Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
109/12.8TACNT.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: JORGE FRANÇA
Descritores: REQUISITOS DA SENTENÇA
FUNDAMENTAÇÃO
NULIDADE DA SENTENÇA
Data do Acordão: 10/11/2017
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COIMBRA (SECÇÃO CRIMINAL DO JUÍZO LOCAL DE CANTANHEDE)
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTS. 374.º, N.º 2, E 379.º, N.º 1, AL. A), DO CPP
Sumário: I – A exigência legal de fundamentação imposta no n.º 2 do art. 374.º do CPP só estará cumprida se a sentença, reportando-se à matéria constante da acusação ou da pronúncia, da contestação, do pedido cível, e ainda à matéria factual, relevante, decorrente da discussão da causa, descrever os factos considerados provados e não provados.

II – Não respeita aquela disposição legal, padecendo a sentença da nulidade prevista no artigo 379.º, n.º 1., al. a), do CPP, o uso da seguinte forma tabelar: não se provaram «todos os demais factos alegados na acusação, pedido civil e contestação, que se dão por integralmente reproduzidos…».

Decisão Texto Integral:


ACORDAM NA SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA

No Juízo Local Criminal Secção Criminal de Cantanhede, Comarca de Coimbra, no Processo Comum (singular) que aí correu termos sob o nº 109/12.8TACNT, foi a arguida A... , submetida a julgamento, acusada pela prática um crime de subtracção de menor, p.p. pelo artº 249º, 1, c) do Código Penal.

O assistente B... deduziu pedido de indemnização civil, pedindo a condenação da arguida a pagar-lhe a quantia de 30.000 euros, a título de indemnização por danos não patrimoniais.

            Efectuado o julgamento, viria a ser proferida sentença, absolvendo a arguida da acusação e bem assim do pedido civil e condenando o assistente nas custas do processo.

Inconformados, recorreram o MP e o assistente, retirando cada um deles as seguintes conclusões da motivação do respectivo recurso:

MP:
1. A sentença recorrida é nula, nos termos do disposto no artigo 379.º n.º 1, alínea a), do Código de Processo Penal, por referência ao n.º 2 do artigo 375.º do mesmo diploma legal, uma vez que não enumerou os factos não provados, tendo feito uma remissão genérica para “todos os demais factos alegados na acusação, pedido cível e contestação, que se dão por integralmente reproduzidos, ao abrigo do princípio da economia processual”.
2. Não faz parte dos elementos típicos do crime de subtracção de menor, previsto e punido pelo artigo 249.º, n.º 1, alínea c), a existência de uma decisão transitada em julgado que julgue verificado o incumprimento, proferida pelo Tribunal de Família e Menores, exigindo-se tão-só, no que a esse assunto diz respeito, a existência de um regime de regulação do exercício do exercício das responsabilidades parentais, proferido ou homologado pelo Tribunal.

Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente e consequentemente ser declarada nula a sentença proferida e substituída por outra que enumere os factos não provados e condene a arguida A... pela prática do crime de subtracção de menor, previsto e punido pelo artigo 249.º, n.º 1, alínea c), do Código Penal. como é de JUSTIÇA!

ASSISTENTE:
1.º Em processo comum, com intervenção do Tribunal Singular, a arguida A... , ora Recorrida, foi absolvida, como autora material, na forma consumada, de um crime de subtracção de menor, p. e p. pelo art.º 249.º n.º 1 alínea c) do Código Penal e foi julgado improcedente por não provado o pedido civil formulado pelo assistente B... e, consequentemente, absolvida a arguida do pedido por este formulado.

2.º O Recorrente não se conforma com a decisão proferida nos autos por padecer a mesma de vícios insanáveis e inultrapassáveis; por incorrer em erro de julgamento de facto e de direito; e por ter sido julgado improcedente o pedido de indemnização civil formulado pelo Assistente.

3.º A sentença recorrida incorreu na nulidade prevista no artigo 379.º, n.º 1, alínea c) do CPP: o Tribunal a quo errou no julgamento da matéria de facto, quer na apreciação da prova produzida, vício contemplado na alínea c) do n.º 2 do art.º 410.º do Código de Processo Penal, quer por a prova existente nos autos e a produzida em audiência de julgamento imporem uma decisão diversa quanto à matéria de facto dada como provada e não provada (n.ºs 3, 4 e 6 do art.º 412.º do Código de Processo Penal) impugnando-se por isso no presente recurso, a matéria de facto.

4.º A decisão recorrida não imputou factos (que foram dados como provados) à Recorrida, o que configura uma manifesta omissão de apreciação e decisão sobre factos alegados pela acusação que deveria conhecer, sendo tais factos relevantes para a decisão da causa, porquanto consubstanciam tais factos o preenchimento dos elementos objectivos e subjectivos do crime de subtração de menor, pelo qual a Recorrida vinha acusada, incorrendo, dessa forma, a decisão Recorrida, na nulidade contemplada na al. c) do n.º 1 do art.º 379.° do CPP relativamente aos seguintes factos:
a) Quanto às férias de verão de 2011 a comunicação foi efectuada pelo assistente sem respeitar o pré-aviso fixado e relativamente às férias de Verão de 2012 a arguida não concordou com a marcação efectuada pelo assistente, por ocupar quase todo o mês de Agosto;

b) Desde que foi estabelecido o acordo até ao final de Dezembro de 2011 o menor esteve com o pai, pelo menos, dois fins-de-semana completos e dois incompletos e das quintas-feiras previstas para 2011 pelo menos por três vezes o menor esteve com o seu pai.

c) No dia de aniversário do menor a 18-11-2011, o pai não esteve com o filho, tendo a arguida via email solicitado ao pai que fosse almoçar com a criança, para este não faltar às actividade, mas o assistente não acedeu e insistiu em ir jantar com a criança.

d) No dia 1-12-2011 (5ªf), o assistente, dirigiu-se a casa da arguida para ver o filho e jantar com ele, e chamou pelo intercomunicador, mas ninguém atendeu.
e) Nos dias 1-09-2011 (5ªf), 4-09-2011 (dom) pelas 19h00, 4-12-2011 (dom) 8-12-2011 (5ª), pelas 19h00, 10-12-2011 (sab) pelas 10h00, o assistente foi a casa da arguida para ir buscar o menor, sendo que umas vezes ninguém atendeu outras o menor recusou ir.
f) No dia 16-12-2011, e nos dias seguintes, o assistente procurou sucessivamente a arguida para gozar o período de férias de Natal com o seu filho, mas o filho não foi de férias com o pai.
g) No dia 1-07-2012, pelas 10h00 e 16h00, o assistente, voltou a dirigir-se a casa da arguida, para ir buscar o filho, após anteriores contactos, mas ninguém atendeu.
h) No dia 2-07-2012, o assistente, contactou telefonicamente com o menor e com a arguida pelas 14h32. Contudo, tal regime de visitas não foi cumprido.
i) O menor não foi de férias com o pai no verão de 2013.


5.º Os referidos factos deveriam ter sido provados tal qual como constam na acusação, ou seja, com uma imputação subjectiva dos mesmos à Recorrida, porque esta era a parte que estava obrigada ao cumprimento do acordo celebrado no âmbito do processo n.º 348/11.11.9TBCNT do 1.º Juízo do Tribunal Judicial de Cantanhede, relativo à Regulação das Responsabilidades Parentais.

