Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1/15.4GBCBR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: MARIA JOSÉ NOGUEIRA
Descritores: AUDIÊNCIA DE JULGAMENTO
LEITURA PERMITIDA DE DECLARAÇÕES PRESTADAS PERANTE AUTORIDADE JUDICIÁRIA
AVIVAMENTO DE MEMÓRIA
CONTRADIÇÕES OU DISCREPÂNCIAS
CONSTITUCIONALIDADE
CONFORMIDADE COM A CONVENÇÃO EUROPEIA DOS DIREITOS DO HOMEM
Data do Acordão: 03/29/2017
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COIMBRA (JC CRIMINAL DE COIMBRA –– JUIZ 1)
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ART. 356.º, N.º 3, DO CPP; ARTS. 20.º E 32.º DA CRP; ART. 6.º DA CONVENÇÃO EUROPEIA DOS DIREITOS DO HOMEM
Sumário: I – Com as alterações introduzidas ao artigo 356.º do CPP pela Lei n.º 20/2013, de 21-01 - e ao invés do que sucede quanto a declarações perante órgão de polícia criminal -, verificados os pressupostos alternativos prefigurados nas alíneas a) e b) do n.º 3 do mesmo artigo – avivamento da memória de quem declarar na audiência que já não recorda certos factos ou esclarecimento de contradições ou discrepâncias entre as declarações anteriores e as feitas em audiência -, a leitura, em audiência de julgamento, de declarações prestadas, em fase processual anterior à de julgamento, diante de autoridade judiciária (Juiz ou Ministério Público) –, não exige o acordo do MP, do arguido e do assistente.

II – Tal interpretação normativa não padece de inconstitucionalidade material, nem ofende o artigo 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.

Decisão Texto Integral:







Acordam em conferência os juízes na 5.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra

I. Relatório

1. No âmbito do PCC n.º 1715.4GBCBR.C1, do Tribunal Judicial da Comarca de Coimbra, Coimbra – JC Criminal – Juiz 1, mediante acusação pública, foram os arguidos A... , B... , C... , D..., E...e F... , todos melhor identificados nos autos, submetidos a julgamento, sendo-lhes, então, imputada a prática, em coautoria, de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, p. e p. pelos artigos 21º e 24º, alíneas b) e i) do D.L. n.º 15/93, de 22.01.

2. Realizada a audiência de discussão e julgamento (no decurso da qual o tribunal comunicou a alteração da qualificação jurídica dos factos relativamente ao arguido C... , passando os mesmos a integrar o crime p. e p. pelo artigo 26.º do D.L. 15/93, de 22.01) por acórdão de 21.10.2016 foi decidido [transcrição parcial do dispositivo]:

I. Condenar o arguido A... pela prática de 1 (um) crime de tráfico de estupefacientes, na forma agravada, pp. Nos artigos 21.º, n.º 1 e 24.º, alínea i) do D.L. n.º 15/93, de 22.01, na pena de 6 (seis) anos e 10 (dez) meses de prisão.

II. Condenar o arguido B... pela prática de 1 (um) crime de tráfico de estupefacientes, na forma agravada, pp. nos artigos 21.º, n.º 1 e 24.º, alínea i) do D.L: n.º 15/93, de 22.01, na pena de 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de prisão.

III. Condenar a arguida D... pela prática de 1 (um) crime de tráfico de estupefacientes, na forma agravada, pp. nos artigos 21.º, n.º 1 e 24.º, alínea i) do D.L. n.º 15/93, de 22.01, na pena de 5 (cinco) anos e 4 (quatro) meses de prisão.

IV. Absolver os arguidos A... , B... e D... do crime de tráfico de estupefacientes agravado, pp. nos artigos 21.º, n.º 1 e 24.º, alínea b) do D.L. n.º 15/93, de 22.01.

V. Absolver os arguidos E...e F... da prática do crime de tráfico de estupefacientes agravado, pp. Nos artigos 21.º, n.º 1 e 24.º, alíneas a) e i) do D.L. n.º 15/93, de 22.01, por que vinham acusados.

VI. Condenar o arguido C... pela prática de 1 (um) crime de traficante-consumidor, pp. no artigo 26.º, n.º 1 do D.L. n.º 15/93, de 22.01, na pena de 18 (dezoito) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 18 (dezoito) meses, com regime de prova.

(…)

Declaro perdidos a favor do estado todos os objetos apreendidos aos arguidos A... , B... e D..., uma

vez que serviram para a prática do crime ou são provenientes da atividade de tráfico – artigos 35.º e 36.º do D.L. n.º 15/93, de 22.01.


*

Declaro perdido a favor do estado todo o produto estupefaciente apreendido nos autos.

Destruam-se as amostras cofres (artigo 62.º, n.º 6, do D.L. n.º 15/93).

(…).

3. Inconformados com o assim decidido recorreram os arguidos A... , D... e B... , extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões:

A... :

1. Foi o ora Recorrente condenado por Acórdão proferido em 21 de Outubro de 2016 pelo Coletivo dos Juízes da Secção Criminal da Instância Central da Comarca de Coimbra, pela coautoria material de um crime de tráfico de estupefacientes agravado p. e p. pelo art.º 21º nº 1 e 24º alínea i) da Lei 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de 6 anos e 10 meses de prisão, cuja coautoria material já lhe era imputada no libelo acusatório.

2. A grande questão é a de saber se poderão ser lidas em julgamento, sem a concordância do arguido, as declarações prestadas por uma testemunha em sede de inquérito quando prestadas perante Magistrado do MP, e a sua leitura tenha sido requerida com o fundamento de existirem discrepâncias entre elas e as feitas em audiência ou a sua leitura seja necessária para o avivamento da memória.

3. O Tribunal Recorrido entendeu que para tais declarações serem lidas em julgamento não é necessário a concordância dos Arguidos, pura e simplesmente porque tinham sido prestadas perante Magistrado do MP, e isso por si só, basta para que fossem reproduzidas em audiência.

4. Tal interpretação do art.º 356º nº 3 do CPP é inconstitucional e contrária à constituição, violando claramente, o disposto no art.º 356º, nº 1, nº 2, alínea b) e nº 5 do CPP e, claramente, o disposto no art.º 20º e do art.º 32º da CRP.

5. Entendemos que o despacho que admitiu e determinou as leituras do depoimento prestado pelas testemunhas, em sede de inquérito é nulo por interpretar o disposto no art.º 356º, nº 3 e 5 contrário à constituição, violando claramente o disposto no art.º 356º, nº 1, n.º 2, alínea b) do CPP e, claramente, o disposto no art.º 20º e do art.º 32º da CRP.

6. Efetivamente, o referido despacho de admissão e determinação de leitura das declarações prestadas pela referida testemunha em sede de inquérito perante Magistrado do MP, é NULO porque não houve a concordância por parte dos arguidos na leitura daquelas declarações como exigido pelo disposto no art.º 356º, nº 2, alínea b) e n.º 5 do CPP e conforme é imposto pelos princípios basilares do contraditório, da imediação e da oralidade, tudo em violação dos referidos já preceitos constitucionais do art.º 20º e 32º da CRP.

7. Este entendimento por parte do Tribunal a quo, que consideramos sem dúvida inconstitucional – entendimento segundo o qual basta as declarações terem sido prestadas perante o MP e que haja discrepâncias ou necessidade de avivamento da memória da testemunha para que se proceda, sem mais e sem a concordância exigida pelo n.º 2 alínea b) do CPP, à leitura das declarações das testemunhas prestadas em sede de inquérito.

8. Diz o Tribunal a quo que o n.º 3 do art.º 356º do CPP permite em audiência a leitura das declarações prestadas perante autoridade judiciária no caso concreto MP), desde que se verifique um dos requisitos previstos nas duas alíneas desse n.º 3, ou seja, desde que se verifique a necessidade de avivar a memória da testemunha ou existam entre as declarações prestadas em inquérito e as feitas em audiência contradições ou discrepância.

9. Referindo que, se assim não fosse, não faria sentido a alteração introduzida ao n.º 3, uma vez que antes o n.º 3 dizia “também permitida a leitura das declarações anteriormente prestadas perante Juiz” e o novo n.º 3 alterou dizendo “também permitida a leitura das declarações anteriormente prestadas perante autoridade judiciária”.

10. Referindo, ainda, que tal alteração apenas tem utilidade se tal leitura não estiver dependente da concordância prevista no disposto no n.º 5 (concordância dos arguidos, MP e Assistente).

11. Bem … o Tribunal a quo parece ter-se esquecido que o artigo em causa, o art.º 356º do CPP, é composto por 9 (nove) números e que, assim sendo, este artigo terá que ser interpretado tendo em conta o seu todo.

12. Antes de mais qualquer disposição legal deve ser analisada desde o seu início (desde do seu nº 1) e em conjugação com outras que com a primeira estejam relacionadas. No caso em concreto deverá ser analisado todo o art.º 356º do CPP.

13. O art.º 356º do CPP regula quais os autos que podem ser lidos em Audiência de Discussão e Julgamento, e começa, como é evidente, pelo seu n.º 1.

14. E este n.º 1 do art.º 356º do CPP fixa inequivocamente a REGRA nesta matéria, através da formulação “Só é permitida a leitura em audiência de autos (…) Ou seja, logo no nº 1 temos a proibição de leitura como status natural.

15. Partindo dessa proibição regra, são estabelecidas, ainda no nº 1, as exceções relativas à leitura de autos: todas aquelas que não contenham declarações do arguido, assistente, partes civis ou de testemunhas; assim como a leitura dos autos decorrentes dos atos regulados pelos artigos 319º, 320º e 321º.

16. Ou seja, regra: não é permitida a leitura de autos que contenham declarações do arguido, assistente, partes civis ou de testemunhas.

17. ESTA É A REGRA. Ou seja do nº 1 resulta, para o que aqui nos interessa, a proibição de leitura como status natural e, ainda, a proibição de leitura de autos que contenham declarações do arguido, assistente, partes civis ou de testemunhas (a contrário).

18. No nº 2 do art.º 356º do CPP deparamo-nos com um regime de exceções à proibição de leitura de autos que contenham declarações do assistente, das partes civis e das testemunhas, quando estas tenham sido prestadas perante o Juiz (aqui entendido no sentido amplo, incluindo o Juiz de Instrução Criminal), ou seja, exceções à alínea b) do n.º 1, em três casos, a saber: - Primeiro, se as declarações tiverem sido obtidas nos termos dos artigos 271º e 294º, isto é se resultarem da prestação de declarações para memória futura; - Segundo, se o MP, o arguido e o assistente estiverem de acordo na leitura; - Terceiro, quando são obtidas mediante rogatórias ou precatórias legalmente permitidas.

19. Ou seja, este n.º 2 do art.º 356º do CPP estabelece, tendo em conta a matéria em análise, que quando as declarações das testemunhas em sede de inquérito tenham sido prestadas perante um juiz apenas podem ser lidas aquelas que tenham sido prestadas para memória futura (o que se entende, pois como sabemos, neste caso, o princípio do contraditório encontra-se totalmente salvaguardado, na medida em que ao arguido e ao seu mandatário são comunicados o dia, hora e local da prestação do depoimento para que possam estar presentes sendo obrigatória a presença do defensor do arguido) aquelas que tenham sido obtidas mediante carta rogatória ou precatória legalmente permitidas (o que se entende, pois como sabemos, neste caso, o princípio do contraditório encontra-se também salvaguardado), ou aquelas relativamente às quais exista a concordância, entre outros, do arguido!

20. O n.º 3, por sua vez, estabelece que “é também permitida a leitura de declarações prestadas perante autoridade judiciária na parte necessária ao avivamento da memória de quem declarar na audiência que já não recorda certos factos ou quando houver entre elas e as feitas em audiência contradições ou discrepâncias.”

21. Ora, tendo em conta o nº 1 e o n.º 2 do referido artigo, este n.º 3 deverá ser interpretado no sentido de que quando as declarações das testemunhas em sede de inquérito tenham sido prestadas perante autoridade judiciária (MP) estas só podem ser lidas em sede de julgamento quando tal leitura seja necessária ao avivamento da memória de quem declarar na audiência que já não recorda certos factos ou quando houver entre elas e as feitas em audiência contradições ou discrepâncias e não com qualquer outro fundamento.

22. Mas relativamente às quais é exigido SEMPRE a concordância prevista no n.º 2 alínea b) do CPP, ou seja a concordância de todos os sujeitos processuais, nomeadamente do arguido.

23. Concretizando o nosso entendimento: - Quando as declarações das testemunhas em sede de inquérito tenham sido prestadas perante juiz, estas podem ser lidas em sede de julgamento, bastando para o efeito a concordância de todos os sujeitos processuais, não se exigindo qualquer fundamento para ser requerida a leitura de tais declarações. Podem ser pedidas sem mais! – Quando as declarações das testemunhas em sede de inquérito tenham sido prestadas perante MP estas só podem ser lidas em sede de julgamento com a concordância de todos os sujeitos processuais e desde que tal leitura seja necessária ao avivamento da memória de quem declarar na audiência que já não recorda certos factos ou quando houver entre elas e as feitas em audiência contradições ou discrepâncias e não com qualquer outro fundamento. Aqui a admissão da leitura de tais declarações tem que ter, para além da concordância de todos os sujeitos processuais, a fundamentação de que tal leitura é necessária para o avivamento da memória da testemunha ou porque se verificaram as referidas contradições ou discrepâncias.

24. Esta exigência de concordância de todos os sujeitos processuais na leitura das declarações prestadas em sede de inquérito por qualquer testemunha resulta não só do art.º 356 nº 2 alínea b), mas também do n.º 5 do mesmo artigo.

25. Agora perguntamos nós: Se assim não fosse, para que caso seria necessário a concordância do arguido prevista no n.º 5, quando neste n.º 5 se refere expressamente “declarações prestadas perante o MP”?

26. Mais: Se assim não fosse, como é que o n.º 2, alínea b) exige a concordância do arguido quando as declarações das testemunhas tenham sido prestadas em inquérito perante um juiz e já não exige essa concordância quando tenham sido prestadas perante MP!?

27. Por sua vez, o n.º 4 do art.º 356.º do CPP abre o leque das declarações que podem ser lidas àquelas declarações que foram prestadas perante o Ministério Público e o Juiz em sede de Inquérito, mas apenas nos casos em que “os declarantes não tiverem podido comparecer por falecimento, anomalia psíquica superveniente ou impossibilidade duradora”.

28. Esta disposição permite o reaproveitar de declarações que não podem de todo ser repetidas em audiência devido a factos não previsíveis antes da sua realização e, embora atalhando ao contraditório, realiza a procura da verdade material, mas apenas quando a contradita da prova se torna absolutamente impossível.

29. Tendo já sido mencionado os efeitos do n.º 5, passamos para a análise do n.º 6, o qual impede a leitura das declarações de testemunhas que, embora tenham deposto durante a fase investigatória, tenham direito a não prestar declarações.

30. O n.º 7 proíbe o depoimento sobre declarações cuja leitura seja proibida, por parte dos órgãos de polícia criminal, assim como de qualquer pessoa, que tenha participado na obtenção dessas mesmas declarações de leitura não permitida. Esta disposição visa garantir a não introdução em audiência das declarações de leitura não permitida através do testemunho de quem as tenha tomado.

31. Quanto ao n.º 8, não permite a visualização ou a audição de atos processuais que reproduzam autos cuja leitura não seja permitida, nos termos deste artigo.

32. Já o n.º 9 obriga o tribunal a fazer constar em ata as autorizações de leitura (previstas no n.º 2 alínea b) e n.º 5), visualização ou audição de autos, assim como a sua fundamentação, sob pena de nulidade.

33. Em suma, podemos dividir as permissões de leitura em três categorias diversas: - Declarações prestadas, com as formalidades estabelecidas para a audiência (as prestadas nos termos dos artigos 271º, 294º, 318º, 319º e 320º do CPP); - Declarações cuja leitura todas as partes tenham acordado permitir – perante o juiz sem qualquer fundamento e quando prestadas perante o MP apenas com o fundamento na necessidade de avivar a memória do declarante ou a esclarecer contradições; - Declarações cujo conteúdo se tornou impossível de repetir em julgamento.

34. Como se vê a partir desta exposição, o sistema em vigor continua a ser extremamente limitativo quanto à leitura, durante a audiência de julgamento, das declarações de testemunhas proferidas em sede de inquérito, perante o Juiz, Ministério Público ou órgãos de polícia criminal.

35. Ou seja, a leitura ou reprodução em audiência das declarações anteriormente prestadas pelas testemunhas perante o Ministério Público nos termos do 356º, n.º 3 (quer seja para o avivamento da memória, quer seja quando houver discrepâncias, entre elas e as feitas em audiência), exige necessariamente, nos termos do n.º 5 a concordância do arguido (exigência da alínea b) do nº 2 para a qual remete a parte inicial do nº 5), SOB PENA DE ESTARMOS PERNATE PROIBIÇÃO DA PROVA OBTIDA.

36. No caso em apreço, e relativamente à leitura em audiência, das declarações prestadas pela testemunha supra identificada, não houve consenso na audiência para a sua leitura como exigido pelo n.º 2, alínea b) e nº 5 ambos do art.º 356º do Código de Processo Penal, pelo que a leitura das referidas declarações em audiência de julgamento constituiu um ato não permitido por lei, pois tal leitura só seria possível com o consentimento de todos os sujeitos processuais, incluindo os arguidos, e esta anuência inexistiu in casu.

37. O Tribunal a quo ao admitir a leitura daquelas anteriores declarações – que não são objeto de prova – perante a não obtenção prévia da concordância de quem tinha legal poder para o permitir ou impedir, por entender que tal concordância não era legalmente necessária e ou exigível, violou o disposto no nº 4 do art.º 20º da CRP e o art.º 32º da CRP.

38. De facto, o Tribunal a quo, ao admitir a leitura das declarações prestadas em inquérito por aquelas testemunhas nos moldes em que o fez desequilibrou o processo a favor da acusação, tendo assegurado um tratamento de favor ou privilégio para o Ministério Público (e, consequentemente, discriminatório para a defesa), não tendo garantido o cumprimento do princípio do contraditório.

39. Por todo o exposto, e atento o disposto no art.º 32º, nºs 1, 2 e 5 da CRP e nos artigos 127º, 355º, 356º, nºs 1, 2, al. b) e 5 e 323º, al. f), estes do CPP, mal andou o Tribunal a quo ao ter procedido à leitura em audiência de julgamento das declarações prestadas pelas referidas testemunhas perante o Ministério Público, porquanto, não tendo havido acordo para as referidas leituras entre os sujeitos processuais, estava-lhe vedado (ao Coletivo de primeira instância), por ser legalmente inadmissível, a leitura das mesmas.

40. Assim sendo, o acórdão recorrido deveria ter adotado um entendimento normativo do art.º 356º nº 2, alínea b) e nº 5 do C.P.P., em consonância com o disposto no art.º 355º nº 1 do C.P.P., no sentido de que não tendo os arguidos dado o seu consentimento à leitura, requerida pelo MP, de declarações produzidas, em inquérito, por testemunhas perante o MP, de declarações produzidas, em inquérito, por testemunhas perante o MP, não pode – em nenhuma das situações previstas no art.º 356º, n.º 3 do CPP – ser admitida a sua leitura em audiência de julgamento e subsequente confronto de tais testemunhas com essas declarações.

41. Ao ter um entendimento totalmente oposto àquele, tal entendimento normativo é inconstitucional, por violação das garantias de defesa consagradas pelo art.º 32º nº 1 da C.R.P. e o princípio do processo equitativo salvaguardado pelo art.º 20º nº 4 da C.R.P. e pelo art.º 6º da C.E.D.H.

42. Tendo estes argumentos em conta, não podemos deixar de anotar que acima deles está a lógica interna do CPP que limita a valoração de prova adquirida de forma ilegal e reproduzida (ou examinada) em audiência quando a sua reprodução não é legalmente permitida.

43. Assim sendo, e para além de todo o exposto, toda a prova extraída da leitura efetuada em julgamento das declarações prestadas por aquelas testemunhas em sede de inquérito são legalmente inadmissíveis, nos termos do art.º 125º do CPP, por tal leitura ser inadmissível, nos termos do art.º 125º do CPP, por tal leitura ser

 inadmissível, nos termos do art.º 356º, nº 2 alínea b) e nº 5 do CPP sem a necessária concordância do arguido.

44. Não poderia desta forma o tribunal recorrido valorar tais depoimentos, devendo os mesmos serem declarados inválido, por violação do art.º 355º do CPP violou desta forma o princípio da imediação, que nos diz que são inutilizáveis as provas que não tiverem sido produzidas em audiência, com exceção das previstas no art.º 356º e 357º do CPP.

45. Assim, para formar decisivamente a sua convicção quanto à participação dos arguidos nos factos que deu como provados, o Tribunal a quo serviu-se de provas nulas e proibidas pelas seguintes normas legais art.º 125º, 128º, 355º e 356º todos do CPP.

46. Face ao supra exposto e sem necessidade de mais considerandos, deve a norma constante do art.º 356º nº 3 do CPP ser declarada inconstitucional, quando interpretada no sentido de que a leitura dos depoimentos testemunhais prestados em sede de inquérito perante autoridade judiciária é admitida, sem ser necessário o consentimento dos arguidos, quando aquela leitura se destine a avivar a memória de quem declare na audiência já não se lembrar de certos factos, ou quando existir entre elas e as feitas na audiência discrepâncias ou contradições.

47. Tal interpretação deve ser declarada inconstitucional, por violação do disposto no art.º 20º nº 4 da CRP, art.º 32 nº 1, 2 e 5 da CRP – INCONSTITUCIONALIDADE QUE DESDE JÁ SE ALEGA (NOVAMENTE) E REQUER PARA OS DEVIDOS EFEITOS LEGAIS.

48. Nestes termos e sem necessidade de mais considerandos, DEVE A DECISÃO RECORRIDA SER REVOGADA E SUBSTITUÍDA POR OUTRA QUE JULGUE A EXISTÊNCIA DA NULIDADE E INCONSTITUCIONALIDADE INVOCADAS E ALEGADAS, com todas as consequência legais que daí advenham.

49. Condenou o Tribunal de 1.ª Instância, o ora Recorrente na pena de 6 anos e 10 meses de prisão pela prática em coautoria material de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo art.º 21º nº 1 e 24.º al. i) do Decreto-Lei 15/93 de 22 de Janeiro, do qual vinham acusados os arguidos.

50. Por sua vez, o mesmo Tribunal que condenou o arguido A... na pena de 5 anos e 10 meses, a arguida D... na pena de 5 anos e 4 meses, e o arguido C... na pena de 18 meses.

51. O Recorrente, não se conforma com a pena aplicada, considerando que a pena de prisão que lhe foi aplicada, é manifestamente excessiva tendo em conta o seu grau de culpa e de participação.

52. A medida da pena, é construída nos termos do binómio culpa e prevenção.

53. Refere o Douto Acórdão ora em crise, que na medida concreta das penas a aplicar relevará, o princípio contido no n.º 1 do art.º 71º do Código Penal.

54. A exigência legal de que a medida da pena seja encontrada pelo Juiz em função da culpa e da prevenção é absolutamente compreensível e justificável.

55. Através do requisito de que sejam levadas em conta as exigências da prevenção, dá-se lugar à necessidade comunitária da punição do caso concreto e, consequentemente, à realização in casu das finalidades da pena.

