Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
3049/20.3T8VIS-A.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: FONTE RAMOS
Descritores: PROVA TESTEMUNHAL
SUBSTITUIÇÃO DE TESTEMUNHA
ADITAMENTO OU ALTERAÇÃO DO ROL DE TESTEMUNHAS
Data do Acordão: 02/01/2022
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: JUÍZO CENTRAL CÍVEL DE VISEU DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE VISEU
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOADA EM PARTE
Legislação Nacional: ARTIGOS 508.º, N.º 1 E 598.º, N.º 2, AMBOS DO CPC
Sumário: I – O pedido de aditamento ou de alteração do rol de testemunhas previsto no n.º 2 do artigo 598.º do CPC não carece de ser fundamento, contrariamente ao que sucede com a substituição de testemunhas prevista no n.º 2 do artigo 508.º do mesmo diploma.

II – Não é admissível o aditamento ao rol de testemunhas requerido dezanove dias antes da efectiva realização da audiência final.

III - A substituição de testemunha deve ser requerida logo que a parte tenha conhecimento do facto que a determina e não apenas em plena audiência de julgamento.

Decisão Texto Integral:






Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

I. Na ação declarativa comum movida por A., S. A., contra B., S. A., a A., em 24.9.2021, veio, nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 598º do Código de Processo Civil (CPC), requerer “o aditamento ao rol de testemunhas” da testemunha C. e a sua inquirição por videoconferência a partir do Tribunal de Lisboa.
A 07.10.2021, pronunciando-se sobre o dito requerimento, o Mm.º Juiz a quo proferiu o seguinte despacho: “Deferido.
Na mesma data, a Ré opôs-se ao aditamento, tendo em conta o preceituado no n.º 2 do referido art.º e porque foi apresentado apenas 19 dias antes da data designada para a audiência de julgamento. Pugnou pela rejeição, ante a sua intempestividade.
No dia seguinte (08.10.2021), a A., invocando, por um lado, a “frustração da notificação da testemunha” D. Decorre do subsequente arrazoado que, nesta concreta invocação, se incorreu em lapso. e, por outro lado, que a testemunha E., indicada no requerimento de prova, “na data designada para a realização da Audiência de Julgamento (...) encontra-se impedida de prestar depoimento em virtude de impedimento pessoal”, veio requerer, “nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 510º do CPC”, “a sua substituição” por F. com “o aproveitamento da videoconferência agendada para o aludido E. a fim de evitar a deslocação da testemunha (...) a esse Tribunal”.
Na audiência de julgamento, de 13.10.2021, o Mm.º Juiz a quo deferiu a requerida substituição Consignou-se em ata o despacho - «Aceito a substituição.» - e que a “#Súmula encontra-se integralmente gravado no sistema áudio Citius#” (sic), mas ante os elementos do processo eletrónico disponibilizados a esta Relação revelou-se impossível aceder a qualquer gravação áudio.; o Exmo. Mandatário da Ré pediu a palavra e declarou opor-se à substituição. No decurso dos trabalhos foi ouvido C., como testemunha, por videoconferência; para “continuação da audiência de julgamento”, designou-se o dia 24.11.2021 (cf. a ata reproduzida a fls. 26 e seguinte).
Inconformada com os referidos despachos, a Ré apelou Por requerimento de 26.10.2021. formulando as seguintes conclusões:
1ª - Em 24.9.2021, a Recorrida juntou aos autos o requerimento com a referência 39946487 solicitando o aditamento ao rol da testemunha C., ao abrigo do disposto no art.º 598º do CPC.
2ª - Como decorre do art.º 248º do CPC, a Recorrente considera-se notificada do mesmo a 27 de setembro, tendo até ao dia 07.10.2021 o direito de exercer o contraditório.
3ª - Nesse dia 07.10.2021, a Recorrente ofereceu aos autos requerimento com a referência 40055747, no qual pugnava pela rejeição do aditamento requerido, em face da sua intempestividade.