6.º A decisão recorrida padece do vício de erro notório na apreciação da prova, nos termos do disposto no artigo 410.º, n.º 2, alínea c) do CPP, porquanto deveriam ter sido considerados como provados os seguintes factos:
a) Sucede que a arguida não incute no menor a necessidade e os benefícios do convívio com o seu pai o assistente, para o seu desenvolvimento saudável, nem lhe transmite a importância da figura parental.
b) Mais apresenta uma ligação fusional com o seu filho, caracterizada por limites muito ténues que dificultam a autonomia, quer da mãe quer do filho e subsequente tentativa de anulação da figura do pai na vida do menor.
c) Mais a arguida não estimula o menor para se relacionar com o pai, quer contrariando atitudes menos adequadas do filho em relação ao progenitor, quer apresentando uma imagem positiva do pai ou apoiando e orientando os convívios entre os dois.
d) Mais permite que o menor se negue a estar com o progenitor, e desculpabiliza as suas atitudes para com o seu pai.


7.º O facto considerado provado Quanto às férias de verão de 2011 a comunicação foi efectuada pelo assistente sem respeitar o pré-aviso fixado e relativamente às férias de Verão de 2012 a arguida não concordou com a marcação efectuada pelo assistente, por ocupar quase todo o mês de Agosto, deveria ter sido considerado não provado e deveria ter sido considerado provado que A arguida não deu qualquer resposta quanto à marcação de férias de verão de 2011, do assistente com o menor, que por isso não gozou qualquer dia de férias com o seu filho. Quanto às férias de verão de 2012, a arguida recusou a marcação efectuada pelo assistente.

8.º Quanto ao facto Desde que foi estabelecido o acordo até ao final de Dezembro de 2011 o menor esteve com o pai, pelo menos, dois fins-de-semana completos e dois incompletos e das quintas-feiras previstas para 2011 pelo menos por três vezes o menor esteve com o seu pai, o mesmo deveria ter sido considerado provado tal como consta na acusação, substituindo-se as expressões “pelo menos”, por outras que atestem a insuficiência de contactos, ao contrário da suficiência de contactos que aquela expressão indicia; tal facto deveria ter a seguinte redacção: Desde que foi estabelecido o acordo até ao final de Dezembro de 2011, dos 17 fins de semana previstos, o menor só esteve com o pai dois fins-de-semana completos e dois incompletos, sendo que de 11 de Julho de 2011 a Janeiro de 2012, o menor não esteve mais de 90 minutos com o pai e sempre com a presença da arguida.Das 17 quintas-feiras previstas para 2011, só por três vezes o menor esteve com o seu pai.

9.º No facto considerado provado No dia de aniversário do menor a 18-11-2011, o pai não esteve com o filho, tendo a arguida via email solicitado ao pai que fosse almoçar com a criança, para este não faltar às actividade, mas o assistente não acedeu e insistiu em ir jantar com a criança deveria ter sido considerado não provado que tendo a arguida via email solicitado ao pai que fosse almoçar com a criança, para este não faltar às actividades, mas o assistente não acedeu e insistiu em ir jantar com a criança e provado que No dia de aniversário do menor a 18-11-2011, o pai não esteve com o filho, porque a arguida não entregou o menor ao assistente para jantar consigo.

10.º No facto considerado provado No dia 1-12-2011 (5ªf), o assistente, dirigiu-se a casa da arguida para ver o filho e jantar com ele, e chamou pelo intercomunicador, mas ninguém atendeu, ao invés de “ninguém atendeu”, deveria ter sido considerado provado que “a arguida não respondeu”.

11.º No facto considerado provado Nos dias 1-09-2011 (5ªf), 4-09-2011 (dom) pelas 19h00, 4-12-2011 (dom) 8-12-2011 (5ª), pelas 19h00, 10-12-2011 (sab) pelas 10h00, o assistente foi a casa da arguida para ir buscar o menor, sendo que umas vezes ninguém atendeu outras o menor recusou ir, em vez de “sendo que umas vezes ninguém atendeu outras o menor recusou ir”, deveria ter sido considerado provado que “mas a arguida não respondeu.”

12.º No facto considerado provado No dia 16-12-2011, e nos dias seguintes, o assistente procurou sucessivamente a arguida para gozar o período de férias de Natal com o seu filho, mas o filho não foi de férias com o pai, em vez de mas o filho não foi de férias com o pai, deveria ter sido considerado provado que “o assistente procurou sucessivamente a arguida para gozar o período de férias de Natal com o seu filho, mas esta não entregou o menor.”

13.º No facto considerado provado No dia 1-07-2012, pelas 10h00 e 16h00, o assistente, voltou a dirigir-se a casa da arguida, para ir buscar o filho, após anteriores contactos, mas ninguém atendeu, em vez de mas ninguém atendeu, deveria ter sido considerado provado “mas a arguida não respondeu”.

14.º No facto considerado provado No dia 2-07-2012, o assistente, contactou telefonicamente com o menor e com a arguida pelas 14h32. Contudo, tal regime de visitas não foi cumprido, ao invés de Contudo, tal regime de visitas não foi cumprido, deveria ter sido considerado provado “ Contudo, a arguida recusou-se a entregar o menor.”

15.º No facto considerado provado O menor não foi de férias com o pai no verão de 2013, deveria ter sido acrescentado “porque a arguida não entregou o menor.”

16.º Deveriam ter sido considerados não provados os seguintes factos:
a) Nesse dia à noite, a vizinha foi ver como estava o C... depois da visita, e foi encontrá-lo a chorar, agarrado à mãe, tendo a criança contado que tinha estado todo o dia em casa, com as janelas fechadas, a jogar Play Station, enquanto o pai lia, até que conseguiu abrir uma janela e gritar por “socorro” na varanda.
b) No dia de aniversário do assistente, a 22-12-2011, às 19h a criança recusou-se a ir jantar com o pai, não obstante a insistência da mãe e dos irmãos. Depois destes últimos se terem ido embora, a mãe juntamente com a vizinha, continuou a tentar persuadi-lo a ir e, a fim de desbloquear o problema, a arguida acedeu à condição imposta pelo C... de o levar e ficar no restaurante, não aceitando todavia a jantar na mesma mesa do pai, como pretendia a criança.
c) No dia 25-12-2011, o assistente passou em casa da arguida para recolher o menor, mas o menor recusou-se a acompanhar o progenitor e no dia 1-1-2012, o menor recusou-se novamente a acompanhar o progenitor.
d) No dia 21-12-2013, a mãe deixou o menor junto à porta da casa do seu pai, estando o assistente na Rua, mesmo em frente, fazendo um sinal de assentimento com a mão, mas a criança após a mãe partir na sua viatura, atirou a mochila ao chão, fugiu do local indo refugiar-se no posto da GNR.
e) (…) o menor recusava peremptoriamente ir com o pai e a arguida não conseguia demover o seu filho nem obrigá-lo a acompanhar o pai, não obstante ter tentado persuadi-lo por todos os meios, fundamentalmente pelo diálogo mas chegando inclusivamente a bater-lhe (com três chapadas, conforme email do assistente de 14.08.2011 a fls 61) tendo pedido ajuda à vizinha, à comadre, às colegas e amigas, tudo sem sucesso.
f) A Segurança Social e os advogados de ambas as partes estiveram reunidos com a criança, procurando convencê-lo a estar com o pai e também não conseguiram demovê-lo.
g) Antes da regulação judicial, após a separação, a mãe chegou a levar por sua iniciativa o C... ao pai.
h) O assistente centra-se, fundamentalmente, em argumentos de autoridade, atinentes ao cumprimento do regime, não tendo um discurso afectivo, tolerante e flexível, não valorizando a vontade do filho, que considera totalmente condicionada pela mãe.
i) O discurso do assistente, mormente, perante o C... , assenta na obrigatoriedade do cumprimento do que foi judicialmente fixado.
j) O C... refere que a mãe sempre insistiu para ele estar com o pai explica a sua recusa dizendo que “não consegue” referindo falta de afecto da parte do pai, atitude impositiva e autoritária relativamente ao regime fixado, sem possibilidade de diálogo, um passado em que o pai estava ausente, e quando presente, lhe chegou a bater e a dirigir-lhe epítetos como “labrego”, a circunstância do pai nas visitas dizer coisas desagradáveis acerca da mãe e do sofrimento causado por todos os processos, salientando como marcante a ameaça de institucionalização.
k) Destaca-se (…) pela sua postura de respeito para com os mais velhos, superiores e semelhantes (…)
l) Demonstra (…) respeito às diferenças individuais, revelando atitudes crítico-reflexivas.
m) O C... guarda uma imagem negativa das visitas ao pai e descreve a separação dos pais, como libertadora para si.
n) A recusa do C... foi-se agravando com a evolução dos processos judiciais, mormente, com a referência a institucionalização.
o) O conflito e tensão decorrente de sucessivos anos de processos judiciais, reforça a impossibilidade de aproximação do C... ao pai, vendo-o como a pessoa que ameaça a estabilidade da sua vida.