56. Através do requisito de que seja tomada em consideração a culpa do agente, dá-se tradução à exigência de que a vertente pessoal do crime – ligada ao mandamento incondicional de respeito pela eminente dignidade da pessoa do agente – limite de forma inultrapassável às exigências de prevenção.

57. O ora Recorrente A... , não se poderia de modo algum, conformar, com a Douta Decisão proferida, no que tange à pena concretamente aplicada, de 6 anos e 10 meses de prisão, e ainda, à não suspensão da pena de prisão, a qual nem sequer foi ponderada atenta a medida da pena aplicada superior a 5 anos.

58. Uma vez que, no entendimento do ora Recorrente a pena concretamente aplicada é manifestamente excessiva, tendo em conta a ilicitude dos factos em apreço.

59. A medida da pena, é construída pelo binómio culpa e prevenção.

60. Contudo, não podemos olvidar, que pese embora a atividade de tráfico provada no âmbito dos presentes autos relativamente aos Arguidos, incida sobre as drogas duras, a verdade é que a mesma foi praticada de forma incipiente, com pouca organização, não foram apreendidos quaisquer produtos estupefacientes nem qualquer elemento pertencente à parafernália do tráfico do tráfico que permita falar em sofisticação ou grande tráfico.

61. Quando se fala de prevenção como princípio regulativo da atividade judicial de medida da pena, não pode ter-se em vista o conceito de prevenção em sentido amplo, como finalidade global de toda a política criminal, ou seja, como conjunto dos meios e estratégias preventivos de luta contra o crime.

62. O que está aqui em causa é na verdade, a aplicação de uma concreta consequência jurídico-penal, num momento em que o crime já foi cometido e não pode por isso falar-se com sentido de prevenção na aceção referida.

63. “Prevenção” tem, no contexto que aqui revela, o preciso sentido que possui quando se discute o sentido e as finalidades de aplicação de uma pena, quando se discute, numa palavra, a questão das finalidades das penas.

64. Dito por outras palavras, “prevenção” significa, por uma lado prevenção geral, e, por outro lado, prevenção especial, com a conotação específica que este termos assumem na discussão sobre as finalidades da punição.

65. Porém, a prevenção geral, no seu entendimento mais atual, como prevenção geral positiva ou de integração, é um momento irrenunciável – e na verdade, o mais essencial – de aplicação da pena, e não pode, por isso deixar de revelar decisivamente para a medida daquela.

66. Assim, a prevenção geral positiva traduz-se na confiança que a sociedade precisa de manter na vigência da norma, é o mínimo exigível da pena, ora no presente caso do ora Recorrente, ainda, que as necessidades de prevenção geral positiva sejam elevadas, tendo em conta que o grau de ilicitude do facto.

67. Acresce, que no caso do ora Recorrente, foi a sua educação num meio pautado pela marginalidade, a baixa escolaridade, e outros fatores de ordem social, que conduziram à delinquência.

68. A medida da pena, não pode em caso algum ultrapassar a medida da culpa. A verdadeira função desta última, na doutrina da medida da pena, reside, efetivamente, numa incondicional proibição de excesso.

69. A culpa constitui um limite inultrapassável, de todas e quaisquer considerações preventivas, sejam elas de prevenção geral positiva ou antes negativa, de integração ou antes de intimidação, sejam de prevenção especial positiva ou negativa, de socialização, de segurança ou de neutralização.

70. Com o que se torna indiferente saber se a medida da culpa é dada num ponto fixo da escala penal ou antes como uma moldura da culpa.

71. De qualquer modo, e qualquer que seja a solução encontrada, de uma ou de outra forma, a culpa é o limite máximo da pena adequado à culpa que não pode ser ultrapassado.

72. Uma tal ultrapassagem, mesmo em nome das mais instantes exigências preventivas, poria em causa a dignitas humana do delinquente e seria assim, como o é nos presentes autos, por razões jurídico-constitucionais, inadmissível.

73. Ora, no modesto entendimento da Recorrente, tal limite foi claramente e grosseiramente ultrapassado, na pena que concretamente foi aplicada de 6 anos e 10 meses de prisão.

74. Não se provou que o Arguido ora Recorrente tivesse obtido lucros dessa mesma atividade, o que tivesse transacionado quantidades elevadas de produto estupefaciente.

75. De facto, a medida da pena não pode exceder a medida da culpa, contudo a pena concretamente aplicada ao ora Recorrente excede claramente a medida da sua culpa.

76. Assim, impõe-se a aplicação de uma pena justa e proporcional, tendo em conta a efetiva participação nos factos.

77. Face ao supra exposto, o Arguido ora Recorrente, entende que para que lhe seja aplicada uma pena justa, adequada e proporcional, a qual não exceda o seu grau de culpa e participação nos factos ora em apreço, esta terá de ser fixada junto ao mínimo legal quer o presente Recurso proceda relativamente à qualificação jurídica dos factos, quer não proceda.

78. Esta medida concreta da pena que o ora Recorrente pretende que agora lhe seja aplicada por este Alto Tribunal é aquela que lhes parece mais adequada, justa e proporcional tendo em conta a sua efetiva participação nos factos em apreço.

79. Pois bem, as penas aplicadas à Recorrente é manifestamente desproporcional tendo em conta a gravidade e a ilicitude dos factos em apreço.

80. Pelo que se entende que o Douto Acórdão recorrido deve ser revogado, devendo ser substituído por outro que condene o ora Recorrente numa pena de prisão fixada no mínimo legal, que irá realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

81. Assim, e por todo o exposto, e independentemente da pena de prisão que seja concretamente aplicada por vós, venerandos Juízes, a verdade é que a mesma deverá ser, sempre, igual mas não superior a cinco anos de prisão, não ultrapassando assim a medida da culpa do Recorrente.

82. Ora, o Recorrente tem inúmeros problemas de saúde e é consumidor de produtos estupefacientes.

83. Para além disso, o Tribunal a quo deveria ter considerado, e não considerou, que o estigma da prisão representa um fator de enorme perturbação no processo de empenho e de afirmação no contexto das relações sociais – para além de desempenhar um fator de aprendizagem que conduz, em percentagem preocupante, a um crescente aperfeiçoamento e à reincidência criminal.

84. Por outro lado, deveria aplicar uma pena ao recorrente que permitisse ponderar a suspensão da mesma.

85. Tal poderia resultar, sem dúvida alguma, um efeito de responsabilização e de estímulo facilitando a reinserção social do Recorrente, auxiliando-o a superar e a não voltar a praticar atos ilícitos.

86. Por outro lado, ainda, se o cumprimento de pena de prisão já é, nos casos gerais, a última das opções a tomar, por maioria de razão o deverá ser no caso do Arguido atentas as razões já explicadas e as suas concretas condições sociais e pessoais.

87. Assim, entende o Recorrente, que tendo em conta as circunstâncias concretas do caso, do estado emotivo do Recorrente, deveria beneficiar de uma pena de prisão próxima do mínimo legal, caso o Recurso não proceda, relativamente, à qualificação jurídica dos factos.

88. Por outro lado, entende o Recorrente que a pena aplicada, pelos motivos supra expostos deveria ser sempre igual e não superior a cinco anos, e ainda, deverá ser suspensa na sua execução sujeita a regras de conduta destinadas a promover a reintegração do ora Recorrente na sociedade.

89. Pelo que se entende que o Douto Acórdão recorrido deve ser revogado, devendo ser substituído por outro que condene o ora Recorrente numa pena de prisão, no nosso humilde entendimento que não deve ultrapassar os 5 anos de prisão, pena que irá realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

90. Assim, e por todo o exposto, e independentemente da pena de prisão que for concretamente aplicada por vós, Venerandos Juízes, a verdade é que a mesma deverá ser, sempre, inferior à pena de prisão aplicada pelo Tribunal a quo, não ultrapassando assim a medida culpa do Recorrente.

91. Face ao exposto entende o Recorrente que, o douto acórdão recorrido deve ser revogado, devendo ser substituído por outro que condene o ora recorrente numa pena de prisão, no nosso humilde entendimento que não deve ultrapassar os 5 anos de prisão; que irá realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

92. E independentemente da pena de prisão que for concretamente aplicada por vós, Venerandos Juízes, a verdade é que a mesma deverá ser, sempre, inferior à pena aplicada pelo Tribunal a quo.

93. O Arguido, ora Recorrente, rejeita, de facto que a pena de prisão efetiva seja a única espécie de pena que realize, no caso concreto, de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

94. Uma vez que, não se encontram esgotadas todas as virtualidades pedagógicas e ressocializadoras que uma pena não detentiva poderá ainda ter sobre o Recorrente, não obstante a gravidade do caso em apreço e dos antecedentes criminais do arguido.

95. O recorrente considera que o Tribunal a quo deveria ter partido de uma premissa que não partiu – da premissa de que as penas devem ter sempre um caráter ressocializador.

96. Pelo que se entende que o Douto Acórdão recorrido deve ser revogado, devendo ser substituído por outro que aplique e suspenda pena de prisão igual e não superior a 5 anos, por esta, ainda, realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

97. E não se diga, a este propósito, que com a pena ora pretendida e respetiva suspensão, não se estará a dar um sinal às comunidades da residência da arguida de que a sua conduta não se pode repetir.

98. Isto porque a suspensão da execução da pena insere-se num conjunto de medidas não institucionais que, não determinando a perda da liberdade física, importam sempre uma intromissão mais ou menos profunda na condução da vida dos delinquentes, pelo que, embora funcionem como medidas de substituição, não podem ser vistas como formas de clemência legislativa, pois constituem autênticas medidas de tratamento bem definido, com uma variedade de regimes aptos a dar adequada resposta a problemas específicos.

99. É substitutivo particularmente adequado das penas privativas de liberdade que importa tornar maleável na sua utilização.

100. No caso em apreço, a simples censura do facto e a ameaça da pena de prisão bastarão para realizar as finalidades da punição, sendo possível fazer um juízo de prognose social favorável aos Arguidos, sendo crível que a Arguida sentirá a sua condenação como uma advertência e que não cometerá no futuro nenhum crime.

101. Por todo o exposto, entende o Recorrente, que ainda é possível fazer um juízo de prognose social favorável, devendo a pena de 6 anos e 10 meses de prisão ser reduzida para uma pena igual e não superior a 5 anos e ser a mesma suspensa na sua execução por igual período, sendo-lhe impostas todas as regras de conduta e injunção que se julgarem adequadas às necessidades do caso em apreço.

102. Constituindo corolário da preferência manifestada pela lei, pelas penas não privativas da liberdade, conhecidos que são os efeitos criminógenos da prisão.

103. Por conseguinte, a suspensão da execução da pena de pisão, pressupõe que o julgador, reportando-se ao momento da decisão, possa fazer um juízo de prognose favorável relativamente ao comportamento do arguido.

104. Ora in casu, entendemos que o desvalor da conduta, não se coloca num plano em que a confiança da sociedade na eficácia da norma e no sistema de justiça reclama pena privativa da liberdade.

105. Salienta-se ainda, que o arguido tem inúmeros problemas de saúde.

106. Assim, julgamos que deverá permitir-se ao Arguido uma derradeira oportunidade para mudar de vida e atuar conforme ao direito.

107. Assim, julgamos que deverá permitir-se ao Arguido ora Recorrente A... , derradeira oportunidade para mudar de vida e atuar conforme ao direito, aplicando-se pena de prisão igual e não superior a cinco anos, e suspendendo-se assim a pena de prisão aplicada.

NORMAS VIOLADAS:

· Artigo 71º nº 1 e 2 do Código Penal;

· Artigo 70º do Código Penal;

· Artigo 71º do Código Penal;

· Artigo 50º do Código Penal;

· Artigo 52º do Código Penal;

· Artigo 1º e 4º do DL nº 401/82 de 23/9;

· Artigo 356º do CPP;

· Artº 20º e Art.º 32º da CRP.

Nestes termos, e nos mais em Direito consentidos que vós, Venerandos Juízes Desembargadores, muito doutamente suprireis, se requer seja o presente recurso julgado procedente nos exatos termos supra expostos, com todas as legais consequências que daí advenham.

Para que, pela vossa douta palavra, se cumpra a consueta Justiça.

D...:

1. Foi a ora Recorrente condenada por Acórdão proferido em 21 de Outubro de 2016 pelo Coletivo de Juízes da secção Criminal da Instância Central da Comarca de Coimbra, pela coautoria material de um crime de tráfico de estupefacientes agravado p. e p. pelo art.º 21.º nº 1 e 24º, alínea i) da Lei 15/93, de 22 de janeiro, na pena de 5 anos e 4 meses de prisão, cuja coautoria material já lhe era imputada no libelo acusatório.

2. No modesto entendimento da ora Recorrente, nos presentes autos, foram incorretamente julgados os factos constantes dos Pontos 8, 46, 47 e 48 matéria de facto provada. Ora, no entender da Recorrente, estes factos deviam constar dos “Factos não provados”, pelo menos, no que tange à participação da ora Recorrente D....

3. Refere o Tribunal Recorrido no Acórdão proferido que fundou a sua convicção, no conjunto de elementos de prova, dos quais o Coletivo de Juízes entendeu resultar provada a prática do crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo artigo 21º nº 1 e 24º, al. i) do DL. 15/93, de 22 de Janeiro. Contudo, entende a Recorrente que a prova produzida deveria ter sido valorada de maneira diversa da plasmada no Acórdão ora em crise.

4. Pugnando a Recorrente no presente Recurso pela sua Absolvição da prática do crime de tráfico de estupefacientes agravado, p. e p. pelo artigo 21º nº 1 e 24º al. i) do DL. 15/93, de 22 de Janeiro. Pois, no entendimento da ora Recorrente, a prova produzida em sede de Julgamento, é manifestamente insuficiente para condenara a ora Recorrente pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, p. e p. pelo artigo 21º nº 1 e 24º al. i) do DL. 15/93, de 22 de Janeiro.

5. Ora, face à insuficiência da prova produzida, e sob pena da violação grosseira do princípio do in dúbio pro reo, deveria o Tribunal a quo ter proferido decisão que absolvesse a ora Recorrente do crime de tráfico de estupefacientes agravado pelo qual foi condenada.

6. Mais, não se conforma a ora Recorrente, nem se poderia de modo algum, conformar, com a Douta Decisão proferida, no que tange ao indeferimento das nulidades arguidas, à pena concretamente aplicada, e à não suspensão da pena de prisão, a qual nem sequer foi ponderada atenta a medida concretamente aplicada. Mais entende a Arguida Recorrente que a pena que concretamente lhe foi aplicada, é manifestamente excessiva tendo em conta a gravidade dos factos provados, e as suas concretas circunstâncias.

7. A arguida ora Recorrente D..., não se conforma de modo algum com a decisão proferida, pois entende que não foi produzida prova, de que a ora Recorrente praticou qualquer ato suscetível de integrar a prática de um crime de tráfico de estupefaciente agravado pela al. i) do art.º 24º do DL. 15/93, de 22 de Janeiro.

8. Não tendo sido produzida qualquer prova em sede de audiência de discussão e julgamento dos seguintes factos que o tribunal a quo, erroneamente valorou como provados, pelo menos no que tange à participação da ora Recorrente, dos factos constantes dos Pontos 8, 46, 47 e 48 da matéria de facto provada.

9. Ora esta Testemunha Z..., nada de relevante referiu relativamente aos Menores E... e P.... Ainda menos, algo que houvesse sido previamente determinado e ordenado pela ora Recorrente.

10. De facto, a testemunha refere que os Menores residiam na habitação dos Arguidos, o que resulta, nomeadamente, do teor dos relatórios sociais. Contudo, esse facto só por si, não permite afirmar que os menores era utilizados na atividade de tráfico dos arguidos.

11. Acontece que, a testemunha não afirmou ter visto qualquer ato praticado pelos Menores em que estivessem presentes os Arguidos B... e D... ora Recorrente. Referindo apenas a presença do Arguido A... .

12. O que não permite por si só, inferir que os Arguidos B... e D... ora Recorrente, tivessem conhecimento do envolvimento dos Menores na atividade delituosa dos Arguidos.

13. A Testemunha Sargento U... , referiu no que tange à alegada utilização dos menores E... e P... que tudo se encontrava vertido nos autos nas vigilâncias. Nos quais não participou em grande maioria das mesmas, tendo referido serem outros colegas que o fizeram.

14. Mais referiu que na residência habitavam os dois menores E... e P.... Contudo nada adiantou relativamente à alegada participação dos mesmos na atividade de tráfico dos arguidos.

15. Não conseguindo a testemunha, afirmar com a certeza que é exigível, quais os arguidos que se encontravam em concreto, no interior do apartamento, enquanto lá também se encontravam os menores.

16. Assim, forçoso é concluir que do depoimento da testemunha não se pode de modo algum extrair que os arguidos B... de D... orientassem ou utilizassem os menores na atividade ilícita do tráfico.

17. Ademais, não se conseguiu sequer extrair do depoimento da testemunha que os Arguidos B... (Filho) e D..., tivessem conhecimento sequer que os menores eram utilizados na atividade de tráfico.

18. Esta Testemunha V... , à semelhança das anteriores também não conseguiu afirmar com certeza que em alguma das três situações que relatou, tivesse visto o Menor E... a trocar o que quer que seja. Afirma apenas ter visto um gesto do menor. Nada mais …

19. Não afirma que tivesse visto o Menor a receber o que quer que seja dos condutores. Ademais, não afirma, nem poderia afirmar qual dos arguidos estava nas imediações do local a orientar os Arguidos.

20. Quanto ao mais, afirma que por vezes via os menores na varanda, por vezes os dois, por vezes só um, por vezes a brincar. O que é consonante com o normal acontecer, uma vez que os menores ali residiam.

21. Assim, do depoimento da testemunha não se pode extrair, por muito esforço, que se faça nesse sentido, que os Arguidos B... e D..., tivessem sequer conhecimento que os Menores era utilizados na atividade de tráfico.

22. Importa desde já salientar, que esta testemunha AO... , foi o primeiro e único consumidor a afirmar em sede de julgamento, que um Menor lhe entregou estupefaciente. Ademais importa desde já referir que esta testemunha, contactava previamente, sempre por telefone o Arguido A... “ AA... ”. E foi na sequência de um desses contactos, que surgiu o menor.

23. Importa também salientar, que a testemunha refere que por vezes contactava o A... (Pai), e na sequência desse contacto aparecia o B... (Filho). Ora, do depoimento desta testemunha devidamente conjugado com os depoimentos dos elementos policiais, não se pode extrair que quer o Arguido B... (Filho), quer a arguida D... tivessem, participação ou conhecimento do envolvimento dos Menores na atividade delituosa.

24. Face ao supra exposto, devem os factos constantes dos pontos 8, 46, 47 e 48 dos factos provados, passar a constar dos factos não provados, pelo menos no que tange à participação do ora Recorrente B... (Filho).

25. Face ao supra exposto deve a ora Recorrente ser absolvida da prática do crime de tráfico de estupefacientes agravado p. e p: pelos artigos 21º nº1 e 24º al: i) do dl. 15/93 de 22 de janeiro, pelo qual foi julgado e condenado, uma vez que não foi produzida prova suficiente da participação da Recorrente nos factos em apreço nos presentes autos.

26. [Os pontos 26 a 68 do presente recurso constituem reprodução das conclusões 2. a 48. supra transcritas do recurso do arguido A... , para as quais, por uma questão de economia, se remete].

69. Como já supra se disse na presente peça recursória no que tange à matéria de facto, nenhuma prova foi produzida em relação à ora Recorrente, pelo menos, no que tange à participação conjunta nos factos com os restantes Arguidos, no que tange à utilização dos menores E... e P... na atividade delituosa de tráfico de estupefacientes.

70. Ou seja, não resultaram provados quaisquer factos dos quais resulte a coautoria da Recorrente com os restantes Arguidos no que tange à utilização dos menores na atividade delituosa de tráfico.

71. Muito menos, no que tange ao envolvimento dos menores nos factos em apreço. Não se provou qualquer facto, que permita afirmar que o Arguido ora Recorrente tinha sequer conhecimento do envolvimento dos menores nos factos, muito menos se provou que o Arguido contasse com a colaboração dos menores no que quer que seja.

72. O Tribunal recorrido condenou os arguidos, e também a recorrente, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art.º 21º, n.º 1 e 24º, al. i) do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro.

73. Assim, atendendo à fundamentação de facto plasmada na presente peça recursória, a Recorrente não deveria ter sido condenada pelo tráfico agravado p. e p. pelos artigos 21.º n.º 1 e 24º, al. i) do Decreto-lei 15/93, de 22 de Janeiro, mas sim pelo tráfico de menor gravidade p. e p. pelo art.º 25º do D.L. 15/93 de 22 de Janeiro.

74. Sendo o crime de tráfico de estupefacientes um crime de perigo abstrato, não se exige para a sua consumação, a existência de um dano real e efetivo.

75. Pelo que a gravidade, a propagação e a tendência para o alastramento dos danos causados pelo tráfico de estupefacientes justificam a tipificação própria dos crimes de perigo, sem violação do princípio da necessidade das penas e das medidas de segurança.

76. Ora, uma vez que o crime de tráfico de estupefacientes possui vários cambiantes ou escalões, a lei não poderia deixar de considerar a existência dessas graduações e, assim, de algum modo distinguir a gravidade relativa da atuação que lhes subjaz.

77. A intenção político-legislativa é, sobretudo, a de permitir ao julgador operar com maior segurança, por mais amplas serem as abrangências e a distinção, identificando-lhes as diferenças, entre os casos de tráfico importante e o chamado “tráfico de menor gravidade”.

78. Ao cabo e ao resto trata-se da assumida opção por uma maior flexibilidade de valoração, não só na tarefa de sopesamento da ilicitude das condutas, como também na não menos delicada operação de delinear parâmetros permissivos de uma adequada justiça relativa no doseamento sancionatório, o que nem sempre é fácil de lograr em domínio tão diversificado como aquele em que ora nos situamos.

79. De todo o modo, a valoração destinada a diferenciar o tráfico mais grave do menos grave não pode nem deve ser realizada de forma superficial ou ligeira. É que não nos podemos esquecer que, muitas vezes, quer os aparentemente pequenos traficantes quer os chamados dealers de rua assumem um papel preponderante ou mesmo essencial nos circuitos do grande tráfico, podendo ser partes integrantes na longa cadeia em que tal tráfico se desenrola.

80. Assim atenta a factualidade provada e apreciada a ilicitude global, entende-se que a atividade da Arguida D... ora Recorrente, se enquadra no crime do artigo 25º do DL 15/93.

81. E em consequência, ser a ora Recorrente condenada pela prática de um crime de tráfico previsto no ARTIGO 25º (tráfico de menor gravidade), do Decreto-lei 15/93 de 22 de Janeiro, em pena de prisão de máximo NÃO SUPERIOR a 3 anos de prisão.

82. Condenou o Tribunal de 1.ª Instância, a ora Recorrente na pena de 5 anos e 4 meses de prisão pela prática em coautoria material de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo art.º 21º nº 1 e 24º al. i) do Decreto-Lei 15/93 de 22 de Janeiro, do qual vinham acusados os arguidos.

83. Por sua vez, o mesmo Tribunal que condenou o arguido A... na pena de 5 anos e 10 meses, o Arguido A... 6 anos e 10 meses, a arguida D... ora Recorrente na pena de 5 anos e 4 meses, e o arguido C... na pena de 18 meses.