4ª - No mesmo dia 07.10.2021, e ainda antes de ter decorrido o prazo para o exercício do contraditório por parte da Ré/recorrente, foi proferido um despacho com a referência 89006460, com a simples menção “deferido”.
5ª - Só no início da audiência de julgamento, em 13.10.2021, a Ré/recorrente se apercebeu que tal deferimento se referia ao pedido de aditamento ao rol, intempestivamente apresentado pela A., dele interpondo o competente recurso, que está em tempo, uma vez que o despacho datado de 08.10.2021 se considera notificado à Ré/recorrente em 11.10.2021.
6ª - O despacho recorrido não acautelou o princípio do contraditório nos termos do n.º 3 do art.º 3º do CPC porquanto o Tribunal a quo deferiu a pretensão da Recorrida sem que a Recorrente tenha tido a possibilidade de sobre ela se pronunciar, omitindo, desta feita, o requerimento através do qual a Recorrente exerceu o seu direito ao contraditório.
7ª - Desta forma, e por esse exato motivo, o despacho recorrido é nulo, por omissão de pronúncia, nos termos do disposto na alínea d) do n.º 1 do art.º 615º do CPC.
8ª - Acresce que, o despacho recorrido, que contém a singela palavra “deferido”, sem mais, é nulo por falta absoluta de fundamentação porquanto não especifica os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão ao abrigo do disposto no art.º 615º n.º 1 alínea b), violando, assim, o disposto no art.º 154º, n.º 1 do CPC.
9ª - Ademais, o requerimento de aditamento ao rol de testemunhas deveria ter sido indeferido por manifesta extemporaneidade porquanto surge 19 dias antes da data da audiência de discussão e julgamento agendada para o dia 13.10.2021, quando a Recorrida teria até 20 dias antes dessa data para o solicitar, ao abrigo do disposto no art.º 598º, n.º 2 do CPC.
10ª - Ao admitir-se o aditamento ao rol de testemunhas sem respeito pelo prazo legal de 20 dias, foi cometida uma nulidade, por violação do disposto no art.º 598º, n.º 2 do CPC.
11ª - Ademais, a inquirição da testemunha aditada, C., na audiência de discussão e Julgamento realizada em 13.10.2021, conduz à nulidade do seu depoimento e à anulação do ulteriormente processado.
12ª - Ao decidir admitir o aditamento ao rol promovido pela A., o despacho recorrido violou a lei e o direito aplicável, designadamente os art.ºs 154º, 3.º n.º 3, e 598º, n.º 2 do CPC, havendo, pois, de concluir pela sua nulidade ao abrigo do disposto no art.º 615º, n.º 1, alíneas b) e d) aplicável aos despachos por força do estatuído no art.º 613º, n.º 3 ambos do CPC, bem como ao abrigo do disposto no art.º 195º, n.º 1 do mesmo diploma, devendo ser revogado e anulados os actos posteriores que dele dependam, in casu, o depoimento da testemunha C. e actos posteriores.
13ª - Em 08.10.2021, a Recorrida ofereceu aos autos o requerimento com a referência 40080053 informando que, em face da impossibilidade de comparecimento da testemunha E. no dia da audiência de julgamento em virtude de impedimento pessoal, solicitava, ao abrigo do art.º 510º do CPC a sua substituição pela testemunha Marco Alves.
14º - A Recorrente pugnou pelo indeferimento da pretensão da Recorrida através de requerimento apresentado em 12.10.2021 Requerimento não junto aos autos de recurso e cuja junção não foi requerida, sendo que também não se juntou certidão do despacho «de designação do dia da audiência de discussão e julgamento de 03.05.2021 (Ref.ª Citius 88006628)» (cf. fls. 12 e 19)..
15ª - Todavia, a pretensão de substituição de testemunha por parte da Recorrida veio, outrossim, a ser deferida através de despacho oral proferido no dia da audiência de discussão e julgamento - 13.10.2021.
