Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
3953/17.6T8LRA.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: VÍTOR AMARAL
Descritores: CONTRATO DE MEDIAÇÃO IMOBILIÁRIA
DEVER DE INFORMAÇÃO
RESPONSABILIDADE CIVIL
Data do Acordão: 12/19/2018
Votação: DECISÃO SUMÁRIA
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA - LEIRIA - JC CÍVEL - JUIZ 5
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTS.342, 483, 485 CC
Sumário: 1. - A violação culposa de dever de informação a cargo de mediador imobiliário, no âmbito da atividade de mediação, perante terceiro interessado, é fonte de obrigação indemnizatória pelo dano causado a esse terceiro.

2. - Cabe ao autor na respetiva ação indemnizatória o ónus da alegação e prova dos pressupostos da obrigação de indemnizar por violação de dever de informar a que aludem os art.ºs 485.º, n.º 2, e 483.º, ambos do CCiv..

3. - Se os autores se convenceram, ao adquirir um imóvel, que a sua área total era substancialmente superior à real (pensaram ser de aproximadamente 3.000 m2), apesar de, em visita ao local, lhes ter sido transmitido, pelo mediador imobiliário, que a área total era de cerca de 1.030 m2, o que estava em conformidade com a documentação do prédio, essa convicção não pode ser atribuída a violação de dever de informação por parte do mediador.

Decisão Texto Integral:
           
                                                            ***
            Recurso próprio, nada obstando ao seu conhecimento.

                                                            ***    

Ao abrigo do disposto no art.º 656.º do Código de Processo Civil atualmente em vigor (doravante, NCPCiv.), o aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26-06 ([1]), segue decisão sumária, face à simplicidade das questões a decidir.

                                                 ***

I – Relatório

G (…) e C (…), ambos com os sinais dos autos,

intentaram ([2]) ação declarativa comum condenatória contra

1.ª - “M (…) Ld.ª”, com os sinais dos autos, e

2.º  - F (…), também com os sinais dos autos,

pedindo a condenação dos RR., solidariamente:

«I) A pagar aos Autores uma indemnização correspondente ao valor de mercado do terreno que julgavam ser seu, no montante de € 44.000,00;

II) Acrescido do pagamento aos Autores de todos os gastos suportados com o referido terreno, a saber:

a) Plantação de diversas árvores de fruto, no montante de € 252,56;

b) Instalação de um sistema de rega gota a gota, no montante de € 108,76;

c) Construção de um muro divisório, no montante de € 3.046,13.

III) Cumulativamente, (…) a indemnizar os Autores a título de danos morais, no valor nunca inferior a € 10.000,00.».

Alegaram, para tanto, em síntese ([3]), que:

- pretendiam adquirir uma moradia e um terreno amplo para plantar árvores e produtos hortícolas e guardar cães, para o que acederam ao portal da “R (…)”, à qual pertence a R. sociedade, e contactaram, nesse âmbito, o 2.º R., indagando de um imóvel com as referidas caraterísticas;

- este R. informou-os estar para venda uma moradia com tais caraterísticas, para o que agendaram uma visita, tendo então o mesmo explicado ser a área da casa com jardim de 370 m2 e que o terreno teria a área de 660 m2 e que se estenderia até ao fundo da rua situada a Este, admitindo, embora, poder não se encontrar registada toda a área, mas que tal poderia ser retificado;

- realizada a escritura de compra e venda do imóvel, tendo os AA. pago a quantia de € 139.000,00, passaram a habitá-lo, definindo espaço para canil, plantando árvores, instalando sistema de rega e construindo um muro;

- posteriormente, foram abordados por terceiro, que afirmou ser o proprietário da quase totalidade do terreno ocupado pelos AA., o que correspondia à realidade;

- os AA. não teriam celebrado o negócio, ou não o teriam celebrado naquelas condições, se o terreno adjacente não tivesse a área que procuravam (a qual julgavam ser de 2.588,81 m2), cujo valor de mercado ascende a € 44.000,00;

- os RR. não cumpriram os deveres a que estavam obrigados no âmbito da atividade de mediação imobiliária que exercem, designadamente deveres de informação, colaboração e lealdade, do que resultaram os danos patrimoniais e não patrimoniais cujo ressarcimento peticionam.

Contestaram, conjuntamente, os RR., concluindo pela total improcedência da ação, para o que alegaram:

- ter o imóvel sido publicitado com as suas caraterísticas reais, nomeadamente com a indicação da área total de 1.000 m2;

- na segunda das visitas efetuadas ao imóvel, os AA. tiveram acesso imediato aos documentos referentes ao mesmo, designadamente caderneta predial urbana e certidão predial, onde consta a mesma área, a qual, como referido pelos próprios AA., lhes foi também indicada pelo 2.º R.;

- a representação errónea dos AA., presumindo que a área a vender abarcava todo o terreno até à construção seguinte, o que implicaria o dobro da área que sempre foi afirmada pelo R. e que constava da documentação que lhes foi entregue, só a eles é imputável.

Dispensada a audiência prévia, foi proferido despacho saneador, com fixação do objeto do litígio e da temática da prova.

Procedeu-se a julgamento, após o que, produzidas as provas, foi proferida sentença ([4]), julgando a ação totalmente improcedente, com absolvição dos RR. dos pedidos formulados.