84. A Recorrente, não se conforma com a pena aplicada, considerando que a pena de prisão que lhe foi aplicada, é manifestamente excessiva tendo em conta o seu grau de culpa e de participação. A medida da pena, é construída nos termos do binómio culpa e prevenção.

85. Através do requisito de que sejam levadas em conta as exigências da prevenção, dá-se lugar à necessidade comunitária da punição do caso concreto e, consequentemente, à realização in casu das finalidades da pena. Através do requisito de que seja tomada em consideração a culpa do agente, dá-se tradução à exigência de que a vertente pessoal do crime – ligada ao mandamento incondicional de respeito pela eminente dignidade da pessoa do agente – limite de forma inultrapassável às exigências de prevenção.

86. A ora Recorrente D..., não se poderia de modo algum, conformar, com a Douta Decisão proferida no que tange à pena concretamente aplicada, de 5 anos e 4 meses de prisão, e ainda à não suspensão da pena de prisão, a qual nem sequer foi ponderada atenta a medida da pena aplicada superior a 5 anos.

87. Uma vez que, no entendimento da ora Recorrente a pena concretamente aplicada é manifestamente excessiva, tendo em conta a ilicitude dos factos em apreço.

88. [Os pontos 88 a 96 do presente recurso constituem reprodução das conclusões 59. a 72. supra transcritas do recurso do arguido A... , para as quais, por uma questão de economia, se remete].

97. Ora, no modesto entendimento do Recorrente, tal limite foi claramente e grosseiramente ultrapassado, na pena que concretamente foi aplicada de 5 anos e 4 meses de prisão.

98. Não se provou que a Arguida ora Recorrente tivesse obtido lucros dessa mesma atividade, ou que tivesse transacionado quantidades elevadas de produto estupefaciente.

99. Ademais o Relatório Social da Arguida espelha a real situação de insuficiência económica em que a Recorrente se encontra. De facto, a medida da pena não pode exceder a medida da culpa, contudo a pena concretamente aplicada ao ora Recorrente excede claramente a medida da sua culpa.

100. Assim, impõe-se a aplicação de uma pena justa e proporcional, tendo em conta a efetiva participação nos factos.

101. Face ao supra exposto, o Arguido ora Recorrente, entende que para que lhe seja aplicada uma pena justa, adequada e proporcional, a qual não exceda o seu grau de culpa e participação nos factos ora em apreço, esta terá de ser fixada junto ao mínimo legal quer o presente Recurso proceda relativamente à qualificação jurídica dos factos, quer não proceda.

102. Esta medida concreta da pena que a ora Recorrente D... pretende que agora lhe seja aplicada por este Alto Tribunal é aquela que lhes parece mais adequada, justa e proporcional tendo em conta a sua efetiva participação nos factos em apreço. Pois bem, a pena aplicada à Recorrente é manifestamente desproporcional tendo em conta a gravidade e a ilicitude dos factos em apreço.

103. Pelo que entende que o Douto Acórdão deve ser revogado, devendo ser substituído por outro que condene o ora Recorrente numa pena de prisão fixada no mínimo legal, que irá realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

104. Assim, e por todo o exposto, e independentemente da pena de prisão que seja concretamente aplicada por vós, Venerandos Juízes, a verdade é que a mesma deverá ser, sempre, igual mas não superior a cinco anos de prisão, não ultrapassando assim a medida da culpa da Recorrente.

105. Ora, o processo de desenvolvimento e socialização da arguida D... decorreu em contexto de valores culturais e vivenciais próprios da etnia cigana, em família sinalizada e conhecida pelo envolvimento em factos ilícitos, nomeadamente tráfico de estupefacientes. Vive em união de facto desde 1993 com A... , segundo os usos e costumes da etnia cigana. A arguida, na qualidade de encarregada de educação dos menores que com ela vivem, tem cumprido o acordo de promoção da CPCJ e é referida como cuidadora de menores. D... é analfabeta, nunca trabalhou e depende do Rendimento Social de Inserção atribuído ao agregado familiar, no valor de € 442,31 mensais, acrescidos dos dois subsídios de parentalidade por cada sobrinho, com o valor total de setenta euros. A Equipa da Cáritas Diocesana de Coimbra já encaminhou a arguida para cursos de aquisição de competências pessoais e escolaridade básica, que não foram concluídos devido a absentismo e desistência. A família tem sido pontualmente apoiada com géneros alimentares pelas técnicas de serviço social da rede social de apoio, nomeadamente nos últimos três anos pela Cáritas Diocesana de Coimbra, desde que foram convidados a abandonar o C (...) Não são conhecidas condenações criminais à arguida D....

106. [Os pontos 106 a 110 do presente recurso constituem reprodução das conclusões 83. a 88. supra transcritas do recurso do arguido A... , para as quais, por uma questão de economia, se remete].

111. Ademais, a Recorrente pese embora todo o circunstancialismo social em que se insere, a verdade é que até à presente data não regista qualquer condenação no seu CRC.

112. [Os pontos 112. a 119. do presente recurso constituem reprodução das conclusões 89. a 100. supra transcritas do recurso do arguido A... , para as quais, por uma questão de economia, se remete].

120. Por todo o exposto, entende a Recorrente, que ainda é possível fazer um juízo de prognose social favorável, devendo a pena de 5 anos e 4 meses ser reduzida para uma pena igual e não superior a 5 anos e ser a mesma suspensa na sua execução por igual período, sendo-lhe impostas todas as regras de conduta e injunção que se julgarem adequadas às necessidades do caso em apreço.

121. Assim, julgamos que deverá permitir-se à Arguida ora Recorrente D..., derradeira oportunidade para mudar de vida e atuar conforme ao direito, aplicando-se pena de prisão igual e não superior a cinco anos, suspendendo-se assim a pena de prisão aplicada.

122. Face ao exposto, até aqui pela recorrente, e entendendo a mesma que foi condenada pelo Tribunal de 1.ª Instância pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, pela alínea i) do art.º 24º do Decreto-Lei 15/93 de 22 de Janeiro, sem prova suficiente para o efeito, entende a mesma que foram violadas várias normas, mormente o artigo 127º do CPP e ainda, os artigos 32º nº 1 e 205º nº 1 da Constituição da República Portuguesa.

123. De facto, uma decisão condenatória – deve sustentar-se na necessária e indispensável concretização dos factos capazes de suportar um juízo seguro sobre a responsabilidade jurídico-penal do agente, sendo, por isso, de realçar, para esse efeito, a irrelevância jurídico-penal das imputações genéricas, que não encontram no texto da decisão aquele limiar indispensável de concretização.

124. Ora, salvo melhor entendimento, a decisão recorrida não se sustenta na tal necessária e indispensável concretização dos factos concretos capazes de suportar o referido e exigido juízo seguro sobre a responsabilidade jurídico-penal da Recorrente quanto à prática do crime pelo qual foi condenada, na medida em que como se já referiu supra, o Tribunal a quo, em momento algum, indica uma única prova concreta, válida e admissível, da prática dos factos por parte da Recorrente, que levaram à condenação pela agravação da al. i).

125. O que o Tribunal a quo fez, com todo o respeito que é sempre muitíssimo, foi ajuizar primeiro pela condenação da Recorrente e depois tentar a todo o custo arranjar provas e argumentos para o efeito. No caso em apreço o Tribunal a quo investigou o que podia e devia investigar, sem que, contudo, haja logrado alcançar aquele limiar de concretização quanto à responsabilidade da Recorrente.

126. É, pois, de concluir no sentido de se verificar, no que à recorrente respeita, uma ausência de provas válidas e admissíveis – ausência essa impeditiva do exercício dos direitos constitucionais previstos no artigo 32º da CRP, desde logo do seu direito de defesa. Por outro lado, verificando-se a ausência de tal concretização e, mesmo assim, havendo condenação do Recorrente, entende-se, com todo o respeito por melhor opinião, que o Tribunal recorrido, violou, ainda, o princípio constitucional de presunção de inocência previsto no art.º 32º, nº 2 da CRP.

127. Por último, diga-se, ainda, que com a violação de tais normativos constitucionais, o Tribunal a quo, e quanto ao ora Recorrente, fez uma interpretação inconstitucional do princípio consagrado no art.º 127º do CPP (livre apreciação da prova).

128. Interpretou-o no sentido de que apesar de não ter conseguido reunir prova suficiente, válida e admissível, de suportar um juízo seguro sobre a responsabilidade jurídico-penal da Recorrente, mesmo assim, e porque o Julgador aprecia livremente a prova segundo a sua convicção e as regras da experiência, e tudo é justificado com base neste princípio aparentemente inatacável, o Tribunal condenou a Recorrente pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes agravado na pena de cinco anos e 4 meses de prisão.

129. A livre convicção não significa, no entanto, apreciação segundo as impressões, nem inexistência de pressupostos valorativos, ou a desconsideração do valor de critérios, ainda objetivos ou objetiváveis, determinados pela experiência comum das coisas e da vida e pelas inferências lógicas do homem comum suposto pela ordem jurídica.

130 Não se analisando em liberdade não motivada de valoração, a livre convicção constitui antes um modo não estritamente vinculado de valoração da prova e de descoberta da verdade processualmente relevante, isto é, uma conclusão subordinada à lógica e à razão e não limitada por prescrições formais exteriores (cf. Cavaleiro de Ferreira, Curso de Processo Penal, II, pág. 27).

131. O princípio, tal como está inscrito no artigo 127.º, significa, no rigor das coisas, que o valor dos meios de prova não está legalmente pré-estabelecido, devendo o tribunal apreciá-lo de acordo com a experiência comum, com o distanciamento, a ponderação e a capacidade crítica, na «liberdade para a objetividade» (cf. Teresa Beleza, Revista do Ministério Público, Ano 19º, pág. 40).

132. Nestes termos, e nos mais em Direito consentidos por vós, Venerandos Juízes Desembargadores, muito doutamente suprireis, se requer seja o presente RECURSO JULGADO PROCEDENTE nos exatos termos supra expostos, com todas as legais consequências que daí advenham.

NORMAS VIOLADAS

· Artigo 71º nº 1 e 2 do Código Penal;

· Artigo 70º do Código Penal;

· Artigo 71º do Código Penal;

· Artigo 50.º do Código Penal;

· Artigo 52º do Código Penal;

· Art.º 356º do CPP;

· Art.º 20º e Art.º 32º da CRP;

· Art.º 24º al. i) do D.L. 15/93 de 22 de Janeiro;

· Art.º 127º do CPP;

· Artigos 32º nº 1 e 205º da CRP.

Nestes termos, e nos mais em Direito consentidos que vós, Venerandos Juízes Desembargadores, muito doutamente suprireis, se requer seja o presente recurso julgado procedente nos exatos termos supra expostos, com todas as legais consequências que daí advenham.

Para que, pela vossa douta palavra, se cumpra a consueta Justiça.

B... :

1.Foi o ora Recorrente condenado por Acórdão proferido em 21 de Outubro de 2016 pelo Coletivo de Juízes da secção Criminal da Instância Central da Comarca de

Coimbra, pela coautoria material de um crime de tráfico de estupefacientes agravado p. e p. pelo art.º 21.º nº 1 e 24º alínea i) da Lei 15/93, de 22 de janeiro, na pena de 5 anos e 10 meses de prisão, cuja coautoria material já lhe era imputada no libelo acusatório.

2. No modesto entendimento do ora Recorrente, nos presentes autos, foram incorretamente julgados os factos constantes dos Pontos 8, 46, 47 e 48 matéria de facto provada.

3. Ora, no entender do Recorrente, estes factos deviam constar dos “Factos não provados”, pelo menos, no que tange à participação do ora Recorrente B... .

4. Refere o Tribunal Recorrido no Acórdão proferido que fundou a sua convicção, no conjunto de elementos de prova, dos quais o Coletivo de Juízes entendeu resultar provada a prática do crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo artigo 21º nº 1 e 24º al. i) do DL. 15/93 de 22 de Janeiro.

5. Contudo, entende o Recorrente que a prova produzida deveria ter sido valorada de maneira diversa da plasmada no Acórdão ora em crise.

6. Pugnando o Recorrente no presente Recurso pela sua Absolvição da prática do crime de tráfico de estupefacientes agravado, p. e p. pelo artigo 21º nº 1 e 24º al. i) do DL. 15/93, de 22 de Janeiro.

7. Pois, no entendimento do ora Recorrente, a prova produzida em sede de Julgamento, é manifestamente insuficiente para condenar o ora Recorrente, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, p. e p. pelo artigo 21º nº 1 e 24º al. i) do DL. 15/93, de 22 de Janeiro.

8. Ora, face à insuficiência da prova produzida, e sob pena da violação grosseira do princípio do in dúbio pro reo, deveria o Tribunal a quo ter proferido decisão que absolvesse o ora Recorrente do crime de tráfico de estupefacientes agravado pelo qual foi condenado.

9. Mais, não se conforma o ora Recorrente, nem se poderia de modo algum, conformar, com a Douta Decisão proferida, no que tange ao indeferimento das nulidades arguidas, à pena concretamente aplicada, e à não suspensão da pena de prisão, a qual nem sequer foi ponderada atenta a medida concretamente aplicada.

10. Mais entende o Arguido Recorrente que a pena que concretamente lhe foi aplicada, é manifestamente excessiva tendo em conta a gravidade dos factos provados, e as suas concretas circunstâncias.

11. O arguido ora Recorrente B... , não se conforma de modo algum com a decisão proferida, pois entende que não foi produzida prova, de que o Recorrente praticou qualquer ato suscetível de integrar a prática de um crime de tráfico de estupefaciente agravado pela al. i) do art.º 24º do DL. 15/93, de 22 de Janeiro.

12. Não tendo sido produzida qualquer prova em sede de audiência de discussão e julgamento dos seguintes factos que o tribunal a quo, erroneamente valorou como provados, pelo menos no que tange à participação do ora Recorrente, dos factos constantes dos Pontos 8, 46, 47 e 48 da matéria de facto provada.

13. Vejamos então toda a prova testemunhal produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, relativa à alegada utilização dos Menores E... e P..., na alegada atividade ilícita de tráfico de estupefacientes, desenvolvida pelos Arguidos.

14. Ora esta Testemunha Z..., nada de relevante referiu relativamente aos Menores E... e P.... Ainda menos, algo que houvesse sido previamente determinado e ordenado pelo ora Recorrente.

15. De facto, a testemunha refere que os Menores residiam na habitação dos Arguidos, o que resulta, nomeadamente, do teor dos relatórios sociais. Contudo, esse facto só por si, não permite afirmar que os menores era utilizados na atividade de tráfico dos arguidos.

16. Acontece que, a testemunha não afirmou ter visto qualquer ato praticado pelos Menores em que estivessem presentes os Arguidos B... e D.... Referindo apenas a presença do Arguido A... .

17. O que não permite por si só, inferir que os Arguidos B... e D... tivessem conhecimento do envolvimento dos Menores na atividade delituosa dos Arguidos.

18. A Testemunha Sargento U... , referiu no que tange à alegada utilização dos menores E... e P... que tudo se encontrava vertido nos autos nas vigilâncias. Nas quais não participou em grande maioria das mesmas, tendo referido serem outros colegas que o fizeram.

19. Mais referiu que na residência habitavam os dois Menores E... e P.... Contudo nada adiantou relativamente à alegada participação dos mesmos na atividade de tráfico dos arguidos.

20. Não conseguindo a testemunha, afirmar com a certeza que é exigível, quais os arguidos que se encontravam em concreto, no interior do apartamento, enquanto lá também se encontravam os menores.

21. Assim, forçoso é concluir que do depoimento da testemunha não se pode de modo algum extrair que os arguidos B... de D... orientassem ou utilizassem os menores na atividade ilícita do tráfico.

22. Ademais, não se conseguiu sequer extrair do depoimento da testemunha que os Arguidos B... (Filho) e D..., tivessem conhecimento sequer que os menores eram utilizados na atividade de tráfico.

23. Esta Testemunha V... , à semelhança das anteriores também não conseguiu afirmar com certeza que em alguma das três situações que relatou, tivesse visto o Menor E... a trocar o que quer que seja.

24. Afirma apenas ter visto um gesto do menor. Nada mais … Não afirma, que tivesse visto o Menor a receber o que quer que seja dos condutores. Ademais, não afirma, nem poderia afirmar qual dos arguidos estava nas imediações do local a orientar os Arguidos.

25. Quanto ao mais, afirma que por vezes via os menores na varanda, por vezes os dois, por vezes só um, por vezes a brincar.

26. O que é consonante com o normal acontecer, uma vez que os menores ali residiam.

27. Assim, do depoimento da testemunha não se pode extrair, por muito esforço, que se faça nesse sentido, que os Arguidos B... e D..., tivessem sequer conhecimento que os Menores era utilizados na atividade de tráfico.

28. Importa desde já salientar, que esta testemunha AO... , foi o primeiro e único consumidor a afirmar em sede de julgamento, que um Menor lhe entregou estupefaciente.

29. Ademais importa desde já referir que esta testemunha, contactava previamente, sempre por telefone o Arguido A... “ AA... ”.

30. E foi na sequência de um desses contactos, que surgiu o menor. Importa também salientar, que a testemunha refere que por vezes contactava o A... (Pai), e na sequência desse contacto aparecia o B... (Filho).

31. Ora, do depoimento desta testemunha devidamente conjugado com os depoimentos dos elementos policiais, não se pode extrair que quer o Arguido B... (Filho), quer a arguida D... tivessem, participação ou conhecimento do envolvimento dos Menores na atividade delituosa.

32. Face ao supra exposto, devem os factos constantes dos pontos 8, 46, 47 e 48 dos factos provados, passar a constar dos factos não provados, pelo menos no que tange à participação do ora Recorrente B... (Filho).

33. Face ao supra exposto deve o ora Recorrente ser absolvida da prática do crime de tráfico de estupefacientes agravado p. e p. pelos artigos 21º nº1 e 24º al: i) do dl. 15/93 de 22 de janeiro, pelo qual foi julgado e condenado, uma vez que não foi produzida prova suficiente da participação do recorrente nos factos em apreço nos presentes autos.

34. [Os pontos 34. a 75. do presente recurso constituem reprodução das conclusões 2. a 48. supra transcritas do recurso do arguido A... , para as quais, por uma questão de economia, se remete].

76. Como já supra se disse na presente peça recursória no que tange à matéria de facto, nenhuma prova foi produzida em relação ao ora Recorrente, pelo menos no que tange à participação conjunta nos factos com os restantes Arguidos.

77. Ou seja, não resultaram provados quaisquer factos dos quais resulte a coautoria do Recorrente com os restantes Arguidos. Muito menos, no que tange ao envolvimento dos menores nos factos em apreço.

78. Não se provou qualquer facto, que permita afirmar que o Arguido ora Recorrente tinha sequer conhecimento do envolvimento dos menores nos factos, muito menos se provou que o Arguido contasse com a colaboração dos menores no que quer que seja.

79. O Tribunal recorrido condenou os arguidos, e também o recorrente, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo art.º 21º, nº 1 e 24º, al. i) do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro.

80. Assim, atendendo à fundamentação de facto plasmada na presente peça recursória, o Recorrente não deveria ter sido condenado pelo tráfico agravado, mas sim pelo tráfico de menor gravidade p. e p. pelo art.º 25º do DL 15/93, de 22 de Janeiro.

81. Assim, atenta a factualidade provada e apreciada a ilicitude global, entende-se que a atividade do Arguido Recorrente se enquadra no crime do artigo 25º do DL 15/93.

82. E em consequência, ser o ora Recorrente condenado pela prática de um crime de tráfico previsto no ARTIGO 25º (tráfico de menor gravidade), do Decreto-lei 15/93 de 22 de Janeiro, em pena de prisão de máximo NÃO SUPERIOR a 3 anos de prisão.

83. Condenou o Tribunal de 1.ª Instância o ora Recorrente na pena de 5 anos e 10 meses de prisão pela prática em coautoria material de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo art.º 21º nº 1 e 24º al. i) do Decreto-Lei 15/93 de 22 de Janeiro, do qual vinham acusados os arguidos.

84. O Recorrente não se conforma com a pena aplicada, considerando que a pena de prisão que lhe foi aplicada é manifestamente excessiva tendo em conta o seu grau de culpa e de participação.

85. A exigência legal de que a medida da pena seja encontrada pelo Juiz em função da culpa e da prevenção é absolutamente compreensível e justificável. Através do requisito de que sejam levadas em conta as exigências da prevenção, dá-se lugar à necessidade comunitária da punição do caso concerto e, consequentemente, à realização in casu das finalidades da pena.

86. Através do requisito de que seja tomada em consideração a culpa do agente, dá-se tradução à exigência de que a vertente pessoal do crime – ligada ao mandamento incondicional de respeito pela eminente dignidade da pessoa do agente – limite de forma inultrapassável às exigências de prevenção.

87. O ora Recorrente B... “ BB”, não se poderia de modo algum, conformar com a Douta Decisão proferida, no que tange à pena concretamente aplicada, de 5 anos e 10 meses de prisão, e ainda, à não suspensão da pena de prisão, a qual nem sequer foi ponderada atenta a medida da pena aplicada superior a 5 anos.

88. Uma vez que, no entendimento do ora Recorrente a pena concretamente aplicada é manifestamente excessiva, tendo em conta a ilicitude dos factos em apreço.

89. [Os pontos 89. a 94. do presente recurso constituem reprodução das conclusões 60., 61., 62., 65., 66. e 67. supra transcritas do recurso do arguido A... , para as quais, por uma questão de economia, se remete].

95. Ora, no modesto entendimento do Recorrente, tal limite foi claramente e grosseiramente ultrapassado, na pena que concretamente foi aplicada de 5 anos e 10 meses de prisão.

96. Não de provou que o Arguido ora Recorrente tivesse obtido lucros dessa mesma atividade, ou que tivesse transacionado quantidades elevadas de produto estupefaciente.

97. [Os pontos 97. a 101 do presente recurso constituem reprodução das conclusões 75., 77., 78., 80 e 81. supra transcritas do recurso do arguido A... , para as quais, por uma questão de economia, se remete].

102. Ora, o Recorrente é ainda muito jovem, e não tendo o Tribunal procedido à aplicação do Regime Especial para Jovens Menores de 21 anos, terá necessariamente de aplicar a pena no seu mínimo legal.

103. Para além disso, o Tribunal a quo deveria ter considerado, e não considerou, que o estigma da prisão representa um fator de enorme perturbação no processo de empenho e de afirmação no contexto das relações sociais – para além de desempenhar um fator de aprendizagem que conduz, em percentagem preocupante, a um crescente aperfeiçoamento e à reincidência criminal: Por outro lado, deveria aplicar uma pena ao recorrente que permitisse ponderar a suspensão da mesma.

104. Por outro lado, entende o Recorrente que a pena aplicada, pelos motivos supra expostos deveria ser sempre igual e não superior a cinco anos, e ainda, deverá ser suspensa na sua execução sujeita a regras de conduta destinadas a promover a reintegração do ora Recorrente na sociedade.

105. Pelo que se entende que o Douto Acórdão recorrido deve ser revogado, devendo ser substituído por outro que condene o ora Recorrente numa pena de prisão, no nosso humilde entendimento que não deve ultrapassar os 5 anos de prisão, pena que irá realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

106. Assim, e por todo o exposto, e independentemente da pena de prisão que for concretamente aplicada por vós, Venerandos Juízes, a verdade é que a mesma deverá ser, sempre, inferior à pena de prisão aplicada pelo Tribunal a quo, não ultrapassando assim a medida da culpa do Recorrente.