16ª - Pese embora o Tribunal a quo tenha entendido que a testemunha substituta F., embora presente nesse dia, não poderia ser inquirida por se encontrar pendente os cinco dias desde a notificação desse despacho de admissão à Recorrente.
17ª - Antolha-se à Recorrente que o pedido de substituição não é mais do que um requerimento de alteração do rol de testemunhas cujo regime consta do art.º 598º, n.º 2, porquanto a norma do art.º 510º do CPC, invocada pela Recorrida, só se aplica quando previamente se verifique o disposto no art.º 508º do CPC que por sua vez só é aplicável em plena audiência de julgamento.
18ª - Com o respeito devido por opinião contrária, afigura-se-nos que o Tribunal a quo errou na determinação da norma aplicável no despacho de admissão de substituição de testemunha e, atendendo à intempestividade do requerimento apresentado pela Recorrida, a pretensão não deveria ter sido deferida – art.ºs 598º, n.º 2 e 154º, n.º 1 do CPC.
19ª - Mesmo que a Recorrida tivesse solicitado ao Tribunal a quo, durante a audiência de julgamento, a substituição da testemunha faltosa – o que não sucedeu – essa pretensão teria de ser indeferida porquanto não alegou e provou qualquer dos fundamentos do n.º 3 do art.º 508 do CPC, ao invés, limitou-se a dizer que a testemunha E. “encontra-se impedida de prestar depoimento em virtude de impedimento pessoal”.
20ª - Acresce que o despacho em crise é desprovido de fundamentação legal porquanto o Tribunal a quo se limitou a aceitar a substituição, admitindo, contudo, que a testemunha substituta não poderia ser inquirida no dia da audiência.
21ª - Nesta conformidade, deve ser revogado o despacho de admissão da substituição da testemunha, por ser nulo ao abrigo do disposto nos art.ºs 615º, n.º 1, alínea b) e 195º do CPC.
Rematou pugnando pela revogação dos despachos recorridos de admissão de meio de prova (aditamento ao rol de testemunhas) e da substituição de testemunha, por nulidade, nos termos do disposto nos art.ºs 195º e 615º, n.º 1, alínea b) do CPC, anulando-se a inquirição da testemunha C. e os atos ulteriormente praticados, e não devendo ser admitida a depor a testemunha substituta F..
A A. respondeu concluindo pela improcedência do recurso.
Atento o referido acervo conclusivo, delimitativo do objecto do recurso, importa reapreciar e decidir, sobretudo, da tempestividade e legalidade dos mencionados meios de prova.
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II. 1. Para a decisão do recurso releva a factualidade (e a tramitação) descrita no relatório que antecede.
2. Cumpre apreciar e decidir com a necessária concisão.
Findo o prazo a que alude o n.º 2 do art.º 598º, assiste ainda à parte a faculdade de substituir testemunhas nos casos previstos no n.º 3; a substituição deve ser requerida logo que a parte tenha conhecimento do facto que a determina (art.º 508º, n.º 1 do CPC Diploma a que pertencem as disposições doravante citadas sem menção da origem., sob a epígrafe “consequências do não comparecimento da testemunha”). A falta de testemunha não constitui motivo de adiamento dos outros atos de produção de prova, sendo as testemunhas presentes ouvidas, mesmo que tal implique alteração da ordem referida na primeira parte do n.º 1 do art.º 512º (n.º 2). No caso de a parte não prescindir de alguma testemunha faltosa, observa-se o seguinte: a) Se ocorrer impossibilidade definitiva para depor, posterior à sua indicação, a parte tem a faculdade de a substituir; b) Se a impossibilidade for meramente temporária ou a testemunha tiver mudado de residência depois de oferecida, bem como se não tiver sido notificada, devendo tê-lo sido, ou se deixar de comparecer por outro impedimento legítimo, a parte pode substituí-la ou requerer o adiamento da inquirição pelo prazo que se afigure indispensável, nunca excedente a 30 dias; c) Se faltar sem motivo justificado e não for encontrada para vir depor nos termos do número seguinte, pode ser substituída (n.º 3).