Da sentença vieram os AA. interpor recurso, apresentando alegação e as seguintes

Conclusões

(…)

Não foi apresentada contra-alegação de recurso.


***

O recurso foi admitido como de apelação, a subir imediatamente e com efeito meramente devolutivo, após o que foi ordenada a remessa dos autos a este Tribunal ad quem.

Nada obstando, na legal tramitação, ao conhecimento do mérito do recurso, cumpre apreciar e decidir.


***

II – Âmbito do Recurso

Perante o teor das conclusões formuladas pela parte recorrente – as quais (excetuando questões de conhecimento oficioso não obviado por ocorrido trânsito em julgado) definem o objeto e delimitam o âmbito do recurso, nos termos do disposto nos art.ºs 608.º, n.º 2, 609.º, 620.º, 635.º, n.ºs 2 a 4, 639.º, n.º 1, todos do NCPCiv. –, importa saber:

a) Se é admissível a impugnação da decisão de facto, ante os moldes em que empreendida, e, caso o seja, se ocorre erro de julgamento de facto da 1.ª instância;

b) Se resulta demonstrada violação de dever de informação a que os RR. estivessem obrigados perante os AA., com consequente obrigação indemnizatória, a ascender ao quantum peticionado.


***

III – Fundamentação

          A) Matéria de facto

É a seguinte a factualidade julgada provada na sentença:

«1- Por título de compra e venda, outorgado no dia 30.06.2014, na 2ª Conservatória do Registo Predial de (...) , os autores declararam comprar e o banco (…) declarou vender, pelo preço de € 139.000,00 o prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de (...) sob o nº 00 (...) descrito na matriz predial urbana da freguesia do (...) sob o artigo nº 11 (...) composto de casa de habitação de um piso e logradouro, sito na Rua (...) , freguesia de (...) , concelho de X (...) , com o valor patrimoniais de € 190.225,82.

2- O prédio referido em 1 encontra-se descrito a favor dos autores na Conservatória do Registo Predial de (...) sob o nº 00 (...) , composto por casa de habitação com um piso e logradouro, com a área total de 1000 m2, sendo de área coberta 383,815 m2 e descoberta de 616,185 m2.

3- Antes da aquisição referida em 1, o prédio encontrava-se inscrito nas Finanças a favor do Banco (…) com o artigo nº 11 (...) e com a área total do terreno de 1.000 m2, área de implantação do edifício de 383,8150 m2, área bruta de construção 383,8150 m2, área bruta dependente 59,5200 m2 e área bruta privativa 324,2950 m2, a confrontar do Norte com (…), do Sul com caminho, do Nascente com (…) e do Poente com (…)

4- Os autores são militares da Guarda Nacional Republicana e antes da aquisição referida em 1, o autor encontrava-se a trabalhar em Lisboa e a autora frequentava o curso de Guardas, em Portalegre.

5- Em Maio de 2014, os autores decidiram adquirir conjuntamente um imóvel composto por casa de habitação e terreno com boas áreas para que aí pudessem plantar algumas árvores de fruto e produtos hortícolas.

6- Com o propósito referido em 5 pesquisaram no site da R (…), no qual encontraram um imóvel que correspondia ao que pretendiam.

7- No referido site vinha a identificação dos réus, que exercem a actividade de mediação imobiliária, pelo que os autores contactaram com o réu indagando da disponibilidade do referido imóvel, ao que aquele informou que o mesmo se encontrava reservado e praticamente vendido.

8- No contacto referido em 7, o autor informou que procurava um imóvel com idênticas características, uma casa com um terreno com boas áreas para que pudesse guardar os seus cães e plantar árvores de fruto, mostrando o réu disponibilidade para o fazer e de que, muito em breve, iria receber uns imóveis da banca e que nessa altura voltaria a contactar os autores.

9- No dia seguinte, pela manhã, o autor foi contactado pelo réu que disse ter encontrado um imóvel que tinha as características pretendidas, uma moradia com bastante terreno, na freguesia de (...) , disponibilizando-se para enviar um ficheiro contendo algumas fotos da moradia.

10- Em data não concretamente apurada, os autores juntamente com o réu fizeram uma visita ao prédio referido em 1, começando por visitar o interior da moradia e no final, num terraço situado nas traseiras da garagem, foi explicado aos autores que a habitação e o jardim envolto teriam cerca de 370 m2 e que o terreno anexo teria 660 m2, o que daria para construir mais duas casas com dimensões idênticas.

11- Após a visita referida em 10, os autores juntamente com o réu, andaram nas imediações do prédio, havendo vegetação alta e densa no mesmo, bem como no prédio limítrofe.

12- Na tarde do dia em que ocorreu a visita, os autores e o réu deslocaram-se ao balcão do B (…) em (...) , a fim de fecharem o negócio e formalizarem o pedido de financiamento para aquisição do imóvel e pagarem a caução exigida para o mesmo.

13- Após a data referida em 1, os autores limparam o terreno e passaram a habitar e a ocupar o imóvel, plantaram diversas árvores de fruto e instalaram um sistema de rega gota-a-gota.

14- Cerca de dois anos após a aquisição referida em 1, os autores ponderaram vender o imóvel, tendo para o efeito contactado os réus que se deslocaram à residência dos autores.

15- Após a situação referida em 14, os autores decidiram construir um muro de vedação em alvenaria, a todo o comprimento do topo Norte do imóvel.