17.º A análise da prova efectuada pelo Tribunal recorrido, ao longo de toda a decisão recorrida, usando adjectivações e comentários, não suportados em qualquer elemento probatório dos autos, depreciativos relativamente ao Recorrente e favoráveis à Recorrida, permite-nos censura e indignação contra a mesma; o Tribunal recorrido, para a fundamentação da matéria de facto, baseou-se, essencialmente, no depoimento do menor, da arguida, “secundado” pelos relatos ditos sensíveis lógicos e coerentes de S... , professora do C... , T... , U... e V... , amigas da arguida; as referidas testemunhas jamais poderiam ter conhecimento dos factos constantes da acusação, por não terem qualquer convívio com o casal e com o menor antes da separação, por não estarem presentes no dia-a-dia e por o seu depoimento ser indirecto.

18.º Quanto ao depoimento do C... , o seu discurso continua a ser moldado pela “desinformação” de que foi alvo por parte da mãe desde o momento da separação, o que é notório nas contradições em que incorre, na relação que faz daquilo que é negativo ao pai, mesmo quando não tem fundamento para tal, na apreciação negativa que faz dos momentos passados com o pai e na “falta de memória” que demonstrou quando confrontado com elementos dos autos em que mostrava felicidade e amor pelo Recorrente; o Tribunal recorrido considerou esses depoimentos mais fidedignos do que os juízos técnicos constantes nos relatórios de avaliação e perícias dos autos.

19.º Ao longo da decisão recorrida, é manifesta a injustificada desconsideração dos elementos probatórios que suportavam a tese do Recorrente e da douta acusação pública, em face dos confusos, pouco claros e contraditórios elementos de prova trazidos ao processo pela Recorrida, das suas declarações e do depoimento do menor; o menor C... não pode de modo algum ser tomado como testemunha isenta e credível, bem pelo contrário; uma correcta apreciação da prova produzida levar-nos ia a uma conclusão contrária, valorando o testemunho dos filhos maiores do Recorrente, Q... e B... , em detrimento do depoimento do menor; o mesmo se diz quanto às declarações da Recorrida, que se contradisse por inúmeras vezes, tendo a decisão recorrida acolhido teses que não podia aceitar.

20.º Comparada a prova valorada pelo Tribunal a quo, com a prova documental de fls. 27 a 77, 362, 743, 343, 346, 362, 259, 467, 990 a 1007, o depoimento das testemunhas, Z... , testemunha P... , Q... , B... e R... e com as conclusões plasmadas nos vários relatórios técnicos que constam dos autos e que entendem que a atitude da Recorrida é totalmente paradoxal: ora refere que tenta convencer o C... a estar com o pai, ora desqualifica a figura paterna e incentiva as recusas do C... , conclui-se que o Tribunal recorrido errou profundamente na análise da prova produzida, assim, quer a prova existente nos autos quera produzida em audiência de julgamento imporem uma decisão diversa quanto à matéria de facto provada e não provada (n.ºs 3, 4 e 6 do art.º 412.º do Código de Processo Penal).

21.º Nos inúmeros relatórios de avaliação é referido que a atitude da Recorrida configura uma manifesta alienação parental, que existe uma relação fusional entre esta e o menor, que o discurso e comportamentos deste são claramente condicionados pela mãe e que esta nunca promoveu, de forma séria, honesta e verdadeira, o relacionamento do C... com o Recorrente; desde o início dos repetidos e injustificados incumprimentos por parte da arguida até à audiência de julgamento, inclusive, quando questionado o menor sobre os motivos pelos quais não queria estar com o pai, sempre teve uma resposta reactiva, afirmando, inúmeras vezes: “porque ele não gosta de mim.” - fls. 345, 386 e 388 dos autos e depoimento do menor; o menor atribuía tudo o que era negativo ao Recorrente, por causa do pré juízo negativo que tinha.

22.º Face a esta abundante prova existente nos autos, os factos constantes na acusação que se seguem deveriam ter sido considerados provados:

Entre 2011 e 2015 foram realizadas várias avaliações, todas elas com alguns denominadores comuns - de fls. 418 e ss, 353 e 354, relatório de perícia psiquiátrica realizado à Recorrida em 22.07.2013, 475 e ss., 544e ss., 381 e ss., 386 e 606:

- Ao longo dos anos, estabeleceu-se uma relação fusional entre a Recorrida e o menor;

- A recorrida nunca estimulou a relação pai-filho;

- A recorrida não reconhece a existência de um problema: quer na sua relação fusional com o C... , quer na completa ausência de contactos com o pai.

23.º Estas conclusões, estes juízos técnico-científicos plasmados nos referidos relatórios, realizados por uma dezena de especialistas de várias instituições: a Dra. D... , da EMAT (fls. 409 e ss., 471 e ss. e fls. 514 e ss.), cujo depoimento foi manifestamente apreciado de forma incorrecta, A Dra. E... , psicóloga que colaborou com a EMAT (fls. 516); a Professora Doutora F... , psicóloga (fls. 353 e ss.),a Mestre G... , psicóloga (fls. 353 e ss. e 544 e ss.) e o Professor Doutor H... , Director do Centro de Prestação de Serviços à Comunidade da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Coimbra (fls. 353 e ss. e 544 e ss.); I... , psiquiatra do departamento de pedopsiquiatria do CHUC, EPE (fls. 381 e ss); o médico psiquiatra do Hospital Sobra Cid, subscritor do relatório de perícia psiquiátrica constante a fls. 530 e ss.;

a Mestre J... e a Mestre L... , ambas psicólogas do Centro de Prestação de Serviços à Comunidade da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Coimbra (fls. 544 e ss.); a Professora Doutora M... , do Instituto Superior Miguel Torga, a fls. 604 e ss. emitiram pareceres  – e são  dez técnicos -  plasmados nos relatórios e nas fls. supra indicadas, que foram, pura e simplesmente, desconsiderados pela Senhora Juiz do Tribunal recorrido, deles apenas aproveitando os relatos que eram feitos pela Recorrida e não as análises técnicas propriamente ditas, como deveria ter sido.


