Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
180/08.7TBTBU.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: CARVALHO MARTINS
Descritores: RESPONSABILIDADE CIVIL
RESPONSABILIDADE PELA CONFIANÇA
ILICITUDE
CAUSALIDADE
CULPA
Data do Acordão: 11/13/2012
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TÁBUA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA PARCIALMENTE
Legislação Nacional: ARTS. 483, 485, 496, 497, 563, 563, 570 CC, DL Nº 119/92 DE 30/6, DL Nº 555/99 DE 16/12.
Sumário: 1.- As normas relativas ao regime jurídico de urbanização ( DL nº 555/99 de 16/12) e aos deveres impostos ao director técnico da obra ( DL nº 119/92 de 30/6 ) têm carácter bifronte, na medida em que visam tutelar interesses de ordem pública e colectiva, mas também interesses particulares, cuja violação implica ilicitude civil.

2.- A fiscalização exercida pelo director técnico da obra, no que respeita o projecto de estabilidade, visa não só garantir a conformidade da obra executada com o projecto, mas também, necessariamente, garantir condições de segurança para os que trabalham na obra, para os que poderão vir a ocupar a obra, nomeadamente o seu dono e para todos aqueles que possam vir a achar-se em contacto com o edifício construído.

3.- Na emergência do disposto no art. 483 CC (responsabilidade por factos ilícitos - princípio geral), a frustração da confiança de outrem conduz à obrigação de indemnizar. A responsabilidade pela confiança é parte integrante do direito civil vigente, encontrando fundamento na directiva jurídica pela qual deve responder pelos danos causados aquele que origina a confiança e a frustra.

4.- No domínio da responsabilidade civil por factos ilícitos ( art.483 CC ) basta, para provar a culpa, que o prejudicado possa estabelecer factos que, segundo os princípios da experiência geral, tornem muito verosímil a culpa, na dimensão definida, cabendo ao lesante fazer a contra-prova, no sentido de demonstrar que a actuação foi estranha à sua vontade ou que não foi determinante para o desencadeamento do facto danoso.

5.- A culpa consiste no nexo de imputação ético-jurídica que liga o facto ilícito à vontade do agente, e, sendo assim, ela compreende questões de facto e múltiplas questões de direito.

6.- O art.563 do CC consagra a teoria de causalidade adequada, segundo a qual uma conduta é causa de um resultado quando este, pelas regras correntes da vida, é consequência directa daquela. Não é, pois, necessário uma causalidade directa bastando uma indirecta que se dá quando o facto não produz ele mesmo o dano, mas desencadeia ou proporciona um outro que leva à verificação deste.

7.- Para que se verifique conculpabilidade do lesado, justificativa de eventual redução ou exclusão da indemnização nos termos do art. 570 nº1 do CC, é necessário que a conduta daquele possa considerar-se uma concausa do dano, em concorrência com o facto do responsável.

Decisão Texto Integral: Acordam, em Conferência, na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra:

I - A Causa:

R (..) e M (…) instauraram a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo sumário, contra J (…) e F (…), alegando, em síntese, que solicitaram ao 1.º réu a elaboração de um projecto de construção de uma moradia, bem como a sua subsequente apresentação no DOUMA da Câmara Municipal de Tábua com vista ao seu licenciamento, o que aquele aceitou fazer, pedindo para esse efeito a colaboração do 2.º réu.

Alegaram ainda que, por força desse acordo, os réus trataram, em conjunto, de

toda a documentação necessária à concessão da licença de construção, entregando na CM Tábua as plantas necessárias a instruir o processo de licenciamento, que obteve aprovação em Fevereiro de 2006.

Porém, segundo a alegação dos autores, veio posteriormente a verificar-se que o projecto de construção estava em desconformidade com o seu objecto, em virtude de o 2.º réu ter assinalado o local de implantação da moradia em zona diferente daquela onde está situado o terreno dos autores, o que inviabilizou a sua construção, causando inúmeros prejuízos àqueles.

Face ao exposto, os autores terminam pedindo a condenação dos réus no pagamento de uma indemnização no valor de € 24 875,29, a título de danos morais e patrimoniais sofridos em virtude daquela conduta.

Devidamente citados para contestar, defenderam-se os réus, rejeitando qualquer responsabilidade na indicação errada do local de implantação da moradia, acrescentando que o processo apresentado na Câmara Municipal de Tábua estava instruído com todos os elementos necessários à determinação exacta daquele local, na medida em que, para além da planta a que os autores apontam o erro de sinalização, foram entregues outras, de maior escala, que permitem uma maior exactidão na localização do terreno.

Assim, concluem os réus que a Câmara Municipal de Tábua tinha ao seu dispor todos os elementos necessários para identificar correctamente o local de implantação da moradia, sendo, por isso, as suas decisões de aprovação do licenciamento e de posterior cassação da licença totalmente alheias à conduta daqueles réus.

Terminam, pois, pugnando pela improcedência da acção e pela sua absolvição do pedido.

Oportunamente, foi proferida decisão onde se consagrou que

Face ao exposto, julgo parcialmente procedente a presente acção e, em consequência:

a) Absolvo o réu F (…) da totalidade do pedido formulado pelos autores;

b) Condeno o réu J (…) a pagar aos autores R (…) e M (…) a quantia de € 3158,24 (três mil cento e cinquenta e oito euros e vinte e quatro cêntimos), acrescidos de juros de mora, à taxa de 4%, nos termos supra descritos, absolvendo-o do restante pedido formulado;

*

Custas pelos autores e pelo réu J (...) na proporção dos decaimentos.

*

R (…) e mulher M (…), autores nos autos acima e à margem referenciados, notificados da sentença final ref. 495007 e com ela não se podendo de todo em todo, conformar, vieram interpor recurso de apelação, para o Tribunal da Relação de Coimbra, alegando e concluindo que:

(…)

J (…), já identificado nos autos em epígrafe mencionados e neles Réu, notificado da sentença final e com ela não se conformando, bem como das alegações de recurso apresentadas pelos Autores, nos termos do disposto no artigo 682.º do Código de Processo Civil, veio interpor recurso subordinado da sentença proferida, de apelação, por sua vez alegando e concluindo que:

            (…)

Não foram produzidas recíprocas contra-alegações.

II. Os Fundamentos:

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir:

Matéria de Facto assente:

1. Encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial de Tábua, sob o n.º

02899/980820, o prédio rústico sito em “Reboleira”, freguesia de Covas, composto de terreno de cultura arvense (pinhal) com a área de 853 m2, a confrontar a norte e nascente com caminho, a sul com António da Mota Garcia e a poente com (…), inscrito na matriz sob o artigo x(...).

2. Encontra-se inscrita na Conservatória do Registo Predial de Tábua a favor de R (…), c.c. M (…), na comunhão de adquiridos, pela cota G2, Ap. 11/990618, a aquisição, por doação, do prédio aludido em A).

3. Encontra-se inscrito na matriz predial rústica da freguesia de Covas, a favor de R (…), o artigo matricial n.º x(...), sito em Reboleira, com a área de 0,85375 HA, composto por terra de pinhal, a confrontar do norte com caminho, do sul com António da Mata Garcia, nascente com caminho e do poente com Rui Miguel Fernandes Henriques.

4. Por escritura pública outorgada em 6 de Novembro de 1998, no Cartório Notarial de Tábua, (…) declararam doar a R (…), seu filho, e este declarou aceitar a doação, além do mais, do imóvel rústico sito na freguesia de Covas, identificado como “Número um – prédio sito à Reboleira, descrito na Conservatória do Registo Predial de Tábua sob o número dois mil oitocentos e noventa e nove e ali registado a favor dos doadores pela inscrição G-dois, e omisso na matriz”.

5. Os autores contactaram o 1.º réu que, como projectista, acordou em prestar os seus serviços para a elaboração do projecto de construção de uma moradia por parte dos autores e subsequente apresentação do mesmo no Departamento de Obras, Urbanismo e Meio Ambiente da Câmara Municipal de Tábua, moradia a construir no prédio aludido em 1 que confronta a norte e nascente com caminho, a sul com António da Mota Garcia e a poente com (…)

6. Para o efeito o autor marido deslocou-se com o 1.º réu ao prédio aludido em 1, especificando-lhe em concreto que moradia queria que fosse construída e a sua precisa localização.

7. Foi com o 1.º réu que o autor encetou as negociações que resultaram na criação do projecto arquitectónico da moradia e foi sempre com o 1.º réu que o autor marido negociou a projecção da moradia.

8. O 2.º réu veio a colaborar com o 1.º réu – por motivo de assistência técnica acordada com o 1.º réu – na elaboração do projecto de construção da moradia, tendo cabido ao réu Fernando Vicente a autoria do projecto para o terreno aludido em 1.

9. Deu entrada na Câmara Municipal de Tábua um pedido de informação prévia no qual figurava como requerente o autor marido.

10. Por ofício datado de 18 de Fevereiro de 2002, relativo a “Pedido de Informação de Acordo com o Plano Director Municipal de Tábua”, no “local” de “Balocas/Covas”, Processo n.º 06/02-SAD/20/004, a Câmara Municipal de Tábua informou o autor de que o aludido pedido foi aprovado por despacho de 6 de Fevereiro de 2002.

11. Os réus eram conhecedores do teor da planta de condicionantes para o local descrito nos documentos n.ºs 10 e 11 – extracto de planta de ordenamento e extracto de planta de condicionantes – juntos pelos autores com a petição inicial e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

12. O 2.º réu assinou a declaração de conformidade do projecto com o Plano Director Municipal em Maio de 2002, junta pelos autores com a petição inicial como documento n.º 12, aquando da sua entrega ao Departamento de Urbanismo da Câmara Municipal de Tábua.

13. Nas mesmas circunstâncias o 2.º réu apresentou a memória descritiva e justificativa da moradia, junta pelos autores com a petição inicial como documentos n.º 13 e 14, e os demais documentos exigidos por lei para a elaboração de projectos urbanísticos.

14. E assinou o termo de responsabilidade pela autoria do projecto de arquitectura, datado de 26 de Abril de 2002, no qual subscreveu, além do mais o seguinte:

F (…) Engenheiro Civil (...) declara, para os efeitos do disposto no n.º1 do art.º 10º do Decreto-Lei 55799 de 16 de Dezembro, com a actual redacção que lhe foi conferida pelo Decreto-Lei nº 177/2001 de 4 de Junho, que o projecto de Arquitectura, de que é autor, relativo à obra de construção de uma moradia, no lugar de Balocas, Freguesia de Covas, Concelho de Tábua, e cujo licenciamento foi requerido por R (…), residente no lugar e Freguesia de Lourosa, concelho de Oliveira do Hospital, observa as normas técnicas gerais e específicas de construção, bem como as disposições regulamentares aplicáveis, designadamente as disposições regulamentares do Regulamento Geral das Edificações Urbanas, assim como os instrumentos do Plano Director Municipal.

15. Aquando da elaboração do termo de responsabilidade aludido em 14 o 2.º réu encontrava-se habilitado pela respectiva Ordem Profissional, para o exercício da profissão de Engenheiro Civil.

16. O autor marido pagou ao 1.º réu o projecto de construção da moradia, tendo

emitido à ordem deste, para pagamento faseado do projecto, quatro cheques, nas datas de 2 de Abril de 2002, 2 de Maio de 2002, 19 de Agosto de 2002 e 18 de Outubro de 2002, sendo os primeiros dois no valor de 500,00 euros e os dois

últimos, respectivamente, no valor de 518,75 euros e 180,00 euros.

17. Por despacho de 17 de Fevereiro de 2006 foi aprovado pelo D.O.U.M.A da Câmara Municipal de Tábua o projecto que constitui o processo n.º 110/02SAD/20/2004, relativo ao pedido apresentado pelo autor marido para construção de uma moradia, sita no Lugar de Balocas, Freguesia de Covas.

18. Ao autor marido foi enviado pelo D.O.U.M.A da Câmara Municipal de Tábua ofício datado de 14 de Março de 2006 dando conta da aprovação do projecto aludido em 17.

19. O respectivo alvará de construção foi emitido em 25 de Outubro de 2006.

20. Mercê da concessão do alvará aludido em 19, o autor marido encetou diligências junto de um Banco, para constituição de um empréstimo e com o empreiteiro, tendo este elaborado um orçamento para a construção da sua futura casa.