16- Após a construção do referido muro, foram abordados por E (…) que afirmou ser proprietário de parte do terreno que se encontrava dentro dos muros de vedação e que os autores já tinham ocupado com árvores de fruto.

17- Na sequência do facto referido em 16, os autores contactaram com, pelo menos, uma funcionária da ré, tendo feito uma reclamação no livro disponível para o efeito, tendo a mesma sido reenviada à ré pelo Departamento de Qualidade da R (…)

18- Aquando da aquisição referida em 1, os autores julgavam ter adquirido também a área do prédio de que é proprietário E (…), a qual dispõe de 1972 m2.

19- O prédio referido em 18 tem um valor de mercado de cerca de € 44.000,00.

20- O facto referido em 16 causou transtorno aos autores.

21- O imóvel referido em 1 encontrava-se publicitado no site da R (…) como dispondo de uma área bruta privativa de 324 m2 correspondendo a área total do lote a 1000 m2.».

E foi julgado não provado:

«a) Os autores não tinham disponibilidade para procurar um imóvel pelo que decidiram que o mesmo deveria ser mediado por uma empresa do ramo imobiliário;

b) Os autores são conhecedores do notório prestígio e reputação que a R (…) goza no mercado nacional e em particular, no concelho de (...) , atendendo à publicidade de meios físicos e humanos de que dispõe;

c) A pesquisa referida em 6 foi feita no dia 20.05.2014;

d) No decurso do contacto referido em 9, o réu explicou que o imóvel em causa tinha sido hipotecado pelo B (…) e que já haveria bastantes interessados no mesmo, tendo em conta que era um negócio excelente, dada a sua localização e tratar-se de uma construção nova, moderna e com um terreno de grandes dimensões;

e) Na ocasião referida em 10, o réu tenha afirmado que o terreno iria até ao fundo da rua situada a Este;

f) Na ocasião referida em 10, o réu referiu que aquele imóvel era constituído por um único número e que se encontrava delimitado por marcos situados a Oeste, Norte e Este;

g) Na ocasião referida em 11, os autores percorreram o terreno em todo o seu comprimento, no sentido Oeste-Este da Rua (...) até ao cruzamento da Travessa (...) ;

h) Chegados ao cruzamento da Rua (...) e a Travessa (...) , os autores constataram que ali se encontravam depositadas várias pedras, tendo o réu dito que deveriam falar com a vizinha que iria certamente removê-las;

i) Nas ocasiões referidas em 10 e 11, o réu tenha dito que a área total do prédio poderia não estar registada, o que, na sua opinião era normal, podendo, posteriormente ser rectificada;

j) Na ocasião referida em 10, o réu sugeriu que oferecessem menos de cerca de € 2.000,00 em relação ao processo de oferta;

l) O réu argumentou e insistiu que se tratava de um excelente negócio, que já tinha inúmeros interessados e que até havia um senhor que pagaria a casa a pronto;

m) No final da visita os autores assinaram um documento com um questionário de avaliação da visita;

n) Durante o período de tempo em que estiveram na agência do B (…) o telefone do réu, tocou diversas vezes, tendo este afirmado aos autores que havia várias pessoas interessadas e que haviam feito um excelente negócio;

o) Em momento algum o imóvel foi exposto no site da Imobiliária R (…), pois como foi explicado pelo funcionário, após a escritura, “nem demos tempo de o colocar no site”;

p) Na ocasião referida de 10 a 12 os autores, além de sentirem uma elevada pressão por, alegadamente, existir imensa procura relativamente ao imóvel, estavam a viver um período de imensa atribulação na sua vida pessoal;

q) Nesse mesmo dia, a autora C (…) teria de se apresentar pela primeira vez no Posto de (...) para ali iniciar funções;

r) Antes da escritura, o imóvel foi alvo de nova avaliação, tendo sido alterado o valor devido a título de impostos, facto de que os autores apenas tiveram conhecimento no dia agendado para a realização da escritura de compra e venda;

s) Em consequência do facto referido em r), os autores tiveram de providenciar pela obtenção da referida verba, com a qual não contavam, no próprio dia, socorrendo-se do auxílio financeiro daqueles que lhes são próximos;

t) Em Fevereiro de 2016 (no dia de carnaval), a habitação dos autores foi alvo de uma tentativa de intrusão no interior da habitação e conversando com a vizinhança, perceberam que aquele tipo de situações era frequente na zona;

u) Na ocasião referida em 14, os funcionários da ré visitaram o imóvel, elogiando a plantação e aconselhando a construção de uma vedação, cobrindo a totalidade do terreno e da casa, que não só aumentaria as condições de segurança, mas também valorizava, em muito, o valor patrimonial do imóvel;

v) Os funcionários da ré disponibilizaram-se inclusivamente a intermediar uma futura venda, caso essa fosse a vontade dos autores;

x) Na sequência do facto referido em 16, os autores contactaram o B(…), que ficou igualmente surpreso e comprometeu-se a averiguar o sucedido;

z) Os autores também tentaram contactar o réu que não atendeu nem retribuiu as inúmeras tentativas de contacto;

aa) Os Autores decidiram contactar F (…), funcionária da ré, a qual, em face do sucedido, ficou igualmente incrédula e prontificou-se a averiguar a situação;

bb) Contudo, as semanas passaram e os autores continuavam a não obter qualquer detalhe ou informação por parte dos réus;