24.º Em processo penal a regra é a de livre apreciação da prova, como decorre do estatuído no art.º 127.º do CPP, onde se estabelece que, salvo quando a lei dispuser diferentemente, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente; ao desconsiderar a apreciação efectuada pelos referidos peritos, a Senhora Juiz do Tribunal recorrido extravasou os limites da livre convicção.

25.º Na promoção que consta de fls. 362, verso, o Digníssimo Magistrado do Ministério Público considerou que havia alienação parental e falta de insight por parte da Recorrida; não se entende como pôde ser considerado credível o depoimento da testemunha S... , porquanto, como resulta de fls. 343 e 346 dos autos.

26.º Quanto ao depoimento do C... , o mesmo não é mais do que uma concretização da alienação parental de que foi alvo por parte da Recorrida, que se iniciou desde antes do ano de 2011são profusos os relatórios que atestam a falta de empenho da Recorrida nas tentativas de aproximar o menor ao pai, Recorrente (fls. 336, 342, 546 e 547); se os momentos que o C... passava com o pai eram tão traumáticos e, segundo a mãe, compreensivelmente, questiona-se por que razão esta incentivava o filho a ir, e porque razão nunca requereu a alteração das responsabilidades parentais, para tentar diminuir tais contactos.

27.º Nas duas avaliações efectuadas ao Recorrente, a fls. 558 e ss. e 565 e ss., as quais incidiram sobre as competências parentais do Recorrente, a conclusão a que chegaram o Dr. N... , médico do serviço de Psiquiatria do CHUC, E.P.E e a Dra. O... , psicóloga do mesmo serviço, foram distintas das conclusões da Senhora Juiz do Tribunal Recorrido; considerou o Tribunal Recorrido que tinha mais competências para avaliar o perfil do Recorrente como pai do que os médicos do serviço de psiquiatria do CHUC, EPE; resulta pois evidente, que a arguida foi absolvida com base numa tese falaciosa construída pelo Tribunal recorrido que, partindo de conclusões meramente especulativas e que notoriamente constituem extrapolações inadmissíveis em face dos elementos probatórios juntos aos autos, decidiu absolver a arguida do crime de subtracção de menor porque vinha acusada.

28.º Considerando toda a exposição realizada e que, relativamente ao pedido de indemnização civil foram dados como provados os factos alegados no pedido de indemnização quanto aos danos causados ao Recorrente, mal andou o Tribunal a quo a improceder por não provado o pedido civil formulado pelo Recorrente, consequentemente, ao absolver a arguida do pedido por este formulado.

29.º A ser a Recorrida condenada na prática do crime, estando provados os danos causados ao Recorrente e não havendo dúvidas quanto ao nexo de causalidade entre os factos praticados pela Recorrida e os danos do Recorrente, terá que proceder o pedido de indemnização civil na sua totalidade.

30.º A sentença recorrida julgou que, in casu resulta objectivamente que o regime de visitas estabelecido para a conveniência do menor com o pai na regulação do exercício das responsabilidades parentais não foi cumprido efectivamente, porém, apesar de assim ter concluído, a sentença considera que falta um pressuposto essencial para que possa considerar-se preenchido o tipo legal, assim decidindo é que, transcrevendo, compulsados os autos de regulação das responsabilidades parentais constata-se que inexiste qualquer decisão transitada em julgado que julgue verificado o incumprimento proferida pelo Tribunal competente (Família e Menores).

31.º Tal entendimento não tem qualquer correspondência com a redacção escrita da norma, não podendo o intérprete e aplicador da norma deixar de ponderar e justificar que o elemento filológico de interpretação que defende seja tirado do sentido das palavras que integram o texto descrito ou da ratio que superintende à sua redacção; e essa exigência a sentença não fez de modo a que o seu destinatário possa alcançar as razões por que seguiu tal caminho interpretativo.

32.º Para o preenchimento do tipo legal do crime de subtracção de menor p. e p. pelo art.º 249º nº 1 alínea c) do Código Penal não pretendeu o legislador, na redacção actual, que existisse prévia condenação do progenitor infractor em decisão transitada em julgado em processo de incumprimento proferido pelo Tribunal de Família e Menores; o legislador ao erigir como ilícito penal as situações de incumprimento do regime das responsabilidades parentais legitimou a intervenção penal por critérios funcionais de necessidade e de utilidade social, por esta via de legitimação o direito penal assume uma função de tutela de bens jurídicos, com propósitos de prevenção geral e especial; o legislador ao erigir como ilícito penal as situações de incumprimento do regime das responsabilidades parentais legitimou a intervenção penal por critérios funcionais de necessidade e de utilidade social, por esta via de legitimação o direito penal assume uma função de tutela de bens jurídicos, com propósitos de prevenção geral e especial.

33.º É ao juiz penal que compete preencher o conceito de "incumprimento" para a norma incriminadora, e não ao juiz de família como peregrinamente defende a sentença, é ao juiz penal, o juiz natural para o julgamento da matéria, que compete apreciar a conduta da agente para a subsumir no conceito de "incumprimento"; nenhum outro juízo valorativo, emitido com fundamento em outros conceitos extra-penais, se convoca aqui, como o faz a sentença; o direito penal é um ramo do direito autónomo dos outros ramos do direito porque o ilícito penal encerra especificidades, quer quanto aos pressupostos de que depende quer quanto às consequências que lhes correspondem.

34.º Entre a política criminal e a dogmática existe uma verdadeira unidade funcional, i. é., as próprias valorações político-criminais penetram toda a dogmática jurídico-penal, pelo que errados estão todos aqueles que pensam o direito penal com carácter "dependente", "acessório", "subordinado" ou "secundário", com função puramente sancionatória, com intervenção com os seus meios próprios apenas quando as sanções impostas para o litígio por outros ramos do direito se relevam ineficazes ou insuficientes; assim pensou o julgador da sentença recorrida ao fazer depender o preenchimento do tipo legal do crime de subtracção do menor de prévia decisão cível em acção de incumprimento; a sentença defende a teoria de que existiria, não uma autonomia do direito penal no sistema jurídico, mas antes uma unidade da ilicitude, se uma acção viola um imperativo jurídico, ela converter-se-ia, mais tarde, em ilícito para todos os ramos do direito; incasu, só se a arguida viesse a ser condenada civilmente em incumprimento é que o direito penal a poderia sancionar.

35.º A sentença recorrida confundiu o crime por que vem acusada a arguida - de subtracção de menor - com o crime de desobediência à decisão judicial, a sentença recorrida não fez a distinção entre um e outro tipo de delito, e ao confundir um com o outro gerou uma decisão inédita, incorrendo em erro grosseiro de direito ao fazer depender o preenchimento do tipo de delito do referido pressuposto processual; mesmo que o julgador discorde da opção legislativa, vedado está ao julgador fazer uma interpretação da norma penal que lhe confira uma dimensão que não tenha correspondência com a sua letra ou ratio, como é o caso da sentença recorrida; e a norma contida na al. c) do artº 249º do C.P. resultou da necessidade que o legislador sentiu em dar nova dimensão à protecção de situações da vida familiar, causadas pelo exercício abusivo por parte de um dos progenitores em detrimento do outro e para protecção do próprio filho.