107. O Tribunal a quo, decidiu não aplicar ao Arguido B... ora Recorrente, o regime especial previsto no Decreto-Lei n.º 401/82 de 23 de Setembro. De facto, antes de mais, entende o recorrente que deveria ter beneficiado do regime especial para jovens previsto nos art.º 1º e 4º do DL 401/82 de 23/9.

108. O tribunal a quo assim não entendeu, uma vez que entendeu que atentas as condenações já sofridas pelo Recorrente, considerou não existirem razões sérias para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social do Recorrente.

109. Ora, o Recorrente à data dos factos apenas tinha 20 anos, tem um filho Menor de tenra idade. Para além disso, o Tribunal a quo deveria ter considerado, e não considerou, que o estigma da prisão representa um fator de enorme perturbação no processo de empenho e de afirmação no contexto das relações sociais – para além de desempenhar um fator de aprendizagem que conduz, em percentagem preocupante, a um crescente aperfeiçoamento e à reincidência criminal.

110. Por outro lado, da atenuação especial da pena pode resultar, sem dúvida alguma, um efeito de responsabilização e de estímulo facilitando a reinserção social do Recorrente, auxiliando-o a superara e a não voltar a praticar atos ilícitos. Por outro lado, ainda, se o cumprimento da pena de prisão já é, nos casos gerais, a última das opções a tomar, por maioria de razão o deverá ser no caso dos jovens delinquentes, pois, estando o jovem-condenado ainda numa fase de formação da sua personalidade o contacto com a realidade prisional e o reflexo difamante e estigmatizante que gera, pode conduzi-lo, irremediavelmente, a uma vida ligada ao crime.

111. Assim, entende o Recorrente, que tendo em conta as circunstâncias concretas do caso, do estado emotivo do Recorrente da sua imputabilidade diminuída e de toda a situação familiar em que se encontrava, e tendo em conta ainda que a Recorrente apenas tinha no seu registo criminal condenações anteriores por crimes diversos do crime de tráfico, deveria o arguido beneficiar do regime da atenuação especial da pena.

112. Por outro lado, e embora haja resultado provado que a arguida procedeu à venda de estupefacientes após lhe ter sido aplicada Medida de Coação no âmbito dos presentes autos, a verdade é que apenas se provou a venda de pequenas doses, e uma posição de submissão do arguido face ao Arguido A... seu pai.

113. Pelo que se entende que o Douto Acórdão recorrido deve ser revogado, devendo ser substituído por outro que condene o ora Recorrente numa pena de prisão (no nosso humilde entendimento que não deve ultrapassar os 4 anos), irá realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

114. Assim, e por todo o exposto, e independentemente da pena de prisão que for concretamente aplicada por vós, Venerandos Juízes, a verdade é que a mesma deverá ser, sempre, inferior a 4 anos de prisão, não ultrapassando assim a medida da culpa do Recorrente, caso o recurso em matéria de facto não proceda.

115. O Arguido, ora Recorrente, rejeita, de facto, que a pena de prisão efetiva seja a única espécie de pena que realize, no caso concreto, de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

116. [Os pontos 116 a 121 do presente recurso constituem reprodução das conclusões 94., 95., 96., 97., 98., 99 e 100 supra transcritas do recurso do arguido A... , para as quais, por uma questão de economia, se remete].

122. Por todo o exposto, entende o Recorrente, que ainda é possível fazer um juízo de prognose favorável, devendo a pena de 5 anos e 10 meses ser reduzida para uma pena igual e não superior a 5 anos e ser a mesma suspensa na sua execução por igual período, sendo-lhe impostas todas as regras de conduta e injunção que se julgaram adequadas às necessidades do caso em apreço.

123. Assim, julgamos que deverá permitir-se ao Arguido uma derradeira oportunidade para mudar de vida e atuar conforme ao direito.

124. Assim, julgamos que deverá permitir-se ao Arguido ora Recorrente B... derradeira oportunidade para mudar de vida e atuar conforme ao direito, aplicando-se pena de prisão igual e não superior a cinco anos, e suspendendo-se assim a pena de prisão aplicada.

125. [Os pontos 125 a 136 do presente recurso, exceção feita à concreta pena de prisão aplicada, reproduzem os pontos 122 a 131 das conclusões supra transcritas do recurso da arguida D..., para as quais, por uma questão de economia, se remete].

NORMAS VIOLADAS

· Artigo 71º nº 1 e 2 do Código Penal;

· Artigo 70º do Código Penal;

· Artigo 71º do Código Penal;

· Artigo 50.º do Código Penal;

· Artigo 52º do Código Penal;

· Artigo 1º e 4º do DL nº 401/82 de 23/9;

· Art.º 356º do CPP;

· Art.º 20º e Art.º 32º da CRP;

· Art.º 24º al. i) do D.L. 15/93 de 22 de Janeiro;

· Art.º 127º do CPP;

· Artigos 32º nº 1 e 205º da CRP.

Nestes termos, e nos mais em Direito consentidos que vós, Venerandos Juízes Desembargadores, muito doutamente suprireis, se requer seja o presente recurso julgado procedente nos exatos termos supra expostos, com todas as legais consequências que daí advenham.

Para que, pela vossa douta palavra, se cumpra a consueta Justiça.

4. Os recursos foram admitidos, com subida imediata e efeito suspensivo.

5. Em resposta aos recursos concluiu o Ministério Público:

1. Não se verifica qualquer nulidade e inconstitucionalidade da norma legal expressa no art.º 356.º, n.ºs 3 e 4 do CPP, quando interpretada no sentido de que a reprodução ou leitura, em audiência de julgamento, das declarações prestadas por testemunhas perante o Ministério Público no decurso do inquérito, não carecerem do consentimento dos arguidos.

2. Na verdade, não divisamos como poderão os arguidos invocar que os seus direitos de defesa saem coartados com tal interpretação, mormente o disposto no n.º 3 do citado preceito legal, quando têm à sua frente a testemunha cujos depoimentos prestados noutra fase processual são reproduzidos, podendo de imediato exercer o contraditório, instando-a ou contra-instando-a sobre a matéria probanda, sendo certo que com a presença física da testemunha também de imediato os princípios da imediação e oralidade se mostram salvaguardados.

3. Aliás, pela não verificação de qualquer nulidade ou inconstitucionalidade daquelas normas se pronunciou já o Tribunal Constitucional no seu acórdão datado de 19.01.2016, proferido nos autos n.º 272/10.0JACBR-J1 desta Instância Central Criminal, na sequência de recurso interposto pela ilustre mandatária dos arguidos ora recorrentes.

4. Relativamente ao enquadramento jurídico dos factos provados, na fundamentação do douto acórdão recorrido deixou o Tribunal consignados de forma expressa quais os factos que reputou como provados e os fundamentos da sua subsunção jurídica ao crime pelo qual os arguidos vieram a ser condenados.

5. Donde inequívoco se torna que o Tribunal 2ª quo” bem enquadrou juridicamente os factos provados ao condenar os ora recorrentes pela comissão do crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art.º 21º nº 1 do Dec. Lei nº 15/93, de 22/01, como o fez.

6. No que às penas de prisão aplicadas concerne, o douto acórdão valorou de forma acertada as circunstâncias a favor e contra os recorrentes com implicações na determinação da pena em concreto, conjugando tudo isto com as prementes necessidades de prevenção geral que se impõem nesta criminalidade;

7. Acresce que, neste caso, existem também necessidades de prevenção especial muito acentuadas, atendendo ao percurso de vida dos arguidos e também aos antecedentes criminais dos arguidos A... e B... .

8. Pelo que, ponderando os critérios legais, as circunstâncias da ação de cada um deles e o tipo de crime praticado, se consideram adequadas e justas as penas aplicadas.

9. Mas mesmo que, por esquema de raciocínio, ainda admitíssemos que esse Venerando Tribunal decidisse serem de aplicar penas que permitissem a respetiva suspensão, entendemos que no caso em apreço nunca deveria a mesma ser determinada.

10. Do disposto no art.º 50º, nº 1 do Código Penal resulta a necessidade da ponderação entre as necessidades de prevenção especial centradas no agente e as necessidades de prevenção geral positiva, de molde a que a reação penal responda adequadamente às expetativas comunitárias na manutenção da validade da norma violada e assegure a proteção do bem jurídico afetado;

11. Nesta norma estabelecem-se os pressupostos para a suspensão da execução da pena, havendo que realizar um juízo de prognose favorável, o qual tem como limite as necessidades de reprovação e prevenção do crime, ou seja, havendo incompatibilidade com as exigências de prevenção geral não pode haver suspensão;

12. Assim sendo, na ponderação da verificação dos requisitos para tal, deve verificar-se não só a situação dos arguidos, mas as necessidades de prevenção geral, que o caso imponha, em face da gravidade do criem;

13. No caso dos autos, existem especiais necessidades de prevenção geral, que afastam a possibilidade de se aplicar a suspensão da execução da pena, pois caso contrário seriam defraudadas as expetativas da comunidade no funcionamento do sistema penal.

Termos em que deverá negar-se provimento aos recursos interpostos, confirmando-se o douto acórdão recorrido.

Todavia, em alto critério, V.ªs Exas. decidirão.

Justiça.

6. Na Relação o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer refutando que haja ocorrido valoração de prova proibida e/ou se verifiquem as invocadas nulidades e inconstitucionalidade; contrariando os alegados erros de julgamento; afastando a subsunção dos factos no artigo 25.º do D.L. n.º 15/93, de 22.01, isto quer por se tratar do tipo legal agravado (artigo 24.º), quer por, ainda que assim não fosse, «a restante matéria de facto dada como provada não permite um juízo que aponte para uma considerável diminuição da ilicitude, antes pelo contrário foi muito vasta quer no tempo, quer pelo número de consumidores vítimas dos crimes de tráfico praticados, a grande e fácil mobilidade para contactos com vista à aquisição de estupefacientes para distribuição aqueles consumidores, bem assim a sua atuação em conjunto, em núcleo familiar, usando menores para tentar disfarçar e iludir a atividade criminosa; pronunciando-se por não se mostrarem reunidos todos os pressupostos de aplicação do Regime Penal dos Jovens ao arguido B... , aduzindo a propósito: «Na verdade, impressiona que venha considerar existirem sérias razões para que o tribunal acredite nas vantagens da aplicação legal da atenuação especial da pena, quando para além dos antecedentes criminais registados, o mesmo pratica este crime, que se traduz numa longa atividade (no tempo) durante um período em que lhe foi feita uma solene advertência traduzida numa anterior suspensão da execução de outra pena de prisão. E mais, no decurso dos presentes autos, depois de lhe serem aplicadas medidas de coação após a detenção inicial, continuou a sua atividade delituosa … (cf. fls. 2066/2067 do douto acórdão).

Relativamente às penas pronuncia-se no sentido de não se apresentarem excessivas e/ou desproporcionais, defendendo a sua manutenção; seja como for sempre seria de afastar a suspensão da execução da pena.

7. Cumprido o n.º 2 do artigo 417.º do CPP, nenhum dos sujeitos processuais interessados reagiu.

8. Realizado o exame preliminar e colhidos os vistos foram os autos à conferência, cumprindo, pois, decidir.

II. Fundamentação

1. Delimitação do objeto dos recursos

Tendo presente as conclusões, pelas quais, sem prejuízo da matéria de conhecimento oficioso, se delimita o objeto do recurso, constituem questões a apreciar:

 

A... :

- Nulidade da decisão que admitiu a leitura dos depoimentos; Valoração de prova proibida; Inconstitucionalidade das normas contidas nas alíneas a) e b) do n.º 3 do artigo 356º do CPP quando interpretadas no sentido de dispensar o acordo do arguido;

- Medida concreta da pena de prisão;

- Suspensão da execução da pena.

D...:

- Nulidade da decisão que admitiu a leitura dos depoimentos; Valoração de prova proibida; Inconstitucionalidade das normas contidas nas alíneas a) e b) do n.º 3 do artigo 356º do CPP quando interpretadas no sentido de dispensar o acordo do arguido;

- Erro de julgamento; Violação do artigo 127.º do CPP, do princípio da presunção de inocência, do in dúbio pro reo; Inconstitucionalidade do artigo 127.º do CPP na interpretação normativa levada a efeito pelo tribunal;

- Errada qualificação jurídico-penal dos factos;

- Medida concreta da pena de prisão;

- Suspensão da execução da pena.

B... :

- Nulidade da decisão que admitiu a leitura dos depoimentos; Valoração de prova proibida; Inconstitucionalidade das normas contidas nas alíneas a) e b) do n.º 3 do artigo 356º do CPP quando interpretadas no sentido de dispensar o acordo do arguido;

- Erro de julgamento; Violação do artigo 127.º do CPP, do princípio da presunção de inocência, do in dúbio pro reo; Inconstitucionalidade do artigo 127.º do CPP na interpretação normativa levada a efeito pelo tribunal;

- Errada qualificação jurídico-penal dos factos;

- Aplicação do Regime Penal Especial para Jovens;

- Medida concreta da pena de prisão;

- Suspensão da execução da pena.

2. O acórdão recorrido

Ficou a constar do acórdão recorrido [transcrição parcial]:

Da audiência de julgamento resultaram provados os seguintes factos, com interesse para a decisão da causa:

1. O arguido B... (conhecido por BB) e sues progenitores, os arguidos A... (conhecido por AA... ) e D..., de comum acordo e em conjugação de esforços, dedicaram-se à cedência e à venda de produto estupefaciente a um elevado número de indivíduos, especialmente cocaína.

2. Para o efeito, os três arguidos, pelo menos durante o período compreendido entre Dezembro de 2014 a Outubro de 2015, transportaram, detiveram, guardaram, cederam e venderam diariamente, heroína e cocaína a um elevado número de indivíduos, em várias zonas e locais, desta cidade, nomeadamente nas proximidades da casa de morada d família, sita no Largo do x..., n.º (...) ., nesta cidade.

3. Para os locais mais distantes, os arguidos dirigiam-se no seu veículo de marca Volvo, de matrícula (...) GR.

4. Após a apreensão deste veículo, a 7 de Outubro de 2015, os arguidos passaram a proceder à entrega e venda do produto estupefaciente especialmente no interior da casa de morada de família, suas proximidades e até na zona da Baixa.

5. As encomendas e entregas de produto estupefaciente eram, na maioria das vezes, precedida de mensagens ou contacto telefónico entre os arguidos e os diversos clientes.

6. Os arguidos A... e B... utilizaram, entre outros, os cartões com os n.ºs 91 (...) , 91 (...) e 91 (...) , entre outros, e a arguida D... utilizou especialmente o n.º 91 (...) .

7. Os arguidos, como contrapartida da entrega do produto estupefaciente, receberam elevadas quantias em dinheiro e também, algumas vezes, telemóveis, tablets, máquinas fotográficas e outros artigos ou objetos.

8. Nessa atividade, os arguidos B... , A... e D... eram ainda coadjuvados por terceiros, nomeadamente, pelos menores, P..., nascida a 23.10.2007, e E..., nascido a 11.05.2002, filho de E...e de AT...., os quais colaboravam com aqueles outros, entregando estupefacientes aos consumidores.

9. No âmbito de tal atividade levada a cabo em conjunto, B... , A... e D... venderam direta e ou indiretamente, produto estupefaciente, especialmente cocaína, por diversas vezes, a inúmeros indivíduos, nomeadamente a:

a. AM... , o qual adquiriu aos arguidos “ AA... ”, “ BB” e D..., em média, três vezes por semana e durante alguns meses, “dentes” de cocaína ao arguido “ AA... ”, pagando € 10,00 por cada “dente”;

b. AN... , que adquiriu por diversas vezes “dentes de cocaína ao arguido “ AA... ”, pagado € 10,00 por cada “dente”;

c. AG...., que adquiriu, por diversas vezes, “dentes” de cocaína aos arguidos “ BB e AA... ”, durante cerca de um ano, pagando por cada “dente” o valor de € 10,00;

d. AI... que, entre os meses de Maio e Julho de 2015, adquiriu ao arguido “ AA... ”, duas ou três vezes, “dentes” de cocaína, pagando € 10,00 por cada “dente”;

e. AD...., que se deslocou à residência do “ AA... ”, onde adquiriu cerca de quatro vezes uma pedra de cocaína;

f. AS..... que, desde o início do mês de Agosto de 2015 até inícios de Outubro de 2015, deslocou-se à residência do “ AA... ”, onde entrava e ali lhe adquiriu, pelo menos 6 vezes “dentes” de cocaína, pagando por cada “dente” 5 10,00.

g. AL...., que, desde o mês de Junho de 2015 e até Outubro do mesmo ano, adquiriu em média duas vezes por semana, aos arguidos “ AA... ”, “ BB” e D... um a dois “dentes” de cocaína, pelos quais pagava o valor de € 10,00 a € 20,00, respetivamente.

h. J... , que adquiriu “ao BB”, no ano de 2015, em Coimbra, “dentes” de cocaína, pelo valor de € 10,00.

i. AO... que adquiriu cocaína para seu consumo, contactando o “ AA... ” através do telemóvel, combinando o encontro junto à paragem do autocarro, sendo que, por regra, quem ia a entregar o produto era o “ BB”, também tendo entregue, pelo menos uma vez, o menor E..., comprando uma ou duas pedras de cocaína, pagando por cada pedra € 10,00.

j. AE....., que, desde o mês de Junho de 2015 e até finais de Setembro do mesmo ano, adquiria ao “ AA... ” “dentes” de cocaína, pelo qual pagava o valor de € 10,00;

k. AF... que, desde o início do verão de 2015 até inícios de Outubro de 2015, deslocou-se à residência do “ AA... ”, na companhia do seu amigo AS... onde este adquiria “dentes” de cocaína, pagando por cada “dente” € 10,00.

l. AQ....., que, no decurso do anos de 2015, adquiriu por diversas vezes cocaína ao “ AA... ”, deslocando-se às proximidades do prédio deste, outras vezes marcou encontros com o “ AA... ”, através do telemóvel, e adquiria a cocaína nos locais por ele referidos e pagava-lhe € 10,00 o “dente”.

m. T... que adquiriu, entre Outubro de 2015 a Dezembro /2015 Janeiro de 2016, pelo menos uma vez, um “dente” de cocaína, pagando cerca € 10,00 ao arguido “ AA... ”.

n. M... que adquiriu, pelo menos três vezes, no ano de 2015 cocaína ao “ AA... ”.

o. I..., que, entre Maio a Setembro de 2015, adquiriu cocaína ao arguido “ BB”.

p. L... que adquiriu ao arguido “ AA... ”, durante o ano de 2015, pelo menos uma vez, cocaína.

11. Os arguidos A... e B... deslocavam-se, por diversas vezes, a várias zonas da cidade do Porto, nomeadamente ao bairro do Aleixo, inicialmente na viatura supra referida de matrícula (...) GR, e, após a apreensão desta, fazendo-se transportar em viaturas de terceiros, para ali adquirir como adquiriram cocaína que depois revenderam, nesta cidade, aos indivíduos supra referidos e a muitos outros não identificados.

12. Os arguidos A... e B... no período de 01.05.2015 a 12.08.2015 (104 dias), deslocaram-se à zona norte (zona do Porto) trinta ocasiões a saber: dias 03.05.2015, 10.05.2015, 14.05.2015, 16.05.2015, 18.05.2015, 19.05.2015, 21.05.2015, 22.05.2015, 23.05.2015, 24.05.2015, 25.05.2015, 27.05.2015, 29.05.2015, 09.06.2015, 12.06.2015, 25.06.2015, 26.06.2015, 27.06.2015, 04.07.2015, pelas 10h13, 05.07.2015, 14.07.2015, 17.07.2015, 29.07.2015, 01.08.2015, 02.08.2015, 03.08.2015, 05.08.2015, 07.08.2015, 10.08.2015, 11.08.2015.

13. No dia 9 de Fevereiro de 2015, os arguidos C... e B... deslocaram-se à cidade do Porto, no veículo de matrícula (...) GR, marca Volvo, modelo V S40 1.8.

14. No dia 11 de Fevereiro de 2015, foram efetuados seguimentos policiais à referida viatura.

15. Durante a manhã foi constatado que o referido veículo se encontrava estacionado no largo do x... em S. Martinho do Bispo.

16. Pelas 12.45 horas, o “ BB”, o arguido B... , saiu do edifício onde reside, dirigiu-se ao veículo de matrícula (...) GR e seguiu a conduzir o mesmo em direção a Fala e seguidamente à Urbanização (...) , onde parou e entrou no edifício com o n.º 2 (Lote 2), pela retaguarda.

17. Pelas 14.10 horas, o arguido B... saiu da Urbanização de (...) , a conduzir o veículo acima mencionado, seguiu pela Via Rápida, posteriormente pela Rua da Caraboio, vindo a parar no Largo do x....

18. Nesta altura, para além do B... , viajava como ocupante, o arguido C... .

19. Após parara o veículo que conduzia, B... dirigiu-se à sua residência.

20. Pelas 14.20 horas, o veículo de matrícula (...) GR, conduzido pelo arguido C... e tendo como ocupante o B... , circulo na Avenida Nova, passando pela Rua Eng.º Júlio Araújo Vieira, desceu a Ladeira de São Martinho do Bispo e seguiu pela Via Rápida no sentido de Coimbra.

21. Depois de passar a Ponte do Açude, o veículo seguiu até às bombas de combustíveis da adémia, onde foi abastecido de combustível pelo condutor.

22. Antes de abastecer, o C... recebeu do B... , duas notas de vinte euros e dirigiu-se de seguida à loja de conveniência, onde efetuou o pré-pagamento de € 40,00.

23. Após, entrou na viatura para o lugar do condutor e seguiu em direção a norte, pela A1, onde entrou no nó de Coimbra Norte.

24. Pelas 17.00 horas, o veículo de matrícula (...) GR, saiu da a1, no nó de Coimbra Sul, seguindo depois pela Via Rápida, entrando seguidamente na Rua da Fontainha, passou pela Rua Infante D. Henrique, Rua dos Covões e dirigiu-se ao largo do x....

25. Ao chegar ao Largo do x..., foi efetuada pela GNR abordagem ao veículo e imobilizados o condutor e ocupante.

26. Quando já se encontrava deitado no pavimento, o arguido B... , logrou arremessar para debaixo do seu veículo, uma pequena embalagem em plástico, contendo no interior, setenta e sete (77) pedaços de uma substância de cor branca, vulgarmente designados por “dentes” que submetido a competente exame laboratorial apurou-se tratar-se de cocaína, com o peso líquido de 7,563 gramas.

27. Do lado do condutor e no pavimento (junto à porta) encontrava-se um cartão multibanco “Visa Electron”, pertencente a AH... utilizado para efetuar o pagamento das portagens e que caiu quando saíram da viatura.

28. Após recolhidas as substâncias, o telemóvel e o cartão acima mencionado, foi o veículo conduzido para as instalações do Comando da GNR, e alvo de busca na sequência da qual foi apreendido no seu interior, uma caixa em cartão, respeitante a uma balança de precisão, pertencente ao arguido B... , e um telemóvel, este pertença do arguido C... .

