Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
240/09.7TBVIS.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: MOREIRA DO CARMO
Descritores: EXPROPRIAÇÃO
INDEMNIZAÇÃO
SOLO APTO PARA CONSTRUÇÃO
CUSTO DE CONSTRUÇÃO
ÍNDICE DE CONSTRUÇÃO
Data do Acordão: 05/08/2012
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: VISEU 2º J C
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTS.23 E 26 CEXP, DL Nº 329-A/2000 DE 22/12, PORTARIA Nº 1379-A/2004 DE 30/10
Sumário: 1. Para determinação do custo da construção deve atender-se, liminar e preferentemente, ex vi do disposto no art. 26º, nº 5, do CE, aos montantes fixados administrativamente para efeitos de aplicação dos regimes de habitação a custos controlados ou de renda condicionada, apenas podendo tais critérios ser postergados ou mitigados se tal se revelar necessário para a prossecução da justiça do caso concreto, hipótese que imporá convincente justificação.

2. O apelo à Portaria 1379-A/2004, que fixou o preço de habitação por metro quadrado da área útil, para efeitos de cálculo da renda condicionada a que se refere o nº 1 do art. 4º do DL 329-A/2000, de 22.12, é um mero referencial auxiliar para avaliação do carácter especulativo, ou não, do valor do mercado encontrado, valor esse que não deverá ser atendido se, comprovadamente, não corresponder ao custo da construção na zona onde se localiza a parcela.

3. Sendo o custo da construção possível de fixar através do recurso aos valores fixados administrativamente, o importante será que o resultado da avaliação seja o valor real e corrente da parcela expropriada.

4. É correcto e ajustado que o índice de construção bruto ponderado para a parcela expropriada seja o resultante da média aritmética dos definidos no PDM para as duas tipologias de construção possíveis de enquadrar no terreno dessa parcela, por corresponder a um aproveitamento económico normal.

5. O Código das Expropriações determina que o cálculo do valor de um solo apto para construção deve ter por base a sua capacidade “aedificandi” valorizada com base nos custos da construção, não implicando, obrigatoriamente, a necessidade de promoção de um loteamento, pois o que se pretende avaliar é o terreno tal qual se encontrava na altura da declaração de utilidade pública.

6. Ao tomar tal valor como referência deixa, naturalmente, de fora todos os encargos e mais valias que estão associadas ao acto de lotear não devendo, por isso, ser imputados nem encargos nem proveitos inerentes ao acto de promoção imobiliária que pode não ser, e normalmente não é, sequer desenvolvido pelo expropriado.

7. Se o PDM permite a construção de caves, destinadas a estacionamento, abaixo da cota da soleira, o normal é o aproveitamento para garagens/arrumos, devendo tal custo de construção ser considerado para efeito de cálculo do valor do solo da parcela expropriada.

Decisão Texto Integral: I – Relatório

1. Nos presentes autos de expropriação, em que é expropriante EP - Estradas de Portugal, S.A. e expropriados C (…) e mulher M (…), foi por despacho do Secretário de Estado Adjunto das Obras Públicas e das Comunicações, publicado no Diário da República nº 245, II Série, de 23.12.2005, posteriormente rectificado pelo despacho do mesmo Secretário de Estado, publicado no Diário da República nº 100, II Série, de 24.5.2007, foi declarada a utilidade pública, com carácter de urgência, da parcela nº 8 (8.1 e 8.2), com a área de 654 m2, a destacar do prédio rústico, sito no lugar denominado Rechosa, da freguesia de Vila Chã, do Concelho de Viseu, com a área de 16.160 m2, inscrito na matriz predial rústica da dita freguesia sob o artigo 459, e não descrito na Conservatória do Registo Predial de Viseu, tudo para a execução da obra “Alargamento e beneficiação da EN2 entre o cruzamento de Fail (incluindo a ligação ao IP3) e Vila Chã de Sá”.

Em 30.6.2006, foi realizada a vistoria ad perpetuam rei memoriam (fls. 24 e segs.).

Os árbitros, por unanimidade, atribuíram à parcela expropriada o valor de 19.860,67 euros (fls. 41 a 48).

Foi adjudicada à entidade expropriante a propriedade da sobredita parcela.