36.º Considera de seguida a sentença que o ilícito não se acha por verificado porque o não cumprimento do regime das responsabilidades parentais no caso em apreço é imputado ao menor, à sua vontade, e não à arguida, a progenitora guardiã; considera a sentença, erradamente, que se provou que a recusa foi sempre do menor e não da mãe, refugiando-se a sentença em episódios factuais, que valora com juízos muito pouco convincentes; a vontade do menor – designadamente, a vontade do menor em não se relacionar com um dos progenitores – é um vértice importante de interesses em conflito: se, por um lado, pode afirmar-se como manifestação de autonomia, contudo, confronta a montante, a questão de saber se a maturidade e o discernimento permitem, de facto, essa autonomia; e a jusante, o direito fundamental do progenitor, que não pode ser arbitrariamente coartado; a “vontade do menor” é algo eminentemente difuso, complexo, incerto e, por isso, pouco objetivo; a vontade do menor será objetiva, se ela apresenta uma razão de ser válida, evidente e de acordo com os parâmetros de um homem médio.

37.º A questão que tem, necessariamente, de colocar-se é averiguar o que é que leva uma criança, sem qualquer motivo, sem qualquer razão justificável, a não querer estar com um dos progenitores; o C... foi descrito na sentença como “um miúdo, para além de inteligente, sincero, puro e genuíno”; averiguar o que é que leva um menor, já com 16 anos, que até é inteligente, sincero, puro e genuíno – nas palavras da Mma Juiz a quo – a não ser capaz de dizer por que razão não quer estar com o pai, a não ser capaz de aventar uma única razão, um esboço de raciocínio, um meio argumento que seja, para justificar o afastamento relativamente à figura parental, é questão que a sentença deveria ter tratado e não tratou; posto isto, não pode a sentença como fundamentar que esta “vontade do menor” possa considerar-se uma manifestação da sua autonomia se ela não tem nenhuma razão, nenhum raciocínio subjacente para a recusa.

38.º A alienação parental – ou, se se preferir, a tentativa por ação ou omissão, por parte de um dos progenitores, no sentido de afastar o filho relativamente ao outro progenitor – é um fenómeno complexo, silencioso e resiliente, nem sempre evidente, nem para o menor, nem tão pouco para o progenitor alienante, porque, por necessidade de controlo e grande insegurança emocional, “o pai que aliena é também, na maioria dos casos, um pai em sofrimento” (Inês Afonso Marques, “Alienação Parental, mito ou realidade?” in Observador 05-02-2015) é precisamente com este estado de coisas – perfeitamente ilegítimo – que o tribunal a quo compactuou, ao afirmar, na referida sentença, que “a recusa foi sempre do menor e não da mãe”, para justificar que não tenha havido incumprimento repetido e injustificado da convivência do menor com o pai, e que não tenha havido recusa, atraso ou dificultação nas visitas – e isto, porque, segundo o tribunal a quo, o incumprimento não foi da mãe, foi, sim, do menor; um critério indispensável para confirmar a alienação parental é, precisamente, o filho assumir que os atos e decisões que põem em causa o progenitor alienante são dele mesmo, isto é, da sua iniciativa e responsabilidade; o que significa, precisamente, que o processo de alienação se encontra perfeitamente consolidado.

39.º E o tribunal a quo, sem fundamentação, sem razões, sem apoio nos factos, à margem de toda a prova pericial que ignorou olimpicamente, deixou-se enredar perniciosamente no discurso da arguida, que tão bem evidencia quando se iniciaram os seus esforços dolosos neste processo contínuo de alienação parental; com perplexidade, a sentença decidiu que à luz das regras de experiência comum, ignorando todas as conclusões dos relatórios técnicos, elaborados e tiradas por quem se pauta por regras da ciência, concluiu que foram as "características" de personalidade do assistente que foram "adensando" o afastamento e cristalizando a ruptura na ligação afectiva entre ambos (pai e filho), e mais referindo a sentença que "sem resultar demonstrada qualquer interferência ou culpa da arguida, quando todos os relatórios sociais, psicológicos, psiquiátricos apontam em sentido oposto ao que concluiu a sentença; tal conclusão só poderia ser justificada à luz da experiência comum, rectius, à luz de experiência e dos valores do próprio julgador, pois não são citados na sentença critérios que densifiquem as tais "regras de experiência comum".

40.º Dos autos resulta demonstrado quer a repetida e injustificada não entrega ou dificuldade de entrega do menor, que tal incumprimento resulta (conforme relatórios periciais) de uma acção da arguida e tal acção causou uma rutura grave na relação familiar entre o C... e o Recorrente, pelo que se encontram preenchidos todos os elementos típicos do crime de subtracção de menor.

41.º A decisão recorrida violou as seguintes normas jurídicas:

Código Penal: art.º 249.º n.º 1 alínea c);

Código de Processo Penal: art.º 127.º; art.º 151.º; alínea c) do n.º 1 do art.º 379.º; alínea c) do n.º 2 do art.º 410.º; 3, 4 e 6 do art.º 412.º

Código Civil: art.º 388.º e art.º 1878.º


42.º O art.º 249º nº 1 alínea c) do Código Penal deveria ter sido interpretado no sentido de não ser elemento do tipo a prévia condenação do progenitor infractor em decisão transitada em julgado em processo de incumprimento proferido pelo Tribunal de Família e Menores.


43.º O art.º 127.º do CPP deveria ter sido interpretado com as excepções previstas para esse exercício do julgador, nomeadamente, a prova pericial, que se integram no princípio da prova legal ou tarifada, que é usualmente baseado na segurança e certeza das decisões, consagração de regras de experiência comum e facilidade e celeridade das decisões.

Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente e, consequentemente, extraídos os corolários dimanados das “conclusões” tecidas, ser a Recorrida condenada, como autora material, na forma consumada, de um crime de subtracção de menor, p. e p. pelo art.º 249.º n.º 1 alínea c) do Código Penal e julgado procedente por provado o pedido civil formulado pelo assistente B... , assim se fazendo a acostumada JUSTIÇA!

            A arguida respondeu aos referidos recursos concluindo pelo não provimento de ambos.

            Nesta Relação, a Ex.ma PGA emitiu douto parecer no sentido da procedência do recurso do MP e bem assim do interposto pelo assistente, este dentro dos limites da procedência do recurso do MP.

            Ainda respondeu a arguida, concluindo como anteriormente.

            Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

FACTOS PROVADOS:

A arguida A... , tem um filho em comum, com o assistente B... de nome C... nascido em 18-11-2000.

Após a separação do casal o menor ficou a viver com a arguida, na Rua (...) , Cantanhede, área desta comarca.