29. As substâncias estupefacientes apreendidas foi adquiridas pelo arguido B... , pelo preço de cerca de € 300,00 euros, e destinavam-se a ser vendidas nesta cidade, a diversos indivíduos.

30. A venda das 77 pedras de cocaína renderiam em Coimbra um valor superior aquele pelo qual as comprou.

31. O arguido C... , à data dos factos, era consumidor de estupefacientes, tendo apenas acedido em transportar o arguido “ BB” ao Porto, onde este adquiriu o produto estupefaciente, visando receber produto estupefaciente como contrapartida, para seu consumo.

32. Ambos conheciam a natureza da substância que detinham e transportavam.

33. Na mala do veículo encontravam-se vários pedaços de carne crua, em avançado estado de decomposição, que libertavam um intenso odor a putrefação, com o intuito claro de despistar qualquer ação de um binómio detetor de drogas.

34. Foram assim os arguidos detidos em flagrante delito e apreendidos os valores, veículo substâncias e restantes objetos.

35. Sujeitos a primeiro interrogatório judicial, ficaram ambos sujeitos a medidas não privativas da liberdade.

36. Não obstante estas detenções e apreensões, os outros arguidos B... , A... e D... continuaram a dedicar-se ao tráfico de estupefacientes, fazendo-o, desde esta data, especialmente e conforme já se referiu, a partir da sua residência, local onde se dirigiram, por diversas vezes, u elevado indeterminado número de indivíduos e adquiriram produto estupefaciente, especialmente cocaína.

37. Assim, no dia 7 de Outubro de 2015, pelas 16H50, foram cumpridos os mandados de busca emitidos à residência de A... , B... e D... para apreensão de produto estupefaciente, valores e outros objetos relacionados com o tráfico de estupefacientes.

38. Tal busca foi efetuada na presença do arguido B... e D....

39. Para além destes, encontravam-se na residência, os arguidos E...e F... e ainda o já referido menor E....

40. A residência é composta por hall de entrada, cozinha, pequena despensa, casa de banho, sala comum, dois quartos e uma varanda.

41. No decurso da busca, foi encontrado e apreendido o seguinte:

a) Na sala, no sofá, no interior de uma embalagem redonda:

- 19 “pedras” ou “dentes” de cocaína, com um peso aproximado de 0,90 gramas;

- Uma pequena embalagem em plástico contendo 19 “pedras” ou “dentes” de uma substância de cor branca, que após ter sido submetidos a teste rápido, acusou positivo a cocaína, apresentando o peso bruto de 2,39 gramas;

- Uma pequena embalagem em plástico contendo 61 “pedras” ou “dentes” de uma substância de cor branca, que após ter sido submetidos a teste rápido, acusou positivo a cocaína, apresentando peso bruto de 7,30 gramas;

- Uma pequena embalagem de uma substância de cor acastanhada, que após ter sido submetida a teste rápido, acusou positivo a heroína, apresentando o peso bruto de 7,98 gramas;

- Uma dose individual de uma substância de cor acastanhada, que, após ter sido submetida a teste rápido, acusou positivo a heroína, apresentando o peso bruto de 0,15 gramas;

- Uma nota de € 20,00 e uma nota de € 5,00, num total de € 25,00.

Ainda na sala e no sofá:

- Um telemóvel Vodafone 875, com o IMEI 355963058208851, sem qualquer cartão.

Na sala, no móvel grande:

- Um telemóvel Samsung, GT-E1180, com o IMEI 357650048039169, sem cartão SIM.

Na sala, dentro de um pote que estava em cima do louceiro:

- Um telemóvel Alcatel, one touch 232, com o IMEI 865008014300021, sem cartão SIM.

Na sala, por baixo de uma mesinha:

- Uma máquina fotográfica Canon EOS600D, com o número série 233076130276, com cartão de memória da marca Samsung 2gb, com respetivo saco e cabos de ligação e carregadores.

Na sala, dentro de uma gaveta do móvel:

- Um suporte de cartão SIM da operadora Vodafone, com o número 711430091420, PIN 8266 e PUK 18256295;

- Um suporte de cartão SIM da operadora Vodafone, com o número 811452198309, PIN 1423 e PUK 12107816;

- Um suporte de cartão SIM da operadora Optimus, com o número 8935103216302547366, PIN 7323 e PUK 21172247;

- Um Nano SIM da operadora Moche, com o número 0000615074307;

- Uma máquina fotográfica da marca Nikon, modelo Coolpix L23, sem cartão de memória;

- Um telemóvel Samsung, GT-S5660, com o IMEI 351825052553117, sem qualquer cartão SIM e sem bateria;

- Um telemóvel Alcatel, one touch 233, com o IMEI 867425012843794, com cartão SIM da operadora Yorn, com o número 811523184189;

- Um telemóvel Samsung, GT-E1180, com IMEI 357650048538467, sem qualquer cartão SIM;

- Um tablet e Zee`Tab 9D11-S, com o número de série 201402EZTAB9D11S4GGRTBK0366.

Na sala, no móvel:

- Um suporte de cartão SIM da operadora Vodafone, com o número 711254255655, PIN 2626 e PUK 46307841;

- Um suporte de cartão SIM da operadora Vodafone, com o número 811240419454, PIN 2101 e PUK 26336922;

- Um suporte de cartão SIM da operadora Moche, com o número 89351060000539134674, PIN 4371 e PUK 71136150;

- Um suporte de cartão SIM da operadora Yorn com o número 811523323803, PIN 6109 e PUK 10911860.

Na sala, dentro da carteira da arguida D...:

- um telemóvel LG – D405n, com o IMEI 352763063489444, sem cartão SIM, com cartão de memória Kingston de 4gb;

- € 270,00 (oito notas de € 20,00, nove notas de € 10,00 e quatro de € 5,00).

b. Na cozinha, numa mesa pequena:

- Os telemóveis dos arguidos A... e E...

- Um telemóvel Optimus, one touch 306, com o IMEI 356080049043708, com cartão SIM da operadora NOS, número 226308295902;

- Um telemóvel Samsung GT-E1200I, com o IMEI 356893067035228, com cartão SIM da operadora Vodafone com o número 711502225567;

- Um telemóvel Vodafone, 875, com o IMEI 355963057989071, sem qualquer cartão;

- Um telemóvel Nokia 6210, com o IMEI 352914020048381, com cartão SIM da operadora WTT, com o número 711502225567216204858309.

Na cozinha, na mochila do E...:

- Um telemóvel Samsung, GT-S3800W, com o IMEI 355171051193332, sem qualquer cartão;

- Um telemóvel Nokia RM-945, com IMEI 351728065841521, com cartão SIM da operadora Yorn, com o número 811523323803;

- Um suporte de cartão SIM da operadora Vodafone, com número 711502462731, PIN 1219 e PUK 94788229;

- Um suporte de cartão SIM da operadora Yorn, com número 811523184189, PIN 5814 e PUK 15261555.

c. Na despensa:

- Um monitor LCD Asus, modelo número 99, série número CCLMTF037487;

- Um monitor LCD Philips, modelo 190WV7CS/00, série número BZ3A0721580221.

d. No quarto do B... , na bolsa da arguida F... :

- Um telemóvel Nokia com o vidro partido com o IMEI 35899605-562608-6;

- € 270,00 (oito notas de 5 20,00, dez notas de € 10,00 e duas de € 5,00).

e. No quarto do B... , em cima de uma cómoda:

- Um plasma Samsung modelo LE32R81B, com o n.º de série 68273HIP904281L.

- Um suporte de cartão SIM da operadora Lycamobile, com o número 8935104010033307805, com o PUK 76413976.

f. No quarto do A... e da D..., na gaveta da mesa-de-cabeceira:

- Um telemóvel Nokia C2-01, com o IMEI 353290055429401, sem cartão SIM e sem bateria;

- Um suporte de cartão SIM da operadora Vodafone, com o número 711446210063, PIN 4667 e PUK 43710900;

- Um suporte de cartão SIM da operadora Vodafone, com o número 711440169711, PIN 8424 e PUK 48568383;

- Um suporte de cartão SIM da operadora USO com o número 89351060000621492725, PIN 5929 e PUK 03817880;

- Um saco de plástico de onde foram recortados pequenos pedaços, normalmente utilizados para acondicionamento para doses individuais de estupefaciente;

- Dois pequenos plásticos, normalmente utilizados para o acondicionamento/transporte de estupefaciente, um deles apresentava ainda resíduos de substância que se suspeitou ser estupefaciente;

- Três “pontas queimadas” dos pequenos sacos de plásticos utilizados no acondicionamento/transporte de estupefaciente.

f) No hall de entrada, dentro de um móvel:

- Um telemóvel Huawei, G6608, com o IMEI 356090042837469, com o cartão SIM da operadora Vodafone.

g) Na sala, em cima de um móvel:

- Um LCD Samsung modelo UE40D5000PWXXC, série número Z8AF35LBB01482W.

42. Efetuado o competente exame laboratorial às substâncias apreendidas apurou tratar-se de cocaína com os pesos líquidos de 6,130 gramas; 1,898 gramas e 0,820 gramas, bem como heroína com os pesos líquidos de 7,636 gramas e 0,054 gramas, equivalente a 19, 6, 15, 10 e <1 doses (doses calculadas de acordo com a portaria 94/96).

43. Nesta sequência, foram os arguidos B... , D..., E...e F... detidos em flagrante delito.

44. Sujeitos a primeiro interrogatório judicial, ficou o primeiro sujeito à medida de coação de prisão preventiva.

45. Durante o decurso da diligência chegou à residência a menor P..., nascida a 23.10.2007, filha de Q...e de R... , no (...) S. Martinho do Bispo.

46. Os supra referidos menores, especialmente E..., foram utilizados pelos restantes arguidos no desenvolvimento do tráfico, nomeadamente na entrega das substâncias estupefacientes, deslocando-se este por algumas vezes ao exterior do edifício onde reside e contactando com indivíduos, para lhes entregar substâncias estupefacientes.

47. Tal aconteceu, entre muitas outras circunstâncias, nomeadamente, no dia 29 de Junho de 2015, quando pelas 13.00 horas, aquele se deslocou junto de um indivíduo que se encontrava próximo do veículo de matrícula (...) PV e entregou-lhe estupefaciente e também no dia 8 de Setembro de 2015, quando pelas 18.15 horas, saiu do edifício, sentou-se no banco da paragem do autocarro e passado cerca de um minuto, após a chegada do veículo de matrícula (...) GV, habitualmente conduzida pelo “ AK....”, ter aberto a porta do lado do passageiro e contactado o condutor, entregando-lhe produto estupefaciente.

48. Durante o período em que o menor contactou o cliente, o arguido B... encontrava-se na varanda do apartamento, observando e supervisionando a transação.

49. Estes menores encontravam-se à guarda da D....

50. Após a prisão preventiva do B... , a 7 de Outubro, foram efetuadas diversas diligências tendo em vista localizar, notificar e interrogar A... .

51. Apesar das diligências efetuadas, não se logrou a notificação por se desconhecer o paradeiro certo do mesmo, apurando-se inicialmente que se ausentara da residência e passara a residir na zona da baixa de Coimbra, posteriormente na zona da Relvinha em casa de familiares, após o que fora visto na varanda da sua residência.

52. Foram assim emitidos Mandados de detenção fora de flagrante delito e posteriormente Mandado de busca para aquela residência, os quais foram cumpridos no dia 23 de Fevereiro de 2016, apurando-se que o arguido A... se encontrava num dos quartos, deitado na cama.

53. No decurso da busca foi encontrado e apreendido o seguinte:

a) No quarto, em cima da mesinha de cabeceira:

- Um telemóvel da marca Nokia RM-945, com o IMEI 351728069542760, com cartão inserido da Operadora Vodafone, com o n.º 91 (...) . O telemóvel encontrava-se ligado.

No móvel da sala:

- Um recorte de papel onde se encontram manuscritos valores e quantidades.

- Documento Único do veículo de matrícula (...) GR, o qual já se encontrava apreendido no âmbito dos presentes autos.

54. Nesse mesmo dia, foi igualmente realizada busca domiciliária para a residência dos arguidos F... e E..., sita na Rua (...) , Vivenda de (...) , nesta cidade, tendo sido apreendido para além do mais:

- 1 telemóvel de marca Vodafone P com o IMEI n.º 359731051258751 com o PIN 7314 a que corresponde o n.º 91 (...) pertencente à F... e que se encontrava em cima de uma mesa na sala;

- 1 telemóvel de marca Samsung, a que corresponde o n.º 93 (...) e que se encontrava na posse do arguido E...;

- € 730,00 (setecentos e trinta euros) em dinheiro do Banco Europeu, constituindo por vinte e sete notas de € 20,00, dezanove notas de 5 10,00, que se encontravam no interior da carteira da arguida F... .

55. A... , B... e D... fizeram da venda de heroína e ou cocaína o seu modo de vida, não exercendo qualquer atividade lícita remunerada.

56. Estes arguidos agiram de comum acordo e em conjugação de esforços com o propósito de deter, guardar, transportar e vender aquelas substâncias, cujas características bem conheciam.

57. Todas as substâncias, veículo, valores, objetos, equipamento e telemóveis apreendidos nos autos aos arguidos A... , B... e D... foram utilizados pelos mesmos no desenvolvimento do tráfico e ou obtidos na sequência dessa atividade criminosa.

58. Agiram sempre de forma livre, voluntária e consciente, sabendo que as suas condutas são proibidas e punidas pela lei penal.

59. O arguido C... acompanhou o arguido “ BB” até à cidade do Porto para este comprar produtos estupefacientes, apenas porque tinha sido combinado entre ambos que por esta ajuda receberia, pelo menos, quatro “dentes” de cocaína.

60. Estes arguidos agiram de comum acordo, visando o C... auxiliar o arguido BB na compra de produto estupefaciente para posterior venda daquela substância, cujas características bem conheciam.

61. Agiram sempre livre, voluntária e conscientemente e sabiam que as suas condutas são proibidas e punidas pela lei penal.

Mais se provou:

62. A... nasceu em França, fruto da itinerância dos pais para esse pais, no seio de um casal de etnia cigana, e ali viveu até aos 19 anos.

63. Em França teve um percurso escolar muito irregular, tendo completado apenas o 4.º ano de escolaridade, uma vez que começou a exercer desde muito cedo a venda ambulante de roupa.

64. No fim da adolescência do arguido, os pais voltaram para Portugal (Vilar Formoso) onde fixaram residência junto de outros familiares.

65. O pai veio a falecer em 2007 e a mãe reside em Nelas, integrada na sua família alargada.

66. O arguido deslocou-se para Coimbra, onde estavam a viver muitos dos seus familiares, para continuar a venda ambulante porta a porta e em feiras.

67. Nesta cidade conheceu a arguida D..., com quem vive desde 1993 e com quem tem um filho, o arguido B... .

68. Ao nível escolar, terá o 6.º ano de escolaridade concluído no E.P. quando cumpriu pena de prisão.

69. A... cumpriu sucessivamente (desde 2002) condenações em penas de prisão efetivas, saindo em liberdade condicional em 2010, pelo período de 5 anos, sendo acompanhado pela DGRSP. A pena foi extinta em abril de 2015.

70. O arguido teve, depois de 2010, vários internamentos nos Serviços de Psiquiatria do CHUC, por atitudes descompensadas e agressivas.

71. Não há registo de qualquer diagnóstico clinico, embora tenha sido acompanhado em regime ambulatório durante os cinco anos de liberdade condicional, sempre sem a sua adesão, seguimento que abandonou em 2014.

72. Sempre teve uma situação económica muito deficitária, bem como o agregado familiar (companheira e filho), vivendo todos de subsídios sociais do estado e de rendimentos não quantificáveis da venda ambulante.

73. A... é consumidor de drogas, nomeadamente de heroína e cocaína.

74. Na pendência deste processo, o arguido residiu sozinho e na rua na sequência de ter abandonado a casa, por desentendimentos com familiares que aí viviam.

75. O agregado era composto, para além de si próprio, pela companheira, pelo filho B... , pelo cunhado e a companheira deste, e pelos dois sobrinhos, menores, estudantes.

76. O arguido só regressou à habitação quando o cunhado e a companheira saíram da casa.

77. A habitação do agregado (habitação social T2, pela qual pagam apenas € 5,00 mensais) é pertença da Câmara Municipal de Coimbra.

78. A casa apresenta falta de condições de higiene e falta de espaço para o número de pessoas que lá habitam periodicamente.

79. A situação económica do agregado é precária e assenta em cerca de € 400,00 mensais provenientes do RSI e abonos de família dos dois menores, tendo como despesas fixas mensais a renda da casa, a água, a eletricidade e as comunicações, no valor de € 600,00.

80. Sem uma profissão estável, que lhe ocupe o dia todo, continua a dedicar-se à venda ambulante de roupas, juntamente com a companheira, na baixa de Coimbra.

81. O arguido A... foi condenado:

a) Em 23.03.1995, por sentença transitada em julgado, pela prática de um crime de ofensas corporais com dolo de perigo, praticado em novembro de 1991, na pena de 54.000$00;

b) Em 14.12.1999, por acórdão transitado em julgado, pela prática de um crime de furto qualificado, praticado em 05.05.1996, na pena de 1 ano de prisão, suspensa na sua execução pelo prazo de 3 anos;

c) Em 06.07.2001, por acórdão transitado em julgado em 23.07.2001, pela prática de um crime de roubo, praticado em 22.11.2000, na pena de 2 anos e 3 meses de prisão, suspensa pelo período de 4 anos com condições;

d) Em 30.04.2004, por acórdão transitado em julgado em 01.02.2005, pela prática de um crime de sequestro, praticado em 07.04.2003, um crime de burla informática e nas telecomunicações, praticado em 07.04.2002, um crime de dano, ocorrido em 27.04.2002, um crime de roubo, praticado em 24.05.2003 e outro crime de roubo, ocorrido em 08.05.2002, na pena única de 12 anos de prisão;

e) Em 30.07.2013, por sentença transitada em julgado em 30.09.2013, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, praticado em 16.07.2013, na pena de 1 ano de prisão, substituída por 250 dias de multa, à taxa diária de € 5,00.

82. B... é filho único do casal progenitor:

83. Os pais sedentarizaram-se em Coimbra há vários anos e fixaram acampamento num local com fracas condições de habitabilidade, que mais tarde foi desmantelado.

84. A família alargada foi então realojada no (...) e passou a ter o apoio da Equipa Técnica do Projeto de Realojamento e Integração das famílias AC... , estando sujeitos a vários programas de competências pessoais e sociais, bem como ocupação dos tempos livres dos menores, onde se incluiu o arguido, com vista à inserção social destas famílias.

85. Posteriormente foram realojados num apartamento social em (...) – Coimbra.

86. O processo de socialização do arguido decorreu de acordo com os valores do seu grupo étnico-cultural.

87. Frequentou a escola entre as 6 e os 17 anos, concluindo o 6º ano de escolaridade.

88. Os pais dedicavam-se à venda ambulante, atividade em que eram apoiados pelo filho.

89. Quando B... tinha cerca de 6 anos de idade, o pai foi preso.

90. O arguido casou, segundo os rituais culturais próprios, aos 15 anos com Nazaré BB, vindo a nascer desta relação um filho, atualmente com 11 meses.

91. À data dos factos, o arguido residia com os pais, a mulher e o filho em casa arrendada aos pais do arguido em S (...) .

92. Na mesma residência viviam ainda dois primos do arguido, que estão aos cuidados dos tios em virtude dos pais dos menores estarem presos.

93. Após a prisão do arguido, a mulher e o filho passaram a residir em casa dos pais dela, no Porto.

94. Quando B... for libertado, a mulher regressará para casa dos sogros.

95. O arguido encontrava-se inscrito no Centro de Emprego como condição para ser integrado no RSI, único rendimento declarado pelo arguido (valor € 130,00).

96. O arguido refere que chegou a consumir produtos estupefacientes, tendo iniciado o consumo aos 14 anos de idade.

97. Desde que foi preso, encontra-se abstinente.

98. Desvaloriza a necessidade de qualquer tipo de tratamento ou acompanhamento para esta problemática.

99. Em meio prisional, tem revelado um comportamento consentâneo com as regras e normas institucionais, sem registo de sanções disciplinares.

100. Encontra-se a frequentar o curso EFA B3, com o objetivo de adquirir o 9º ano de escolaridade, apresenta uma avaliação positiva, mas pouco interesse na execução das tarefas propostas.

101. O arguido beneficia do apoio da mulher e da mãe que, no momento atual, se concretizam nas visitas frequentes que efetuam ao Estabelecimento Prisional.

102. O arguido B... foi condenado:

a) Em 21.06.2012, por sentença transitada em julgado em 06.09.2012, pela prática de um crime de furto qualificado, praticado em 21.06.2012, na pena de 180 dias de multa, à taxa diária de € 6,00;

b) Em 26.06.2014, por sentença transitada em julgado em 06.05.2015, pela prática de um crime de roubo, ocorrido em 13.03.2013, na pena de 16 meses de prisão, suspensa por 16 meses.

(…)

124. O processo de desenvolvimento e socialização da arguida D... decorreu em contexto de valores culturais e vivenciais próprios da etnia cigana, em família sinalizada e conhecida pelo envolvimento em factos ilícitos, nomeadamente tráfico de estupefacientes.

125. Vive em união de facto desde 1993 com A... , segundo os usos e costumes da etnia cigana.

126. A arguida na qualidade de encarregada de educação dos menores que com ela vivem, tem cumprido o acordo de promoção da CPCJ e é referida como cuidadora dos menores.

127. D... é analfabeta, nunca trabalhou e depende do rendimento Social de Inserção Social atribuído ao agregado familiar, no valor de € 442,31 mensais, acrescidos dos dois subsídios de parentalidade por cada sobrinho, com o valor total de setenta euros.

128. A Equipa da Cáritas Diocesana de Coimbra já encaminhou a arguida para cursos de aquisição de competências pessoais e escolaridade básica, que não foram concluídos devido a absentismo e desistência.

129. A família tem sido pontualmente apoiada com géneros alimentares pelas técnicas de serviço social da rede social de apoio, nomeadamente nos últimos três anos pela Cáritas Diocesana de Coimbra, desde que foram convidados a abandonar o C (...)