*

Os expropriados interpuseram recurso da decisão arbitral, alegando, para tanto, que: são donos do referido prédio, tendo sido expropriada a apontada área; não existia, na via confinante, qualquer aqueduto artificial que desaguasse no prédio do expropriado; a expropriante construiu um aqueduto que passou a canalizar as águas pluviais e outras águas residuais para o prédio do expropriante, provocando-lhe elevados danos; a expropriante, através de um seu representante, assumiu proceder às alterações no aqueduto de forma a não lesar o expropriado, não o tendo cumprido; à data da DUP, o prédio confinava com a via pública e tinha dois caminhos de acesso a esta; aqueles acessos estavam situados a Norte e a Sul, um deles provido de portão e o outro aberto, sem qualquer portão ou porta; com as obras de alargamento da via, a expropriante suprimiu os acessos acima referidos; a localização da parcela expropriada era excelente, situando-se nas imediações do centro urbano e junto à principal via de acesso a Coimbra e Lisboa; a parcela situava-se numa zona de construção habitacional dispersa, o que lhe conferia um excelente nível de qualidade ambiental; o alargamento da via veio trazer ao prédio um sensível decréscimo da qualidade ambiental, devido ao aumento da quantidade de tráfego rodoviário; o prédio era servido por adequadas e suficientes redes de abastecimento de água, de energia eléctrica, de telefone fixo e de saneamento; parte do prédio encontrava-se ocupada com culturas de vegetais destinados ao consumo doméstico e não com culturas de regadio; o prédio não estava, nem era previsível que estivesse, onerado com cedências de área para incluir no domínio público; as construções existentes no prédio sujeito à expropriação, respeitaram todas as exigências administrativo-legais; o prédio deve ser qualificado com “solo apto para construção” para todos os efeitos, designadamente para cálculo do seu valor económico; a máxima área da parcela potencialmente utilizável para construção de habitação era de 291,85 m2; a máxima área da parcela potencialmente utilizável para construção de garagens era de 72,96 m2; o valor de cada metro quadrado de área de construção de habitação era de 668,49 €/m2; o valor de cada metro quadrado de área de construção de garagens era de 334 €/m2; o valor global da parcela expropriada, adicionada de 22% de factores de valorização e deduzida dos encargos de ligações às redes e da percentagem de ausência de risco e de esforço construtivo, é de 40.827,18 €; a indemnização pela expropriação deve compreender uma compensação monetária no valor de 40.827,18 €; a indemnização deve igualmente compreender a condenação da expropriante na execução das obras de supressão/redireccionamento do aqueduto construído e, bem assim, o restabelecimento dos acessos que foram suprimidos com as obras.

Concluíram pedindo que o recurso seja julgado procedente e, em consequência, seja a expropriante condenada:

a) No pagamento ao expropriado da indemnização em dinheiro no valor de 40.827,18 €;

b) Na execução das obras de supressão/redireccionamento do aqueduto construído e, consequentemente, das respectivas águas afluentes;

c) Na execução das obras necessárias ao restabelecimento dos acessos do prédio à via pública, recolocando-os nas mesmas e precisas condições em que se encontravam à data da DUP.

*

A entidade expropriante interpôs também recurso da decisão arbitral, alegando, para tanto, que: a parcela expropriada em termos de Plano Director Municipal encontra-se enquadrada numa área de expansão habitacional, pelo que terá de ser avaliada segundo ás regras contidas no Código de Expropriações, como solo apto para construção; pese embora os perito tenham acolhido este raciocínio, erraram na aplicação dos diversos valores que levam ao computo da justa indemnização, desde logo ao considerem uma Portaria que no corpo do seu texto refere “preços de habitação por metro quadrado de área útil”; o nº 5, do art. 26º, do CE refere-se a custo de construção, pelo se verifica que a portaria utilizada pelos peritos não se aplica à avaliação dos solos expropriados, muito menos a solos que não tenham qualquer construção; o custo de construção é de 492 €/m2, devendo pois ser esse o valor a aplicar; verifica-se igualmente que as construções existentes no local onde se insere a parcela expropriada, são habitações isoladas, pelo que, tendo em conta a integração urbanística e não existindo na envolvente qualquer construção em banda, não se encontra justificação para a aplicação de índices de construção superiores a 0,45, incluindo os anexos, como aliás decorre da alínea b2) do art. 28º, por remissão da alínea b) do nº 2 do art. 30º, ambos do Regulamento do Plano Director Municipal; uma vez que a parcela ora expropriada se localiza junto de uma das estradas mais movimentadas de Viseu, a qualidade ambiental é gravemente afectada pelo que nunca se poderá aceitar a atribuição de um índice de 11%, como o que foi aplicado pelos peritos; pelo que tendo em conta a sua localização, envolvência e a qualidade ambiental que serve o local das parcelas, o índice não poderá ser superior a 7%; as infra-estruturas existentes, somam um índice de 6% uma vez que as parcelas eram servidas de arruamento pavimentado, rede de água, de saneamento, eléctrica e telefónica; no que se refere ao valor a aplicar nos termos do disposto no nº 9, do art. 26º, do CE, concorda com o valor apontado pelos peritos no montante de 15 €/m2; no que se refere a aplicação do disposto no nº 10, do art. 26º, entende que se deve deduzir a percentagem de 15%.