As responsabilidades parentais quanto a contactos com o progenitor B... estão reguladas desde 4-05-2011, por sentença transitada em julgado no processo 348/11.11.9TBCNT do 1.º Juízo do Tribunal Judicial de Cantanhede, no âmbito da Regulação das Responsabilidades Parentais, quanto a visitas, nos seus pontos 8º a 12º, 14º a 17º do seguinte modo:

“8º O pai poderá ter consigo o menor, de 15 em 15 dias, das 10:00 horas de Sábado até às 20:00 horas de Domingo, devendo para tanto ir busca-lo e levá-lo a casa da mãe (…);

9º Quando o fim-de-semana que competir ao pai for antecedido ou seguido de um dia feriado, o pai poderá, também, ter o menor consigo nesses dias;

10º Nas semanas em que o pai não passe o fim-de-semana imediatamente anterior com o menor, poderá jantar com ele durante essa semana, às quintas-feiras, indo para o efeito busca-lo às 19:00 onde o menor se encontre, entregando-o às 21:00 em casa da mãe;

11º Nas férias escolares de verão, o pai terá consigo o menor durante trinta dias de férias, sendo quinze dias seguidos, devendo avisar a mãe dos períodos escolhidos, pelo menos com noventa dias de antecedência, sendo desde já fixados para o presente ano o período de apenas 15 dias, sendo 10 seguidos;

12º O pai terá consigo o menor durante a primeira metade dos dias das férias escolares de Natal e Páscoa, contados a partir do dia imediato ao da cessação das aulas;

14º As festividades de Natal e Ano Novo, considerando o dia e a véspera, são passados em anos alternados com o pai e com a mãe, passando a véspera com um e o dia com o outro. Assim,

a) O menor passará com a mãe a próxima noite de Natal, de dia 24 de Dezembro de 2011 e almoçará com o pai no dia 25 de Dezembro de 2011 e no ano seguinte passará a noite de Natal com o pai e o dia com a mãe e assim sucessivamente;

b) Da mesma forma, o menor passará a noite de fim de ano (31 de Dezembro de 2011) com a mãe e almoçará com o pai no dia 1 de Janeiro de 2012, sendo estes dias passados alternadamente com ambos os progenitores nos anos seguintes;

15º O menor passará o dia de Páscoa alternadamente com cada um dos progenitores, passando o próximo dia de Páscoa com a mãe;

16º No dia de aniversário do menor este almoçará ou jantará com o pai, sem prejuízo das suas actividades escolares e extra-curriculares;

17º O pai tomará uma das refeições principais com o menor no dia do aniversário daquele, devendo comunicar previamente à mãe a sua pretensão;”

No primeiro fim-de-semana após a regulação acima referida, atenta a recusa do menor em ir com o pai, a arguida solicitou a intervenção de uma vizinha, que conversou com o mesmo, convencendo o C... a ir, mas a criança só acedeu sob condição de não haver pernoita, o que foi transmitido ao assistente.

Nesse dia à noite, a vizinha foi ver como estava o C... depois da visita, e foi encontrá-lo a chorar, agarrado à mãe, tendo a criança contado que tinha estado todo o dia em casa, com as janelas fechadas, a jogar Play Station, enquanto o pai lia, até que conseguiu abrir uma janela e gritar por “socorro” na varanda.

Quanto às férias de verão de 2011 a comunicação foi efectuada pelo assistente sem respeitar o pré-aviso fixado e relativamente às férias de Verão de 2012 a arguida não concordou com a marcação efectuada pelo assistente, por ocupar quase todo o mês de Agosto.

Desde que foi estabelecido o acordo até ao final de Dezembro de 2011 o menor esteve com o pai, pelo menos, dois fins-de-semana completos e dois incompletos e das quintas-feiras previstas para 2011 pelo menos por três vezes o menor esteve com o seu pai.

No dia 17-09-2011 foi o casamento de um sobrinho do assistente, e foi efectuado o convite de casamento para o menor estar presente no evento, tendo a arguida estado com o menor na cerimónia, ausentando-se de seguida, cerca das 16h, existindo no casamento um espaço específico destinado às crianças.

No dia de aniversário do menor a 18-11-2011, o pai não esteve com o filho, tendo a arguida via email solicitado ao pai que fosse almoçar com a criança, para este não faltar às actividade, mas o assistente não acedeu e insistiu em ir jantar com a criança.

No dia 1-12-2011 (5ªf), o assistente, dirigiu-se a casa da arguida para ver o filho e jantar com ele, e chamou pelo intercomunicador, mas ninguém atendeu.

Nos dias 1-09-2011 (5ªf), 4-09-2011 (dom) pelas 19h00, 4-12-2011 (dom) 8-12-2011 (5ª), pelas 19h00, 10-12-2011 (sab) pelas 10h00, o assistente foi a casa da arguida para ir buscar o menor, sendo que umas vezes ninguém atendeu outras o menor recusou ir.

No dia 16-12-2011, e nos dias seguintes, o assistente procurou sucessivamente a arguida para gozar o período de férias de Natal com o seu filho, mas o filho não foi de férias com o pai.

No dia de aniversário do assistente, a 22-12-2011, às 19h a criança recusou-se a ir jantar com o pai, não obstante a insistência da mãe e dos irmãos. Depois destes últimos se terem ido embora, a mãe juntamente com a vizinha, continuou a tentar persuadi-lo a ir e, a fim de desbloquear o problema, a arguida acedeu à condição imposta pelo C... de o levar e ficar no restaurante, não aceitando todavia a jantar na mesma mesa do pai, como pretendia a criança.

Na sequência disso, a arguida telefonou ao assistente pelas 19h27, quando este já estava no restaurante na companhia dos seus dois outros filhos, dizendo-lhe que levaria o menor ao restaurante, o que sucedeu, tendo a mãe ficado noutra mesa.

No dia 25-12-2011, o assistente passou em casa da arguida para recolher o menor, mas o menor recusou-se a acompanhar o progenitor e no dia 1-1-2012, o menor recusou-se novamente a acompanhar o progenitor.

No dia 1-07-2012, pelas 10h00 e 16h00, o assistente, voltou a dirigir-se a casa da arguida, para ir buscar o filho, após anteriores contactos, mas ninguém atendeu.

No dia 2-07-2012, o assistente, contactou telefonicamente com o menor e com a arguida pelas 14h32.

Em 13-07-2012, o menor já não pernoitava em casa do progenitor há mais de um ano, e no âmbito de uma conferência de pais ocorrida em 13-07-2012, arguida e assistente acordaram, sem prejuízo do regime fixado, que a criança estivesse com o pai na tarde de dia 18-07-2012, no dia 21-07-2012, passando as férias de verão com pai desde o dia 4 a 15 de Agosto desse ano. Contudo, tal regime de visitas não foi cumprido.

O menor não foi de férias com o pai no verão de 2013.

Vindo em conferência de pais de 6-8-2013, no processo 348/11.9TBCNT-A, determinado judicialmente, uma vez que o pai já não estava com o menor há mais de dois anos, que o menor passasse os dias 17 a 27 de Agosto de 2013, das 10, às 19 horas.

Nesse dia, o menor foi chamado à sala no Tribunal, para lhe ser explicado o decidido, designadamente que se não cumprisse poderia ser institucionalizado, tendo este adoptado uma postura de recusa.

A promoção o Ministério Público, que consta em Acta, antevia a possibilidade de institucionalização do C... e foi determinada a instauração de processo de promoção e protecção ao menor.

Mais foi consignado nessa acta, que a arguida assumiu uma postura de incentivo a tal rejeição.

Após, houve nova conferência de pais em 4-09-2013, onde foi acordado um regime provisório nos seguintes termos:

“I - No próximo dia 6 de Setembro o C... passará o dia com o pai, indo a mãe entregar o seu filho a casa daquele pelas 10:00 horas entregando o progenitor o seu filho à mãe pelas 21:00 horas já jantado;

II - Doravante, todas as terças-feiras o pai do C... irá busca-lo no fim das suas actividades escolares ou extracurriculares, passando com ele o período de tempo até às 21:00, que incluirá o jantar do C... ;

III – A partir do próximo dia 22 de Setembro inclusive o pai estará com o C... todos os Domingos de 15 em 15 dias, indo a mãe entrega-lo à casa do pai pelas 10 horas e 30 minutos, procedendo o pai à entrega do seu filho em casa da mãe pelas 21:00 horas já jantado.