21. Por escritura pública outorgada em 8 de Janeiro de 2007, no Cartório Notarial de Tábua, R (…)e mulher M (...)  e (…) na qualidade de procuradora da Caixa Geral de Depósitos S.A., declararam, além do mais, que por tal escritura a Caixa Geral de Depósitos, S.A. concedia a R (…) e mulher M (…) um empréstimo da quantia de setenta mil euros, importância da qual estes se confessavam solidariamente devedores.

22. Mais declararam que em garantia: do capital emprestado; dos respectivos juros à taxa anual de 8,246 %, acrescida, em caso de mora, de uma sobretaxa até 4%, ao ano, a título de cláusula penal; das despesas extrajudiciais que a parte credora fizesse incluindo as despesas para segurança ou reembolso dos seus créditos e as emergentes do contrato; R (…), com o consentimento da sua mulher, constituía hipoteca sobre o prédio rústico, sito à Reboleira ou Reboleiras, na freguesia de Covas, concelho de Tábua, composto de terreno de pinhal, inscrito na matriz pelos artigos x(...) e y(...), descrito na Conservatória do Registo Predial de Tábua sob o n.º z(...).

23. A Câmara Municipal de Tábua, D.O.U.M.A., dirigiu ao autor ofício datado de 28 de Setembro de 2007, pelos autores junto como documento n.º29, do qual consta, além do mais:

Audiência Prévia

Proc. N.º 110/02-SAD/40/004 – Construção de uma moradia

Req: R (…)

Local: Balocas / Covas

Na sequência do despacho do Excelentíssimo Senhor Presidente da Câmara Municipal de 27 de Setembro de 2007, vimos pelo presente notificar V. Ex.ª, da intenção de cassação do Alvará de Licença de Construção n.º 87/2006, emitido em 25 de Outubro de 2006, após a declaração de nulidade da licença – artigo 79º, nº 1 e nº 4 do Regime Jurídico de Urbanização e Edificação, com fundamento na informação técnica de 15 de Junho de 2007 e parecer jurídico de 05 de Julho de 2007, em virtude de a obra em causa se localizar fora do perímetro urbano o que constitui uma violação do Plano Director Municipal.

Mais se notifica V. Ex.ª, na qualidade de interessado, para se pronunciar no prazo de 15 dias úteis, nos termos dos artigos 100º e 101º do Código de Procedimento Administrativo, sobre o que se lhe oferecer (...).

24. A Câmara Municipal de Tábua, D.O.U.M.A., dirigiu ao autor ofício datado de 8 de Janeiro de 2008, pelos autores junto como documento n.º30, do qual consta, além do mais:

Declaração de Nulidade de Licença – Artigo 79º, Nº 1 e Nº 4 do RJUE

Proc. N.º 110/02-SAD/40/004 – Construção de uma moradia

Req: R (…)

Local: Balocas / Covas

Venho pelo presente notificar V. Ex.ª, que esta Câmara Municipal na sua reunião ordinária de onze de Dezembro de dois mil e sete, deliberou, com fundamento na informação técnica de 15 de Junho de 2007 e parecer jurídico de 05 de Julho de 2007, em virtude de a obra em causa se localizar fora do perímetro urbano o que constitui uma violação do Plano Director Municipal, declarar a nulidade da Licença, e consequentemente, proceder à cassação do respectivo alvará, nos termos do artigo 79º, nº 1 e nº 4, do Regime Jurídico de Urbanização e Edificação.

25. Não obstante o aludido em 1, o prédio aí identificado situa-se no lugar de Balocas.

26. Antes da entrega na Câmara Municipal de Tábua do projecto de construção da moradia aludido em 8, foi encaminhado para a aludida Câmara Municipal um

pedido de informação de acordo com o Plano Director Municipal vigente em 2002, visando-se averiguar da viabilidade do projecto para o lugar onde se pretendia construir a moradia.

27. O aludido pedido de informação é o referido em 10.

28. Na sequência da decisão aí aludida os réus apresentaram no Departamento de Urbanismo da Câmara Municipal de Tábua o projecto de arquitectura referente à moradia pretendida pelos autores para o prédio aludido em 1, sito no local referido em 25.

29. À data da apresentação do projecto de arquitectura referente à moradia

pretendida pelos autores no Departamento de Urbanismo da Câmara Municipal de Tábua, o local assinalado na planta topográfica junta pelos autores com a petição inicial como documento n.º8 e assinalado no extracto de planta de ordenamento junta pelos autores com a petição inicial como documento n.º 9, correspondia ao local assinalado pelo 2.º réu para a implantação da moradia.

30. À data da apresentação no Departamento de Urbanismo da Câmara Municipal de Tábua do projecto de arquitectura referente à moradia pretendida pelos autores, os locais aludidos em 29 encontravam-se em espaço urbanizável.

31. Na sequência do aludido em 20 e com a assinatura do contrato de empreitada, os autores efectuaram um pagamento ao empreiteiro no valor de 10 000,00 euros, para que este iniciasse o desbravamento do terreno e a respectiva implantação de alicerces no prédio aludido em 25 sito no local aludido em 1.

32. Em 25 de Janeiro de 2007, o autor marido requereu junto da Câmara Municipal de Tábua a substituição e aprovação de planta de implantação, alegando a existência de desfasamento do levantamento topográfico em relação ao existente.

33. Em Junho de 2007 os fiscais de obras da Câmara Municipal de Tábua dirigiram-se ao terreno aludido em 1, sito no local referido em 25 e verificaram que o terreno onde se pretendia construir a moradia estava localizado fora da zona do perímetro urbano.

34. Após consultarem a cartografia e vistoriarem o terreno dos autores, os réus estavam em condições de saber que o local previsto para a construção da futura moradia dos autores se encontrava excluído da zona do perímetro urbano.

35. Não obstante o aludido em 34, os réus projectaram a obra para local diferente da localização real do prédio dos autores e em zona de perímetro urbano.

36. Aquando da apresentação no Departamento de Urbanismo da Câmara Municipal de Tábua do projecto em nome do autor marido, os réus indicaram uma zona na planta cartográfica próxima do prédio pertencente ao autor.

37. A actuação descrita em 35 e 36 levou a que fosse conseguida a aprovação do licenciamento.

38. Mercê do aludido em 32 a 37, os réus sentiram-se frustrados e ficaram transtornados, continuando muito abalados com o facto de não poderem habitar a moradia que desejavam construir.

39. Com a emissão do alvará aludido em 19 os autores despenderam a quantia de € 1119,11.

40. Para fornecimento de energia à obra de construção da moradia, os autores

pagaram à EDP a quantia de € 170,80 euros.

41. Para abastecimento de água, os autores celebraram contrato com a empresa Águas do Planalto, S.A., despendendo a quantia de € 391,25.

42. Com as despesas notariais, registrais e fiscais devidas pela formação do contrato aludido em 21 e 22 os autores despenderam a quantia de € 463,83.

43. Os autores entregaram 7.000,00 euros à Caixa Geral de Depósitos, a título de entrada, atenta a aprovação do seu crédito à habitação.

44. Os autores despenderam com a operação de crédito à habitação que contrataram com a Caixa Geral de Depósitos, entre 11.07.2006 (data do início do estudo do processo de crédito) e 09.11.2007 (data do cancelamento da operação de crédito e liquidação do capital mutuado), os seguintes valores:

a) 264,02€, relativos a juros;

b) 404,15€, relativos a comissões, de estudo do processo de crédito, de preparação de minuta da escritura, de conversão do registo da hipoteca, de processamento de liquidações de prestações, de cancelamento do crédito e liquidação do capital mutuado;

c) 48,00€, relativos a despesas;

d) 87,90€, relativos a impostos.

45. Por causa do empréstimo contratado com a CGD, os autores despenderam ainda, entre 08.02.2007 e 25.10.2007, 224,59€ relativos a prémios de seguros de vida contratados com a Companhia de Seguros (...), S.A. para garantia do referido empréstimo de crédito à habitação.

46. Atenta a aprovação e contratação do seu crédito à habitação e por causa deste, os autores entregaram ainda à CGD e à Companhia de Seguros (...) S.A., para além dos montantes referidos, o valor total de 1 028,66€.

47. Aquando da elaboração do projecto de construção da moradia dos autores e

subsequente entrega deste no Departamento de Urbanismo da Câmara Municipal de Tábua, a implantação da obra respeitava todos os afastamentos exigidos.

48. Após a aprovação do projecto na Câmara Municipal de Tábua verificou-se existir um desfasamento relativo às distâncias/afastamentos entre o muro da moradia e a estrada.

49. Em virtude do aludido em 48, os réus procederam a um novo levantamento topográfico e subsequente elaboração de nova planta de implantação que entregaram nos serviços da Câmara Municipal, requerendo a sua respectiva anexação ao processo, substituição e aprovação.

50. O local onde os autores pretendiam construir a sua moradia era inepto para a construção, por não corresponder a espaço urbanizável.

51. A Câmara Municipal tinha elementos para conhecer a circunstância referida em 50.

52. A EDP emitiu um parecer relativo à existência de uma linha de média tensão

próxima do prédio dos autores e trocou com a Câmara Municipal de Tábua diversa correspondência acerca da viabilidade de alimentação eléctrica da moradia, bem como da sua construção naquele local por causa da sua proximidade à linha de média tensão.

Nos termos do art. 684°, n°3, e 690°,n°1, do CPC, o objecto do recurso acha-se delimitado pelas conclusões do recorrente, sem prejuízo do disposto na última parte do n°2, do art. 660°, do mesmo Código.

Das conclusões - no que ao recurso de apelação interposto por R (…) e mulher M (…) autores nos autos acima e à margem referenciados, ressaltam as seguintes questões:

I.

A4) A conduta do R. F (…), de que dão conta os factos provados n.ºs 8, 11, 12, 13, 14, 15, 28, 29, 30, 33, 35 e 36, com as consequências de que dão conta os factos provados n.ºs 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 31, 32, 37, 38, 39, 40, 41, 42, 43, 44, 45, 46, integra, se não a primeira, a segunda modalidade de ilicitude prevista no art. 483.º, n.º 1, do Código Civil, sendo assim aquele R. também responsável pelo dever de indemnizar, contrariamente ao que em erro de julgamento e violação das normas legais dos arts. 483.º, n.º 1, do Código Civil, 86 e 87.º do Estatuto dos Engenheiros (Decreto-Lei n.º 119/92, de 30 de Junho) e 10.º do Decreto-Lei n.º 555/99 decidiu a sentença recorrida. Ademais,

B) face dos factos provados 11, 34, 35 e 36, a culpa do R. F (…) é efectiva e verifica-se, tal como a do R. J (…) (além da presunção de culpa que quanto a este se verifica por ser fonte da sua responsabilidade uma relação contratual). Por conseguinte,

C) Assim afirmados os requisitos da culpa e da ilicitude, e verificando-se os demais pressupostos da responsabilidade e os RR. F (…) e J (…) (e não apenas este) respondem solidariamente pela indemnização dos danos causados, como impõem as normas legais dos arts. 490.º e 497.º do Código Civil, em cuja violação a sentença recorrida também incorreu ao afastar a responsabilidade do R. R (…)

Apreciando, diga-se, de acordo com o que a decisão em probatório consagra e a fls. 290 se reconhece, no que respeita ao réu F (…), que este “agiu na qualidade de colaborador ou auxiliar técnico do réu J (…), a solicitação única e exclusiva deste”. O que significa não poder também deixar de ser imputada ao referido réu F (…) qualquer responsabilidade pelos danos causados aos autores.

Desde logo porque decorre do art. 483.° Código Civil (responsabilidade por factos ilícitos) que são elementos constitutivos da responsabilidade civil extracontratual: o facto, a ilicitude, a imputação do facto ao lesante, o dano e o nexo da causalidade entre o facto e o dano (Almeida Costa, Obrigações, 4, 364).

Isto porque, no domínio da responsabilidade civil por factos ilícitos basta, para provar a culpa, que o prejudicado possa estabelecer factos que, segundo os princípios da experiência geral, tomem verosímil a mesma culpa.  (Ac. RL, 18-4-1989: Ci, 1989, 2.°-139). Com feito, fora do quadro da responsabilidade civil contratual pode qualquer consumidor lesado ressarcir-se, imputando a respectiva reparação do dano ao produtor da coisa viciada ou defeituosa quanto às suas qualidades intrínsecas. Em qualquer dos casos, incumbe ao lesado a prova de ocorrência de nexo de causalidade entre a desconformidade das qualidades que a coisa deveria ter como intrínsecas e o dano verificado (Ac. RC, 6-3-2001: CJ, 2001, 2°- 16). O que não deixou de acontecer.