130. Não são conhecidas condenações criminais à arguida D....

(…)


*

Não se provaram outros factos com interesse para a causa, nomeadamente que:

a) Os arguidos identificados em 1. vendiam e cediam produto estupefaciente na Feira dos Vinte e Três, em Casais do Campo e Ribeiro de Frades.

b) Os arguidos B... , A... e D... eram coadjuvados na prática os atos descritos em 1 a 7 pelos arguidos C... , E...e F... .

c) Os menores P...e E... ajudavam os arguidos B... , A... e D... a pesar produto estupefaciente.

d) AI... comprava dois 2dentes” de cocaína ao AA... duas a três vezes por semana, pagando 5 20,00, tendo-lhe comprado cocaína cerca de 20/25 vezes.

e) S..., desde o final de 2014, passou a adquirir especialmente ao arguido “ AA... ” e à arguida D..., em média duas vezes por semana, um “dente” de cocaína, pelo qual pagava o valor de € 10,00.

f) AD... pagou sempre € 10,00 pela dose de cocaína.

g) AS... comprou cerca de 30 vezes cocaína ao “ AA... ”.

h) J... adquiriu à D..., no ano de 2015, na zona da baixa de Coimbra, “dentes” de cocaína, pelo valor de € 10,00.

i) AO... realizava transações no hall de entrada do prédio onde residia o “ AA... ”.

j) AR.... adquiria cocaína, ligando ao “ AA... ” através do telemóvel por aquele utilizado, e que por cada “pedra” de cocaína, lhe entregava a quantia de € 10,00.

k) Os arguidos entregavam produtos estupefacientes a AO... no hall de entrada do prédio onde residia o “ AA... ”.

l) AE... adquiria “dentes” de cocaína, em média, três vezes por semana.

m) Os factos descritos em l) ocorreram cerca de 10 vezes.

n) AQ... , em rega, entregava vinte ou trinta euros em troca da cocaína.

o) T... adquiria, em média, quatro a cinco vezes por semana, um “dente” de cocaína ao arguido “ AA... ”.

p) AP... , durante o ano de 2015, adquiriu ao “ AA... 2, em média, duas vezes por semana, cocaína, pagando-lhe entre € 10,00 a € 20,00, e que, no início de 2016, foi contactado por este informando-o que tinha cocaína para vender.

q) Os factos descritos no ponto 9n) ocorriam, em média, duas vezes por semana.

r) I..., entre Maio a Setembro de 2015, adquiriu cocaína ao menor E....

s) L... adquiriu aos arguidos “ AA... ”, BB e D... durante o Verão de 2015, por diversas vezes, cocaína.

t) Os arguidos “ AA... ” e “ BB” pediam a determinados indivíduos, nomeadamente a AF... para os transportar nos seus veículos ao Porto, propondo-lhe o pagamento do combustível, respetivas portagens e oferecendo cinco “dentes” de cocaína, como forma de pagamento.

u) No dia 9 de Fevereiro de 2015, os arguidos C... e B... compraram produto estupefaciente na cidade do porto.

v) As 77 “pedras” de cocaína referidas em 30, renderiam em Coimbra valor não inferior a € 770,00.

w) Nenhum dos arguidos era consumidor de estupefacientes.

x) Os arguidos E... e F... encontravam-se na residência dos arguidos “ AA... ”, “ BB” e D... colaborando com eles na venda de produto estupefaciente, ora pesando, ora entregando diretamente aos clientes que ali se dirigiam.

y) Os arguidos F... e E...venderam, sob a orientação dos arguidos B... , A... e D..., cocaína e heroína a diversos indivíduos que se deslocavam àquela residência.

z) Os arguidos F... e E... venderam nomeadamente a AE... .

aa) Os arguidos F... e E... também pesavam, guardavam e transportavam o produto estupefaciente, sob orientações daqueles três arguidos.

bb) A partir da prisão preventiva aplicada ao arguido B... e do “desaparecimento” do arguido A... , os arguidos F... e E... passaram a exercer de forma autónoma, até Fevereiro de 2016, a venda de estupefacientes, angariando eles próprios indivíduos que vendiam por sua conta, heroína e cocaína, na baixa de Coimbra.

cc) Os € 730,00 que se encontrava no interior da carteira da arguida F... , e que foram apreendidos na busca, provinham da venda de produto estupefaciente.

dd) Os arguidos E... e F... fizeram da venda de heroína e cocaína o seu modo de vida, não exercendo qualquer atividade lícita remunerada.

ee) Os arguidos E... e F... agiram de comum acordo com os demais arguidos e em conjugação de esforços com o propósito de deter, guardar, transportar e vender aquelas substâncias cujas características bem conheciam.

ff) Todas as substâncias, veículo, valores, objetos, equipamentos, telemóveis apreendidos nos autos foram utilizados pelos arguidos E... e F... no desenvolvimento do tráfico e ou obtidos na sequência dessa atividade criminosa.

gg) Os arguidos E... e F... agiram sempre livre, voluntária e conscientemente, sabendo que as suas condutas são proibidas e punidas pela lei penal.

Motivação da decisão de facto

A convicção do Tribunal quanto à factualidade considerada provada radicou na análise crítica concatenada e ponderada da prova produzida em julgamento, apreciada segundo as regras da experiência comum e o princípio da livre apreciação do julgador (artigo 127.º do Código de Processo Penal).

Analisemos, pois, em pormenor.

Os factos descritos nos pontos 1 a 6 e 9 foram dados como provados atendendo à prova testemunhal produzida em sede de audiência de julgamento, conjugada com os relatos de diligências externas constantes dos autos (devidamente confirmados pelos agentes envolvidos), com as buscas efetuadas, com a leitura do conteúdo dos telemóveis dos arguidos e, claro, com exames efetuados ao produto estupefaciente apreendido que confirmou tratar-se de heroína e cocaína (cf. fls. 208 e 687).

Não obstante a existência de diversa prova, o certo é que só a prova testemunhal era suficiente para se concluir que os arguidos A... , B... e D... se dedicavam à venda de produto estupefaciente, principalmente cocaína, embora também vendessem heroína (cf. busca efetuada à residência dos arguidos onde foi apreendida substância desta natureza – fls. 246).

Assim, valoramos, desde logo, os depoimentos dos agentes de autoridade – U... , V... e Z... – que realizaram diversas diligências externas e observaram diversos consumidores a contactar os arguidos ou a irem a casa deles, onde permaneciam poucos minutos. Como é consabido, este tipo de contactos – frequentes e fugazes – apenas são efetuados por consumidores para comprarem produto estupefaciente. Os relatos de diligências externas juntos aos autos confirmam efetivamente esta realidade (cf. por exemplo fls. 187, 188, 199, 201, 224, 226, 228, 230, 232, 234, 236, 238, 645, 647, 648, 650, 651, 653, 654, 656, 713).

Também, como já referimos, diversos consumidores confirmaram os factos que considerámos provados.

Assim, o AM... admitiu que adquiria aos arguidos “ AA... ”, “ BB” e D..., em média, três vezes por semana e durante alguns meses, “dentes” de cocaína, pagando € 10.00 por cada “dente”. Esclareceu, ainda, que tanto lhes comprava na baixa da cidade de Coimbra, como em casa deles.

Já a testemunha AN... disse que era consumidor e que o “ AA... ” lhe chegou a arranjar um “dente” de cocaína. Tentou, sem êxito, dizer que se deslocava diversas vezes a casa dos arguidos para fazer reparações. Todavia, considerámos que não era credível esta parte do seu depoimento, porquanto, se atentarmos aos relatos de diligência externas de fls. 202 ou de fls. 224, verificamos que a testemunha entrou na casa dos arguidos e saiu passado 4 e 2 minutos, respetivamente, sendo manifestamente impossível fazer qualquer reparação nestes escassos minutos. Assim, admitindo a testemunha que era consumidor de estupefacientes e que se deslocava a casa dos arguidos por breves minutos, temos de concluir, seguindo as regras da experiência comum, que ali se dirigia para comprar estupefacientes.

A testemunha AG... descreveu que, à data dos factos era consumidor de cocaína, e que adquiriu, durante alguns meses, “dentes” de cocaína aos arguidos “ BB”, “ AA... ” e D..., pagando por cada “dente” o valor de € 10,00. Esclareceu que tanto ia a casa deles, como o “ AA... ” vinha até perto de sua casa para lhe entregar o produto.

AI... relatou que adquiriu ao arguido “ AA... 2, duas ou três vezes, “dentes” de cocaína, pagando € 10,00 por cada “dente”.

A testemunha AD... disse que se deslocou à residência do “ AA... ”, onde adquiriu, cerca de quatro vezes, uma “pedra” de cocaína. Por vezes dividiam estas mesmas doses.

Já a testemunha AS... admitiu que se deslocou à residência do “ AA... ”, onde adquiriu, pelo menos 6 vezes “dentes” de cocaína, pagando por cada “dente” € 10,00. Ainda relatou que também lhe comprou estupefaciente à beira do rio.

AL... descreveu que adquiria, em m´dia duas vezes por semana, aos arguidos “ AA... ”, “ BB” e D... um a dois “dentes” de cocaína, pelos quais pagava o valor de € 10,00 e € 20,00, respetivamente.

A testemunha J... relatou que adquiriu ao arguido “ BB”, no ano de 2015, em Coimbra, “dentes” de cocaína, pelo valor de € 10,00.

AO... disse que era consumidor de cocaína e heroína. Para adquiri estas substâncias, contactava o “ AA... ” através do telemóvel, combinando o encontro junto à paragem do autocarro, sendo que, por regra, quem ia entregar o produto era o “ BB”, que lhe entregava uma ou duas “pedras” de cocaína, pelo preço de € 10,00 cada. Referiu, ainda, que, pelo menos uma vez, o menor E... lhe entregou produto estupefaciente.

AE... narrou que, desde o mês de Junho de 2015 e até finais de Setembro do mesmo ano, adquiria ao “ AA... ” “dentes” de cocaína, pelos quais pagava o valor de € 10,00.

AF... disse que se deslocou à residência do “ AA... 2, na companhia do seu amigo AS... , onde este adquiria “dentes2 de cocaína, pagando por cada “dente” € 10,00.

A testemunha AQ... declarou que adquiriu, por diversas vezes, cocaína ao “ AA... ”, deslocando-se às proximidades do prédio deste. Noutras ocasiões marcou encontros com ele, através do telemóvel, e adquiria a cocaína nos locais por ele indicados. Pagava-lhe € 10,00 o “dente”.

T... narrou que adquiriu, pelo menos uma vez, ao arguido “ AA... ” um “dente” de cocaína, pagando cerca de € 10,00.

M... disse que adquiriu, pelo menos três vezes, no ano de 2015, cocaína ao “ AA... ”, sendo que, por vezes, consumiam os dois.

A testemunha I... declarou que comprou cocaína aos arguidos “ AA... ” e “ BB”, embora os contactos para o encontro fossem sempre estabelecidos com o primeiro.

L... narrou que adquiriu ao arguido “ AA... ”, pelo menos uma vez, cocaína, tendo ido a casa deste.

Além destas testemunhas que se encontravam identificadas na acusação como compradores de estupefacientes, ouvidos mais testemunhas que também corroboraram os factos em análise. Assim, a testemunha AB.... relatou que consumia produto estupefaciente com o arguido BB (sendo certo que o relato de diligência externa de 02.09 – fls. 224 – demonstra que a testemunha também se deslocou a casa dos arguidos por breves minutos, o que evidencia que também lhe comprava produto estupefaciente). A testemunha G... disse que o arguido “ AA... ” lhe chegou a oferecer, duas ou três vezes, cocaína. A testemunha H... admitiu que mandava mensagens ao “ AA... ” para amigos lhe comprarem cocaína e que, efetivamente, eles compravam e depois lhe entregavam a sua parte. A testemunha O... também admitiu que telefonava ao “ AA... ” para dividirem cocaína ou para lhe vender., ao que este acedia. Já a testemunha N... referiu que chegou a ir a casa dos arguidos, por lhe terem dito que eles vendiam cocaína, mas, na data em que lé foi, não tinham e, por isso, nunca lhes comprou.

Toda a prova testemunhal, como vimos, é inequívoca no sentido de que os arguidos se dedicavam à venda de produto estupefaciente.

Os elementos constantes do apenso I – onde se descrevem as diversas mensagens enviadas e recebidas pelos arguidos A... , B... e D... – também comprovam a atividade de tráfico a que se dedicavam os arguidos, sendo frequentes as mensagens a combinar encontros e a falar de pagamentos (cf.., a título de exemplificativo, fls. 9, 11, 12, 14, 19, 35, 36, 38, 40, 47, 98, 102, 103, 122, 139, 190, 191 e 192 do apenso I).

O apenso III refere-se às diferentes comunicações estabelecidas pelos diferentes telemóveis dos arguidos, onde, com particular relevância para a prova dos factos constantes dos pontos 5 e 6, podemos aperceber-nos dos contactos telefónicos estabelecidos pelos consumidores acima identificados e os arguidos (cf. fls. 53 a 56 do apenso III).

Na busca efetuada, em 07 de outubro de 2015, à residência dos arguidos A... , B... e D... – documentada a fls. 245 – foi apreendido produto estupefacientes em quantidade que não se compadece com o mero consumo e, ainda, plásticos e sacos de plástico recortados, normalmente utilizados para acondicionamento de doses individuais de estupefacientes. Todos estes objetos também demonstram que os arguidos se dedicavam à venda de cocaína e heroína.

Considerámos provado que os arguidos A... , B... e D... receberam elevadas quantias em dinheiro (ponto 7 e 57), uma vez que as testemunhas acima identificadas confirmaram que lhes compravam estupefacientes, o que foi conjugado com o tempo em que os arguidos se dedicavam a este tipo de atividade (período coincidente com a investigação – cf. relatos de diligências externa e buscas). Além disso, é do conhecimento comum que o tráfico de estupefacientes movimenta grandes quantias e dinheiro, com lucro para quem vende. Das buscas efetuadas foi possível constatar que os arguidos tinham na sua residência diversos objetos eletrónicos, nomeadamente, 2 máquinas fotográficas, 1 tablet, 16 telemóveis e 2 LCD (guardados na despensa), 1 plasma e 1 LCD num dos quartos. Das informações da Segurança Social constante de fls. 1444 e seguintes, e das Finanças, constantes de fls. 975, 976 e 977, resulta que os arguidos não têm atividade remunerada e que a arguida D... recebe o RSI. A ser assim, os arguidos não beneficiavam de rendimentos que lhes permitisse ter tal quantidade de objetos que, como sabe, não são acessíveis a todos. Deste modo, é legítimo concluir, recorrendo às regras da experiência comum, que tais bens forma recebidos pelos arguidos em troca de produto estupefaciente (pontos 7 e 57).

Dos factos provados resultou assentes que os arguidos eram ajudados pelos menores P...e E... (que têm atualmente 8 e 14 anos de idade e se encontravam à guarda da arguida D..., como consta do relatório social de fls. 1772), na entrega de produtos estupefacientes, (ponto 8, 46 a 49).

Consideramos provados estes factos tendo em consideração o depoimento da testemunha AO... , que, como vimos, admitiu que o menor E... lhe entregou uma vez cocaína, e os relatos de diligências externas de 29.06.2015, 02.09.2015 e de 08.09.2015 – cf. fls. 145, 224 e 22. Na primeira situação, o agente relatou que viu um menor a colocar na mão de um indivíduo algo de pequenas dimensões, regressando de imediato a casa, e, na segunda situação, viu o menor sair da residência e a deslocar-se em passo de corrida e a regressar passado 16 minutos, ficando a menor P...na varanda do apartamento, “numa posição de clara vigilância” e, na terceira situação, o menor sentou-se num banco de autocarro e, passado cerca de 1 minuto, chegou um veículo, o menor abriu a porta do passageiro, contactando com o condutor, regressando logo de seguida a casa.

O agente da GNR V... também declarou que não tem dúvidas que os menores eram utilizados no tráfico, tendo presenciado duas situações em que os viu a entregar “algo”, que presumiu legitimamente, dizemos nós, ser estupefaciente. Com efeito, todos sabemos que este tipo de entregas/vendas rápidas são de estupefacientes, sendo certo que, sabendo nós que os arguidos que viviam com os menores traficavam estupefacientes, temos de concluir que estas entregas fugazes era de cocaína ou mesmo heroína (substâncias por eles traficadas).

Também o agente Z... assegurou que viu o menor a fazer uma entrega a um condutor.

Toda esta prova, analisada criticamente e à luz das regras da experiência comum, nos leva a concluir que os menores também eram utilizados na venda de produto estupefaciente.

Os factos constantes dos pontos 11 e 12 forma dados como provados, conjugando a prova constante do apenso II, com as declarações do arguido C... , depoimentos das testemunhas U... e AJ... e o auto de apreensão de fls. 53.

Pois bem, as listagens de fls. 2, 7, 8, 9, 10, 12, 13, 14, 15, 21, 32, 33, 53, 64, 68, 71, 72, 74, 87, 99, 117, 130, 133, 144, 156 e 167 do apenso II (referentes aos registos de trace back do telemóvel apreendido na casa dos arguidos) comprovam que em todas as situações identificadas no ponto 12 os arguidos se deslocaram à cidade do Porto. Se atentarmos que, no dia 11.02.2015, foram efetuados seguimentos policiais à viatura (...) GR e que a mesma seguiu pela A1, em direção ao Norte e, quando regressou, foi efetuada uma abordagem policial, tendo-se apreendido 77 pedaços de cocaína, com o peso líquido de 7,563 (cf. autos de apreensão de fls. 53 e depoimentos dos agentes da GNR U... e AJ... ) e que o arguido C... (que seguia nesse veículo) admitiu que tinham ido comprar estupefaciente, facilmente concluímos que os arguidos se abasteciam naquele local. Na verdade, em nenhuma outra vigilância se encontraram indícios que a compra de estupefacientes ocorresse noutro sítio, sendo certo que trinta viagens ao Porto em tão curto espaço de tempo, permite-nos, com segurança, afirmar que era nesta cidade que os arguidos compravam o estupefaciente que depois vendiam em Coimbra. É óbvio que os arguidos depois de verem o seu veículo apreendido, tiveram de encontrar outro meio de se deslocarem à cidade do Porto e, por isso, se considerou provado que utilizavam veículos de terceiros.

O facto descrito em 13 resulta do relato de diligência externa de fls. 40 e das declarações do arguido C... que confirmou que se deslocaram à cidade do Porto.

No que se refere aos factos constantes dos pontos 14 a 34, atendemos às declarações do arguido C... , que admitiu os factos tais como os considerámos provados, aos relatos de diligência externa de fls. 42 e 43, ao teste rápido registado a fls. 44, ao auto de apreensão de fls. 53, ao relatório fotográfico de fls. 58 a 63 e declarações dos agentes da GNR U... e AJ... , que também descreveram os factos por si presenciados.

O facto descrito em 35 resulta do auto de interrogatório de fls. 73 a 82.

Já no que se refere ao ponto 36, importa dizer que o mesmo resulta, não só dos relatos de diligência externa realizadas (onde se constatou que continuavam a ocorrer contactos frequentes de consumidores com os arguidos) – cf. fls. 645 e seguintes – como a busca efetuada, a 07 de outubro de 2017, veio demonstrar que os arguidos tinham na sua posse uma quantidade significativa de produto estupefaciente e outros objetos utilizados no tráfico, como os já referidos sacos de plástico, utilizados para individualizar as doses a vender. Acresce que as testemunhas já cima identificadas afirmaram que compravam produto estupefaciente aos arguidos após o dia 10.02.2015, conforme relatado.

Os factos descritos em 37 a 41 e 45 resultam provados pela análise do auto de busca de fls. 245 a 249, autos de pesagem e teste rápido de fls. 250 a 254, registo fotográfico de fls. 268 a 285.

Relativamente à natureza do produto estupefaciente, valoramos o relatório pericial de fls. 208 e 687 (ponto 42).

Os pontos 43 e 44 resultam provados do auto de interrogatório de fls. 350 a 371.

Os factos descritos em 50 a 52 resultam provados da informação de fls. 769, 770, do despacho de fls. 780 e do auto de busca de fls. 811.

No que se refere às buscas efetuadas a 23 de fevereiro de 2016 – ponto 53 e 54 -, valorámos os autos de busca e apreensão de fls. 811, 812, 826 e 827, o documento de fls. 814 e os registos fotográficos de fls. 820 a 823, 828 e 829.

Os factos descritos nos pontos 55, 56, 58, 60 e 61 foram dados como provados pela conjugação dos restantes factos dados como provados. Como vem sendo dito na jurisprudência, dado que o dolo pertence à vida interior de cada um, é portanto de natureza subjetiva, insuscetível de direta apreensão. Só é possível captar a sua existência através de factos materiais comuns de que o mesmo se possa concluir, entre os quais surge com maior representação o preenchimento dos elementos integrantes da infração. Pode comprovar-se a verificação do dolo por meio de presunções, ligadas ao princípio da normalidade ou das regras da experiência”. No mesmo sentido vide Ac. da R.P. 0140379, de 03.10.2001, Ac. R.G. 1559/05.1, de 14.12.2005, ambos em www.jurisprudencia.vlex.pt.

No que concerne aos factos constantes do ponto 59, importa dizer que acreditámos nas declarações do arguido C... , que esclareceu estes factos. Com efeito, o arguido não estava a ser investigado nos presentes autos, pelo que é plausível que apenas tenha tido participação no facto descrito e que tenha atuado apenas e tão só para conseguir cocaína, substância estupefaciente que consumia.

Valorámos os relatórios sociais e os certificados de registo criminal, juntos aos autos a fls. 1772, 1744, 1800, 1807, 1863, 1989, 1814, 1819, 1825, 1829, 1836 e 1838 para dar como assentes os demais factos dados como provados.

As demais testemunhas ouvidas não tinham conhecimento de factos relevantes para a boa decisão da causa.

No que respeita à factualidade dada como não provada, resultou a mesma da ausência de prova convincente produzida a tal respeito.

Não deixaremos, no entanto, de dizer que a investigação dos autos não incidia sobre os arguidos E... e F... (conforme confirmado pelo agente da GNR U... )., não existe qualquer relato de diligência externa que os implique e na busca efetuada na residência dos mesmos nada foi encontrado. Assim, o facto de frequentarem a caso dos arguidos, de quem eram familiares, e estarem no local quando ocorreu a busca, não nos permite imputar a prática de atos de tráfico. Manifestamente não existia prova quanto a eles.

3. Apreciação

Do recurso dos arguidos A... , B... e D...

a. [Da nulidade do despacho que não reconheceu a arguida nulidade; Da proibição de prova traduzida na leitura, em sede de audiência de julgamento, sem o acordo dos arguidos, das declarações prestadas pelas testemunhas perante o Ministério Público; Da inconstitucionalidade das alíneas a) e b) do n.º 3 do artigo 356.º, na interpretação levada a efeito pelo Coletivo]

Transversal a todos os recursos surge a questão da nulidade do despacho proferido em sede de julgamento, no qual, a requerimento do Ministério Público, formulado ao abrigo do disposto no artigo 356.º, n.º 3, alíneas a) e b) do CPP, o tribunal a quo, deferiu a leitura do depoimento prestado no decurso do inquérito perante a autoridade judiciária (M. P.), circunstância que veio a ocorrer – pese embora a oposição dos recorrentes -, conforme resulta da documentação dos atos da audiência, no que respeita às testemunhas AN... e AS... , tendo sido relativamente a este último que a questão foi suscitada (pelos ora recorrentes) e indeferida no acórdão.

Agora, incidindo num universo mais alargado (parecendo ser seu propósito estender a alegação a todos os casos em que, com a sua oposição, a leitura foi autorizada), defendem os recorrentes não prescindirem as normas invocadas do acordo dos arguidos (na respetiva leitura) e, por conseguinte, ao não ter seguido semelhante entendimento, teria o Coletivo violado o dito preceito normativo, dando origem à sobredita nulidade, traduzida na valoração de prova proibida.

Os depoimentos em questão, ou seja aqueles cuja leitura, em sede de audiência de julgamento, com a oposição dos recorrentes, foi autorizada surgem efetivamente a fundamentar a convicção do tribunal, o que significa terem sido objeto de valoração; Por outro lado, os despachos que, na sequência de requerimento do Ministério Público, permitiram a respetiva leitura encontram-se fundamentados nas alíneas a) e/ou b) do n.º 3 do artigo 356.º do CPP.

Assentando em tais pressupostos, assistirá razão aos recorrentes?

Vejamos.