Concluiu requerendo que o recurso seja julgado procedente e, em consequência, seja atribuído a título de justa indemnização a quantia de 10.904,51 €.

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Os expropriados responderam ao recurso interposto pela entidade expropriante nos termos e pelos fundamentos constantes a fls. 107 e segs., onde pugnam pela improcedência do mesmo.

A entidade expropriante também respondeu ao recurso interposto pelos expropriados nos termos e pelos fundamentos constantes a fls. 121 e segs., pugnando, igualmente, pela improcedência do mesmo.

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Foi efectuada a avaliação prevista nos arts. 61º e 62º do CE, na sequência da qual os peritos nomeados pelo Tribunal e o indicado pelos expropriados fixaram a quantia que reputam como a justa indemnização a atribuir aos expropriados em 36.728.64 €, e, por sua vez, o perito indicado pela entidade expropriante fixou como justa a indemnização de 28.167,97 euros (fls. 162 a 175).

Os peritos prestaram esclarecimentos (fls. 209 a 218, 227 a 234 e 256 a 258).

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As partes alegaram, nos termos do disposto no art. 64º do CE (fls. 264 a 277).

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Foi depois proferida sentença que julgou, parcialmente, procedente o recurso interposto pelos expropriados e totalmente improcedente o recurso interposto pela entidade expropriante, e que fixou em 32.647,68 € o montante da indemnização a pagar pela entidade expropriante aos expropriados pela parcela, objecto da presente expropriação, acrescida do valor da respectiva actualização nos termos indicados.

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2. A expropriante interpôs recurso, tendo formulado as seguintes conclusões:

1.O presente recurso vem interposto da sentença proferida pelo Tribunal a quo, que condenou a expropriante no pagamento de uma indemnização no montante de €. 32.647,68
2.A expropriante não se conforma com a presente decisão, que partilhou na íntegra o relatório pericial maioritário, ignorando contudo as provas vertidas no presente processo, bem como a correcta aplicação da lei. 

3.Os peritos aplicaram a Portaria incorreta para apurar o valor do solo, violando assim o estipulado no Código de expropriações.

4.Ainda acrescentaram a este valor as percentagens determinadas no n.º 6 e 7 do artigo 26.º, duplicando assim o valor do solo.

5.Relativamente aos índices urbanísticos aplicados na peritagem, fica demonstrado que violaram o disposto no regulamento do Plano Diretor Municipal de Viseu.

6.O mesmo acontecendo com a consideração da área destinada a Garagens e arrumos.

7.Assim como se demonstrou o Tribunal a quo colocou em causa os Princípios constitucionais da justa indemnização e da proporcionalidade, quando aderiu aos critérios defendidos no relatório dos peritos.

8.Pois mesmo atendendo que a determinação do valor do bem expropriado é uma questão essencialmente técnico-construtiva, e sendo verdade que deve o juiz dar a sua concordância ao parecer unânime dos peritos, não poderemos ignorar que esta não pode ser aplicada quando se suscitem questões de direito com relevância para o cálculo do valor do bem expropriado ou que existam elementos de prova suficientemente sólidos que habilitem o Tribunal a divergir dos peritos, o que é o caso.

9.Com tal decisão o Tribunal o quo violou os princípios constitucionais da proporcionalidade, dado que atribui uma indemnização superior ao valor das parcelas; da igualdade pois beneficiou os expropriados relativamente aos seus vizinhos e da justa indemnização, dado que tão injusta é a indemnização que peca por defeito, como a que peca por excesso.       
Assim e na posse de todos os elementos que agora se alegaram e de outros que fazem parte dos presentes autos, deve o recurso da expropriante ser julgado procedente por provado e em consequência ser revogada a sentença recorrida.
Desta forma fazendo a esperada JUSTIÇA.