cc) Aquando da realização do levantamento topográfico, os autores foram abordados pela Sra. (…), vizinha e funcionária no restaurante “(…)”, a qual, confrontada com a notícia de que o terreno não pertencia aos autores, confessou que, em data que não consegue precisar, o Sr. (…) terão ido almoçar ao citado estabelecimento e, nessa ocasião, terão dito expressamente que tinham vendido o imóvel confinante com o prédio da Sra. (…), ou seja, a casa e o terreno;

dd) O réu sempre afirmou aos autores e a terceiros que a área referida em 18 estava incluída no prédio a vender;

ee) O réu, anteriormente ao contacto com os autores, havia informado a potenciais compradores do prédio mencionado em 1, que a área referida em 18 estava incluída;

ff) Se os autores soubessem que a área referida em 18 não estava incluída não teriam feito a aquisição referida em 1, facto que era do conhecimento do réu;

gg) O réu nunca entregou aos autores qualquer documentação ou forneceu qualquer informação que permitisse aos autores consultar o registo predial;

hh) Aquando da visita ao imóvel, os autores tiveram acesso imediato à caderneta predial e certidão predial do imóvel».


***

B) Impugnação da decisão da matéria de facto

Da admissibilidade da impugnação

Não se conformam os AA./Apelantes com a decisão de facto proferida, pugnando pela sua modificação e concluindo, simplesmente, que, alterando a Relação “a factualidade dada como não provada nos pontos enunciados e da[ndo] como provada a factualidade agora referida”, há fundamento para a revogação da sentença e procedência do pedido formulado na ação.

Ao longo das suas conclusões de apelação, os Recorrentes, sem qualquer menção a factos concretos do elenco factual da sentença – quadro dos factos dados como provados [de 1- a 21-] e dos julgados não provados [de a) a hh)] –, pugnam no sentido de a prova produzida permitir uma decisão “diferente, nomeadamente, quanto à conduta do Réu F (…)que induziu os autores em erro, apenas para os levar a adquirir o imóvel a todo o custo” [conclusão D)], R. esse que “violou os seus deveres de prestar informação, clara, correta e verdadeira, ao transmitir aos autores que o imóvel em causa tinha uma configuração que não tinha qualquer adesão à realidade” [conclusão E)], posto que “1000 m2 naquele terreno poderiam ter várias configurações” [conclusão G)], faltando informação “quanto à exata configuração dos 1000m2, para que os compradores pudessem ter uma perceção real do imóvel” [conclusão H)].

E, na mesma senda, insistem em ocorrido “erro de apreciação dos depoimentos das testemunhas” [conclusão I)], sendo “patente” que “os Réus eram desconhecedores das confrontações do imóvel” [conclusão J)] e que “as próprias confrontações estavam incorretas”, por a nascente o imóvel que os Autores compraram não confina[r] com (…), mas antes com (…)” [conclusão L)], o que “induziu igualmente os Recorrentes em erro” [conclusão M)], tendo ficado “provado em sede de prova testemunhal, que não existiam marcos a limitar o prédio” [conclusão N)], não se compreendendo “como é que o tribunal entendeu que os Recorridos não induziram os autores em erro propositadamente” [conclusão Q)], sendo seguro que “os Recorridos não prestaram informação clara, objetiva e verdadeira aos Recorrentes que queriam adquirir um imóvel que tivesse um terreno amplo para a plantação de árvores e de hortícolas” [conclusão S)].

Por se limitarem os Recorrentes, nesta parte, a este arrazoado conclusivo, deve, desde logo, colocar-se a questão da (in)admissibilidade da empreendida impugnação da decisão de facto.

Com efeito, esperava-se que os Apelantes esclarecessem devidamente – nas suas conclusões –, não só quais os factos que, na sua ótica, foram julgados erradamente, como ainda quais as concretas provas que, uma vez criticamente analisadas/valoradas, obrigavam a uma decisão diversa da adotada, no sentido de delimitar, de forma motivada, o âmbito objetivo e probatório da impugnação de facto, devendo, ademais, indicar com exatidão, baseando-se em prova gravada, as passagens da gravação em que se fundassem, sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, procederem à respetiva transcrição ([5]), sem prescindir da expressa indicação do sentido decisório pretendido (a decisão que, a seu ver, deveria ser proferida sobre cada uma das questões de facto impugnadas, como tudo resulta do disposto no art.º 640.º do NCPCiv., que dispõe quanto aos obrigatórios ónus a cargo do recorrente impugnante da decisão de facto).

É que, em sede de impugnação da decisão de facto, cabe ao Tribunal de recurso verificar se o juiz a quo julgou ou não adequadamente a matéria litigiosa, face aos elementos a que teve acesso, tratando-se, assim, da verificação quanto a um eventual erro de julgamento na apreciação/valoração das provas (formação e fundamentação da convicção), aferindo-se da adequação, ou não, desse julgamento.

Para tanto, se o Tribunal de 2.ª instância é chamado a fazer o seu julgamento dessa específica matéria de facto, o mesmo é comummente restrito a pontos concretos questionados – os objeto de recurso, no mesmo delimitados, necessariamente no plano conclusivo –, procedendo-se a reapreciação com base em determinados elementos de prova, concretamente elencados, designadamente certos depoimentos indicados pela parte recorrente.