Como escreve Paulo Dá Mesquita, A Prova do Crime e o que se disse antes do Julgamento, pág. 599, A proibição de valoração como prova das declarações processuais anteriores ao julgamento de assistente, partes civis e testemunhas, comporta exceções, surgindo, desde logo «uma categoria de atos pré-definidos funcionalmente dirigidos à utilização como prova do julgamento em que se antecipa o contraditório na produção da prova.

Além dos casos de antecipação do contraditório na produção da prova, a intransmissibilidade probatória é objeto de derrogações centradas na articulação entre a forma de recolha do depoimento e factos supervenientes à declaração, suscetíveis de serem divididos entre casos em que a fonte de prova é ouvida na audiência de julgamento e aqueles em que está indisponível e não chega a prestar qualquer depoimento.

Sendo a fonte de prova ouvida no julgamento, a reprodução das suas anteriores declarações processuais apenas é admitida quando prestadas perante juiz e para «avivamento da memória de quem declarar na audiência que já não recorda certos factos», ou quando da sua leitura decorre a existência de «contradições» ou «discrepâncias».

Contudo, se as normas em análise (artigo 356.º, n.º 3, als. a) e b), do CPP), relativamente às contradições e discrepâncias já haviam sido objeto de flexibilização em 2007 (na versão até então vigente apenas era possível a leitura no caso de «contradições ou discrepâncias sensíveis que não possam ser esclarecidas de outro modo»), com as alterações introduzidas ao Código de Processo Penal pela Lei n.º 20/2013, de 21.01, o n.º 3 do artigo 356.º, passou, no que ora releva, enquanto se deixou de reportar apenas ao juiz - menção substituída por «autoridade judiciária» (artigo 1.º, n.º 1, alínea b) do CPP) - a incluir ainda as declarações prestadas perante o Ministério Público, resultando clara a intenção que ditou essa maior abrangência, lendo-se, a propósito, na Exposição de motivos (cf. a Proposta de Lei n.º 77/XII) que conduziu à alteração: Sendo residuais os casos em que as testemunhas são efetivamente inquiridas por um juiz nas fases preliminares do processo, deve ser assegurada a possibilidade de leitura ou reprodução das declarações anteriormente prestadas perante o Ministério Público em caso de necessidade de avivamento de memória e no caso de contradições com o depoimento anteriormente prestado.

Alteração, essa, que, no dizer do Tribunal Constitucional, traduzindo um alargamento da possibilidade de utilização na audiência de julgamento de declarações anteriormente prestadas pelo assistente, por partes civis ou por testemunhas, mesmo na ausência de consenso entre Ministério Público, arguido e assistente – se inscreve na linha geral da reforma de 2013: a conciliação prática entre, por um lado, a necessidade de celeridade e eficácia no combate ao crime e de defesa da sociedade; e, por outro lado, a garantia dos direitos de defesa do arguido.

É, assim, hoje possível, na norma, ou conjunto de normas em que se decompõe o artigo 356.º do CPP, descortinar cinco núcleos, a saber: (i) um primeiro constituído pelas situações reportadas nas alíneas a) e b) do n.º 1 (independentemente de quem as recolheu); (ii) um segundo integrado pelas alíneas a) e c) do n.º 2 (perante o juiz); (iii) um terceiro reportado nos n.ºs 2, al. b) e 5 (independentemente de quem as recolheu – Juiz, MP, OPC), desde que tenha havido acordo; (iv) um quatro resultante do n.º 3 desde que prestadas perante AJ (Juiz, MP), com as finalidades, alternativas, enunciadas nas alíneas a) e b) respetivas; (v) o quinto composto pelas situações descritas no n.º 4 (declarações que não podem, pelos motivos contemplados na norma, ser repetidas em audiência), se, igualmente, prestadas perante autoridade judiciária.

Por conseguinte, diferentemente do defendido pelos recorrentes, o acordo dos intervenientes processuais apenas se torna exigível quando as declarações que se querem ver reproduzidas (lidas) foram prestadas perante os OPC ou, fora do quadro previsto nas alíneas a) e b) do n.º 3 do artigo 356.º, perante o Ministério Público.

Constituem estas (a par das demais previstas no preceito) exceção à proibição de valoração das provas, para efeito de formação da convicção do tribunal, não produzidas (diretamente) ou examinadas em sede de audiência de julgamento (artigo 355.º do CPP), sistema que - decorrente dos princípios da imediação e contraditório - comporta desvios, no caso do n.º 3 do artigo 356.º, justificáveis pela necessidade de avivar a memória do declarante ou de esclarecer contradições, dispensando-se aqui, desde que prestadas perante a autoridade judiciária, o dito acordo.

Terá sido, como vimos, a consciência da extrema limitação do regime quanto à leitura em sede de julgamento das declarações prestadas no decurso do inquérito, as quais, não raramente, em audiência, ou caiem num estranho esquecimento ou inexplicavelmente se contradizem, que determinou o legislador a flexibilizar o sistema por forma a permitir a leitura dos depoimentos feitos perante o Ministério Público.

A questão da inconstitucionalidade da interpretação normativa dada às alíneas a) e b) do n.º 3 do artigo 356.º do CPP no sentido de dispensar o acordo, designadamente da defesa, já foi submetida à apreciação do Tribunal Constitucional (Ac. TC n.º 24/2016) que decidiu «Não julgar inconstitucional o artigo 356.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, quando interpretado no sentido de que a leitura dos depoimentos prestados no inquérito perante o Ministério Público é admitida, sem ser necessário o consentimento dos arguidos, quando aquela leitura se destine a avivar a memória de quem declare na audiência já não se lembrar de certos factos, ou quando existir entre elas e as feitas na audiência discrepâncias ou contradições».

Na fundamentação, onde surgem mencionados sistemas, como o alemão e o italiano, com soluções diferenciadas no que tange ao aproveitamento dos depoimentos prestados em atos processuais anteriores à audiência de julgamento, em certos casos mais restritivos, noutros menos, merece destaque a evolução da jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem relativa ao artigo 6.º, parágrafo 3.º, alínea d), da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, a qual, colocando (inicialmente) em causa a regra da prova única ou determinante no sentido em que «um processo (penal) não é equitativo, caso a condenação se funde exclusivamente ou em medida decisiva em depoimentos de testemunhas que o arguido não tenha podido interrogar em nenhuma das fase do processo, veio a ser flexibilizada no acórdão Al-Khawaja e Tahery com a admissão pelo Tribunal de, em determinadas circunstâncias poder a mesma ser afastada sem violação do artigo 6.º, parágrafo 3.º, alínea d), da Convenção, admitindo, portanto, a condenação do arguido com base em depoimentos de testemunhas lidos na audiência sem que as mesmas testemunhas tenham alguma vez sido interrogadas, direta ou indiretamente, pelo arguido (…), orientação confirmada no acórdão Schatscbaschwili.

Com referência a tais elementos prossegue o aresto: Estas indicações confirmam que o reconhecimento de um espaço de livre conformação quanto à disciplina legal da admissibilidade da leitura em audiência é corrente no panorama jurídico europeu, inexistindo soluções absolutas. Constantes são apenas a orientação geral correspondente à imediação e a exigência da salvaguarda dos direitos de defesa e do contraditório quanto aos depoimentos a apreciar na audiência.

(…)

Entende este Tribunal que o citado alargamento não afeta intoleravelmente nem a equidade do processo criminal nem as garantias de defesa do arguido e que, por isso, ainda se situa no âmbito da liberdade de conformação do legislador.

Com efeito, o alargamento em causa, além de respeitar apenas às diligências realizadas por magistrados que a própria lei processual qualifica como “autoridade judiciária” (…), encontra-se balizado – e, por isso, também justificado por razões atendíveis – pelas funções previstas nas alíneas a) e b), do n.º 3, do artigo 356.º do CPP (…). Trata-se, assim, de um importante instrumento auxiliar no avivamento da memória de quem presta declarações em audiência ou na aferição da credibilidade desses depoimentos (cfr. o Acórdão n.º 90/2013), cuja importância para a descoberta da verdade material não pode ser desprezada.

Acresce que a solução legal não impede o arguido de, no exercício do contraditório, confrontar na audiência de julgamento a testemunha com as declarações feitas nesse momento e com eventuais contradições ou discrepâncias resultantes da leitura de declarações proferidas em momento processual anterior perante o Ministério Público, contrainterrogando-a ou oferecendo meios de prova que abalem a sua credibilidade. O princípio do contraditório não é afastado, nem a sua eficácia relativamente à formação da convicção do julgador se mostra diminuída. Por outro lado, mantém-se a salvaguarda estatuída no artigo 356.º, n.º 6, do CPP: proibição da leitura de depoimento prestado em inquérito ou instrução por testemunha que, em audiência, se tenha validamente recusado a depor.

(…)

Deste modo, a solução consagrada no artigo 356.º, n.º 3, do CPP, além de contribuir para a busca da verdade no quadro do processo criminal e para a consequente maior eficácia no combate ao crime e defesa da sociedade, não subtrai ao arguido meios de defesa legítimos nem afeta as condições da sua participação paritária na dialética inerente ao processo na fase da audiência de julgamento – por isso, não viola o direito ao processo equitativo previsto no artigo 20.º, n.º 4, da Constituição; nem, por outro lado, impede ou dificulta desproporcionadamente a defesa do arguido, já que este pode na audiência de julgamento exercer plenamente o contraditório relativamente às testemunhas cujas declarações tenham sido lidas nessa mesma audiência – daí não ocorrer violação nem das garantias de defesa nem do princípio do contraditório consignados no artigo 32.º, n.ºs 1, 2 e 5, da Constituição.

De facto, como diz Paulo Dá Mesquita (ob. Cit., pág. 605), Sendo a fonte da prova ouvida no julgamento, a reprodução de anteriores declarações articula-se com a inquirição e presença pessoal no julgamento podendo assegurar-se a contra-inquirição ainda que diferida, relativamente ao que se disse antes do julgamento (…). Perspetiva do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem que não coloca nestes casos (em que as fontes são inquiridas em julgamento) as mesmas limitações inferenciais à utilização probatória desses elementos de prova. Na jurisprudência do TEDH o contraditório devido também absorve a utilizibilidade dos anteriores depoimentos sempre que seja facultada a contra-inquirição em julgamento.

Não contende, assim, com a Convenção a consideração no julgamento de declarações anteriores de uma testemunha que a defesa pode inquirir na audiência.

Em síntese:

(i) Da conjugação dos artigos 355.º e 356.º do CPP, em função da ressalva levada a efeito no n.º 2 do primeiro preceito, decorre que valem em julgamento as provas contidas em atos processuais cuja leitura, visualização ou audição em audiência sejam permitidas, nos termos dos artigos que seguem;

(ii) Entre os quais, concretamente no artigo 356.º, se mostra incluída a leitura das declarações da testemunha anteriormente prestadas no decurso do inquérito, pese embora com as limitações resultantes das próprias normas, já no que concerne à qualidade da entidade perante a qual foram proferidas, já no que respeita ao propósito que as justifica, já quanto à necessidade, ou não, de consenso entre sujeitos processuais;

(iii) Realidades que, não deixando de constituir exceções ao princípio da imediação, encontram respaldo ou na impossibilidade da sua produção direta em julgamento ou por outros motivos pertinentes como sucede com os casos de «avivamento da memória de quem declarar na audiência que já não recorda certos factos» ou para esclarecer «contradições ou discrepâncias» (cf. alíneas a) e b) do n.º 3 do artigo 356.º do CPP);

(iv) Com as alterações introduzidas pela Lei n.º 20/2013, de 21.01 no Código de Processo Penal, o regime de exceção contemplado nas alíneas a) e b) do n.º 3 do artigo 356.º do CPP – já aquando da Reforma de 2007 flexibilizado - foi alargado de forma a abranger não só, como até então, as declarações prestadas perante o juiz, mas também as proferidas perante o Ministério Público;

(v) As quais – ao invés do que se passa quando prestadas perante o OPC -, verificados os pressupostos alternativos prefigurados numa das ditas alíneas, quais sejam o avivamento da memória de quem declarar na audiência já não se recordar de certos factos ou o esclarecimento de contradições ou discrepâncias entre as declarações anteriormente prestadas e as feitas em audiência, não exigem o acordo dos sujeitos processuais, e logo o do arguido;

(vi) A justificação desta maior flexibilização resulta com clareza da Exposição de motivos (Proposta de Lei n.º 77/XII) que conduziu à alteração, na parte em que refere: Sendo residuais os casos em que as testemunhas são efetivamente inquiridas por um juiz nas fases preliminares do processo, deve ser assegurada a possibilidade de leitura ou reprodução das declarações anteriormente prestadas perante o Ministério Público em caso de necessidade de avivamento de memória e no caso de contradições com o depoimento anteriormente prestado;

(vii) Na situação em apreço, verificando-se o circunstancialismo descrito nas alíneas a) e b) do n.º 3 do artigo 356.º do CPP, o qual surge a justificar a autorização da leitura das declarações em questão, não ocorre a arguida nulidade, tão pouco se assiste à valoração de prova proibida, não merecendo, como tal, censura o acórdão recorrido já enquanto indeferiu o invocado vício, já enquanto não dispensou, na formação da convicção, a consideração dos ditos depoimentos;

(ix) O Tribunal Constitucional (acórdão TC n.º 24/2016), suscitada que foi a inconstitucionalidade das ditas normas (alíneas a) e b), do n.º 3, do artigo 356.º do CPP), na interpretação normativa perfilhada pelo tribunal a quo no sentido de em tais casos não ser exigível a concordância do arguido para a leitura das declarações anteriormente prestadas perante o Ministério Público, decidiu: Não julgar inconstitucional o artigo 356.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, quando interpretado no sentido de que a leitura dos depoimentos prestados no inquérito perante o Ministério Público é admitida, sem ser necessário o consentimento dos arguidos, quando aquela leitura se destine a avivar a memória de quem declare na audiência já não se lembrar de certos factos, ou quando existir entre elas e as feitas na audiência discrepâncias ou contradições»;

(x) Realçando, por um lado, não se traduzir a solução consagrada no artigo 356.º, n.º 3 do CPP numa subtração dos meios de defesa legítimos, tão pouco na afetação da sua participação paritária na dialética inerente ao processo na fase de julgamento, afastando, assim, a violação do direito a um processo equitativo (artigo 20.º, n.º 4 da CRP) e, por outro lado, não impedir ou dificultar desproporcionadamente a defesa do arguido, assegurado que está o exercício pleno do contraditório em sede de audiência em relação às testemunhas cujas declarações, em julgamento, tenham sido objeto de leitura, contrariando, deste modo, a alegada derrogação das garantias de defesa ou do princípio do contraditório com assento no artigo 32.º, n.ºs 1, 2 e 5 da CRP;

(xi) Perspetiva do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem que não coloca nestes casos (em que as fontes são inquiridas em julgamento) as mesmas limitações inferenciais à utilização probatória desses elementos de prova. Na jurisprudência do TEDH o contraditório devido também absorve a utilizibilidade dos anteriores depoimentos sempre que seja facultada a contra-inquirição em julgamento.

Assim:

(xii) Não foram violadas as normas processuais comuns e/ou constitucionais convocadas pelos recorrentes, designadamente os artigos 125.º, 128.º, 355.º, 356º do CPP, 20.º, n.º 4, 32.º, n.ºs 1, 2 e 5 da CRP, tão pouco o artigo 6.º da CEDH.

Improcedem, pois, nesta parte os recursos.

Do recurso dos arguidos D... e B...

b. [Impugnação da matéria de facto]

Insurgem-se os recorrentes com o que consignado se mostra nos pontos 8., 46., 47. e 48 dos factos provados, os quais, no seu entender, consubstanciam erros de julgamento.

Tendo sido documentadas, através de gravação, as declarações prestadas na audiência de discussão e julgamento pode, efetivamente, este tribunal conhecer de facto (cf. artigos 363.º e 428.º do CPP), para além do que resulta do texto da decisão recorrida, por si, ou conjugada com as regras da experiência comum.

E pese embora os recursos revelarem um cumprimento assaz deficiente dos ónus que sobre os recorrentes impedem sempre que visam atacar a matéria de facto, ainda, assim, é possível identificar os segmentos colocados em crise, quais sejam:

 (i) A utilização, por si, dos menores na atividade de tráfico, porquanto não teria resultado da prova que houvessem estes agido segundo a sua determinação e ordens;

 (ii) o conhecimento da sua parte do envolvimento dos menores na dita atividade;

(iii) os atos de entrega de estupefaciente, descritos em 47. dos factos provados.

E quais, então, as concretas provas que imporiam decisão diversa da recorrida?

Perscrutadas as respetivas conclusões, constata-se satisfazerem-se os recorrentes com a (sua) síntese do que teriam sido os depoimentos das testemunhas aí identificadas; na correspondente motivação transcrevem parte significativa dos mesmos para concluir (conclusões, estas, comuns aos dois recursos):

a. «Ora esta Testemunha Z..., nada de relevante referiu relativamente aos Menores E... e P....

Ainda menos, algo que houvesse sido previamente determinado e ordenado pela ora Recorrente.

De facto, a testemunha refere que os Menores residiam na habitação dos Arguidos, o que resulta, nomeadamente do teor dos relatórios sociais.

Contudo, esse facto só por si, não permite afirmar que os menores eram utilizados na atividade de tráfico dos arguidos.

Acontece que, a testemunha não afirmou ter visto qualquer ato praticado pelos Menores em que estivessem presentes os arguidos B... e D... ora Recorrente.

Referindo apenas a presença do Arguido A... .

O que não permite por si só, inferir que os Arguidos B... e D... ora Recorrente, tivessem conhecimento do envolvimento dos Menores na atividade delituosa dos Arguidos.

b. A testemunha Sargento U... , referiu no que tange à alegada utilização dos menores E... e P... que tudo se encontrava vertido nos autos nas vigilâncias.

Nos quais não participou em grande maioria das mesmas, tendo referido serem outros colegas que o fizeram.

Mais referiu que na residência habitavam os dois Menores E... e P....

Contudo nada adiantou relativamente à alegada participação dos mesmos na atividade de tráfico dos arguidos.

Não conseguindo a testemunha, afirmar com a certeza que é exigível, quais os arguidos que se encontravam em concreto, no interior do apartamento, enquanto lá também se encontravam os menores.

Assim, forçoso é concluir que do depoimento da testemunha não se pode de modo algum extrair que os arguidos B... e D... orientassem ou utilizassem os menores na atividade ilícita de tráfico.

Ademais, não se conseguiu sequer extrair do depoimento da testemunha que os Arguidos B... (Filho) e D..., tivessem conhecimento sequer que os menores eram utilizados na atividade de tráfico.

c. Esta Testemunha V... , à semelhança das anteriores também não conseguiu afirmar com certeza que em alguma das três situações que relatou, tivesse visto o Menor E... a trocar o que quer que seja.

Afirma apenas ter visto um gesto do menor. Nada mais …

Não afirma, que tivesse visto o Menor a receber o que quer que seja dos condutores.

Ademais, não afirma, nem poderia afirmar qual dos arguidos estava nas imediações do local a orientar os Arguidos.

Quanto ao mais, afirma que por vezes via os menores na varanda, por vezes os dois, por vezes só um, por vezes a brincar.

O que é consonante com o normal acontecer, uma vez que os menores ali residiam.

Assim, do depoimento da testemunha não se pode extrair, por muito esforço, que se faça nesse sentido, que os arguidos B... e D..., tivessem sequer conhecimento que os Menores era utilizados na atividade de tráfico.

d. Importa desde já salientar, que esta testemunha AO... , foi o primeiro e único consumidor a afirmar em sede de julgamento, que um Menor lhe entregou estupefaciente.

Ademais importa desde já referir que esta testemunha, contactava previamente, sempre por telefone o Arguido A... “ AA... ”.

E foi na sequência de um desses contactos, que surgiu o menor.

Importa também salientar, que a testemunha refere que por vezes contactava o A... (Pai), e na sequência desse contacto aparecia o B... (Filho).

Ora, do depoimento desta testemunha devidamente conjugado com os depoimentos dos elementos policiais, não se pode extrair que quer o Arguido B... (Filho), quer a arguida D... tivessem, participação ou conhecimento do envolvimento dos Menores na atividade delituosa.

Perante semelhante quadro, manifesto se torna não impor a prova indicada decisão diversa da recorrida.

Não obstante, sempre diremos:

1. No que respeita aos atos de entrega de estupefaciente, descritos em 47. dos factos provados, os relatos de diligência externa de fls. 145/146, 224/225 e 226/227, de 29.06.2015, 02.09.2015 e de 08.09.2015, respetivamente, conjugados com o depoimento das testemunhas V... , militar da GNR, que participou em todas as vigilâncias reportadas nos ditos RDE, já enquanto descreveu o modo como o menor E... contactou com o condutor da viatura, concretamente os gestos de ambos [o condutor abriu a mão e o menor colocou-lhe algo na palma da mão], já enquanto narrou, numa outra situação, o encontro, na paragem de autocarro junto à residência dos arguidos/recorrentes, do menor com um outro indivíduo que chegou numa viatura [sentam-se e ambos, em simultâneo, debruçam-se sobre o mesmo lado, não chegando o menor a entrar no veículo, voltando para casa], enquanto relatou, numa terceira ocasião, o contacto estabelecido entre o menor e um indivíduo que se fazia deslocar num veículo [trocam qualquer coisa]; Z..., cabo da GNR com intervenção na vigilância de 29.06.2015, quando esclareceu: saiu o A... (Pai) e após falar com o condutor foi a casa e depois saiu o E... e foi ao veículo, que tinha dado entretanto a volta, e o menor entregou-lhe qualquer coisa]; AO... , à data dos factos consumidor de estupefaciente, ao referir: Uma vez o menor entregou-me cocaína; Contactava telefonicamente com o AA... combinavam: Olha espera aí na paragem; Quem apareceu foi o miúdo], não consentem outra decisão senão a tomada pelo Coletivo.

Com efeito, assente que está dedicarem-se os arguidos/recorrentes à atividade de tráfico de estupefaciente; serem constantes as deslocações de consumidores à sua residência com vista à aquisição de droga, onde nem sempre entravam, aguardando, por vezes, no respetivo veículo, designadamente junto da paragem de autocarro; residir o menor E... com os arguidos, encontrando-se, tal como a menor P... , à guarda da arguida D...; constatado que foi no decurso das vigilâncias a conduta do menor no confronto com os indivíduos a que se reportam os RDE, quer quanto ao tempo do contacto (sempre fugazes), quer quanto aos gestos levados a cabo por cada um, quer quanto ao regresso, de imediato a casa, que outra coisa se poderia inferir? Por certo, não será propósito dos recorrentes fazer crer a este tribunal haverem-se os ditos encontros destinado à entrega de dropes, gomas, enfim doces!