3. Não houve contra-alegações.

II - Factos Provados

1. Por despacho nº 26641-B/2005 de 30 de Novembro do Sr. Secretário de Estado Adjunto das Obras Públicas e das Comunicações, publicado no Diário da República nº 245, II Série, de 23/12/2005, posteriormente rectificado pelo Despacho nº 9417/2007, de 24 de Maio, do mesmo Sr. Secretário de Estado, publicado no Diário da República nº 100, II Série, de 24/05/2007, foi declarada a utilidade pública, com carácter de urgência, da parcela nº 8 (8.1 e 8.2), com a área de 654 m2, a destacar do prédio rústico, situado no lugar denominado Rechosa, da freguesia de Vila Chã, do Concelho de Viseu, com a área de 16.160 m2, inscrito na matriz predial rústica da dita freguesia sob o artigo 459, e não descrito na Conservatória do Registo Predial de Viseu, tudo para a execução da obra “Alargamento e beneficiação da EN2 entre o cruzamento de Fail (incluindo a ligação ao IP3) e Vila Chã de Sá”.

2. Em 30.05.2006, foi realizada a vistoria ad perpetuam rei memoriam, da parcela em causa.

3. Em 14.07.2006 a entidade expropriante tomou posse administrativa da parcela expropriada.

4. Procedeu-se à arbitragem perante a entidade expropriante, tendo os árbitros, por unanimidade, atribuído à parcela expropriada o valor de 19.860,67 euros.

5. A entidade expropriante efectuou o depósito da quantia indicada.

6. Por despacho proferido em 23/01/2009 foi adjudicada a parcela de terreno em causa à entidade expropriante.

7. A parcela, na da data da vistoria, apresentava-se plana, com boa exposição, e o solo, de boa profundidade, encontrava-se ocupado com culturas de regadio.

8. A parcela era servida pelas seguintes infra-estruturas urbanísticas: acesso rodoviário com pavimentação em betuminoso, rede de abastecimento domiciliário de água, rede de distribuição de energia eléctrica em baixa tensão e rede telefónica.

9. O Plano Director Municipal de Viseu, em vigor à data da DUP, classifica a área onde se situa a parcela como “Área de expansão Urbana”.

III - Do Direito

1. Uma vez que o âmbito objectivo dos recursos é balizado pelas conclusões apresentadas pelos recorrentes, apreciaremos, apenas, as questões que ali foram enunciadas (arts. 685º-A, e 684º, nº 3, do CPC).

Nesta conformidade, a única questão a resolver é a seguinte.

- Cálculo do montante da indemnização a atribuir (que se desdobra em 3 pontos, constantes das conclusões de recurso 3ª a 6ª).

2. Na sentença recorrida escreveu-se que:

“(…)

Ao expropriado deve ser atribuída uma indemnização que lhe garanta uma compensação plena da perda patrimonial, por si sofrida, de forma a colocá-lo na posição de poder adquirir outro bem de igual natureza e valor.

Ora, o pagamento da justa indemnização, para além de ser uma exigência constitucional da expropriação, em conformidade com o plasmado no artigo 62.º, nº 2, da Constituição da República Portuguesa, é também a concretização do princípio do Estado de Direito Democrático, nos termos do qual se torna obrigatório indemnizar os actos lesivos de direitos ou causadores de danos.

No artigo 23.º do Código das Expropriações, repete-se aquele comando constitucional, estabelecendo-se um critério geral para a determinação da justa indemnização garantida nos casos de expropriação por utilidade pública.

De acordo com aquele normativo, a indemnização será fixada com base no valor dos bens expropriados, visando-se assim compensar não o benefício alcançado pelo expropriante, mas ressarcir o prejuízo do expropriado.

E o prejuízo deste mede-se referindo-se apenas ao valor do bem expropriado - pelo valor real e corrente dos bens expropriados, isto é, pelo seu valor de mercado e não pelas despesas que se hajam de suportar para obter a substituição da coisa expropriada por outra equivalente (cfr. designadamente, Fernando Alves Correia, in Garantias do Particular na Expropriação por Utilidade Pública, pág. 129; José Osvaldo Gomes, in Expropriações por Utilidade Pública, pág. 154 e Acórdão da Relação de Évora, de 12/05/94, in Colectânea de Jurisprudência, tomo III, pág. 269).

Ao arbitrar a indemnização cumpre o Tribunal o principio da igualdade, já que o expropriado, que havia ficado numa situação de desigualdade perante os restantes concidadãos ao ser desapossado do seu bem, recupera, através da indemnização pecuniária, a paridade que lhe havia sido retirada com a expropriação (cfr. Acórdão da Relação de Coimbra, de 15.02.2005, CJ, tomo I, pág. 21).