No caso de substituição de alguma das testemunhas, não é admissível a prestação do depoimento sem que hajam decorrido cinco dias sobre a data em que a substituição à parte contrária foi notificada, salvo se esta prescindir do prazo; se não for legalmente possível o adiamento da inquirição, de modo a respeitar aquele prazo, fica a substituição sem efeito, a requerimento da parte contrária (art.º 510º - n.º 1, com a epígrafe “substituição de testemunhas”). O disposto no n.º 1 não prejudica a possibilidade de o juiz ordenar a inquirição, nos termos do art.º 526º Que assim reza: Quando, no decurso da ação, haja razões para presumir que determinada pessoa, não oferecida como testemunha, tem conhecimento de factos importantes para a boa decisão da causa, deve o juiz ordenar que seja notificada para depor (n.º 1). O depoimento só se realiza depois de decorridos cinco dias, se alguma das partes requerer a fixação de prazo para a inquirição (n.º 2). (n.º 3).
O requerimento probatório apresentado pode ser alterado na audiência prévia quando a esta haja lugar nos termos do disposto no art.º 591º ou nos termos do disposto no n.º 3 do art.º 593º (art.º 598º - n.º 1, com a epígrafe “alteração do requerimento probatório e aditamento ou alteração ao rol de testemunhas”). O rol de testemunhas pode ser aditado ou alterado até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, sendo a parte contrária notificada para usar, querendo, de igual faculdade, no prazo de cinco dias (n.º 2). Incumbe às partes a apresentação das testemunhas indicadas em consequência do aditamento ou da alteração ao rol previsto no número anterior (n.º 3).
3. No n.º 2 do art.º 598º estabelece-se que o rol de testemunhas, inicialmente apresentado (cf. art.ºs 552º, n.º 6 e 572º, alínea d)) ou alterado (cf. os mesmos normativos e o n.º 1 do art.º 598º), pode ser aditado ou alterado até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final. À semelhança do regime consagrado no n.° 1 do art.° 512°-A do CPC de 1961 (na redação conferida pelo DL n.º 180/96, de 25.9), sendo que na redação originária do DL n.º 329-A/95, de 12.12, a matéria da alteração ao rol de testemunhas estava integrada no art.º 512º, nos seus n.ºs 2 e 3; com a revisão do DL n.º 180/96, de 25.9, passou a constituir um preceito autónomo.
O sistema anteriormente vigente, assentando numa tendencial imutabilidade dos requerimentos probatórios, mesmo nos casos em que decorriam largos meses ou anos entre a indicação das testemunhas e a realização da audiência, configurava-se como excessivamente restritivo, «amarrando», sem justificação plausível, a parte a provas indicadas com enorme antecedência - vide (nomeadamente) Lopes do Rego, Comentários ao CPC, Vol. I, Almedina, 2ª edição, 2004, pág. 448.
No entanto, findo aquele prazo de 20 dias, é ainda possível às partes substituir testemunhas, nos termos e casos previstos no art.º 508º (e art.º 510º).
O n.º 2 do art.º 598º não exige qualquer justificação para o aditamento ou a alteração ao rol de testemunhas [apresentado ou já alterado nos momentos próprios aludidos nos art.ºs 552º, n.º 6 e 572º, alínea d)], contrariamente ao art.º 508º, que apenas permite a substituição de testemunha em certos casos pontuais (por exemplo, impossibilidade definitiva da testemunha para depor, posterior à sua indicação).
Naturalmente, o descrito quadro normativo da atividade probatória visa o regular andamento da causa, em harmonia com o direito de ação, sabendo-se que, no processo civil, sendo clara a opção do legislador no sentido da prevalência do fundo sobre a forma Principalmente, desde as últimas décadas, antolha-se indiscutível a supremacia relativa do direito substantivo sobre os puros ritos do direito adjetivo - cf., a propósito, Antunes Varela, in RLJ, 122º, pág. 255.