Como bem explicita Abrantes Geraldes ([6]):

“(…) a) Em quaisquer circunstâncias, o recorrente deve indicar sempre os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões;

(…) d) O recorrente deixará expressa a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, como corolário da motivação apresentada, tendo em conta a apreciação crítica dos meios de prova produzidos, exigência nova que vem na linha do reforço do ónus de alegação, por forma a obviar à interposição de recursos de pendor genérico ou inconsequente, também sob pena de rejeição total ou parcial da impugnação da decisão da matéria de facto; (…)”.

Para depois concluir que a rejeição do recurso quanto à decisão de facto deve verificar-se, para além do mais, nas situações de falta “de especificação nas conclusões dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorrectamente julgados”, tal como de falta “de posição expressa sobre o resultado pretendido relativamente a cada segmento da impugnação”, constituindo, aliás, exigências que “devem ser apreciadas à luz de um critério de rigor. Trata-se, afinal, de uma decorrência do princípio da auto-responsabilidade das partes, impedindo que a impugnação da decisão da matéria de facto se transforme numa mera manifestação de inconsequente inconformismo. Exigências que afinal devem ser o contraponto dos esforços de todos quantos, durante décadas, reclamaram pela atenuação do princípio da oralidade pura e pela atribuição à Relação de efectivos poderes de sindicância da decisão sobre a matéria de facto como instrumento de realização da justiça. Rigor a que deve corresponder o esforço da Relação quando, debruçando-se sobre pretensões bem sustentadas, tenha de reapreciar a decisão recorrida …” ([7]).

Ante este quadro referencial, parece notório – salvo o devido respeito por diverso entendimento – que os Apelantes não observaram um ónus, a seu cargo, estabelecido no art.º 640.º do NCPCiv., na al.ª a) do respetivo n.º 1 – em conjugação com o art.º 639.º do mesmo Cód. –, pois que omitiram, nas conclusões oferecidas, a necessária indicação dos concretos pontos de facto que consideram incorretamente julgados.

Na verdade, deve a parte recorrente apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou a anulação da decisão (art.º 639º, n.º 1, do NCPCiv.), donde que, ao ónus de alegar, sempre acresça o ónus de concluir – sendo as conclusões que definem o objeto e delimitam o âmbito recursivo ([8]) –, com os fundamentos a terem de ser, primeiramente, expostos e desenvolvidos no corpo da alegação, para, depois, serem enunciados e resumidos, em jeito conclusivo, de molde a fundamentar a pretensão recursiva (de alteração ou a anulação da decisão).

            Assim, como vem sendo entendido ([9]), o Tribunal ad quem tem de cingir-se, por regra, às conclusões recursórias para determinar o objeto do recurso: só deve conhecer das questões ou pontos compreendidos nas conclusões, pouco importando a extensão objetiva dada ao recurso no antecedente corpo alegatório, sendo que o que constar das conclusões sem corresponder a matéria explanada nas alegações propriamente ditas, não pode ser considerado e não é possível tomar conhecimento de questões que não estejam contidas nas conclusões das alegações, ainda que versadas no corpo alegatório prévio.

No acervo conclusivo dos aqui Apelantes não são indicados factos concretos que sejam objeto de impugnação recursória, apenas se aludindo, vagamente, na al.ª O) das conclusões, a erro “ao não dar como provado, que o Réu F (…) tinha dito a outros potenciais interessados, que o terreno terminava no final da rua Este e que se poderiam construir duas moradias equivalentes”.

Assim, não é indicado, em sede conclusiva, o objeto fáctico da impugnação, embora se perceba que os impugnantes pretendem a reversão do juízo de não provado, todavia perante um largo quadro fáctico da sentença dado como não provado e que aqueles não identificam/delimitam, antes misturando elementos probatórios com matéria de pendor conclusivo ou valorativo.

Donde que a impugnação de facto não possa, salvo o devido respeito, ser admitida, por incumprimento, mormente na obrigatória sede conclusiva, de importante ónus a cargo da parte recorrente.

Vício este determinante da “imediata rejeição do recurso na respetiva parte”, como dispõe aquele preceito imperativo do n.º 2, al.ª a), do art.º 640.º do NCPCiv. ([10]).

Especificamente sobre o ónus legal aqui inobservado e consequências da respetiva omissão, veja-se ainda o Ac. STJ de 19/02/2015 ([11]), em cujo sumário pode ler-se:

«1. Para efeitos do disposto nos artigos 640.º, n.º 1 e 2, e 662.º, n.º 1, do CPC, importa distinguir, por um lado, o que constitui requisito formal do ónus de impugnação da decisão de facto, cuja inobservância impede que se entre no conhecimento do objeto do recurso; por outro, o que se inscreve no domínio da reapreciação daquela decisão mediante reavaliação da prova convocada.

2. A exigência da especificação dos concretos pontos de facto que se pretendem impugnar com as conclusões sobre a decisão a proferir nesse domínio tem por função delimitar o objeto do recurso sobre a impugnação da decisão de facto.

(…)

4. É em vista dessa função que a lei comina a inobservância daqueles requisitos de impugnação com a sanção da rejeição imediata do recurso, nos termos do artigo 640.º, n.º 1, proémio, e n.º 2, alínea a), do CPC.