E nem o alcance do disposto no art. 485º Código Civil é despiciendo. Para o efeito, retenha-se, por confronto, justamente, que:

ART. 485.” (Conselhos, recomendações ou informações) — 1. Os simples conselhos, recomendações ou informações não responsabilizam quem os dá, ainda que haja negligência da sua parte.

2. A obrigação de indemnizar existe, porém, quando se tenha assumido a responsabilidade pelos danos, quando havia o dever jurídico de dar o conselho, recomendação ou informação e sã tenha procedido com negligência ou intenção de prejudicar, ou quando o procedimento do agente constitua facto punível.

Assumindo, pois, legitimamente como réu, em acção de responsabilidade civil extracontratual, aquele a quem é imputada a autoria do facto ilícito (Ac. STA, 3-11-1988: BMJ, 381 .°-358, e AD, 329.°-629). Com efeito, a inerente responsabilidade por conselhos, recomendações ou informações, quando haja o dever jurídico de as prestar (inarredáveis, também, circunstancialmente) e se actue com dolo ou negligência (art. 485.º, n.° 2, do Cód. Civil) verifica-se se esse dever resultar de um contrato (mandato, prestação de serviços, empreitada, etc.) ou se surgir em resultado de uma dúvida fundada do titular do direito à informação relativamente à respectiva existência ou conteúdo (ou amplitude) e houver quem esteja em especiais condições de prestar as informações necessárias. O dever jurídico de prestar informações, recomendações ou conselhos e de responsabilização pelo seu incumprimento, doloso ou negligente, só aproveita à pessoa perante quem se esteja vinculado e não a terceiro que, eventualmente, tenha sido lesado por uma informação, recomendação ou conselho erróneos (Ac. RL, 22-5-1992: CJ, 1993, 3.°-188).

E sem que se possa arredar constituir património adquirido da ciência civilística a distinção entre deveres de prestação e “outros deveres de conduta” ou “deveres laterais”, os quais resultam, sobretudo, do princípio da boa fé. De acordo com esta impostação do problema, deverá haver responsabilidade não apenas quando exista um dever de informar mas igualmente quando exista um dever de proceder com cuidado (plural, conjunto, de quem assume directa e acessoriamente o dever de dar a informação. Tal como Vaz Serra propôs e estava escrito ainda no anteprojecto do Cód. Civil, primeira revisão.

Não descortinamos, pois, explicação racional para uma mudança de rumo para, também aqui, se evitarem contradições normativas sem qualquer justificação, de serem tidos em conta os princípios consagrados noutros locais da lei civil ande se colocam problemas de responsabilidade por informações (nomeadamente os arts. 227.°, nº 1, e 762.°, n.° 2). Dos quais resulta que pode haver ilicitude não apenas quando existia o dever de informar, mas igualmente quando, mesmo sem dever de informar, se deva entender que existe um dever de proceder com cuidado se é prestada uma informação (Sinde Monteiro, em Cad. Sust. Admi., 36.°-22 e s., o qual remete para a Responsabilidade por Conselhos, 1989, págs. 333 e as.), que, em termos de trabalho conjugado se revela perniciosa  por lesiva de interesses de outrem que deveriam, em primeira linha, por tais agentes serem salvaguardados.

Deve considerar-se que concorrem os elementos de responsabilidade, ilicitude, culpa e nexo de causalidade quando o administrado agiu - através de outrem - em conformidade com os esclarecimentos prestados pela Administração sobre a interpretação de regulamentos e normativos específicos atinentes à concessão de uma informação (que mais tarde se reconheceu ser tida como errónea), mesmo no circunstancialismo provado fornecida pela entidade pública referenciada ( e que foi necessariamente, do mesmo modo causadora dos danos invocados, e contra quem, estranhamente, se não exigiram responsabilidades!... (Ac. STA, l.°, 11-11-2001: AD, 475.°-978).

O que determina, necessariamente apreciar, em função, mais uma vez e sempre, do que vem provado que, no domínio da responsabilidade civil por factos ilícitos, basta, para provar a culpa, que o prejudicado possa estabelecer factos que, segundo os princípios da experiência geral, tomem muito verosímil a culpa, na dimensão definida, cabendo ao lesante fazer a contra-prova, no sentido de demonstrar que a actuação foi estranha à sua vontade ou que não foi determinante para o desencadeamento do facto danoso (Ac. STJ, 20-12-1990: BMJ, 402.°-558). O que este(s) últimos) não lograram.

A pretexto, exactamente, de haver agido na qualidade - aceite e actuante - de colaborador ou auxiliar técnico do réu J (…) . Pelo haverá, do mesmo modo, de ser imputada ao réu F (…) responsabilidade pelos danos causados aos autores, passando, pois, a analisar-se os termos em que aquela poderá ser. Sem nunca olvidar que este - como a própria decisão assinala - “agiu na qualidade de colaborador ou auxiliar técnico do réu J (...), a solicitação única e exclusiva deste”!’

Do mesmo modo - reforçando o argumento -, em nenhuma circunstância se pode descurar - cf. Ac. RC de 26.01.2010 (Proc. 1801.08.7TBCBR.C1), Relator Carlos Gil - onde, pertinentemente, se  assinala o que, aqui, igualmente, se haverá de convocar:

«(…) Nos termos do disposto no artigo 86°, n° 5, do Estatuto da Ordem dos Engenheiros, aprovado pelo decreto-lei n° 119/92, de 30 de Junho, “o engenheiro deve procurar as melhores soluções técnicas, ponderando a economia e a qualidade da produção ou das obras que projectar, dirigir ou organizar.”

“O engenheiro deve prestar os seus serviços com diligência e pontualidade, de modo a não prejudicar o cliente nem terceiros, nunca abandonando, sem justificação, os trabalhos que lhe forem confiados ou os cargos que desempenhar” (artigo 87°, n°2, do Estatuto da Ordem dos Engenheiros).

As duas previsões legais que se acabam de citar inserem-se no Capítulo III, do Estatuto da Ordem dos Engenheiros, capítulo intitulado “deveres decorrentes do exercício da actividade profissional”.

(…)

Uma das tarefas fundamentais do Estado é o de assegurar um correcto ordenamento do território (artigo 9°, alínea e), da Constituição da República Portuguesa), tarefa que se projecta nos direitos sociais de habitação e urbanismo (artigo 65° da Constituição da República Portuguesa) e no direito do ambiente (artigo 66°, no 2, alínea b) e e), da Constituição da República Portuguesa). Logo no plano constitucional é visível o entrecruzar de interesses públicos e de carácter colectivo com interesses particulares dos interessados, beneficiados ou afectados pelas operações de ordenamento do território.

O direito da construção, enquanto segmento normativo do direito da edificação contém “prescrições de direito público relativas à criação de novas edificações e das suas vicissitudes, segundo critérios de segurança, durabilidade estética, qualidade, salubridade, conforto, reserva da intimidade privada, funcionalidade e economia de recursos energéticos”.

“Todos os factos relevantes relativos à execução de obras licenciadas ou autorizadas devem ser registados pelo respectivo director técnico no livro de obra, a conservar no local da sua realização para consulta pelos funcionários municipais responsáveis pela fiscalização de obras” (artigo 97°, n° 1, do decreto-lei n° 555/99, de 16 de Dezembro), fiscalização que se destina a “assegurar a conformidade das operações urbanísticas com as disposições legais e regulamentares aplicáveis e a prevenir os perigos que da sua realização possam resultar para a saúde e segurança das pessoas” (artigo 97°, no 1, do decreto-lei n° 555/99, de 16 de Dezembro).

Os normativos que se acabam de citar evidenciam de forma clara que a intervenção do director técnico visa garantir que a execução da obra obedece aos projectos apresentados e às exigências impostas pela administração.

(…)

A fiscalização exercida pelo director técnico da obra, no que respeita o projecto de estabilidade, visa não só garantir a conformidade da obra executada com o projecto, mas também, necessariamente, garantir condições de segurança para os que trabalham na obra, para os que poderão vir a ocupar a obra, nomeadamente o seu dono e para todos aqueles que possam vir a achar-se em contacto com o edifício construído, O cumprimento do projecto de estabilidade dá garantias de que a construção não virá pôr em perigo todos aqueles que podem vir a ter contacto com a obra ou a estar nas suas proximidades.

Assim, afigura-se-nos que as normas relativas ao regime jurídico de urbanização e aos deveres impostos ao director técnico da obra têm carácter bifronte, na medida em que visam tutelar interesses de ordem pública e colectiva, mas também interesses particulares. Não por acaso, o Sr. Professor Antunes Varela indicava como exemplo de norma de protecção relevante para a modalidade de ilicitude consistente na violação de lei que protege interesses alheios, certas infracções da construção civil. Por isso, ao invés do sustentado na decisão sob censura, afigura-se-nos sustentável juridicamente a afirmação da existência de ilicitude na conduta omissiva imputada ao réu engenheiro..

(…)

Ainda assim, sempre se dirá que as normas citadas do Estatuto dos Engenheiros são claras na afirmação de que a imposição dos deveres de diligência e que visam a tutela não só do cliente mas também de terceiros, pelo que também por este prisma, se acaso se confirmar a violação de deveres profissionais por parte do réu, o terceiro prejudicado poderá com tal fundamento normativo intentar a responsabilização do engenheiro incumpridor».

O que responde afirmativamente às questões em I configuradas.

II.

D2) Ao nível da mera concausalidade, que não culpa, da actuação do Município, não se poderá deixar ainda de reconhecer que a actuação dos RR. é causa juridicamente relevante à luz do critério estatuído no art. 563.º do Código Civil dos danos incorridos pelos AA., que é o que basta para, a este nível, afirmar a responsabilidade total dos RR. pela totalidade do valor dos danos produzidos. E,

 D3) Mesmo considerando culpa também do Município de Tábua na sua actuação e na produção de danos nos AA., e assim o problema de concorrência de culpas, certo é que a norma legal do art. 497.º do Código Civil impõe o regime da solidariedade dos responsáveis lesantes, respondendo todos e cada deles pela totalidade do valor dos danos, cabendo direito de regresso entre eles, não podendo credor lesado. Assim,

 D4) contrariamente ao que em erro de julgamento e violação das normas dos arts. 497.º do CC decidiu a sentença recorrida, os RR. são sempre responsáveis e devem indemnizar a totalidade do valor dos danos incorridos pelos AA. Agravadamente,

D5) Tendo ignorado por completo a pertinência e aplicação da norma do art. 497.º do Código Civil, a sentença recorrida incorreu assim, nesta parte, não apenas em erro de julgamento e violação de norma legal, mas em erro e lapso manifesto na determinação de norma aplicável e na qualificação jurídica dos factos, nos termos do disposto no art. 669.º, n.º 2, a) do Código de Processo Civil, requerendo-se pois, nesta parte, nos termos e ao abrigo do disposto no art. 669.º, n.º 2, a) e 670.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, a reforma da sentença recorrida e a prolação de despacho pelo Meritíssimo Tribunal a quo que corrija tal vicio, e, não o fazendo o Meritíssimo Tribunal a quo, sejam V.ªs Ex.ªs Venerados desembargadores a suprir tal vício decidindo nos termos supra apontados.

Convocando o disposto no art. 563.° Código Civil (nexo de causalidade), dele decorre que “a obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão”. Nestes termos, não é necessário uma causalidade directa, basta uma indirecta (o autor da lesão é responsável por todos os factos ulteriores que eram de esperar segundo o curso normal das coisas, ou foram especialmente favorecidos pela conduta do agente quer na sua própria verificação quer a sua actuação concreta em relação ao dano de que se trata) (P. Coelho, Obrigações, 166).

Quer tal significar que, no seguimento do art. 563.º do Cód. Civil a nossa lei acabou por consagrar a teoria de causalidade adequada, segundo a qual uma conduta é causa de um resultado quando este, pelas regras correntes da vida, é consequência directa daquela. Não é, pois, necessário uma causalidade directa bastando uma indirecta que se dá quando o facto não produz ele mesmo o dano mas desencadeia ou proporciona um outro que leva à verificação deste (Ac. RE, 7-12-1993: BMJ, 432.°-452).