Garantia de prevalência do fundo sobre a forma, através da previsão de um poder mais interventor do juiz, compensado pela previsão do princípio da cooperação, por uma participação mais ativa das partes no processo de formação da decisão”, como se afirma na parte inicial do Preâmbulo do DL n.º 329-A/95, de 12.12.
No domínio do direito adjetivo tem-se acentuado o papel interventivo do juiz, sobretudo, quando está em causa a descoberta da verdade material – a prova dos factos da causa deixou de constituir monopólio das partes, podendo o juiz realizar ou ordenar oficiosamente as diligências necessárias ao apuramento da verdade (art.º 265º, n.º 3 do CPC de 1961, na redação do DL n.º 180/96, de 25.9/art.º 411º do CPC de 2013), razão pela qual não se afigura defensável, sobretudo neste domínio, a total e irrestrita afirmação do princípio da preclusão e da autorresponsabilidade das partes [cf., a propósito, J. Lebre de Freitas, Introdução ao Processo Civil, Coimbra Editora, 1996, págs. 138 e 145]., tal não significa o postergar de todas e quaisquer exigências de ordem formal. Ainda não é tempo, e porventura nunca o será, de ignorar o ensinamento de Rudolf Von Jhering, segundo o qual “a forma é inimiga jurada do arbítrio e irmã gémea da liberdade”.
Cf., ainda, nomeadamente, o acórdão da RC de 14.7.2010-processo 973/09.8TBVIS-A.C1, publicado no “site” da dgsi.
4. A A. apresentou o aditamento ao rol de testemunhas desrespeitando o termo final para o efeito (“até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final”) Densificando-se, assim, “uma regra de estabilização dos meios de instrução a partir do vigésimo dia que antecede a data em que se realize a audiência final” - vide Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro, Primeiras Notas ao Código de Processo Civil, Os artigos da reforma, 2ª edição, Vol. I, Almedina, 2014, pág. 370., pois a audiência de julgamento em que se deu início à produção da prova - inclusive, com a audição da testemunha (aditada) -, realizou-se a 13.10.2021 Dominando na doutrina e na jurisprudência o entendimento de que se deverá ter por referência a data da efetiva realização da audiência final – cf., quanto à interpretação/aplicação de disposição similar do CPC de 1961, na reforma de 1995/96 (art.º 512º-A), nomeadamente, J. Lebre de Freitas, e Outros, CPC Anotado, Vol. 2º, cit., pág. 390 e C. Lopes do Rego, Comentários ao CPC, Vol. I, 2ª edição, 2004, Almedina, pág. 448 e seguinte; sobre o atual CPC, vide J. Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, CPC Anotado, vol. II, 3ª edição, págs. 241 e 675 e seg. e, de entre vários, o acórdão da RC de 08.9.2015-processo n.º 2035/09.9TBPMS-A.C1, publicado no “site” da dgsi. e aquele aditamento ocorrera 19 dias antes (cf. art.º 279º, alínea b) do Código Civil Que assim reza: «À fixação do termo são aplicáveis, em caso de dúvida, as seguintes regras: (...) b) Na contagem de qualquer prazo não se inclui o dia, nem a hora, se o prazo for de horas, em que ocorrer o evento a partir do qual o prazo começa a correr).
O aditamento ao rol de testemunhas não podia ser admitido atendendo à sua intempestividade (como bem se refere sob a “conclusão 9ª”, ponto I., supra).
Por conseguinte, e tendo-se por prejudicada a apreciação da invocada nulidade do despacho por “falta absoluta de fundamentação” - sabendo-se que se trata de despacho corrente/habitual, proferido, obviamente, no pressuposto de que o seu objeto é do inteiro conhecimento das partes e se verificam os requisitos/pressupostos para o atendimento do requerido -, dúvidas não restam de que importa revogar o despacho recorrido de 07.10.2021, com a consequente anulação do processado posterior conforme a previsão do art.º 195º, n.ºs 1 e 2 Preceitua-se no referido art.º: «Fora dos casos previstos nos artigos anteriores, a prática de um ato que a lei não admita, bem como a omissão de um ato ou de uma formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa (n.º 1). Quando um ato tenha de ser anulado, anulam-se também os termos subsequentes que dele dependam absolutamente; a nulidade de uma parte do ato não prejudica as outras partes que dela sejam independentes (n.º 2).»