Uma vez que no próximo dia 6 de Outubro o pai do C... se encontrará ausente no Algarve, tal dia será gozado com o filho no próximo dia 13 de Outubro.”

Em nova conferência de pais de 17-12-2013, foi acordado que o menor passasse com o pai três dias seguidos de 21 a 23 de Dezembro indo a mãe entregá-lo a casa do pai pelas 10 horas da manhã de Sábado e entregando-o pelas 21:horas de segunda-feira.

No dia 21-12-2013, a mãe deixou o menor junto à porta da casa do seu pai, estando o assistente na Rua, mesmo em frente, fazendo um sinal de assentimento com a mão, mas a criança após a mãe partir na sua viatura, atirou a mochila ao chão, fugiu do local indo refugiar-se no posto da GNR.

Foi elaborado um Relatório de ocorrência assinado pelo militar da GNR X... onde narra que foi aí atendido C... “que estava bastante aflita, em pânico, porque tinha sido entregue pela sua mãe ao seu pai para passar três dias e como tinha medo fugiu e deslocou-se a este posto a pedir ajuda. De imediato lhe perguntei o que se tinha passado, tendo ele me respondido que não suportava a ideia de estar com o pai, e que tinha muito medo dele, tendo-lhe fugido.” Sendo que com a chegada do assistente ao Posto “ assim que entrou despoletou uma reacção de medo e pânico na criança tendo esta fugido de imediato para a casa de banho e se trancado”.

Devido à situação do menor, foi requerida a instauração de processo de promoção e protecção do menor, a 5-12-2013, o qual já se encontra arquivado.

Até à data da conferência de pais de dia 14-04-2015, o regime de visitas não foi cumprido.

A arguida sabia que devia respeitar o estabelecido na regulação das responsabilidades parentais, no que diz respeito à convivência do menor com o progenitor mas o menor recusava peremptoriamente ir com o pai e a arguida não conseguia demover o seu filho nem obrigá-lo a acompanhar o pai, não obstante ter tentado persuadi-lo por todos os meios, fundamentalmente pelo diálogo mas chegando inclusivamente a bater-lhe (com três chapadas, conforme email do assistente de 14.08.2011 a fls 61) tendo pedido ajuda à vizinha, à comadre, às colegas e amigas, tudo sem sucesso.

A Segurança Social e os advogados de ambas as partes estiveram reunidos com a criança, procurando convencê-lo a estar com o pai e também não conseguiram demovê-lo.

Antes da regulação judicial, após a separação, a mãe chegou a levar por sua iniciativa o C... ao pai.

No âmbito da perícia realizada o assistente definiu-se como metódico, racional, de análise fria e calculista, ponderado, com capacidade de auto-controlo emocional, reservado, determinado, inteligente, culto, pragmático, bom negociador, com grande espírito de resistência e boa eficiência no trabalho e apresentou resultados abaixo da média no dominio do Neuroticismo o que é sugestivo de um sujeito geralmente calmo, resistente, seguro e não emotivo.

O assistente centra-se, fundamentalmente, em argumentos de autoridade, atinentes ao cumprimento do regime, não tendo um discurso afectivo, tolerante e flexível, não valorizando a vontade do filho, que considera totalmente condicionada pela mãe.

O C... refere que a mãe sempre insistiu para ele estar com o pai explica a sua recusa dizendo que “não consegue” referindo falta de afecto da parte do pai, atitude impositiva e autoritária relativamente ao regime fixado, sem possibilidade de diálogo, um passado em que o pai estava ausente, e quando presente, lhe chegou a bater e a dirigir-lhe epítetos como “labrego”, a circunstância do pai nas visitas dizer coisas desagradáveis acerca da mãe e do sofrimento causado por todos os processos, salientando como marcante a ameaça de institucionalização.

O C... é um aluno com excelente desempenho no processo de ensino aprendizagem. É notório o seu compromisso com a responsabilidade, com a capacidade de se relacionar com os outros, de os encarar como seres humanos integrais, respeitando as características de cada um, sejam sociais, culturais ou religiosas. Destaca-se pela consciência que tem da sua dignidade como pessoa, pela sua postura de respeito para com os mais velhos, superiores e semelhantes, pela sua conduta na escola, pelo seu espírito de solidariedade e pela sua participação cívica. É evidente a sua visão crítica relativamente a diversos assuntos abordados em contexto de aula. Demonstra espírito de investigação, criatividade, iniciativa e respeito às diferenças individuais, revelando atitudes crítico-reflexivas.

Pratica a actividade física na escola, consciente de que contribui para o seu desenvolvimento físico e a criação de hábitos saudáveis para o corpo. Empenha-se em práticas sadias de higiene individual zelando pela sua boa apresentação pessoal. Demonstra uma busca constante por dominar recursos científicos que lhe permitam situar-se criticamente diante da realidade, assumindo responsabilidades sociais. Cumpre os dispositivos regulamentares, normas e determinações superiores. Acata as normas de disciplina e de serviço existentes. Tem o prefeito conhecimento dos regulamentos, normas, directrizes e ordens. Zela pela conservação do material, dos equipamentos e das instalações da escola. Mantém a sua encarregada de educação/mãe ciente das actividades escolares, bem como das solicitações da escola, particularmente das que se referem à necessidade da sua presença e ao cumprimento dos compromissos. Apresenta-se correctamente e tem conduta exemplar no seu relacionamento com a comunidade. É considerado aluno-destaque em todas as áreas de estudo ou disciplinas, demonstrando alto rendimento nos estudos e tornando-se exemplo para os seus pares. Tem uma preocupação constante com todo o trabalho inerente à sua vida escolar. Prima por irrepreensível conduta disciplinar”.

Inexiste qualquer decisão condenatória da arguida, transitada em julgado, proferida pelo Tribunal de Família e Menores competente, no âmbito de incidente de incumprimento.

A partir do ano de 2010 o Demandante começou a sentir a falta de capacidade de concentração, dificuldade de memória, desmotivação, ansiedade, stress no seu quotidiano, na sua vida profissional, o que se traduzia também em entraves e constrangimentos em aceitar convites profissionais para sair para países estrangeiros.

A capacidade de trabalho do Demandante ficou diminuída e a sua produtividade cientifica baixou.

O Demandante não assumiu alguns cargos, por sentir que não os podia desempenhar da melhor maneira e deixou de realizar projectos científicos que tinha em carteira, como a edição do Tratado das Leis de Cícero para a Fundação Calouste Gulbenkian, não participando em congressos e em cursos internacionais em outros países, tais como Espanha, Brasil e Chile.

O Demandante sente sofrimento, tristeza, mágoa e frustração, vividas diariamente e que se mantém na actualidade por não estar com o filho.

O discurso do assistente, mormente, perante o C... , assenta na obrigatoriedade do cumprimento do que foi judicialmente fixado.

O C... guarda uma imagem negativa das visitas ao pai e descreve a separação dos pais, como libertadora para si.

A recusa do C... foi-se agravando com a evolução dos processos judiciais, mormente, com a referência a institucionalização.