Há, naturalmente, que restringir a causa àquela ou àquelas condições que se encontrem para com o resultado numa relação mais estreita, isto é, numa relação tal que seja razoável impor ao agente responsabilidade por esse mesmo resultado, isto é, o agente só responderá pelos danos para cuja produção a sua conduta era adequada. Se o agente produziu a causa donde resultou o dano, sem dúvida que a sua conduta é adequada ao resultado, mesmo que, concomitantemente com a sua conduta, haja a conduta de terceiros a concorrer para esse resultado ou, pelo menos, a não o evitar. Com efeito «desde que o devedor ou lesante praticou um facto ilícito, e este actuou como condição de certo dano», justifica-se perfeitamente «que o prejuízo (embora devido a caso fortuito ou, em certos termos, à conduta de terceiro) recaia, em princípio, não sobre o titular do interesse atingido, mas sobre quem, agindo ilicitamente, criou a condição do dano» (A. Varela em «Das Obrigações em Geral», 4.ª edição, pág. 800). Só não seria assim se o facto ilícito se pudesse considerar de todo em todo indiferente, na ordem natural das coisas, para a produção do dano registado (mesmo local do Ac. RC, 9-1-1990: CJ, 1990, 1 .°- 81). O que, circunstancialmente, pelo que se consagrou em probatório e vem de dizer-se, de todo, não aconteceu.

E o que os Autos revelam é, afinal (o que em decisório sagazmente se assinalou), é que:

“(…) Ora, volvendo ao caso em apreço, se é certo que o comportamento do réu J (…), praticado “pela mão” do réu F (…), constituiu um factor determinante para a verificação dos danos sofridos pelos autores, não é menos verdade que, paralelamente àquela conduta, surgiu outra circunstância que, não sendo exclusivamente imputável aos réus, acabou por ser determinante na causação dos prejuízos. E, assim, apesar de a concorrência ou colaboração de outros factores para a produção dos danos não excluir a existência de responsabilidade do réu, já que a sua conduta, neste caso o cumprimento defeituoso da seu prestação, não foi alheia ou indiferente ao desencadeamento dos prejuízos (cfr. a este propósito as considerações vertidas no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 28.04.2011, disponível in www.dgsi.pt), isso não significa que aquele deva responder integralmente pelos prejuízos verificados, na medida em que não foi apenas a sua acção que os determinou.

Pelo que, pese embora não nos compita, na presente acção, responsabilizar terceiros pelos prejuízos causados aos autores, a factualidade supra descrita, designadamente no ponto 51, não permite que mantenhamos à margem da decisão da causa a apreciação do comportamento da Câmara Municipal de Tábua, concretamente, da sua concorrência para o resultado danoso consumado na esfera jurídica dos autores, já que esta influirá, necessariamente, na determinação da medida da responsabilidade do réu.

Referimo-nos, como já se depreende, ao acto de aprovação do licenciamento da construção requerida pelos autores sem que o processo entregue na Câmara Municipal reunisse as condições legais exigidas para o efeito, já que as plantas apresentadas não continham uma representação do local visado coerente entre si.

Na verdade, se, por um lado, não nos restam dúvidas que o comportamento dos

réus, enquanto acto impulsionador do erro, foi aquele que mais e com maior peso contribuiu para a falha na apreciação do processo de licenciamento da obra em causa – até porque o erro de sinalização incidiu apenas sobre a planta destinada a aferir da inserção do local pretendido para a construção em zona urbanizável, em conformidade com o PDM – não podemos, por outro lado, desconsiderar a contribuição que a falta de cuidado na análise do processo pelos técnicos da Câmara Municipal acabou por trazer à ocorrência dos prejuízos posteriormente sofridos pelos autores.

Com efeito, assim como competia aos réus cumprir escrupulosamente as regras

técnicas com vista a uma indicação correcta do local de construção, bem como a apresentação e sinalização das plantas de forma coerente entre si e em conformidade com a realidade, também à Câmara Municipal incumbia maior zelo e profundidade na análise do processo, por forma a que as desconformidades que vieram a ser constatadas após a aprovação do licenciamento tivessem sido atempadamente detectadas.

De todo o modo sempre nos parece que a maior contribuição para os danos verificados foi dada pela representação incorrecta efectuada nas plantas entregues pelos  réus, já que o facto de a planta mal sinalizada ser aquela que, por ser de escala equivalente ao extracto da planta de ordenamento, se destina a ser confrontada com esta a fim de enquadrar as zonas urbanizáveis e não urbanizáveis, foi, quanto a nós, determinante para iludir a análise dos técnicos da Câmara Municipal, potenciando o erro que uma análise mais cuidada e menos mecanizada poderia ter evitado, mas que acabou por determinar a aprovação do licenciamento e, consequentemente, os prejuízos dos autores.

Face a todo o exposto, concluímos que a medida da responsabilidade do réu J (…) pelos prejuízos causados aos autores não poderá ir além dos 70 %.

Chegados a este ponto, importa ainda deixar claro que ao limitarmos nesta medida a responsabilidade do réu não estamos a formular qualquer juízo, que sempre nos parecia extravasar o objecto da acção, acerca da responsabilidade civil de terceiros pelos danos causados aos autores, mas tão-só a balizar a responsabilidade do réu pelos danos cuja reparação vem peticionada, em função da medida da sua contribuição para a verificação daqueles, o que sempre implica uma apreciação, no plano da causalidade, acerca da concorrência de outros factores (…).

Com efeito, se se discute a causalidade naturalística, ou seja, a fixação da sequência naturalística dos factos, que conduz a um certo dano, o seu encadeamento sequencial, de modo a determinar se o efeito proveio de um dado facto anterior, isso reconduz-se a matéria de facto, já que estamos perante a ponderação do trajecto naturalístico dos actos que se sucedem uns aos outros. Já se está perante matéria de direito quando nos situamos no âmbito da causalidade jurídica, uma vez que, então, do que se trata é de valorar, integrar e enquadrar normativamente a sequência naturalística dos factos e das coisas, em ordem a saber se - face ao mundo do direito - essa sequência releva de forma a poder fixar-se normativamente a conexão de causa-efeito entre um facto e um dano. O próprio Supremo Tribunal de Justiça não pode apreciar o trajecto sequencial dos factos, mas pode apreciar a valoração causal que esses factos e esse trajecto — predeterminado pelas instâncias — suscitam, uma vez que, neste último caso, não estamos na esfera estrita dos factos, mas da sua valoração jurídica. A nossa lei civil (art. 563.» do CC) consagra a teoria da causalidade adequada, teoria esta que admite duas variantes: a positiva e a negativa. Na variante positiva, que é mais restritiva e mais conexionada com a valoração ética do facto (pelo que é utilizada para a fixação do nexo causal no âmbito do direito criminal) a previsibilidade do agente tem que se referir ao facto e à amplitude dos danos que dele emergem; ou seja, o agente só é culpado do que previu, quanto ao facto que praticou e quanto aos danos que perspectivou. Na variante negativa — a que está consagrada no art. 563.° do CC — que é mais ampla e que tem um sentido ético da culpa menos restrito (por isso que é mais utilizada no direito civil, na teoria da responsabilidade), a previsibilidade do agente reporta-se ao facto e não aos danos, o que significa que o agente será sempre responsável por danos que jamais previu, desde que provenham de um facto - condição deles - que ele praticou e que visualisou. Assim, um facto é causal de um dano quando é uma de entre várias condições sem as quais o dano não se teria produzido. (Ac. STJ, 3-12-1998: BMJ, 482.°-207).

Consequentemente, havendo responsabilidade do comissário, por culpa (mesmo) presumida, os comitentes respondem civilmente, solidariamente, com o comissário, em conformidade como estatuído nos arts. 497º, n.° 1, e 503°, fl° 1, ambos do Cód. Civil. O art. 566°, n°3, do Cód. Civil pressupõe a existência de um dano, cujo valor exacto não é possível averiguar (Ac. STJ, 12-1-1984: BMJ, 333.°-41 3, e RL/, 121 .°-26, com anotação de Antunes Varela) [naturalmente que o direito de regresso consagrado no art. 497°, nº2, do Cód. Civil só é admitido contra os responsáveis solidários que tenham agido com culpa. O comitente que, por via da solidariedade, satisfazer a indemnização por inteiro tem o direito a exigir do comissário aquilo que pagou (RP, 9-11-1992: BMJ, 421 .°-495)].

Precise-se, no entanto, não obstante o que se deixa dito, a pretexto do art. 669.°, n.° 2, do CPC (esclarecimento ou reforma da sentença), não obstante, que ele visa apenas os lapsos manifestos, não se destinando a emendar erros de julgamento, caso em que entraria em contradição com o art. 666.° do mesmo diploma (Ac. STJ, de 7.3.2002, lncid. o.° 3944/01-7.ª: Sumários, 3/2002). Em rigor, com o mesmo alcance, diga-se também que o art. 670.° CPC (processamento subsequente) apenas veda recurso autónomo do despacho de indeferimento, nada obstando, porém, a que o recurso da sentença abranja aquele (Anot. ao Desp. RP, de 4.1.1974: RT, 92.°-47).

Precisão correctiva (derradeira) processual, assim feita, no mais, recolhem resposta afirmativa as questões em II configuradas.

Ademais,

III

E1) Não se tendo pronunciado, omitindo qualquer referência na sua fundamentação, e desconsiderando o dano da quantia de 1.119,11€ que os AA. despenderam com a emissão do alvará de construção (e cuja licença veio a ser declarada nula e cuja respectiva construção deixou de ser feita) como resultou do facto provado 39, a sentença recorrida incorreu, não apenas em erro de julgamento e violação de norma legal, mas em vícios de omissão de pronúncia, falta de fundamentação de direito, contradição entre os fundamentos de facto e a decisão de direito e manifesto lapso na determinação de norma legal e na qualificação jurídica de tais factos, nos termos do disposto nos arts. 668.º, n.º 1, als. b), c), d) e 669.º, n.º 2, a), todos do Código de Processo Civil, requerendo-se assim, também nesta parte, nos termos e ao abrigo do disposto no art. 670.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, a prolação de despacho pelo Meritíssimo Tribunal a quo a reformar a decisão e a correcção de tais vícios da sentença recorrida, e, não o fazendo o Meritíssimo Tribunal a quo, sejam V.ªs Ex.ªs Venerados Desembargadores a suprir tais vícios. Ora,

Inevitavelmente, haverá de dizer-se, também, que a alínea d) do n.° 1 do art. 668.° do Cód. Proc. Civil se conjuga com o art. 660.° do mesmo Código, sendo certo que o n.° 2 deste último normativo se reporta a causas de pedir e a pedidos o que não é confundível com argumentos, considerações ou razões (Ae. RE, de 5.5.1988: BMJ, 377.°-574).

Em todo o caso, as causas de nulidade de sentença ou de acórdão taxativamente enumeradas no art. 668.° do Cód. Proc. Civil não incluem no seu elenco o erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável. A lei só considera nulidade a falta absoluta de motivação ou seja a sua ausência completa. A eventual insuficiência ou mediocridade da motivação constitui uma espécie diferente que não contende com o valor legal da sentença. Para que ocorra nulidade prevista na al. c) do n.° 1 do art. 668.° do Cód. Proc. Civil é necessário que exista uma real contradição entre os fundamentos e a decisão apontando a fundamentação num sentido e a decisão num sentido diferente (Ac. STJ, de 20.6.2000: Sumários, 42.°-21). E o que se vem apreciando assim o configura.

No mais, atento o insistente elemento narrativo processual, já supra considerado despropositado, remete-se, tão só para o que na parte final da resposta anterior se apreciou.

E2) Constituindo tal gasto, na modalidade de dano emergente (art. 564.º, n.º 1, 1.ª parte), um prejuízo patrimonial dos AA. decorrente da actuação ilícita e culposa dos RR., sempre a ele se teria que atender na fixação do montante da indemnização para repor o património dos AA. à situação que existiria não fosse a lesão, como decorre e é imposto pelos arts. 562.º e 566.º, n.ºs 1 e 2 do Código Civil, em cuja violação a sentença recorrida incorreu ao não ter assim decidido. Ademais,

Incontornavelmente, os danos patrimoniais compreendem não só os danos emergentes, isto é, os prejuízos sofridos, ou seja, a diminuição do património do lesado, como também os lucros cessantes, ou seja os ganhos que se frustraram, os prejuízos que lhe advieram por não ter aumentado, em consequência da lesão, o seu património (Ac. RP 19-9-1994:BMJ, 439.°-644). Em decorrência, nos termos dos arts. 562°, 564.° e 566.° do Cód. Civil deve seguir-se de perto a chamada teoria da diferença entre aquilo que o lesado perdeu por causa do ocorrido e o que, natural e previsivelmente, não teria perdido se não tivesse acontecido, nos termos consagrados em probatório (Ac. RL, 23-1-1997: BMJ, 463.°-628).