5. Nessa conformidade, enquanto que a especificação dos concretos pontos de facto deve constar das conclusões recursórias, já não se afigura que a especificação dos meios de prova nem, muito menos, a indicação das passagens das gravações devam constar da síntese conclusiva, bastando que figurem no corpo das alegações (…)».

Assim sendo, a impugnação da decisão de facto tem de ser rejeitada por lacuna conclusiva quanto ao seu âmbito objetivo fáctico, por falta de indicação dos concretos pontos fácticos impugnados, sem possibilidade de suprimento ([12]).

Mas mesmo que assim não se entendesse e se considerasse que a menção da dita al.ª O) das conclusões é suficientemente indicativa/densificadora da factualidade que se pretendia impugnar nessa parte, nem por isso a impugnação deveria proceder.

Assim, poderia, eventualmente, procurar defender-se ([13]), em sede interpretativa – no que não se concede –, a superação da lacuna conclusiva, fazendo corresponder a menção de que “o Réu F (…) tinha dito a outros potenciais interessados, que o terreno terminava no final da rua Este e que se poderiam construir duas moradias equivalentes” ao que consta da al.ª ee) dos factos dados como não provados.

Com efeito, por um lado, a referência à hipotética construção de “duas moradias equivalentes” ou de “dimensões idênticas” já consta do ponto 10-, parte final, dos factos provados, ponto esse – como qualquer outro do quadro fáctico julgado provado – não objeto de impugnação.

E, por outro lado, daquela al.ª ee) consta, como não provado, que “O réu, anteriormente (…), havia informado a potenciais compradores do prédio (…) que a área referida em 18 estava incluída”, tratando-se, pois, da “área do prédio de que é proprietário (…), a qual dispõe de 1972 m2”.

Ora, como fazer corresponder, face aos dados disponíveis e em sede interpretativa do acervo conclusivo, a menção de que o “terreno terminava no final da rua Este” com a dita “área do prédio de que é proprietário (…), a qual dispõe de 1972 m2”?

Mormente, tendo em conta que está provado, sem impugnação, ter sido prestada informação aos AA., in loco – e numa altura em que AA. e 2.º R., conjuntamente, “andaram nas imediações do prédio, havendo vegetação alta e densa no mesmo, bem como no prédio limítrofe”, portanto, em visita pormenorizada ao local (prédio e imediações) –, no sentido de a habitação e o jardim envolto terem cerca de 370 m2 e o terreno anexo 660 m2 [factos 10- e 11- apurados], perfazendo um total de cerca de 1.000 m2 (não mais de 1.030 m2), muito inferior, pois, em qualquer caso, aos quase 2.000 m2 (mais precisamente 1972 m2) da dita área daqueloutro prédio alheio.

E ainda sobre a área do prédio adquirido em discussão esclarece a factualidade provada – repete-se, sem impugnação alguma e, por isso, tornada definitiva – que se tratava de um prédio inscrito matricialmente com uma área total de terreno de 1.000 m2, com o que se conformava a publicitação da R. sociedade, que aludia a uma área total (do lote) de 1.000 m2 [factos 3- e 21-].

O que, ademais, bem se compatibiliza com o provado sob o facto 2-, isto é, que o prédio adquirido pelos AA. está descrito, no plano registral, como tendo uma área total de 1.000 m2, incluindo, assim, uma área coberta (casa de habitação) de 383,815 m2 e uma área descoberta/sobrante de 616,185 m2.

Bem se compreende, por isso, que não seja viável, desde logo, fazer corresponder a referida menção de que o terreno terminava no final da rua Este com a dita área de 1972 m2 de prédio vizinho/alheio.

E, outrossim, que não seja credível que os AA. fossem recetores de uma informação – e, sobretudo, nela tenham razoavelmente confiado – no sentido de um prédio, que visitaram, com casa de habitação e terreno anexo com uma área total de cerca de 1.000 m2 (dos quais esse terreno ocupava cerca de 660 m2 ), comportar ainda uma área excedente de terreno de 1972 m2, isto é, quase o dobro daquela área total.

Dito de outro modo, explicado, no local visitado, aos AA. o que consta do ponto 10- dos factos provados, não seria credível que lhes fosse também dito – de forma contraditória –, e eles acreditassem (de molde a serem induzidos em erro ou enganados), que, em vez de uma área total de cerca de 1.000 ou 1.030 m2, o prédio abrangesse ainda uma área de terreno de (mais) 1972 m2.

Em suma, tendo de ser rejeitada a impugnação da decisão de facto – que, doutro modo, não poderia proceder –, permanece inalterado o quadro fáctico fixado pela 1.ª instância.


***

C) Substância jurídica do recurso

Da obrigação indemnizatória por violação de dever de informação

1. - Os AA., tendo adquirido e pago o preço de compra de um imóvel de que são proprietários, vieram pedir indemnização no montante total de € 57.407,45, que se subdivide nas seguintes parcelas:

- € 44.000,00, correspondentes ao valor de mercado do terreno que julgavam ser seu;

- € 252,56, por plantação de diversas árvores de fruto no referido terreno;

- € 108,76, por instalação ali de um sistema de rega gota-a-gota;

- € 3.046,13, pela construção de muro divisório; e

- € 10.000,00, a título de danos morais.

Como vincam nas suas conclusões de recurso, assentam a pretensão indemnizatória em responsabilidade civil obrigacional dos RR. por violação de dever de informação, sem o que nem sequer teriam adquirido o imóvel em discussão.