O conflito e tensão decorrente de sucessivos anos de processos judiciais, reforça a impossibilidade de aproximação do C... ao pai, vendo-o como a pessoa que ameaça a estabilidade da sua vida.

A arguida não tem antecedentes criminais, é professora, vive em casa própria com o filho C... e aufere o vencimento mensal ilíquido de 2.568,38€, tendo um rendimento anual também ilíquido de 37.514,56€.

FACTOS NÃO PROVADOS:

Todos os demais alegados na acusação, pedido cível e contestação, que se dão por integralmente reproduzidos, ao abrigo do princípio da economia processual.

DECIDINDO:

            Analisadas as conclusões que dos respectivos recursos retiram os assistentes, verificamos que quer o MP, quer o assistente, arguem a nulidade da sentença recorrida, com fundamento na violação da norma do artº 379º, 1, a, por referência ao artº 375º, 2, ambos do CP, o primeiro e por violação da norma constante da al. c) daquele artº 379º, 1, o segundo.

Em processo penal, o regime das nulidades obedece ao princípio da legalidade, enunciado no nº 1 do artº 118º do Código respectivo, segundo o qual a violação ou a inobservância das disposições da lei de processo penal só determina a nulidade quando esta for expressamente cominada na lei.

Um dos casos em que a lei comina expressamente com nulidade a violação de determinadas estatuições legais, é o do artº 379º, que enumera taxativamente, no seu nº 1, as causas de nulidade da sentença.

Aí se dispõe que, em processo penal, a sentença é nula:

a) Se não contiver as menções referidas no nº 2, e na alínea b) do nº 3, do art. 374º; 

b) Se condenar por factos diversos dos descritos na acusação ou na pronúncia, fora dos casos previstos nos art.s 358º e 359º;

c) Quando o tribunal deixe de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia conhecer.

São estes os casos e não outros que determinam a nulidade da sentença.

Na perspectiva em que o recorrente MP enfoca a arguida nulidade do acórdão, esta traduzir-se-ia na circunstância de a sentença recorrida não ter procedido à enumeração dos factos não provados.

É sabido, que o dever de fundamentação das decisões judiciais se encontra constitucionalmente consagrado no artigo 205º, nº 1, da Constituição da República Portuguesa, devendo obedecer às formas previstas na lei.

Aí se estipula que «as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei».

Em processo penal, a forma que a lei prevê para cumprir o dever de fundamentação de uma sentença é a que consta na previsão do art. 374º, nº 2.

De acordo com este normativo, a sentença deve, sob pena de nulidade (artº 379º, 1, a), CPP), conter as seguintes menções:

a) A enumeração dos factos provados e não provados;

b) A exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos de facto que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para criar a convicção do tribunal.

A enumeração dos factos provados e não provados mais não significa do que descrever (especificar, narrar, seleccionar) um a um, de forma metódica, os factos que resultaram provados e os que resultaram não provados, reportando-se à matéria constante da acusação ou da pronúncia, da contestação, do pedido cível e ainda aos factos provados resultantes da discussão da causa que se mostrem relevantes para a decisão e não constem daquelas peças processuais.

Esta exigência legal impõe-se pela necessidade de se demonstrar que o tribunal apreciou, em concreto, todos os factos submetidos a julgamento, relevantes para a boa decisão da causa, seja por lhe terem sido trazidos pela acusação e/ou pela defesa, seja porque resultaram da discussão da audiência de julgamento (neste sentido, v. o ac. desta Relação, de 18/1/2012 (tirado no processo nº 392/10.3PCCBR-C1, disponível em www.dgsi.pt).

Ora, analisada a sentença recorrida, na parte referente à descrição dos factos não provados, verificamos que esta, ao invés de os enumerar um por um, como impõe a norma legal, lança mão de uma fórmula sacramental que de forma alguma respeita aquela imposição legal de fundamentação. Porque a norma impõe um concreto dever de fundamentação, v.g. através da descrição de cada um dos factos relevantes constantes da acusação e do pedido civil, não pode o intérprete deixar de a observar, invocando um princípio de economia processual que a lei expressamente quis arredar.

A exigência legal de fundamentação, que a lei impõe naquele nº 2 do artº 374º do CPP só se mostrará respeitada se a sentença enumerar (descrever um a um, metodicamente, especificar) todos os relevantes factos constantes daquelas referidas peças. Daí que entendamos que não respeita a norma o uso daquela forma encantatória e tabelar, usada na sentença, ao afirmar que não se provaram «todos os demais factos alegados na acusação, pedido civil e contestação, que se dão por integralmente reproduzidos…». Se fosse admissível tal entendimento, por igualdade de razão haveria ele de ser extensivo aos factos provados, que a lei não distingue dos não provados, antes lhes dando um tratamento homogéneo. Só procedendo à descrição de cada um dos factos alegados, dando-os concretamente como provados ou não provados, demonstrará o tribunal que os apreciou na sua individualidade e que a sua convicção não se formou a partir de uma tese global, antes se formou a partir da análise de cada um dos concretos factos invocados.

Tal falta da fundamentação exigida pelo artº 374º, 2, do CPP, conduzirá à nulidade cominada na al. a), do nº 1, do artº 379º, ambos do CPP, nulidade essa que é de conhecimento oficioso, como resulta do nº 2 deste artº 379º.

A referida fundamentação de forma alguma satisfaz aquela referida exigência legal, razão pela qual ocorre a nulidade arguida pelo MP. A peça em que se traduz a sentença deve tornar perfeitamente compreensíveis pelos seus destinatários processuais e a todos os cidadãos a quem ela se dirige também, em termos de aviso, de prevenção geral, quais os raciocínios básicos efectuados em sede de julgamento de facto e quais as razões de facto relevadas para efeito de integração (ou não) do ilícito imputado e de concretização das penas.

Só assim os intervenientes processuais que para tanto possuam o necessário interesse em agir poderão sindicar a concreta factualidade provada ou não provada, em sede de impugnação, nos termos do disposto no artº 412º, 3 e 4 do CPP.

Também o assistente arguiu a nulidade da sentença, referindo-a embora à omissão de pronúncia prevista na al. c) daquele artº 379º do CPP.

Afirma que «o tribunal ‘a quo’ não se pronunciou sobre um conjunto de factos constantes da acusação imputados à recorrida e que consubstanciam o preenchimento dos elementos objectivos e subjectivos do crime de subtracção de menor, pelo qual a recorrente vinha acusada».

Muito embora a questão possa ser também reconduzida, de forma genérica, à nulidade da sentença por omissão de pronúncia, o certo é que ela merece tratamento autónomo na al. a) do mesmo nº 1, nos termos já analisados.

Face à necessidade de reformulação da sentença, de forma a incluir na respectiva fundamentação todos os relevantes factos provados e não provados, constantes da acusação e do pedido civil, impõe-se ao tribunal que aprecie todos os factos que consubstanciem os elementos típicos do crime por que vem acusada a arguida/recorrida.

A ocorrida nulidade, determina prejudicialidade relativamente ao conhecimento do fundo dos recursos.

Termos em que, nesta Relação, se acorda em conceder parcial provimento aos recursos, decretando a nulidade da sentença recorrida, a qual deverá ser reformulada, nos termos referidos, de forma a saná-la dessas invalidades.

Recursos sem tributação.

Coimbra, 11 de Outubro de 2017

(Jorge França – relator)

(Elisa Sales – adjunta)