Na doutrina e na jurisprudência firmou-se o seguinte entendimento: “se a (pretensa) nulidade está coberta por uma decisão judicial (despacho) que ordenou, autorizou ou sancionou o respetivo acto ou omissão, (…) o meio próprio para a arguir não é a simples reclamação, mas o recurso competente a interpor e tramitar como qualquer outro do mesmo tipo. É a doutrina tradicional, condensada na máxima: ´dos despachos recorre-se, contra as nulidades reclama-se`.”
No caso em apreço a (pretensa) nulidade invocada ficou coberta (consumada/integrada) pela decisão recorrida, pelo que o recurso deduzido era o meio processual adequado para contra ela reagir - neste sentido, cf., nomeadamente, Alberto dos Reis, CPC Anotado, Vol. V (reimpressão), Coimbra Editora, 1984, pág. 424; Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, 1979, pág. 183 e Antunes Varela, e Outros, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 1985, pág. 393 e, de entre vários, os acórdãos da RP de 23.3.2020-processo 16238/15.3T8PRT-A.P1 e da RL de 09.10.2014-processo 2164/12.1TVLSB.L1-2 e 23.10.2018-processo 1121/13.5TVLSB.L1-1, publicados no “site” da dgsi. .
5. Relativamente ao despacho que deferiu a substituição de testemunha, afigura-se que nada existe nos autos que permita concluir pela ilegalidade e/ou intempestividade do correspondente requerimento apresentado pela A..
A A. alegou que a testemunha E., indicada no requerimento de prova, “na data designada para a realização da Audiência de Julgamento encontra-se impedida de prestar depoimento em virtude de impedimento pessoal”; no dia da dita audiência, não compareceu.
Reza a lei que a substituição deve ser requerida logo que a parte tenha conhecimento do facto que a determina (art.º 508º, n.º 1) Expressão legal igual à de anteriores codificações - art.º 634º, § 4º do CPC de 1939 e art.º 629º, n.º 1, 2ª parte, do CPC de 1961., - não, necessariamente, em plena audiência de julgamento, mas deve sê-lo logo que a parte, conhecido o facto, esteja em condições de requerer a substituição Vide, nomeadamente, J. Lebre de Freitas, e Outros, CPC Anotado, Vol. 2º, Coimbra Editora, 2001, pág. 557 e Alberto dos Reis, CPC Anotado, Vol. IV (reimpressão), Coimbra Editora, 1987, pág. 404.
Discorda-se, pois, da posição defendida no acórdão da RP de 21.10.2020-processo 3423/19.8T8AVR-A.P1 [assim sumariado: «I – O regime de substituição de testemunhas, previsto no artigo 508º do CPC é apenas aplicável no decurso da audiência de discussão e julgamento. II – Admitir a substituição de testemunhas a apresentar, não identificadas, requerida seis dias antes da data agendada para a audiência de julgamento, seria um mero expediente para o seu adiamento, sem fundamento legal.»], citado na alegação de recurso e publicado no “site” da dgsi. - faculdade que se poderá exercer, nomeadamente, ocorrendo impossibilidade definitiva para depor, posterior à sua indicação ou impossibilidade de comparecer por outro impedimento legítimo (n.º 3, alíneas a) e b)), não se estabelecendo quaisquer exigências formais quanto à prova da impossibilidade, pelo que, em geral, bastará a simples invocação duma das situações que a lei prevê (não afastada ou infirmada por quaisquer outros factos, suscetíveis de corporizar eventual utilização distorcida ou patológica de tal mecanismo) e a observância dos demais requisitos de ordem adjetiva.