Consequentemente, colhe resposta afirmativa havendo de considerar-se, outro sim, “o dano da quantia de 1.119,11€ que os AA. despenderam com a emissão do alvará de construção (e cuja licença veio a ser declarada nula e cuja respectiva construção deixou de ser feita) como resultou do facto provado 39”.

F1) O dispêndio do preço de 1698,75€ é um prejuízo patrimonial dos AA. decorrente do incumprimento (pontual e perfeito) das prestações a que os RR. estavam obrigados e que de outra forma não se teria verificado, e a ele deve a indemnização atender nos termos das normas legais dispostas nos arts. 483.º, n.º 1, 798.º, 801.º, n.ºs 1 e 2, 562.º, 563.º e 566.º do Código Civil, em cuja violação a sentença recorrida também incorreu ao ter decidido diversamente. Com efeito,

Na emergência do disposto no art. 483º Código Civil (responsabilidade por factos ilícitos - princípio geral), a frustração da confiança de outrem é de conduzir à obrigação de indemnizar. A responsabilidade pela confiança é parte integrante do direito civil vigente, encontrando fundamento na directiva jurídica pela qual deve responder pelos danos causados aquele que origina a confiança e a frustra. Os réus - ambos os réus -   não podem deixar de responder pelos danos causados, consagrados em probatório, ainda que, até, tivessem agido sem culpa (Cf. Ac. RP, 7-6-2004: CJ, 2004, 3.°-190).

Por sua vez, em função do que se consagra no art. 798º Código Civil (responsabilidade do devedor) proceder de boa fé no cumprimento da obrigação é agir com o maior empenho, lealdade e correcção na realização da prestação a que o devedor se encontra adstrito. O cumprimento defeituoso da obrigação verifica-se não apenas quanto à obrigação de entrega da coisa, mas quanto a toda e qualquer outra obrigação, proveniente do contrato ou qualquer outra fonte. E apenas se dá quando a obrigação realizada pelo devedor não corresponde, pela falta de qualidades ou requisitos dela, ao objecto da obrigação a que ele estava adstrito. No cumprimento defeituoso, os meios de que o credor lesado se pode servir são (além de outros, variáveis de caso para caso) a acção de cumprimento (para obter a prestação devida) e o direito à indemnização dos danos provenientes do cumprimento defeituoso (Cf. Parecer de A. Varela: CJ, 1987, 4.°-21).

Em vertente diferenciada, é discutido se a impossibilidade a que o art. 801º Código Civil (impossibilidade culposa) alude tem de ser uma impossibilidade absoluta, ou se basta uma extrema dificuldade ou onerosidade da prestação (impossibilidade relativa). Enquanto alguns adoptam a primeira destas soluções, entendendo que, para se extinguir a obrigação, é indispensável que a prestação se tenha tornado absolutamente impossível, outros sustentam que à impossibilidade absoluta deve ser equiparada a excessiva dificuldade da prestação atendendo a que o devedor só é obrigado aos esforços e despesas que, segundo a boa fé, lhe são exigíveis para a obtenção do resultado da prestação. Não obstante o Cód. Civil não ter expressamente acolhido as disposições do anteprojecto à excessividade da prestação, não pode concluir-se daí que seja inadmissível essa doutrina, dado que, ainda que tivesse valor decisivo na interpretação das leis a chamada «vontade do legislador» (o que é altamente duvidoso), aquela omissão pode significar apenas ter-se deixado à jurisprudência e à doutrina a posição a tomar nesta matéria.

Quanto a nós, a teoria do «limite de sacrifício», além de imposta pelo princípio da boa fé (art. 762°, n.° 2), é-o também pela interpretação das declarações negociais que fundam a obrigação, não podendo presumir-se que o devedor tenha querido vincular-se a esforços e despesas superiores àquelas que razoavelmente lhe são exigíveis para a prestação. Isto, em princípio; pois, se da interpretação do negócio for de excluir que tal resulta deste, é o devedor obrigado até ao limite de absoluta impossibilidade.

E certo que esta teoria pode dar lugar a insegurança jurídica, mas também o é que essa insegurança não é mais que uma inevitável consequência da variabilidade das situações jurídicas e de interpretação das leis ou das declarações negociais.

Os próprios sequazes da orientação que só atribui relevância à impossibilidade absoluta, introduzem-lhe limitações (Vaz Serra, RLJ, 104.°-214).

De acordo com tal pressuposto, a falta de cumprimento ocorre, designadamente, quando a prestação deixou de ser executada no devido tempo e já não pode ser cumprida e por se ter tornado impossível (arts. 801.º e 802°) (Ac. RL. 13.4.1977:CJ,1977,2º,406).

Como nos Autos, onde se clangora (fls. 299): -

“Por sua vez, também o valor de € 1 698, 75, referido no ponto 16 e no artigo 68.º da PI, correspondente ao preço acordado e pago ao réu J (…) como contrapartida da execução do projecto de construção da moradia, não pode considerar-se abrangido na indemnização por danos patrimoniais, já que constitui um gasto que os autores sempre teriam, sob pena de não poderem sequer submeter o processo à apreciação camarária. Por outro lado, não podemos esquecer que a obrigação decorrente do contrato de prestação de serviços celebrado entre os autores e o réu J (...) é uma obrigação de meios e não de resultado, o que significa que aquele não se comprometeu a conseguir a aprovação do licenciamento, mas tão-só a realizar o trabalho material necessário para esse efeito. Pelo que o facto de o licenciamento não ter sido aprovado não confere aos autores o direito à restituição do preço acordado para a prestação do serviço, mas tão-só o direito a serem ressarcidos dos prejuízos decorrentes da execução daqueles de forma imperfeita ou defeituosa, o que equivale por dizer ao dano contratual positivo ou “in contractu”, cuja reparação visa colocar o lesado na situação em que estaria caso o contrato tivesse sido correctamente cumprido” -

mas que se não acompanha pelas razões abrangentes que se  elencam, em sequência, a pretexto de próacção configurada. Desde logo porque, no que respeita à obstinação, relativamente à invocação dos arts. 562.º, 563.º e 566.º do Código Civil, em termos também de ecologia processual de circunstância refira-se, tão só, continuando a vincular o que anteriormente se disse, - neste contexto - que não se torna necessária uma causalidade directa, basta uma indirecta (o autor da lesão é responsável por todos os factos ulteriores que eram de esperar segundo o curso normal das coisas, ou foram especialmente favorecidos pela conduta do agente quer na sua própria verificação quer a sua actuação concreta em relação ao dano de que se trata) (P. Coelho, Obrigações, 166).

Depois, no propósito sequentemente configurado -

 F2) Sendo certo que as obrigações dos RR. são de meios e não de resultado, a violação (culposa, diga-se) das obrigações verificou-se, antes do próprio resultado (obtenção de licenciamento), na própria execução das suas actividades e serviços (o projecto), i.e. nos próprios meios, como decorre de forma linear e cristalina dos factos provados 8, 11, 12, 13, 14, 15, 28, 29, 30, 33, 34, 35 e 36. Por outro lado, -

 Por outro lado, clarificando, refira-se que obrigação de meios, no domínio do Direito Civil, também chamada obrigação de pura diligência, é aquela em virtude da qual o devedor não fica vinculado a obter um resultado preciso, mas apenas a empregar a diligência necessária no sentido da obtenção desse resultado. Assim, por exemplo, o médico compromete-se tão-somente a fazer tudo para conseguir curar o doente, sem, no entanto, o garantir.

O credor de uma obrigação deste género não pode, em princípio, responsabilizar o seu devedor por ou deficiente execução, a não ser que prove que este último actuou negligentemente, cometendo um erro indesculpável ou não utilizando todos os meios prometidos.

E não sem olvidar que a classificação das obrigações em obrigações de meios e de resultado tem sido muito contestada por grande parte da doutrina, sobretudo com a consideração de que qualquer obrigação pode qualificar-se como obrigação de meios, uma vez que ao devedor é sempre exigível um certo grau de diligência na realização da conduta de vida, e, ao mesmo tempo, todas as obrigações são, embora em medida diversa, obrigações de resultado, já que todas elas tendem para a obtenção de um dado resultado, cuja realização corresponde à satisfação do interesse do credor que as justifica.

A distinção é, pois, tendencial e só pode operar-se em função do carácter mais ou menos aleatório que a consecução do resultado do comportamento debitório assume em relação a este (ANA PRATA, DICIONÁRIO JURÍDICO, 4ª EDIÇÃO ACTUALIZADA E AUMENTADA, 2ª. REIMPRESSÃO DA EDIÇÃO DE MARÇO/2005, com a colaboração de JORGE CARVALHO, 2006, p.818).

O que significa que o valor de € 1 698, 75, referido no ponto 16 e no artigo 68.º da PI, correspondente ao preço acordado e pago ao réu J (…) como contrapartida da execução do projecto de construção da moradia, haverá de ser, necessariamente ressarcido, nos termos que vêm de explanar-se.

Do mesmo modo, o perfil probatório eleito nos Autos torna insusceptível de arredar, efectivamente, como no essencial, vem alegado, que

 F3) Prevendo uma implantação da construção em localização diversa do terreno dos AA. e em terreno que não era dos AA., requerentes do licenciamento, sendo a localização do terreno dos AA. integrável segundo o PDM em zona não urbanizável, o projecto e a sua execução é impossível e totalmente imprestável não tendo qualquer valor, e, por conseguinte, à luz do interesse creditício, verifica-se incumprimento definitivo da prestação ou cumprimento defeituoso de uma tal forma que equivale ao seu total incumprimento. Donde que,

Consequentemente,

F4) Nos termos do (obstinadamente voltado a invocar…) disposto nos arts. 798.º e 801.º, n.ºs 1 e 2, do Código Civil, tem o credor, independentemente de resolução, direito à restituição da prestação que já tiver realizado e a indemnização, fixada nos termos do disposto no arts. 562.º, 563.º e 566.º do Código Civil, há-de repor o credor na situação patrimonial hipotética que existiria não fosse o incumprimento. Aliás,

F5) Como vem defendendo a jurisprudência sobretudo a mais recente, relevante não é a distinção entre dano pelo interesse contratual positivo ou negativo, mas a causalidade juridicamente relevante entre facto ilícito e culposo e o prejuízo, à luz do critério estatuído no art. 563.º do Código Civil. Ora,

F6) Como, atentas as circunstâncias supra expendidas, o projecto executado idealiza a implementação de uma construção impossível ele é imprestável e não tem qualquer valor, tendo os AA. pago por ele quantias no valor de 1698,75€, tal significa que o património dos AA., em troca de um bem de nenhum valor, ficou privado dessas quantias de 1698,75€, que é o valor do prejuízo e do que a indemnização terá que repor; se o facto não tivesse ocorrido, ou os RR. não teria feito o projecto ou teriam feito o projecto de forma correcta e perfeita com o valor do preço que por ele pediram: em qualquer dos casos, o prejuízo do pagamento do preço por um bem sem valor, não se teria verificado, sendo esse valor atendível e relevante para a indemnização.

O que, do mesmo modo, não deixa - precisões feitas e pleonasmos arredados  - de atribuir resposta afirmativa às questões em III.

IV.