2. - É à luz da factualidade provada (e da não provada) que cabe verificar se estão os Apelados (sociedade imobiliária e seu colaborador, ambos exercendo a atividade de mediação imobiliária) constituídos na obrigação de indemnizar por via de violação, negligente ou dolosa e danosa, do dever jurídico de prestação de informação.

É sabido que a responsabilidade indemnizatória convocada assenta em diversos pressupostos cumulativos necessários: o facto, a ilicitude, a culpa, o dano e o nexo de causalidade entre culpa e dano.

Mas – cabe indagar, desde logo, em sede de ilicitude – houve violação do dever de informar a cargo dos RR./Apelados, imobiliária e seu colaborador?

Na sentença, considerando-se inexistir responsabilidade dos RR. perante os AA. pela via da responsabilidade contratual (a existir contrato de mediação imobiliária, o mesmo foi celebrado entre o banco “B (…)” e a R. sociedade e não com os AA.), foi afastada também a “responsabilidade civil extracontratual” por se ter entendido, em sede de ilicitude, inexistir demonstração de violação de dever de informação ou indução em erro.

Assim se exprime o Tribunal recorrido na respetiva fundamentação jurídica:

«Essencialmente, o que defendem os autores é que, por força do comportamento do réu, foram induzidos em erro, uma vez que julgavam que o prédio, que lhes foi mostrado por aquele, tinha determinada configuração, isto é, abarcava também o prédio que, vieram a saber mais tarde, pertencia a um terceiro e que tinha a área de 1972 m2.

Ora, da factualidade provada não se encontra demonstrada qualquer conduta do réu nesse sentido, sendo aceite pelos próprios autores que o mesmo sempre referiu que o logradouro do prédio tinha 660 m2 (cf. facto 10). Esta área, por sua vez, encontra-se perfeitamente plasmada em toda a documentação referente ao prédio, designadamente da escritura e dos elementos que a acompanhavam.

Desta forma, e perante a informação que lhes foi transmitida quanto à área do prédio, não se percebe como foram induzidos em erro, ao ponto de terem para si que o prédio em questão tinha uma área mais do dobro do que aquela afirmada pelo réu, tanto assim que, atendendo à sua formação profissional, era-lhes exigível que a percepcionassem.

Posto isto, concluímos que apenas aos autores se deve uma falsa percepção das dimensões do terreno, não havendo prova de qualquer facto ilícito praticado pelo réu Fernando, susceptível de fundamentar a responsabilização dos réus, pelo que nos dispensamos, por desnecessária, a apreciação dos demais pressupostos da responsabilidade civil extracontratual.».

Os AA./Recorrentes insistem, por sua vez, na existência de ilicitude por violação do dever de informação.

Vejamos.

3. - Os deveres de informação e proteção da confiança dos ora AA./Apelantes, também a cargo, para além da parte vendedora – aqui não acionada –, dos RR./Apelados (enquanto imobiliária interveniente e emitente de informações e seu colaborador, ambos no exercício da atividade de mediação imobiliária), impunham que estes dispusessem, por sua vez, de um quadro de informação exato/adequado/coerente (não contraditório), por forma a afastar toda a hipótese de erro da sua parte.

Por isso, poderia merecer relevância o apuramento exaustivo do dito quadro de informação de que dispunham os RR./Apelados caso se chegasse à conclusão de que os AA./Apelantes foram vítimas de violação do invocado dever de informação, posto que a pretensão condenatória se reporta a dever indemnizatório por violação culposa de um dever de informação, como tal gerador de um dano, cabendo, por isso, aos Demandantes o ónus da prova dos pressupostos do direito a indemnização (art.º 342.º, n.º 1, do CCiv.).

Ora, produzidas e apreciadas as provas, continua a constar dos factos não provados que:

- algum dos RR. tenha afirmado aos AA. ou a terceiros que a área referida em 18- (os ditos 1.972 m2 excedentes) estava incluída no prédio a vender;

- tenham sido informados potenciais compradores do prédio mencionado que aquela área excedente estava incluída;

- caso os AA. soubessem que essa área não estava incluída, não teriam feito a aquisição do imóvel, o que era do conhecimento do R.;

- este nunca entregou aos autores qualquer documentação ou forneceu qualquer informação que lhes permitisse consultar o registo predial.

E persiste provado, como já referido, o que consta, designadamente, dos pontos 1-, 2-, 3-, 10-, 11- e 21- do quadro fáctico apurado, designadamente que foi prestada explicação aos AA., in loco, quando, com o 2.º R., andaram nas imediações do prédio, em visita pormenorizada ao local (prédio e imediações), no sentido de a habitação e o jardim terem cerca de 370 m2 e o terreno anexo 660 m2, perfazendo um total de cerca de 1.000 m2 (não mais de 1.030 m2), muito inferior, pois, em qualquer caso, aos quase 2.000 m2 (mais precisamente 1972 m2) da dita área do prédio alheio.

Ademais, o prédio encontrava-se inscrito matricialmente com uma área total de terreno de 1.000 m2, com o que se conformava a publicitação da R. sociedade, que aludia a uma área total (do lote) de 1.000 m2.

