimento está a ideia de que o trabalhador em situação de subordinação jurídica se pode inibir de tomar decisões livres por temer represálias na sua situação profissional, circunstância que aliás torna indisponíveis uma série de direitos dos trabalhadores, designadamente o direito à retribuição devida.
            No caso em apreço,  tendo o Autor assinado uma declaração - factos 51 a 53, supra acrescentados -  onde se afirma ressarcido de “todos os créditos vencidos à data da cessação, bem como aqueles que são exigíveis em virtude da mesma, nada mais tendo a receber ou a exigir” da Ré “seja a que titulo for” deve concluir-se, a nosso ver, que se trata de uma renúncia a reclamar direitos, com efeitos situados no domínio do contrato de remissão.
            O Autor considerou-se, assim, pago de todos os créditos emergentes do contrato de trabalho e da sua cessação, pelo que esta declaração integra uma renúncia aos eventuais créditos que eventualmente pudessem resultar do contrato de trabalho e da sua cessação.
            E uma vez que a anuência da Ré resulta da natureza da própria declaração e da também da circunstância de juntar essa declaração abdicativa aos presentes autos com a contestação, temos que a mesma  foi aceite pela Ré, constituindo tal encontro de vontades um verdadeiro contrato de remissão abdicativa - cfr.  Ac. da Rel. do Porto de 22/05/2000, CJ, 2000, T. III, pag. 246, Ac. da Rel. de Coimbra de 2/3/2006, in www.dgsi.pt, processo 3900/05, Ac. da Rel. do Porto de 8-5-2006, in www.dgsi.pt, processo 0542317, e, mais recentemente, o Ac. desta Relação de 10/7/2013 (relator Azevedo Mendes), in www.dgsi.pt, proc. 335/11.7TTCVL.C1.
            Como acima se referiu, cessada a relação laboral já nada justifica que o trabalhador não possa dispor livremente dos seus eventuais créditos resultantes do contrato de trabalho, da sua violação ou cessação, uma vez que já não se verificam os constrangimentos existentes durante a vigência dessa relação.
            E, como se refere no Ac. desta Relação proferido no âmbito do processo 493/11.0TTLRA.C1 (relator Azevedo Mendes), mesmo a circunstância de se tratar de uma declaração genérica, não descriminando os diversos créditos salariais, não invalida, por si só, essa conclusão. Sob pena de, como refere o Acórdão desta Relação de 19/01/2005 in www.dgsi.pt, processo 3598/04, se entrar “em colisão com as normas que regem quer a figura da remissão, quer as próprias normas que regulam a forma de interpretar as declarações negociais, quer ainda o princípio da possibilidade de renúncia a direitos de natureza disponível”.
            Deste modo, concluímos que essa declaração de quitação total e plena é plenamente válida e eficaz, tendo a remissão conduzido à extinção dos créditos do Autor reclamados na acção, devendo proceder o recurso em conformidade.”.
Em sentido idêntico tinha já decidido este mesmo Tribunal da Relação no seu acórdão de 23/7/2006, proferido no processo 3900/05 e de cujo sumário consta, designadamente, que “Tendo o trabalhador posto termo ao seu contrato de trabalho e nessa sequência subscrito um documento de quitação, no qual diz “ter recebido da entidade patronal as quantias nele discriminadas, as quais totalizam todas as retribuições a que tem direito, dando total quitação e nada mais tendo a haver seja a que título for”, deve entender-se como válida e eficaz a remissão consubstanciada nesse documento, com a consequente extinção de qualquer obrigação da entidade patronal relativamente a esse trabalhador.”.
Por outro lado, partindo de uma declaração assinada pela trabalhadora e segundo a qual “ A... declara que já lhe foi paga uma compensação de valor global, que abrangia todos os créditos vencidos à data da cessação do referido contrato de trabalho, bem como aquelas exigíveis em virtude da referida cessação, compensação que já foi recebida pelo trabalhador e pelo qual dá integral confirmação”, este mesmo Tribunal decidiu no sentido de que “…à semelhança do decidido no acórdão desta Relação, relatado pelo mesmo relator, tirado no âmbito do procº 277/10.3TTCVL. C1, nenhum óbice se vislumbra para que não se considere ter existido uma verdadeira e válida remissão abdicativa pois que, como acima ficou dito, inexistem quaisquer vícios da vontade que a possam invalidar.” – acórdão de 27/6/2014, relatado pelo Exmo. Desembargador Felizardo Paiva e subscrito como adjuntos pelos aqui relator e segundo adjunto.
Recorde-se, também, o acórdão do STJ de 10/12/2009, proferido no processo 884/07.1TTSTB.S1, em que partindo-se de uma declaração do trabalhador de que recebeu uma dada importância “…a título de créditos laborais devidos pela cessação do contrato de trabalho que com esta manteve. Mais declara que, recebendo a quantia indicada, nada mais tem a haver ou receber da dita entidade empregadora, seja a que título for, mormente a título de créditos emergentes do dito contrato de trabalho, sua violação ou cessação.” se considerou que “… tal declaração negocial configura uma inequívoca declaração negocial abdicativa, através da qual o mesmo renunciou a todos os créditos — conhecidos ou não — emergentes do contrato de trabalho e da sua cessação.”.