G1) Quanto ao dispêndio pelos AA. de 10.000,00€ a favor do empreiteiro para que este iniciasse o desbravamento do terreno e a implantação de alicerces (facto provado 31), para deixar de lhe atender e relevar para o montante da indemnização, a sentença recorrida tece considerações factuais e jurídicas sem qualquer suporte nos factos provados , incorrendo em violação das normas legais dispostas no art. 659.º, n.ºs 2 e 3, do Código de Processo Civil. Todavia,

 G2) Sendo tudo o que vem provado o que consta do facto provado 31, do que não há dúvida é que tal dispêndio configura manifestamente um prejuízo patrimonial, sob a forma de dano emergente, que resultou da actuação dos RR. e que não teria ocorrido não fosse essa actuação, importando uma perda patrimonial nessa mesma valia de 10.000,00€ cuja reposição implica o pagamento de indemnização nesse mesmo valor, devendo por isso ser considerado para o quantum da indemnização como decorre e é imposto pelas normas legais dispostas nos arts. 562.º, 563.º, 564.º, n.º 1 e 566.º do Código Civil, contrariamente ao que em erro de julgamento e violação de tais normas legais decidiu a sentença recorrida. Ademais,

Insista-se que a sentença proferida em processo judicial constitui um verdadeiro acto jurídico, a que se aplicam as regras regulamentadoras dos negócios jurídicos. A interpretação da sentença — enquadrável mesmo na esfera de competência do STJ — exige que se tome em consideração a fundamentação e a parte dispositiva, factores básicos da sua estrutura  (Ac. STJ, de 28.1.1997: Col. Jur./STJ, 1997, 5.°-83). Tanto assim que, na apreciação da prova, o n.° 3 do art. 659.° do CPC apenas comete ao juiz o dever fazer o exame crítico das provas de que lhe cumpre conhecer, o que sucede apenas quanto às que têm valor probatório fixado na lei (documentos exornados de força probatória plena, factos admitidos por acordo ou confissão das partes) para considerar determinados factos como provados (Ac. STJ, de 16.12.2004: Proc. 04B3896.dgsi.Net). O que, limpidamente, aconteceu.

A esse pretexto não pode, pois - neste particular - deixar de se acompanhar o raciocínio expresso em decisório, segundo o qual:

“(…) Finalmente, quanto à entrega de € 10 000,00 ao empreiteiro contratado pelos autores para dar início à construção da obra (cf. ponto 31 e 74.º da PI), se é certo que a mesma representou para os autores uma diminuição no seu património, já não cremos que essa perda possa ser imputada ao réu, na medida em que a obra não chegou a ser iniciada, não tendo sequer sido efectuadas as respectivas marcações e, nessa medida, aquela quantia, que apenas foi entregue ao empreiteiro no pressuposto de a obra vir a ser construída, deveria ter sido restituída. Na verdade, o réu não pode ser prejudicado pela inércia dos autores em fazer valer um direito do qual livremente dispuseram, sendo certo que o acordo firmado entre os autores e o empreiteiro não produz qualquer efeito perante terceiros, neste caso o réu. É que, como é bem sabido, as obrigações têm carácter relativo, vinculando apenas as pessoas que intervieram na sua constituição, pelo que o facto de os autores terem eventualmente combinado com o empreiteiro que a primeira prestação do contrato não carecia de ser restituída não pode, sem mais, produzir efeitos na esfera jurídica do réu, o qual será responsável pelos prejuízos efectivamente causados ao autor, na medida do seu real prejuízo, mas já não pelo pagamento de uma quantia indemnizatória “fictícia” entregue a um terceiro.

Assim, considerando que a execução defeituosa do serviço por parte do réu não foi de molde a prejudicar os autores no que respeita a pagamentos relativos à construção da obra, já que esta não chegou a ter início, aquele montante não será considerado no quantum indemnizatório(…)”.

O que responde negativamente às questões em IV.

V.

H1) Quanto aos e sua compensação, contrariamente ao que se diz na sentença, além dos danos não patrimoniais abalos psicológicos e incómodos pessoais de gravidade não despicienda, verificou-se nos AA. a frustração de expectativas e disposições de vida já em marcha, deixando de poder concluir e habitar a casa que já tinham planeado, licenciado, para a qual já tinham terreno, para a qual contrataram empréstimo e empreiteiro. Donde que,

H2) Atenta tal gravidade não despicienda dos danos, a culpa grave, no mínimo negligência grosseira dos RR., sem que nada venha apurado relativamente às posses dos RR. e relativamente aos AA. sabendo-se que estes tiveram que pedir dinheiro emprestado para construir a casa no valor de 50.000,00€ e que não têm assim grandes posses, impunha-se, nos termos e à luz das normas legais dos arts. 496.º, n.ºs 1 e 3 e 494.º do CC, uma compensação de 2.000,00€ para cada um dos AA. e assim de 4.000,00€ no total, e não, apenas de 500,00€ para cada um dos AA., 1.000,00€ no total, como em erro de julgamento e violação das referidas normas decidiu a sentença recorrida. Assim,

É incontroverso (arts. 496.º, n.ºs 1 e 3 e 494.º do CC) serem indemnizáveis os danos não patrimoniais correspondentes a um «choque moral» provocado ao lesado pela conduta do lesante (Ac.RC, 19-4-1988: BMJ, 376.°-670). Sendo que a indemnização dos danos não patrimoniais visa, simultaneamente, compensar o lesado e sancionar o lesante. Em todo o caso, equidade não é sinónimo de arbitrariedade, mas sim um critério para correcção do direito, em ordem a que se tenham em consideração, fundamentalmente, as circunstâncias do caso concreto (Ac. RE, 13-10-1988: BMJ, 380.°-560).

Neste sentido, ao invés do que no ponto anterior se concluiu, tem-se por adequada, na diegese crítica que os Autos assinalam, na vinculação de tal tipo de danos, uma compensação de 2.000,00€ para cada um dos AA, assim de 4.000,00€ no total.

Configurando como afirmativa a resposta às questões em V.

VI.

 I) Considerando os imputados erros de julgamento da sentença recorrida quanto às questões da responsabilidade solidária de ambos os RR., de responsabilidade solidária destes pelo total dos danos causados, mesmo que existindo concorrência de culpa de outrem, os apontados quanta indemnizatórios que devem ser alterados, mantendo-se os demais valores dos danos considerados pela sentença que não são objecto do presente recurso, deviam como devem agora os RR. ser solidariamente condenados no pagamento aos AA. da quantia de 18.781,95€ dezoito mil e setecentos e oitenta e um euros e noventa e cinco cêntimos) acrescida de juros à taxa legal até efectivo e integral pagamento.

O que vem de dizer-se, acompanhando as expressões quânticas expressas e pretendidas - no que se consegue vislumbrar do elemento narrativo configurado -, assentes na tessitura institucional de protecção jurídica e judiciária agora configuradas, permite, apenas - como é dito -

- mantendo-se os demais valores dos danos considerados pela sentença que não são objecto do presente recurso -,

condenar os RR., solidariamente, no pagamento aos AA. - da quantia de 5.817,86 Euros [alvará = 1.119,11 Euros + execução do projecto de construção da moradia (1.698,75 Euros) + diferença atribuída aos AA. pelos danos não patrimoniais (4.000,00 Euros - 1.000,00 Euros = 3.000,00 Euros), resultantes das importâncias que se entendem, pelas razões expostas, assim serem de ressarcir pelos RR., ambos os RR., aos AA., algebricamente correspondentes.

XxX

Por sua vez, das conclusões - no que ao recurso subordinado da sentença proferida respeita -

impondo-se dizer que, tendo ficado parcialmente vencidas na acção ambas as partes, interposto recurso principal por uma delas, pode a outra, em vez de se limitar a contraditar a argumentação desenvolvida pela recorrente, interpor recurso (subordinado) quanto à parte da decisão que lhe foi desfavorável. Em tal situação, o tribunal superior reaprecia, na sua totalidade, a decisão impugnada (Ac. STJ, de 9.3.2004: Proc. 0254675.dgsi.Net). Com o recurso subordinado a pressupor que as partes recorrentes tenham ficado vencidas, ou seja, que houve uma sucumbência (recíproca) das partes, quer total quer parcial (Ac. RC, de 21.12.2004: Proc. 331 4/04.dgsi.Net). Em todo o caso, quando conhecer do objecto do recurso principal — e tal assim quer o julgue procedente, quer o julgue improcedente —, o tribunal de recurso deve apreciar também o recurso subordinado (Ac. STJ, de 7.4.2005: Proc. 05B205.dgsi.Net); fazendo-o -

 interposto por J (…), já identificado nos autos em epígrafe mencionados e neles Réu, nos termos do disposto no artigo 682.º do Código de Processo Civil, emergem as seguintes questões:

I.

D1)- Do elenco factual dado como apurado na sentença recorrida, e fazendo uma correcta subsunção jurídica do conjunto de prova existente, resulta com clarividência que o facto de apenas uma das plantas, elaborada à escala de 1/25.000, não se encontrar em conformidade com todas as demais constantes do projecto de licenciamento, de acordo com as regras da experiência comum, se mostrou de todo indiferente para a verificação do dano.

D2)- Resultou provado (pontos 50, 21 e 52 da sentença recorrida) o seguinte:

a)- Que “O local onde os autores pretendiam construir a sua moradia era inepto para a construção, por não corresponder a espaço urbanizável.”

b)- Que “A Câmara Municipal tinha elementos para conhecer a circunstância referida em 50.”(sublinhado nosso).

c)- Que “A EDP emitiu um parecer relativo à existência de uma linha de média tensão próxima do prédio dos autores e trocou com a Câmara Municipal de Tábua diversa correspondência acerca da viabilidade de alimentação eléctrica da moradia, bem como da sua construção naquele local por causa da sua proximidade à linha de média tensão.” (sublinhado nosso).

D3)- Na Decisão da Matéria de Facto com a ref.ª: 490257, referiu-se nos presente autos o seguinte:

“...todos os engenheiros civis ouvidos em audiência … referiram, unanimemente, que é visível a “olho nu” a desconformidade entre o local assinado com um ponto vermelho na planta topográfica de fls. 32, à escala 1/10000 relativamente àquele que está indicado, também a vermelho, na planta de fls. 19/316 do processo de obras, à escala de 1/25000.”

“...segundo afirmam expressamente as testemunhas referidas, esta desconformidade era facilmente constatável não só através de uma visita ao local, como também mediante uma comparação entre todas as plantas juntas ao processo , desenhadas a diferentes escalas, sendo que de todas elas, o único ponto divergente é o que se encontra assinalado na planta de fls. 19/316 do processo de obras.” (sublinhado nosso).

D4)- O que deveria ter levado a Meritíssima juíza a quo a concluir, ao contrário do que decidiu, que foi exclusivamente o comportamento da Câmara Municipal de Tábua, ao conceder a aprovação do licenciamento, que foi determinante para a produção dos danos verificados, pois sabendo-se que a desconformidade da planta elaborada à escala de 1/25.000 era facilmente constatável não só através de uma visita ao local, como também mediante uma comparação entre todas as plantas juntas ao processo, desenhadas a diferentes escalas (o que nos leva a concluir que as mesmas não foram analisadas em violação do disposto nos números 1 e 8 do artigo 20.º do Decreto – Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro), e que a Câmara Municipal conhecia concretamente do local porque a EDP trocou consigo diversa correspondência acerca da viabilidade de alimentação eléctrica da moradia, bem como da sua construção naquele local por causa da sua proximidade à linha de média tensão, tendo a Câmara consequentemente elementos para conhecer e conhecendo, como ficou demonstrado, que o local onde os autores pretendiam construir a sua moradia era inepto para a construção, por não corresponder a espaço urbanizável, esta não deveria ter concedido a aprovação do licenciamento, sendo a sua conduta ou comportamento a única causa determinante para a produção dos danos verificados, e não o comportamento do réu.

D5)- A actuação do réu recorrente, nos precisos termos em que se traduziu, em nada contribuiu para produção dos danos verificados na esfera jurídica dos autores, pois estes só se produziram por virtude de circunstâncias supra descritas, alheias ao comportamento do réu e devidas exclusivamente ao comportamento da referida Câmara Municipal, o que deverá conduzir à sua absolvição, pelo que, não se tendo assim considerado e decidido, na prolação da sentença sub judice incorreu-se em erro de julgamento e foram violados preceitos imperativos ao julgador e consagrados nos números 1 e 8 do artigo 20.º do Decreto – Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro, e no artigo 563.º , do Código Civil.

Apreciando, também, diga-se - como se inferirá da leitura sequencial da parte pretérita do Acórdão que se vem desenvolvendo - concatenada com, mais uma vez, inevitável remissão inter-textual expressiva, também como se apreciou em decisório, não poder deixar de se concordar que:

“Na verdade, se, por um lado, não nos restam dúvidas que o comportamento dos réus, enquanto acto impulsionador do erro, foi aquele que mais e com maior peso contribuiu para a falha na apreciação do processo de licenciamento da obra em causa — até porque o erro de sinalização incidiu apenas sobre a planta destinada a aferir da inserção do local pretendido para a construção em zona urbanizável, em conformidade com o PDM — não podemos, por outro lado, desconsiderar a contribuição que a falta de cuidado na análise do processo pelos técnicos da Câmara Municipal acabou por trazer à ocorrência dos prejuízos posteriormente sofridos pelos autores.