Ante o alegado e os elementos disponíveis, a “substituição” por F. - com “o aproveitamento da videoconferência agendada para o aludido E. a fim de evitar a deslocação da testemunha (...) a esse Tribunal” -, foi admitida respeitando-se a exigência de a mesma não poder ser ouvida sem que hajam decorridos cinco dias (sobre a data em a foi notificada da substituição - art.º 510º, n.º 1, 1ª parte), pois a parte contrária não prescindiu do aludido prazo. Na alegação de recurso, a Ré afirmou que, no seu requerimento de 12.10.2021 [cf. “nota 4”, supra], «enfatizou não prescindir do prazo de 5 dias fixado no art.º 510º, n.º 1 do CPC para que a prestação do depoimento fosse admissível e pugnou pela inadmissibilidade da impetrada substituição», o que, diga-se, não é contrário ao alegado, por exemplo, nos pontos 30. a 32. da fundamentação da resposta à alegação de recurso: «30. Ora, a Recorrente, no requerimento de 12.10.2021, não se opôs, em concreto, à substituição de testemunha. / 31. Apenas alegou que não se encontravam decorridos os cincos dias previstos no art.º 510º do CPC (que, diga-se, no momento de apresentação do aludido requerimento, entendeu como aplicável), alegando que não prescindia de tal prazo, /32. Concluindo que deveria então tal substituição ficar sem efeito, por inexistir possibilidade de adiamento da inquirição, no seu entendimento.»
O despacho de 13.10.2021 respeita os requisitos/pressupostos legais. Não se podendo concluir, como a Ré/recorrida, que “o nominado pedido de substituição não passou de um pedido de alteração ou aditamento ao rol, o qual, de harmonia com o plasmado no n.º 2 do artigo 598º do CPC, deveria ter sido apresentado até 20 dias antes da data da realização efetiva da audiência final”.
6. No que concerne à alegada “falta absoluta dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão ao abrigo do disposto no art.º 615º, n.º 1, alínea b) do CPC”, dir-se-á, apenas, que, relevando igualmente o expendido em II. 4., supra, o Mm.º Juiz a quo não deixou de ponderar os fundamentos de facto e de direito invocados pelas partes, deferindo o requerido por considerar verificados os requisitos de que a lei faz depender o atendimento da requerida substituição.
7. A Ré exerceu plenamente os seus direitos adjetivos, inclusive, aqueles inerentes à estrutura dialética ou polémica do processo Vide Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, 1979, pág. 379. (art.º 3º).
8. O demais invocado na alegação e na resposta não está contido no âmbito das questões decididas e submetidas à reapreciação desta Relação - assim, designadamente, a concreta conformação da realidade e a (pressuposta e eventual) atuação a que se alude em II. 4., in fine, supra. Contudo, sempre se dirá que, na alegação, a Ré afirma que «o Código de Processo Civil contém diversos preceitos legais que permitem contrabalançar o regime do artigo 598º n.º 2, obviando a eventuais iniquidades decorrentes dos mecanismos de preclusão, como é o caso do disposto no artigo 526º, n.º 1 do CPC», perspetiva de algum modo corroborada, pela A., nos pontos 13 e seguintes da fundamentação da resposta à alegação de recurso, sabendo-se que a inquirição por iniciativa do tribunal prevista no n.º 1 do art.º 526º do CPC é um poder-dever do juiz e deve ter lugar sempre que, com base em elementos objetivos colhidos nos autos, haja razões para presumir que determinada pessoa tem conhecimento de factos importantes para a decisão da causa.
9. Procedem, desta forma, parcialmente, as “conclusões” da alegação de recurso.
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III. Pelo exposto, julga-se parcialmente procedente o recurso de apelação e, em consequência, revoga-se o despacho de 07.10.2021, com as consequências indicadas em II. 4, supra, e confirma-se o despacho de 13.10.2021.
Custas por A. e Ré, em partes iguais.
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01.02.2022