Aplicando à situação em apreço tão sólida e constante orientação jurisprudencial, da qual não vislumbramos razões suficientes para divergir, é forçoso concluir, tal como concluiu o tribunal recorrido, no sentido de que estão extintos, por remissão abdicativa válida e eficaz, todos os direitos que a autora pretende fazer valer através desta acção e as correspondentes obrigações da ré que pretendiam ver-se reconhecidas.

Importa referir, a propósito das referenciadas validade e eficácia, que a apelante jamais peticionou a declaração de anulação da "Declaração/Recibo" que está em consideração, designadamente na interpretação que pudesse sustentar-se de que a mesma corporizava uma remissão abdicativa, sendo certo que a anulabilidade não pode ser declarada oficiosamente, razão pela qual estava e está vedada processualmente, sob pena de violação dos princípios da auto-disponibilidade das partes e do pedido, qualquer possibilidade de essa anulabilidade ser judicialmente declarada.

Não vem arguida, nem o tribunal a vislumbra, qualquer causa de inexistência ou nulidade da referenciada "Declaração/Recibo", nessa interpretação, que devesse ser declarada oficiosamente, sendo que os factos alegados na petição e na resposta a respeito dos contornos e finalidades de emissão dessa declaração não são suficientes para integrar uma causa de invalidade desse tipo.

Anote-se que a violação da boa-fé por parte da ré que foi exclusivamente arguida pela autora a este propósito não constitui fonte legal de invalidade da declaração negocial[12], podendo, quando muito, constituir fonte de responsabilidade civil pré-contratual[13], contratual[14] ou pós-contratual[15] ou de abuso de direito[16] e das correspondentes consequências legais, designadamente em matéria de obrigação de indemnização.

Em face do referido nos três parágrafos que antecedem e independentemente do contexto em que a "Declaração/Recibo" foi emitida e das finalidades a que a mesma se destinava, designadamente do que a respeito foi alegado na petição e na resposta, não podia ser declarada a inexistência, nulidade ou anulabilidade daquela "Declaração/Recibo", com a consequente irrelevância do que assim se alegou.

Nesse enquadramento, não acompanhamos a recorrente quando considera que: i) a matéria de facto é insuficiente para a decisão da causa (conclusão 15ª), pois, como visto, a mesma é suficiente para se decidir a presente acção nos termos exactos em que a mesma foi decidida; ii) os autos deveriam ter prosseguido para o apuramento de outros factos para lá dos que se deram por demonstrados, em especial dos factos alegados pela autora relativamente ao contexto em que a "Declaração/Recibo" foi emitida e à respectiva finalidade, com a consequente fundamentação deficiente da decisão recorrida (conclusões 14ª, 16ª a 18ª), pois que tais factos são irrelevantes, na justa medida já assinalada em que não foi peticionada a declaração de anulação dessa "Declaração/Recibo"  e em que tais factos não integram qualquer causa de inexistência ou de nulidade da declaração que pudesse declarar-se oficiosamente.

Concluindo, decidiu acertadamente o tribunal recorrido ao julgar totalmente improcedente a acção e absolvendo a ré de todos os pedidos formulados pela autora.

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IV - Decisão


Acordam os juízes que compõem esta secção social do Tribunal da Relação de Coimbra no sentido de julgar a apelação improcedente, confirmando-se a decisão recorrida.
Custas pela recorrente
Coimbra, 21/2/2018.
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(Jorge Manuel Loureiro)

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(Paula Maria Roberto)

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(Ramalho Pinto)


Sumário:


I) Em processo do trabalho não tem de existir decisão fundamentada a dispensar a realização da audiência preliminar.

II) Extinguem-se por remissão abdicativa todos os direitos que poderiam emergir para o trabalhador de um contrato de trabalho, da sua cessação e da declaração de ilicitude da forma como essa cessação foi decidia pelo empregador, incluindo o direito à reintegração, no caso de o trabalhador assinar e entregar ao empregador uma Declaração/Recibo” emitida  pelo empregador em que consta que … o empregador “efetuou o pagamento ao Declarante do montante de € 1.678,60 a título de compensação”, sendo que “A compensação referida no artigo antecedente constitui uma compensação pecuniária global que engloba todos os créditos vencidos à data da cessação do contrato de trabalho ou exigíveis em virtude dessa cessação, já recebida pelo Declarante” e que “O Declarante dá plena quitação do montante referido no número 3, que esse montante integra todos créditos vencidos ou exigíveis em virtude da cessação do contrato de trabalho, não tendo o Declarante qualquer outro valor a receber ou a reclamar da entidade empregadora.
….................................
(Jorge Manuel Loureiro)