Com efeito, assim como competia aos réus cumprir escrupulosamente as regras técnicas com vista a uma indicação correcta do local de construção, bem como a apresentação e sinalização das plantas de forma coerente entre si e em conformidade com a realidade, também à Câmara Municipal incumbia maior zelo e profundidade na análise do processo, por forma a que as desconformidades que vieram a ser constatadas após a aprovação do licenciamento tivessem sido atempadamente detectadas”;

Não obstante, configura-se como inultrapassável a circunstância de, por pedido se entender unicamente a pretensão formulada na conclusão da petição inicial, independentemente de quaisquer factos constantes da parte narrativa deste articulado (Ac. RL, de 20.1.1994: BMJ, 433.°-607). Sempre como a pretensão do autor; o direito para que ele solicita ou requer a tutela judicial e o modo por que intenta essa tutela (a providência judiciária requerida); o efeito jurídico pretendido pelo autor (M. Andrade, Noc. Elementares Proc. Civil, 2.ª ed., 107; ed. 1979, III). É a enunciação da forma de tutela jurisdicional pretendida pelo autor e do conteúdo e objecto do direito a tutelar (ob. cit., 1979, 32»

Este termo pode usar-se em processo no sentido geral de solicitação, manifestação a outra pessoa do desejo de ver praticar certo acto ou certa omissão. Mas quando se fala, em processo civil, de “pedido” está-se, geralmente, a usar a palavra para designar a solicitação do autor de uma actuação judicial determinada (condenação, declaração, execução, etc.), solicitação que está na base do processo (Castro Mendes, Dir. Processual Civil, 1980, 2.°-287). São seus elementos uma pretensão material e uma pretensão processual (ibid.). São pressupostos processuais: a inteligibilidade, a idoneidade e a determinação (ob. cit., 290). Elementos necessariamente condicionadores da actuação processual do juiz, impossibilitado, por isso mesmo, a emissão de qualquer veredicto “ultra vel petitum” como acontece.

No mais, a vinculação à prova produzida e a interpretação decorrente para dizer o Direito sobre o caso concreto, já anteriormente, a este respeito expressa e para a qual se remete, não permite sufragar, tudo visto - ao invés do que vem alegado que:

“A actuação do réu recorrente, nos precisos termos em que se traduziu, em nada contribuiu para produção dos danos verificados na esfera jurídica dos autores, pois estes só se produziram por virtude de circunstâncias supra descritas, alheias ao comportamento do réu e devidas exclusivamente ao comportamento da referida Câmara Municipal, o que deverá conduzir à sua absolvição, pelo que, não se tendo assim considerado e decidido, na prolação da sentença sub judice incorreu-se em erro de julgamento e foram violados preceitos imperativos ao julgador e consagrados nos números 1 e 8 do artigo 20.º do Decreto – Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro, e no artigo 563.º , do Código Civil.

Neste específico interesse (sendo o interesse aquilo que inter est as pessoas e os bens), acrescente-se, precisões efectuadas, que, verificando-se que na sentença recorrida constam os factos e as razões de direito em que o tribunal alicerçou a sua decisão e esta é consequência lógica daquela fundamentação, é evidente que aquela peça processual não está inquinada de qualquer nulidade (art. 668.°, n.° 1, alíneas b), c) e e) do Cód. Proc. Civil,) (Ac. RE, de 22.5.1997: Col. Jur., 1997, 3.°-265).

Permanece, por isso, como atrás, a condenação atribuída (fls.296), onde se conclui (corrigindo), que:

“ a medida da responsabilidade do réu J (…) pelos prejuízos causados aos autores não poderá ir além dos 70 %; (…) deixando claro que ao limitar nesta medida a responsabilidade do(s) réu (s) não se formula (sibi imputat) qualquer juízo, que sempre parecia extravasar o objecto da acção, acerca da responsabilidade civil de terceiros pelos danos causados aos autores, mas tão-só a balizar a responsabilidade do(s) réu(s) pelos danos cuja reparação vem peticionada, em função da medida da sua contribuição para a verificação daqueles, o que sempre implica uma apreciação, no plano da causalidade, acerca da concorrência de outros factores”.

Sendo esta a resposta, integrada com o supra referenciado, às questões colocadas em I.

II.

E7)- Foi o comportamento da Câmara Municipal consubstanciado na aprovação do pedido de informação prévia em total desrespeito pelo o ínsito no artigo 3.º da Portaria n.º 1110/2001, de 19 de Setembro, e na vinculada e consequente aprovação do projecto de licenciamento em violação do disposto nos números 1 e 8 do artigo 20.º do Decreto – Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro, nos moldes já referidos em 43º a 46º, da presente peça recursiva, que por questões de economia processual aqui se dão por reproduzidos, as únicas causas determinantes para a produção dos danos verificados na esfera jurídica dos autores, não permitindo os autos concluir, tanto através da matéria dada como assente na sentença recorrida como pelos documentos juntos aos mesmos, que os danos cuja responsabilidade na sentença recorrida se imputou ao réu recorrente, tenham sido causados pelo seu comportamento ou conduta, ou que o mesmo tenha sido determinante para a sua verificação, uma vez que tal conduta, efectuado o juízo de prognose póstuma subjacente à aplicação da doutrina da causalidade adequada, se revelou de todo indiferente e inadequada à verificação desse resultado, o que deverá conduzir à sua absolvição.

Inquestionável, seguramente, aquilo que vem de dizer-se! Em todo o caso não foram activados mecanismos reactivos e proactivos de parte - v.g. em termos, até, de intervenção de terceiros artº.s. 320,ss.CPC) - que a tal obstassem, colocando, processualmente tal entidade em termos de se tornar, porventura, em tais condições, susceptível, eventualmente, de contingências processuais a determinar - sempre reactivamente e após solicitação de partes -, pelo Tribunal.

O que responde negativamente à questão em II.

III.

F)- Nos termos do disposto no artigo 570.º, n.º 1 do Código Civil, “Quando um facto culposo do lesado tiver concorrido para a produção ou agravamento dos danos, cabe ao tribunal determinar, com base da gravidade das culpas de ambas as partes e nas consequências que delas resultaram, se a indemnização deve ser totalmente concedida, reduzida ou mesmo excluída.”

F1)- Também em virtude desta disposição legal estaria sempre afastada qualquer responsabilidade dos réu recorrente atenta a culpa dos autores, a qual resulta da factualidade dada como provada, pois que foi o autor marido quem figurou como requerente no pedido de informação prévia que deu entrada na Câmara Municipal de Tábua (ponto 9 da sentença recorrida), visando com tal pedido de informação prévia averiguar da viabilidade do projecto para o lugar onde pretendiam construir a moradia, (ponto 26 da sentença recorrida).

F2)- Da análise de tal pedido de informação prévia, cujo original se encontra na pasta anexa a estes autos, no qual figura como requerente o autor marido, e que veio a ser aprovado, por despacho de 6 de Fevereiro de 2002, constata-se claramente que, além do mesmo não ter sido instruído de acordo com o ínsito no artigo 3.º da Portaria n.º 1110/2001, de 19 de Setembro, também os pontos assinalados nas plantas do plano director municipal que o integraram, identificando o lugar onde os autores pretendiam construir a moradia, se encontravam em espaço urbanizável.

F3)- Sabendo o autor marido e tendo obrigação de saber, que os pontos constantes das plantas do plano director municipal que integraram pedido de informação prévia no qual figura como requerente, assinalados em espaço urbanizável, não correspondiam ao local onde possuía a propriedade na qual pretendia construir a moradia, acabou, por culpa sua, por induzir em erro a edilidade o que conduziu à aprovação do pedido de informação prévia, tendo sido esse facto determinante e que levou à sua aprovação pela Câmara Municipal através do despacho de 6 de Fevereiro de 2002 e, evidentemente, à posterior aprovação do projecto de licenciamento da moradia, atento o disposto no artigo 17.º, n.º 1 do Decreto – Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro.

F4)- Tal conduta dos autores sempre determinaria, à luz do ìnsito no artigo 570°, n.º 1 do Código Civil, a exclusão da indemnização em que o réu foi condenado, o que deverá conduzir à sua absolvição.

F5)- A sentença recorrida violou, nesta parte, o disposto nos artigos 17.º, n.º 1 do Decreto – Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro e 570°, do Código Civil, ao não decidir pela a exclusão da indemnização em que o réu foi condenado, pois face à descrita matéria de facto que o Tribunal deu como provada e aos documentos cujo original se encontra na pasta anexa a estes autos, a decisão lógica a proferir seria a da improcedência da acção, pela absolvição do réu do pedido, ao não suceder verifica-se a nulidade da sentença recorrida, uma vez que os fundamentos de facto estão em manifesta contradição com a decisão proferida - cfr. artigo 668.º, n.º 1, al. c), do Código de Processo Civil - devendo nesta parte, ao abrigo do disposto no artigo 712.º, n.º 1 alíneas a) e b), do Código de Processo Civil, ser revogada e sentença e substituída por Acórdão que absolva o réu do pedido.

Inquestionavelmente, para que se verifique conculpabilidade do lesado, justificativa de eventual redução ou exclusão da indemnização nos termos do ars. 570°, n.° 1, do CC, é necessário que a conduta daquele possa considerar-se uma concausa do dano, em concorrência com o facto do responsável (Ac. STJ, 10-3-1998: BMJ, 475 .°-635). Isso resultou provado e foi estabelecido nos termos transactos. De tal decorre, análise feita, nada mais haver a  acrescentar sobre o ponto, nesta sede, mntendo-se como dito  a fixada percentagem de 70% atribuída aos RR.

A culpa, por sua vez, consiste no nexo de imputação ético-jurídica que liga o facto ilícito à vontade do agente, e, sendo assim, ela compreende questões de facto e múltiplas questões de direito. Não pode, pois, dizer-se, sem mais, constituir a culpa só mera questão de direito. Na situação em causa, a culpa dos autores e dos réus (a censura feita a ambos) funda-se no facto de terem devido e terem também podido agir de outra forma, ou seja, de terem agido inconvenientemente, embora lhe tivesse sido possível, com o cuidado exigível, a diligência devida ou, com boa vontade, comportar-se em termos convenientes (precisando-se, ainda, que a obrigação de indemnizar não é uma obrigação pecuniária, um débito pecuniário, mas de uma dívida de valors (Ac. STJ, 15-6-1988: BMJ, 378.°-677).

Em todo o caso - levantada que foi, igualmente a questão -, diga-se que a alteração, pela Relação, da decisão do tribunal de 1ª instância sobre a matéria de facto, só pode verificar-se se ocorrer alguma das situações (excepcionais) contempladas no n.° 1 do art.° 712° e que são as seguintes: a) Se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa ou se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada, nos termos do artigo 685 °-B, a decisão com base neles proferida; b) Se os elementos fornecidos pelo processo impuserem decisão diversa, insusceptível de ser destruída por quaisquer outras provas; e) Se o recorrente apresentar documento novo superveniente e que, por si só, seja suficiente para destruir a prova em que a decisão assentou.

Preceitua-se ainda:

No caso a que se refere a segunda parte da alínea a) do número anterior, a Relação reaprecia as provas em que assentou a parte impugnada da decisão tendo em atenção o conteúdo das alegações de recorrente e recorrido, sem prejuízo de oficiosamente atender a quaisquer outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados (n.° 2).

No nosso direito processual civil acha-se consagrado o princípio da livre apreciação da prova segundo o qual o tribunal aprecia livremente as provas, decidindo os juízes segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto, salvo se a lei exigir, para a existência ou prova de facto jurídico, qualquer formalidade especial, pois neste caso esta não pode ser dispensada (art.° 655°).

O princípio da prova livre (por contraposição à prova legal: prova por documentos, por confissão e por presunções judiciais) vigora no domínio da prova pericial (ou por arbitramento) (art.° 389° CC), da prova por inspecção (art.° 391° CC) e da prova por testemunhas (art.° 396° CC), sendo a prova apreciada pelo juiz segundo a sua experiência, a sua prudência, o seu bom senso, com inteira liberdade, sem estar vinculado ou adstrito a quaisquer regras, medidas ou critérios legais.

Aquele princípio situa-se na linha lógica dos princípios da imediação, oralidade e concentração: é porque há imediação, oralidade e concentração que ao julgador cabe, depois da prova produzida, tirar as suas conclusões, em conformidade com as impressões recém-colhidas e com a convicção que, através delas, se foi gerando no seu espírito, de acordo com as máximas de experiência aplicáveis.