Tudo elementos que mostravam uma área substancialmente inferior àquela que os AA. pensaram ter adquirido (facto 18-): julgaram ter adquirido um total de aproximadamente 3.000 m2, quando o que resulta lhes ter sido explicado no próprio local é que se tratava de um imóvel com uma área total de 370 m2 + 660 m2 (facto 10-).

Daí que, salvo o devido respeito, só possa concluir-se, como na sentença em crise, que a falsa perceção das dimensões do terreno não é imputável a conduta dos RR., não se mostrando que tenham estes incorrido em violação do dever de informação que sobre eles impendia enquanto no exercício da atividade de mediação imobiliária.

Assim, não vem demonstrada qualquer omissão – ou errónea veiculação – relevante de informação pela R. Imobiliária ou pelo seu co-R., tal como não lograram os AA. provar que só contrataram por terem confiado em informação errónea que lhes tenha sido prestada por tais RR..

Não se demonstra, pois, salvo o devido respeito, a imputada violação relevante de dever de obtenção e transmissão de informação a cargo da imobiliária interveniente no negócio e do seu co-R., que fosse geradora de dever de indemnizar para os RR./Apelados.

Nada, pois, a censurar à decisão recorrida, improcedendo as conclusões em contrário dos Apelantes.

                                                 ***

Concluindo (art.º 663.º, n.º 7, do NCPCiv.):

1. - A violação culposa de dever de informação a cargo de mediador imobiliário, no âmbito da atividade de mediação, perante terceiro interessado, é fonte de obrigação indemnizatória pelo dano causado a esse terceiro.

2. - Cabe ao autor na respetiva ação indemnizatória o ónus da alegação e prova dos pressupostos da obrigação de indemnizar por violação de dever de informar a que aludem os art.ºs 485.º, n.º 2, e 483.º, ambos do CCiv..

3. - Se os autores se convenceram, ao adquirir um imóvel, que a sua área total era substancialmente superior à real (pensaram ser de aproximadamente 3.000 m2), apesar de, em visita ao local, lhes ter sido transmitido, pelo mediador imobiliário, que a área total era de cerca de 1.030 m2, o que estava em conformidade com a documentação do prédio, essa convicção não pode ser atribuída a violação de dever de informação por parte do mediador.  

                             

                                                 ***

IV – Decisão

Pelo exposto, negando-se provimento à apelação, mantém-se a decisão recorrida.

Custas da apelação pelos AA./Apelantes.

                                                  ***

Coimbra, 19/12/2018

Escrito e revisto pelo Relator – texto redigido com aplicação da grafia do (novo) Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (ressalvadas citações de textos redigidos segundo a grafia anterior).

Assinatura eletrónica.


Vítor Amaral ( Relator )


([1]) Cfr. art.ºs 1.º e 8.º, ambos da Lei n.º 41/2013, de 26-06.
([2]) Em 04/10/2017.
([3]) Segue-se, nesta parte, por economia de meios, a síntese do relatório da decisão recorrida.
([4]) Conhecendo de facto e de direito, datada de 08/06/2018.
([5]) Cfr. art.º 640.º do NCPCiv., bem como Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, cit., ps. 126 e segs., e Recursos em Processo Civil, Novo Regime, 3.ª ed., Almedina, Coimbra, pág. 153, e ainda, no mesmo sentido, Luís Correia de Mendonça e Henrique Antunes, Dos Recursos, Quid Juris, Lisboa, págs. 253 e segs.. Vide também Luís Filipe Brites Lameiras, Notas Práticas ao Regime dos Recursos em Processo Civil, Almedina, Coimbra, 2008, pág. 80. No mesmo sentido se tem pronunciado a jurisprudência do STJ, podendo ver-se, por todos, os Ac. desse Tribunal Superior de 04/05/2010, Proc. 1712/07.3TJLSB.L1.S1 (Cons. Paulo Sá), e de 23/02/2010, Proc. 1718/07.2TVLSB.L1.S1 (Cons. Fonseca Ramos), ambos disponíveis em www.dgsi.pt.
([6]) Cfr. Recursos no Novo Código de Processo Civil, cit., ps. 126 e seg., com negrito aditado.
([7]) Cfr. op. cit., ps. 128 e seg., com sublinhado aditado.
               ([8]) Vide, Abrantes Geraldes, op. cit., p. 118.
([9]) Cfr., inter alia, Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, vol. V (reimpressão), Coimbra Editora, Coimbra, 1984, ps. 308 e segs. e 358 e segs., e Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, Código de Processo Civil Anotado, vol. 3.º, Coimbra Editora, Coimbra, 2003, p. 33.

([10]) Como vem entendendo a jurisprudência dominante do STJ, “no âmbito do recurso de impugnação da decisão da matéria de facto, não cabe despacho de convite ao aperfeiçoamento das respectivas alegações” – cfr. Ac. STJ de 09/02/2012, Proc. 1858/06.5TBMFR.L1.S1 (Cons. Abrantes Geraldes), disponível em www.dgsi.pt, com itálico aditado, bem como demais jurisprudência ali citada. No mesmo sentido, à luz do NCPCiv., cfr. Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, cit., ps. 127 e seg..
([11]) Proc. 299/05.6TBMGD.P2.S1 (Cons. Tomé Gomes), disponível em www.dgsi.pt, com itálico e sublinhado aditados.
([12]) Fosse com o que consta da antecedente alegação, fosse já mediante subsequente convite ao aperfeiçoamento.
([13]) De forma sempre problemática e arriscada, como se verá.