2. No que tange à supervisão por parte do recorrente B... (filho) reportada no ponto 48., também o RDE de 08.09.2015 (fls. 226/227) enquanto dá conta da postura vigilante deste, na varanda do apartamento, durante o lapso de tempo em que o menor procedeu à entrega de estupefaciente ao condutor do veículo ali mencionado não permite qualquer reserva sobre o bem fundado da decisão;

3. Já no que se reporta à utilização, pelos recorrentes B... (filho) e D..., dos menores na atividade de tráfico, independentemente das considerações supra, tendo resultado apurada uma atuação, juntamente com o arguido A... , de comum acordo e em conjugação de esforços, irrelevante se torna que o auxílio, em cada momento, prestado pelos menores, tenha resultado de determinação ou ordem deste ou daquele arguido já que a tal forma de comparticipação criminosa não é exigível que todos os agentes pratiquem todos os factos relevantes, permitindo, antes, que estes, não obstante a sua execução, porventura, parcial, lhes sejam integralmente imputados; ponto é que, cada um deles, tenha o domínio sobre o sucesso total do facto, domínio, esse, que lhe advém da essencialidade do papel que desempenha no plano;

4. Significa, pois, que apenas o alegado desconhecimento dos arguidos/recorrentes no envolvimento dos menores na atividade de tráfico seria passível de os fazer alcançar o fim (óbvio) que justifica a sua pretensão.

Mas também aqui as coisas tinham de fazer sentido e não fazem.

Na verdade.

A atitude vigilante, atrás reportada, do recorrente B... é por demais elucidativa do seu conhecimento sobre a utilização do menor na atividade de tráfico, apreciação que não difere relativamente à recorrente D....

 De facto, residindo os menores no apartamento (com as características descritas no ponto 40.º dos factos provados) onde vivia a arguida com os demais coarguidos; encontrando-se as crianças à sua guarda; procedendo, também, ela à venda de estupefacientes aos que ali se dirigiam, o que ocorreu em ocasiões em que os menores estavam na habitação, chegando, por vezes, eles próprios, a abrir porta aos consumidores (cf. o depoimento das testemunhas AG... , AM... ) em articulação com a atitude manifestamente vigilante por si assumida aquando das saídas e entradas de curta duração do menor (cf. RDE de fls. 224/225), a circunstância de, encontrando-se ela em casa, P..., então com cerca de oito anos de idade, ter permanecido, no decurso do período em que o menor E... esteve ausente, na varanda do apartamento «numa posição de clara vigilância e de forma a verificar qualquer movimentação no exterior» (cf. RDE de fls. 224/225); o facto dos menores, em ocasiões em que a recorrente também se encontrava no interior do apartamento, permanecerem na varanda, vigiando as movimentações no exterior (cf. RDE de fls. 224/225), constituem aspetos que, conjugados entre si, apontam de forma insofismável para a correção da decisão.

Com efeito, não pode ser ignorada a influência da prova indireta na reconstrução da verdade processual na medida em que permite – como sucede no caso em apreço - partindo de factos indiciários (diretamente demonstrados), relacionando-os entre si, com recurso às regras da experiência e do senso comum, chegar a uma linha de realidade suficientemente segura e de sentido lógico.

Procedimento, de todo, compatível com as normas dos artigos 126.º e 127.º do CPP enquanto consentem uma leitura de forma a permitir que possam ser provados factos sem que exista uma prova direta deles, satisfazendo-se, outrossim, com a prova indireta, conjugada e interpretada no seu todo, sem que nisso se veja ofensa a quaisquer princípios constitucionais, como o da legalidade, da garantia dos direitos de defesa, da presunção de inocência e do contraditório, com assento no artigo 32.º da CRP, posto que, como sucede no caso, haja uma fundamentação crítica dos diversos meios de prova produzidos e analisados em audiência, sem descurar a efetiva garantia concretizada num grau de recurso em matéria de facto.

E assim respondemos à invocada violação dos artigos 127.º do CPP e 32.º, n.º 1 da CRP, em que o tribunal a quo não incorreu, revelando-se, antes, a interpretação do primeiro normativo em tudo conforme aos supra enunciados princípios constitucionais, designadamente o da presunção de inocência, não se verificando, como tal, a alegada inconstitucionalidade.

No domínio do facto resta ainda a arguida violação do in dubio pro reo, princípio que, relevando na apreciação e valoração da prova, só pode ser afirmado quando seguindo o processo decisório evidenciado na motivação da convicção for de concluir que o tribunal tendo ficado num estado de dúvida, decidiu contra o arguido, «… ou quando a conclusão retirada pelo tribunal em matéria de prova se materialize numa decisão contra o arguido que não seja de forma suficiente quanto ao seu sentido, pela prova em que assenta a convicção … Inexistindo dúvida razoável na formulação do juízo factual fica afastado o princípio do in dubio pro reo, sendo que tal juízo factual não tem por fundamento uma inversão da prova, ou ónus da prova a cargo do arguido, mas resulta do exame e discussão livre das provas produzidas e examinadas em audiência, como impõe o art. 355.º n.º 1 do CPP, subordinadas ao princípio do contraditório, conforme art. 32.º n.º 1 da CRP» - [cf. acórdão do STJ de 14.10.2009, Proc. n.º 101/08.7PAABT.E1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.]

Na situação concreta, seguindo o processo decisório refletido no acórdão não se deteta ter sido o Coletivo assolado pela dúvida no que respeita ao acervo factual tido por provado (mormente quanto à utilização – com o conhecimento de todos - pelos arguidos A... , D... e B... , dos menores na atividade de tráfico que de comum acordo e em conjugação de esforços levaram a efeito), dúvida essa, que este tribunal de recurso, debruçando-se sobre a fundamentação da convicção e não tendo prescindido da audição integral dos registos áudio bem como da análise da prova documental, também não tem, por leve que seja!

Concluindo:

Não resultando demonstrado o erro de julgamento, refletindo a decisão recorrida, devidamente fundamentada e sustentada, a dimensão correta do princípio da livre convicção, procedendo a uma interpretação ajustada das regras da experiência comum, em harmonia, portanto, com o artigo 127.º do CPP, sem que se detete violação em qualquer dimensão, designadamente do in dúbio pro reo, do princípio da presunção de inocência; tão pouco transparecendo vício relativo à confeção técnica da decisão que o impeça é de considerar definitivamente fixado, tal como decorre da decisão em crise, o acervo fatual.

Recursos dos arguidos D... e B...

c. [Da qualificação jurídico-penal]

Não se conformam os arguidos/recorrentes com a subsunção jurídico-penal dos factos ao crime de tráfico agravado, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 21.º, n.º 1 e 24.º, alínea i), do D.L. n.º 15/93, de 22.01, o qual pretendem ver substituído pelo crime privilegiado do artigo 25.º do mesmo diploma.

O dissídio, porém, assenta na preconizada alteração da matéria de facto que não se veio a concretizar.

Não obstante sendo a matéria de indagação e aplicação do direito, nomeadamente a qualificação jurídica, de conhecimento oficioso não deixaremos de a enfrentar no quadro do acervo factual apurado.

Foram os arguidos, ora recorrentes, condenados pela prática, em coautoria, de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto no artigo 21.º, n.º 1 do D.L. 15/93, de 22.01, punido nos termos do artigo 24.º com referência à agravante qualificativa da respetiva alínea i).

A questão do caráter automático, ou não, das circunstâncias agravantes do artigo 24.º, pelo menos no que concerne ao funcionamento da alínea h), tem suscitado posições nem sempre unívocas no seio da jurisprudência: por um lado a corrente que, com recurso a uma «impossibilidade lógica» ou «contradição nos termos» defende, uma vez verificada a agravante, não ser aplicável o tipo privilegiado [cf. v.g. os acórdãos do STJ de 19.02.2004 (proc. n.º 3466/03, 5.ª), 12.05.2004 (proc. n.º 4220/03- 3.ª), 21.04.2005 (proc. n.º 766/05, 5.ª), 12.10.2006 (proc. n.º 2427/06-5.ª)]; por outro lado, uma outra, com apelo à «teleologia da circunstância qualificativa em causa», contrariando o caráter automático do funcionamento da dita agravante, admitindo a aplicação do tráfico de menor gravidade (cf. v.g. os acórdãos do STJ 14.07.2004, (proc. n.º 2147/04-3.ª), 30.03.2005 (proc. n.º 3963/04-3.ª), 29.11.2006 (proc. n.º 2426/06-3.ª)].

É certo que a discussão se tem vindo a colocar a propósito da agravante contemplada na alínea h), circunstância que, a nosso ver, não excluirá, à partida, que possa ser equacionada relativamente a outras.

Seja como for, determinante no caso que nos ocupa é a subsunção dos factos ao n.º 1 do artigo 21.º (tipo matricial), pois que o período de tempo por que perdurou a atividade de tráfico (cerca de um ano); a regularidade com que ocorriam as vendas (existindo consumidores que chegavam a adquirir-lhes cocaína mais do que uma vez por semana); o número considerável de pessoas a quem, ora na sua habitação, ora em locais previamente combinados, lhes adquiriam estupefaciente; a natureza do produto estupefaciente em causa (maioritariamente cocaína, mas também heroína) afastam a considerável diminuição da ilicitude pressuposta no tráfico privilegiado.

Com efeito, contrariamente ao que defendem os recorrentes a atividade, em conjugação de esforços, pelos três desenvolvida – implicando, com alguma frequência, deslocações ao Norte do país com o objetivo  de se abastecerem do estupefaciente que depois vendiam na cidade de Coimbra, não é suscetível de ser confundida com aquela outra do pequeno traficante de rua. E a circunstância das quantidades, de cada vez, vendidas se situarem ao nível dos «dentes» de cocaína, cujo preço por unidade era de € 10,00, tendo presente o período longo de tempo em que atuaram – permitindo assim a sua difusão por um número elevado de consumidores – não contraria semelhante juízo. Acresce que a atividade de tráfico contou com o empenho do núcleo familiar, uns (arguida D...) atuando mais intramuros, outros (os arguidos A... e B... ), não deixando de ocupar, igualmente, esse espaço, agindo mais no exterior, contando todos eles com o apoio dos telemóveis apreendidos para contactarem e serem contactados, com vista à venda/aquisição de estupefaciente, pelos consumidores. Significativo, ainda, o estupefaciente (equivalente a 50 doses, das quais 40 de cocaína; 10 de heroína) e, sobretudo, os artigos que, no decurso das revistas e buscas lhes foram apreendidos (tais como plasmas, LCD(s), Monitores de LCD, um número significativo de telemóveis), não compatíveis com a condição consequente à sua desocupação em termos laborais.

Mostra-se, assim, perfectibilizado o crime de tráfico de estupefacientes, previsto no artigo 21.º do D.L. n.º 15/93, de 22.01.

Agravado pela circunstância da alínea i) do artigo 24.º do citado diploma, qual seja: O agente utilizar a colaboração, por qualquer forma, de menores ou e diminuídos psíquicos?

Como vem referido no acórdão do STJ de 08.10.2008, cujo sumário se mostra disponível em http://www.pglisboa.pt, A agravante qualificativa prevista na alínea i) do dito artigo 24.º - colaboração de menores ou de diminuídos psíquicostem origem na Convenção das Nações Unidas contra o Tráfico Ilícito de Estupefacientes e de Substâncias Psicotrópicas, assinada em 1988 e que Portugal ratificou em 1991; aí se refere que as Partes Contratantes se encontravam profundamente preocupadas com o crescente efeito devastador do tráfico ilícito de estupefacientes (…) e, em particular, com a utilização de crianças em várias regiões do mundo como mercado de consumo e para fins de produção, distribuição e comércio ilícito (…) o que constitui um perigo de gravidade incalculável (…) O exórdio da Convenção permite inferir que que o compromisso de considerar circunstância factual agravativa das infrações a utilização de menores nos atos de produção, distribuição e comércio de estupefacientes resulta da apreensão das Partes Contratantes desse fenómeno, do reconhecimento das consequências sociais que o tráfico de estupefacientes provoca, procurando evitar que a danosidade social tenha consequências nas camadas jovens.

Reportando-se a agravante ao tipo de ilicitude, ao maior desrespeito pelo padrão axiológico vigente na sociedade, não podemos deixar de considerar que a funcionalização pelos arguidos/recorrentes dos menores, especialmente do E... (então com 12/13 anos de idade), na atividade de tráfico de estupefacientes, concretizada, além do mais, nas entregas de produto a consumidores que se deslocavam até junto da residência onde habitavam na companhia dos recorrentes, representa um desvalor da ação que, colocando em crise as preocupações, a propósito, enunciadas na Convenção das Nações Unidas, agrava de forma significativa a ilicitude, não sendo ainda de desprezar a circunstância das crianças, à época, se encontrarem à guarda da arguida D..., sua encarregada de educação!

Não temos, assim, dúvida que a dimensão da ilicitude, moldada nas circunstâncias do caso concreto, revela um quid específico que introduz uma medida especialmente forte do grau de ilicitude que ultrapassa consideravelmente o círculo base das descrições-tipo – [cf. acórdão do STJ de 04.05.2005 (proc. n.º 1263/05-3.ª].

Donde nenhuma censura merece, enquanto condenou os arguidos/recorrentes pelo crime de tráfico agravado, p. e p. pelos artigos 21.º, n.º 1 e 24.º, alínea i), do D.L. n.º 15/93, de 22.01, o acórdão recorrido.

Recurso do arguido B...

d. [Da aplicação do Regime Penal Especial para Jovens]

Não se conforma o recorrente com a decisão na parte em que afastou a aplicação do Regime Penal Especial aplicável aos jovens entre os 16 e os 21 anos.

Consubstanciando o mesmo uma opção de política criminal assente na necessidade de encontrar as respostas que melhor se adequam à prática por jovens adultos de factos considerados pela lei como crime, à qual, como aspeto essencial, subjaz o objetivo de evitar, na medida do possível, a aplicação de penas de prisão [cf. a Proposta de Lei n.º 45/VIII, Diário da Assembleia da República, II série – A, de 21.09.2000, na passagem «comprovada a natureza criminógena da prisão, sabe-se que os seus malefícios se exponenciam nos jovens adultos, já porque se trata de indivíduos particularmente influenciáveis, já porque a pena de prisão, ao retirar o jovem do meio em que é suposto ir inserir-se progressivamente, produz efeitos dessocializantes devastadores»], posição sistematicamente afirmada, quer ao nível da doutrina, quer no domínio da jurisprudência [cf. vg. acórdãos do STJ de 27.10.2004, CJ, STJ, ano XII, T. III, 213; de 18.06.2014 (proc. n.º 578/12.6JABRG.G1); de 31.03.2016 (proc. 499/14.8PWLSB.L1.S1], importa, pois, apurar se, de acordo com um juízo de razoabilidade, ocorrem motivos capazes de levar a concluir no sentido que da aplicação do regime especial ao arguido (recorrente) resultam vantagens para a sua ressocialização. 

Existirão, de facto, razões para crer que assim será?

O Coletivo entendeu que não, discorrendo a propósito:

[…]

Assim, nos termos do artigo 4.º do D.L. n.º 401/82, se “for aplicável pena de prisão, deve o juiz atenuar especialmente a pena (…), quando tiver sérias razões para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social do jovem condenado”

É pois atendendo à finalidade da punição que deve apurar-se se o arguido deve beneficiar da atenuação especial da medida da pena. Mas tal critério não é o único. O artigo 4º impõe, quando for aplicável pena de prisão, a atenuação especial desde que se tenha sérias razões para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social do jovem condenado. Tais sérias razões resultarão da apreciação do juiz face à personalidade e conduta do jovem.

Retornando ao caso concreto, verificamos, desde logo, que o arguido B... , sendo ainda um jovem, atualmente com 20 anos, já sofreu duas condenações criminais, por crimes de furto e de roubo. Praticou os factos em análise em pleno período de suspensão de uma pena de prisão de 16 meses e, nos presentes autos, mesmo depois de detido e de lhe terem sido aplicadas medidas de coação, continuou a atividade delituosa, indiferente a uma eventual revogação da pena de prisão suspensa ou agravamento das medidas de coação. Daqui resulta inequivocamente que o arguido não deverá beneficiar do regime para jovens delinquentes, pois não há razões sérias para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social deste jovem.

Apreciação, esta, que sindicamos na íntegra.

Efetivamente, sendo, no caso, óbvias as exigências de socialização, perante a indiferença do arguido em se deixar motivar pelas penas, circunstância bem patente no facto de ter praticado o crime em apreço nos autos no decurso do período de suspensão da execução de uma pena de 16 meses de prisão, aliado à manifesta persistência na atividade de tráfico, sendo, a este respeito, assaz elucidativos os factos vertidos nos pontos 14. a 36. (factos provados), não se vislumbra, de momento, nenhuma circunstância suscetível de, num exercício responsável e sustentado, abrir uma fresta de esperança quanto a um seu futuro comportamento e, assim, conduzir a um juízo de vantagem decorrente da aplicação do regime em questão na reinserção social do arguido.

É que a consideração dos benefícios que, em abstrato, decorrerão para o agente de um menor período de reclusão não se podem quedar num lugar-comum de boa retórica, antes tem de ser integrada por elementos concretos que (…) permitam concluir que o delinquente, uma vez fora da prisão, se integrará num meio envolvente propício a que se afaste de ambientes, lugares e pessoas que o poderão levar, novamente, para a prática de atos da mesma natureza dos praticados [cf. acórdão do STJ de 31.03.2016], elementos, esses, que não conseguimos detetar.

Não merece, também neste domínio, censura o acórdão recorrido.

Recursos dos arguidos A... , D... e B...

e. [Da medida da pena]

Nenhum dos recorrentes se conforma com a pena aplicada.

Contudo, no exercício tendente à demonstração da sua falta de adequação – naturalmente, por excesso – nem por isso cuidam de invocar factos relevantes, que não tenham sido já considerados no acórdão e que não se mostrem prejudicados pela decisão quanto à qualificação jurídico-penal da conduta, capazes de provocar o efeito pretendido. Na verdade, prendem-se em considerações de ordem geral, trazem à colação a natureza incipiente do tráfico e – comum aos três – a circunstância de ter sido a sua educação num meio pautado pela marginalidade, a baixa escolaridade, e outros fatores de ordem social, que conduziram à delinquência.

É claro que os recorrentes D... e B... também aqui partem do pressuposto de que o crime a imputar deveria ser o de tráfico privilegiado ou, quando muito, o tipo matricial do artigo 21.º, nº 1 do D.L. n.º 15/93, de 22.01, caso em que a moldura penal abstrata correspondente seria outra.

Porém, não foi esse o entendimento do tribunal a quo, como não foi o deste tribunal.

Visando a aplicação das penas a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade, encontrando-se a pena limitada pela culpa e tendo presentes os critérios de determinação da respetiva medida concreta, a qual dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção (artigos 40.º e 71.º do C. Penal), debrucemo-nos sobre a decisão recorrida.

Neste âmbito ficou a constar: No que à prevenção geral diz respeito, note-se que as exigências se afiguram muito elevadas. Com efeito, o crime de tráfico de estupefacientes é muito praticado no nosso país, impondo repor a confiança na norma violada (…).

Em sede de medida concreta da pena, há que ponderar, ainda, o grau de ilicitude do facto, que se reputa de muito elevado. Com efeito, não podemos esquecer que os factos se prolongaram no tempo, durante quase um ano, e o tipo de drogas comercializadas são das mais graves, provocando grande dependência nos consumidores. Embora não se conheça a quantidade de produto vendido, os demais factos indicam-nos que se tratava de tráfico com algum significado (veja-se as vezes que os arguidos iam ao Porto, a quantidade de consumidores que admitiram que compravam aos arguidos, os objetos apreendidos, que provinham desta atividade, e ainda as quantidades de produto estupefaciente que foram apreendidas nos autos).

Também resulta dos factos provados que o arguido “ AA... ” teria o papel mais ativo, era ele que recebia os telefonemas para posterior entrega de produto estupefaciente, se bem que o seu filho entregava frequentemente a droga aos compradores e só mais raramente entregava a arguida D....

Também é importante relembrar que os arguidos, não obstante as detenções e apreensões efetuadas a 11 de fevereiro de 2015, continuaram a dedicar-se ao tráfico de estupefacientes, indiferentes às sanções que previsivelmente lhes iam ser aplicadas.

Temos outrossim, de atender que os arguidos não tinham atividade profissional regular e que seria do tráfico de estupefacientes que obtinham rendimentos para as suas despesas diárias.

Todos os arguidos agiram com dolo direto, na sua modalidade mais intensa.

Quanto à conduta dos agentes anterior e posterior à prática do facto:

O Arguido A... , conhecido por “ AA... ”, embora integrado em termos familiares (…), não tem hábitos de trabalho, dedica-se à venda ambulante, vivendo essencialmente de subsídios sociais. É consumidor de drogas. Já sofreu cinco condenações criminais, de onde destacamos as mais graves: roubos, sequestro e tráfico de estupefacientes. Nenhuma das penas que lhe foram aplicadas serviram de suficiente advertência, tendo praticado os factos em análise, indiferente às possíveis consequências dos seus atos. São, pois, muto elevadas as exigências de prevenção especial em relação a este arguido.

O Arguido B... , também conhecido por “ BB”, encontra-se familiarmente inserido, vivendo inicialmente com os seus progenitores, tendo, posteriormente, constituído a sua própria família, tendo companheira e um filho menor. Durante determinados períodos dedicou-se à venda ambulante. Admite que consumia estupefacientes e que se encontra abstinente. No meio prisional tem revelado um comportamento consentâneo com as regras, encontrando-se a frequentar um curso que lhe dá equivalência ao 9.º ano. No entanto, o arguido, com apenas 20 anos de idade, já sofreu duas condenações criminais, por crimes de furto e roubo. Praticou os factos em pleno período de suspensão de uma pena de prisão. No âmbito destes autos foi detido, foram-lhe aplicadas medidas de coação e, indiferente a tudo, continuou a traficar, o que levou à sua prisão preventiva.

A arguida D..., mulher e mãe dos demais arguidos, não tem outros filhos mas cuida de dois sobrinhos menores (…). É analfabeta, nunca trabalhou e depende do RSI e dos subsídios de parentalidade. Não tem antecedentes criminais.

Ponderadas tais circunstâncias, no seio de uma moldura penal, cujos limite mínimo e máximo se situam, respetivamente, em 5 e 15 anos de prisão, teve o Coletivo por adequado aplicar aos arguidos: A... a pena de 6 anos e 10 meses de prisão; B... a pena de 5 anos e 10 meses de prisão; à arguida D... a pena de 5 anos e 4 meses de prisão, penas, estas, que atendendo à forte necessidade, no domínio da criminalidade em questão, de reafirmação da validade das normas e dos valores que protegem (é muito relevante o sentimento comunitário de afetação de valores), às exigências de prevenção especial de ressocialização, prementes no caso dos arguidos A... e B... , mais atenuadas, em função da ausência de antecedentes criminais – pese embora não lhe ser conhecido o desempenho de qualquer atividade lícita –, quanto à arguida D..., revelam-se as penas concretas encontradas, as quais não extravasam da respetiva culpa, ajustadas.

Recurso dos arguidos A... , B... e D...

f. [Da suspensão da execução da pena de prisão]

Falhando o pressuposto formal da pena de substituição, qual seja a aplicação de pena não superior a cinco anos de prisão (artigo 50.º do C. Penal), falece a pretensão dos recorrentes.

III. Decisão

Termos em que acordam os juízes que compõem este tribunal em julgar improcedentes os recursos interpostos pelos arguidos A... , B... e D....

Fixa-se a taxa de justiça, a cargo de cada um dos recorrentes em 4 (quatro) UCs (artigos 513.º do CPP e 8.º do RCP).

Comunique ao tribunal de 1.ª instância.

Coimbra, 29 de Março de 2017

[Processado e revisto pela relatora]

(Maria José Nogueira - relatora)

(Isabel Valongo - adjunto)