As provas são apreciadas livremente, sem nenhuma escala de hierarquização, de acordo com a convicção que geram realmente no espírito do julgador acerca da existência do facto sendo que, nos termos do art.° 396° do CC, a força probatória dos depoimentos das testemunhas é apreciada livremente pelo tribunal.

Daí que a Relação só possa alterar a decisão sobre a matéria de facto e anular a decisão, excepcionalmente, nas situações acima descritas.

Na sequência do alargamento dos poderes de sindicância da decisão sobre a matéria de facto, por parte da Relação, tem a jurisprudência convergido em determinados parâmetros de intervenção:

- Considerado, desde logo, o preâmbulo do DL 39/95, de 15.02 o recurso não pode visar a obtenção de um segundo julgamento sobre a matéria de facto, mas tão só obviar a erros ou incorrecções eventualmente cometidas pelo julgador.

Depois, não pode o Tribunal da Relação pôr em causa regras basilares do nosso sistema jurídico, maxime, os referidos princípios da livre apreciação da prova e da imediação, sendo inequívoco que o tribunal de 1ª instância encontra-se em melhores condições para apreciar os depoimentos prestados em audiência.

O registo da prova, pelo menos nos moldes em que é processado actualmente nos nossos tribunais — mero registo fonográfico —, não garante de forma tão perfeita quanto a que é possível na 1ª instância, a percepção do entusiasmo, das hesitações, do nervosismo, das reticências, das insinuações, da excessiva segurança ou da aparente imprecisão, em suma, de todos os factores coligidos pela psicologia judiciária e dos quais é legítimo ao tribunal retirar argumentos que permitam, com razoável segurança, credibilizar determinada informação ou deixar de lhe atribuir qualquer relevo.”

O que não obsta, necessariamente, à apreciação crítica da fundamentação da decisão de 1ª instância, não bastando uma argumentação alicerçada em mero poder de autoridade.

Em síntese, e como se decidiu no acórdão da relação de Lisboa, de 12.05.201112: “para que este Tribunal possa atender à eventual divergência quanto ao decidido, no Tribunal recorrido, na fixação da matéria de facto, deverá ficar demonstrado pelos meios de prova indicados pelo Apelante, a ocorrência de um erro na apreciação do seu valor probatório, exigindo-se, contudo e para tanto, que tais elementos de prova sejam inequívocos quanto ao sentido pretendido por quem recorre, pois não podemos ignorar que no processo civil impera o principio da livre apreciação da prova”.

Decorre de todo o exposto - na relevância do que, globalmente, se expôs - a improcedência do recurso da decisão da matéria de facto.

Daí, do mesmo modo, se atribuir resposta negativa às questões em III.º

Podendo, assim, concluir-se, sumariando, que:

1.

 Concorrem os elementos de responsabilidade, ilicitude, culpa e nexo de causalidade quando o administrado agiu - através de outrem - em conformidade com os esclarecimentos prestados pela Administração sobre a interpretação de regulamentos e normativos específicos atinentes à concessão de uma informação (que mais tarde se reconheceu ser tida como errónea), mesmo no circunstancialismo provado fornecida pela entidade pública referenciada (e que foi necessariamente, do mesmo modo causadora dos danos invocados, e contra quem, estranhamente, se não exigiram responsabilidades!...).

2.

O que determina, necessariamente, apreciar, em função, mais uma vez e sempre, do que vem provado que, no domínio da responsabilidade civil por factos ilícitos, basta, para provar a culpa, que o prejudicado possa estabelecer factos que, segundo os princípios da experiência geral, tornem muito verosímil a culpa, na dimensão definida, cabendo ao lesante fazer a contra-prova, no sentido de demonstrar que a actuação foi estranha à sua vontade ou que não foi determinante para o desencadeamento do facto danoso. O que este(s) últimos) não lograram.

3.

 Nos termos do disposto no artigo 86°, n° 5, do Estatuto da Ordem dos Engenheiros, aprovado pelo decreto-lei n° 119/92, de 30 de Junho, “o engenheiro deve procurar as melhores soluções técnicas, ponderando a economia e a qualidade da produção ou das obras que projectar, dirigir ou organizar. O engenheiro deve prestar os seus serviços com diligência e pontualidade, de modo a não prejudicar o cliente nem terceiros, nunca abandonando, sem justificação, os trabalhos que lhe forem confiados ou os cargos que desempenhar” (artigo 87°, n°2, do Estatuto da Ordem dos Engenheiros. As duas previsões legais que se acabam de citar inserem-se no Capítulo III, do Estatuto da Ordem dos Engenheiros, capítulo intitulado “deveres decorrentes do exercício da actividade profissional”.

 4.

A fiscalização exercida pelo director técnico da obra, no que respeita o projecto de estabilidade, visa não só garantir a conformidade da obra executada com o projecto, mas também, necessariamente, garantir condições de segurança para os que trabalham na obra, para os que poderão vir a ocupar a obra, nomeadamente o seu dono e para todos aqueles que possam vir a achar-se em contacto com o edifício construído, O cumprimento do projecto de estabilidade dá garantias de que a construção não virá pôr em perigo todos aqueles que podem vir a ter contacto com a obra ou a estar nas suas proximidades.

5.

Assim, afigura-se que as normas relativas ao regime jurídico de urbanização e aos deveres impostos ao director técnico da obra têm carácter bifronte, na medida em que visam tutelar interesses de ordem pública e colectiva, mas também interesses particulares. Não por acaso, o Sr. Professor Antunes Varela indicava como exemplo de norma de protecção relevante para a modalidade de ilicitude consistente na violação de lei que protege interesses alheios, certas infracções da construção civil. Por isso, ao invés do sustentado na decisão sob censura, afigura-se-nos sustentável juridicamente a afirmação da existência de ilicitude na conduta omissiva imputada ao réu engenheiro.

6.

Ainda assim, sempre se dirá que as normas citadas do Estatuto dos Engenheiros são claras na afirmação de que a imposição dos deveres de diligência e que visam a tutela não só do cliente mas também de terceiros, pelo que também por este prisma, se acaso se confirmar a violação de deveres profissionais por parte do réu, o terceiro prejudicado poderá com tal fundamento normativo intentar a responsabilização do engenheiro incumpridor.

7.

No seguimento do art. 563.º do Cód. Civil a nossa lei acabou por consagrar a teoria de causalidade adequada, segundo a qual uma conduta é causa de um resultado quando este, pelas regras correntes da vida, é consequência directa daquela. Não é, pois, necessário uma causalidade directa bastando uma indirecta que se dá quando o facto não produz ele mesmo o dano mas desencadeia ou proporciona um outro que leva à verificação deste.

8.

Há, naturalmente, que restringir a causa àquela ou àquelas condições que se encontrem para com o resultado numa relação mais estreita, isto é, numa relação tal que seja razoável impor ao agente responsabilidade por esse mesmo resultado, isto é, o agente só responderá pelos danos para cuja produção a sua conduta era adequada. Se o agente produziu a causa donde resultou o dano, sem dúvida que a sua conduta é adequada ao resultado, mesmo que, concomitantemente com a sua conduta, haja a conduta de terceiros a concorrer para esse resultado ou, pelo menos, a não o evitar.

9.

A alínea d) do n.° 1 do art. 668.° do Cód. Proc. Civil se conjuga com o art. 660.° do mesmo Código, sendo certo que o n.° 2 deste último normativo se reporta a causas de pedir e a pedidos o que não é confundível com argumentos, considerações ou razões.

10.

Os danos patrimoniais compreendem não só os danos emergentes, isto é, os prejuízos sofridos, ou seja, a diminuição do património do lesado, como também os lucros cessantes, ou seja os ganhos que se frustraram, os prejuízos que lhe advieram por não ter aumentado, em consequência da lesão, o seu património). Em decorrência, nos termos dos arts. 562°, 564.° e 566.° do Cód. Civil deve seguir-se de perto a chamada teoria da diferença entre aquilo que o lesado perdeu por causa do ocorrido e o que, natural e previsivelmente, não teria perdido se não tivesse acontecido, nos termos consagrados em probatório.

11.

Na emergência do disposto no art. 483º Código Civil (responsabilidade por factos ilícitos - princípio geral), a frustração da confiança de outrem é de conduzir à obrigação de indemnizar. A responsabilidade pela confiança é parte integrante do direito civil vigente, encontrando fundamento na directiva jurídica pela qual deve responder pelos danos causados aquele que origina a confiança e a frustra. Os réus - ambos os réus -   não podem deixar de responder pelos danos causados, consagrados em probatório, ainda que, até, tivessem agido sem culpa.

12.

Por sua vez, em função do que se consagra no art. 798º Código Civil (responsabilidade do devedor) proceder de boa fé no cumprimento da obrigação é agir com o maior empenho, lealdade e correcção na realização da prestação a que o devedor se encontra adstrito. O cumprimento defeituoso da obrigação verifica-se não apenas quanto à obrigação de entrega da coisa, mas quanto a toda e qualquer outra obrigação, proveniente do contrato ou qualquer outra fonte. E apenas se dá quando a obrigação realizada pelo devedor não corresponde, pela falta de qualidades ou requisitos dela, ao objecto da obrigação a que ele estava adstrito. No cumprimento defeituoso, os meios de que o credor lesado se pode servir são (além de outros, variáveis de caso para caso) a acção de cumprimento (para obter a prestação devida) e o direito à indemnização dos danos provenientes do cumprimento defeituoso.

13.

Configura-se como inultrapassável a circunstância de, por pedido se entender unicamente a pretensão formulada na conclusão da petição inicial, independentemente de quaisquer factos constantes da parte narrativa deste articulado. Sempre como a pretensão do autor; o direito para que ele solicita ou requer a tutela judicial e o modo por que intenta essa tutela (a providência judiciária requerida); o efeito jurídico pretendido pelo autor. É a enunciação da forma de tutela jurisdicional pretendida pelo autor e do conteúdo e objecto do direito a tutelar.

14.

Inquestionavelmente, para que se verifique conculpabilidade do lesado, justificativa de eventual redução ou exclusão da indemnização nos termos do ars. 570°, n.° 1, do CC, é necessário que a conduta daquele possa considerar-se uma concausa do dano, em concorrência com o facto do responsável. Isso resultou provado e foi estabelecido nos termos transactos. De tal decorre, análise feita, nada mais haver a  acrescentar sobre o ponto, nesta sede, mantendo-se, como dito,  a fixada percentagem de 70% atribuída a ambos os RR.

15.

A culpa, por sua vez, consiste no nexo de imputação ético-jurídica que liga o facto ilícito à vontade do agente, e, sendo assim, ela compreende questões de facto e múltiplas questões de direito. Não pode, pois, dizer-se, sem mais, constituir a culpa só mera questão de direito. Na situação em causa, a culpa dos autores e dos réus (a censura feita a ambos) funda-se no facto de terem devido e terem também podido agir de outra forma, ou seja, de terem agido inconvenientemente, embora lhe tivesse sido possível, com o cuidado exigível, a diligência devida ou, com boa vontade, comportar-se em termos convenientes (precisando-se, ainda, que a obrigação de indemnizar não é uma obrigação pecuniária, um débito pecuniário, mas de uma dívida de valores).

III. A Decisão:

Pelas razões expostas, concede-se parcial provimento ao recurso (principal) interposto, revogando-se parcialmente a sentença recorrida em segmento que impõe a condenação solidária dos RR, ambos os RR - mantendo-se a percentagem fixada em 70% (!...), - no pleno da responsabilidade plural existente -, a pagar aos AA. a quantia de 5.817,86 Euros [alvará = 1.119,11 Euros + execução do projecto de construção da moradia (1.698,75 Euros) + diferença atribuída aos AA. pelos danos não patrimoniais (4.000,00 Euros - 1.000,00 Euros = 3.000,00 Euros), resultantes das importâncias que se entendem, pelas razões expostas, serem aquelas a ressarcir pelos RR., ambos os RR., aos AA., algebricamente correspondentes, acrescidos de juros de mora, à taxa de 4%, nos termos supra descritos, absolvendo-os dos restantes pedidos formulados, por isso, no mais se mantendo a decisão proferida;

 considerando-se, por sua vez, totalmente improcedente o recurso subordinado.

Custas pelos recorrentes, em proporção, fixando-se a taxa de justiça em 4 UC para os AA. e 6 UC para os RR..

António Carvalho Martins ( Relator )

Carlos Moreira

João Moreira do Carmo