[1] Importa não perder de vista que este normativo só exige fundamentação em relação a decisões judiciais proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo, não sendo desse tipo a decisão sob censura, que relativamente à audiência preliminar não decidiu qualquer pedido do autor ou da ré, nem decidiu qualquer dúvida que se encontrasse suscitada no processo, limitando-se a conferir ao processo o ritualismo processual normal, qual seja o da não realização, por regra, da audiência preliminar.
[2] Atente-se em que esta norma apenas exige a fundamentação de decisões judiciais que não sejam de mero expediente – decisões que se limitem a prover ao andamento regular do processo, sem interferir no conflito de interesses entre as partes (art. 152º/4 do NCPC) - sendo duvidoso, no mínimo, que não seja deste último tipo a decisão sob censura de dispensar a realização da audiência preliminar, com a consequente desnecessidade de fundamentação dessa decisão.
[3] Cfr. arts. 613º/3 e 615º/1/d do NCPC.
[4] Sobre esta temática pode consultar-se Carlos Lopes do Rego, in Estudos em Homenagem ao Conselheiro José Manuel Cardoso da Costa, 2004, pp. 835 e segs.
[5] Sobre a proibição da indefesa e a exigência do contraditório decorrentes do direito constitucional a um processo equitativo, podem consultar-se, entre outros, os acórdãos do Tribunal Constitucional 62/2017, 461/2016, 245/2016, 87/2016, Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Ano­tada, 2007, volume I, pp. 415 e 416.
[6] Cfr. Parecer da Comissão Constitucional nº 18/81, in Pareceres da Comissão Constitucional, 17º, pp. 14 e segs, José Lebre de Freitas, João Redinha e Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, vol. 1º, 1999, p. 9.
[7] José Lebre de Freitas, Introdução ao Processo Civil, Conceitos e Princípios Gerais à luz do Código Revisto, 1996, p. 96, e Código de Processo Civil Anotado, vol. 1º, 1999, p. 8.
[8] Trata-se de matéria a abordar a respeito da quinta questão.
[9] Trata-se de matéria a abordar a respeito da quinta questão.
[10] Posto que a decisão final proferida e ora sob censura teria seria produzida nos mesmo termos em que o foi, independentemente daquele requerimento da ré e do que se viesse a decidir sobre a respectiva (in)admissibilidade processual.
[11] Neste caso, o trabalhador tinha assinado uma declaração da qual constava o seguinte: “Declaro que nesta data recebi 1.224,59 € da Inerlena Extracção e Comércio de Inertes SA a título de compensação pecuniária de natureza global pela cessação do contrato de trabalho, na qual estão incluídos todos os créditos vencidos à data da cessação, bem como aqueles que são exigíveis em virtude da mesma, nada mais tendo a receber ou a exigir daquela empresa seja a que titulo for.”.
Nesse mesmo caso, o autor tinha deduzido as seguintes pretensões: “-  seja declarado nulo e sem termo o contrato de trabalho celebrado em 14.04.2011 e, consequentemente, seja declarado ilícito o despedimento do Autor e este reintegrado ou indemnizado no montante de 2.100,00 €;
              - seja a Ré condenada pagar ao Autor as prestações pecuniárias que deixou de auferir desde a data do despedimento inválido até à data do trânsito em julgado da decisão final ou, em alternativa, caso se venha a entender que o contrato é válido, deve a Ré ser condenada a pagar ao Autor a título de compensação pela denúncia do contrato a quantia de 373,28 €;
              - em qualquer caso, seja a Ré condenada a pagar ao Autor as quantias de  499,65 €, devida a título da Cl.ª 74.º n.º 7 e Prémio TIR, de 2.228,47 €, devida a título de trabalho suplementar e nocturno prestado,  de 814,50 €, a título de despesas nos termos da Cl.ª 47.º A, e de 141,40 €, a título de horas de formação não ministrada;
               -seja a Ré condenada a pagar juros à taxa legal, contados sobre as mencionadas quantias, desde a citação até efectivo e integral pagamento.”.


[12] Não se conhece normativo legal que associe qualquer espécie de invalidade (inexistência, nulidade ou mera anulabilidade) à violação do princípio da boa-fé que tenha estado subjacente à emissão de uma dada declaração negocial.
[13] Art. 227º do CC.
[14] Arts. 762º/2 e 798º do CC.
[15] Mota Pinto, Cessão da Posição Contratual, Colecção Teses, Almedina, p. 354, Almeida Costa, Direito das Obrigações, 8ªedição, pp.318/319, Maurício Mota, A Pós-eficácia das Obrigações Revisitada, disponível em http://www.estig.ipbeja.pt/~ac_direito/0310-PosEficaciaObrigaRevisitadas.pdf, Menezes Cordeiro, Da Pós-eficácia das Obrigações, Estudos de Direito Civil. vol. I, Coimbra, Almedina, 1991, e Da Boa-Fé No Direito Civil, pp. 630/631, reedição de 1997.
[16] Art. 334º do CC.