A justa indemnização depende do seu valor traduzir a adequada restauração da lesão patrimonial o que implica um mínimo de correspondência a referenciais de mercado, correspondendo ao valor da transacção do bem expropriado nesse mercado.

Contudo, esse mínimo de correspondência a referenciais de mercado corresponde ao valor de mercado normal ou habitual em que não entram factores especulativos ou anómalos (cfr. Acórdão da Relação do Porto, 13.01.2005, CJ, tomo I, pág. 171, e o aí citado Acórdão do Tribunal Constitucional nº 422/2004, Processo n.º 462/2003, DR II série, de 4.11.2004).

Considerando tudo o que se expôs quanto à justa indemnização, e no sentido de concretizar os apontados princípios fundamentais - da legalidade, da utilidade pública ou da necessidade, da proporcionalidade e da igualdade -, é o próprio Código das Expropriações, que dá os critérios a seguir na fixação da indemnização.

(…)

Com efeito, dispõe o citado artigo 26.º, n.º 1, do Código das Expropriações que: “O valor do solo apto para a construção calcula-se por referência à construção que nele seria possível efectuar se não tivesse sido sujeito a expropriação, num aproveitamento económico normal, de acordo com as leis e os regulamentos em vigor, nos termos dos números seguintes e sem prejuízo do disposto no n.º 5 do artigo 23.º”.

E logo o mesmo artigo 26º adopta dois critérios de cálculo daquele valor:

- o primeiro - critério principal - regulado nos nºs 2 e 3; e

- o segundo - critério subsidiário - aplicável no caso de se não revelar possível a aplicação do primeiro, com a disciplina prevista nos n.ºs 4 e seguintes.

Isto sempre sem prejuízo do disposto no nº 5 do artigo 23.º do mesmo Código, que, na procura do valor dos bens expropriados (“valor real e corrente dos bens numa situação normal de mercado”), prevê a possibilidade do expropriante e expropriado requererem, ou o tribunal decidir oficiosamente, que a avaliação se faça de acordo com outros critérios, quando, no caso, a que viesse a ser feita em conformidade com os critérios enunciados nos artigos 26.º e seguintes não permitisse a referida correspondência.

No caso vertente, não é possível aplicar o critério estabelecido no nº 2 e 3 do citado artigo 26º, pelo que o critério a adoptar para calcular o valor do solo, qualificado como apto para a construção, é o critério subsidiário previsto no artigo 26º, nº 4 e ss, segundo o qual aquele (valor do solo) se calcula em função do custo da construção em condições normais de mercado.

Este custo é determinado tendo em conta, como referencial, os montantes fixados administrativamente para efeitos de aplicação dos regimes de habitação a custos controlados ou de renda condicionada.

O valor do solo varia até 15 % do custo de construção, atendendo-se nesta variação a vários factores, nomeadamente localização e qualidade ambiental e dos equipamentos existentes na zona.

A percentagem fixada (até 15 % do custo de construção) pode, ainda, ser acrescida até ao limite de percentagens legalmente estabelecidas para diversos factores, que aumentam o valor do solo, referidos nas alíneas a) a i) do n.º 7 do artigo 26º.

O custo de construção pode ainda ser acrescido ou diminuído se, pelas especiais condições do local, ele for substancialmente reduzido ou agravado.

Quando o aproveitamento urbanístico que serviu de base à avaliação implicar uma sobrecarga incomportável para as infra-estruturas existentes, deverão descontar-se no cálculo do montante indemnizatório as despesas necessárias ao reforço dessas infra-estruturas.

O valor determinado pelas regras enunciadas será corrigido (diminuído) com a aplicação de uma percentagem máxima de 15 % daquele valor, “pela inexistência de risco e do esforço inerente à actividade construtiva”.

No caso vertente os peritos não apresentaram relatório unânime.

A avaliação de terrenos traduz-se numa questão predominantemente técnico-construtiva, para cuja apreciação cognitiva e crítica se exigem conhecimentos especializados que o juiz, em regra, não possui.

Não obstante o tribunal apreciar livremente as conclusões da prova pericial (artigo 389º, do Código Civil), em princípio, só deverá afastar-se do resultado a que chegaram os peritos quando houver contradição entre as premissas de que partiram e as conclusões a que chegaram.

Assim, por via de regra, é de seguir a orientação defendida maioritariamente pelos peritos (cfr. Acórdãos da Relação do Porto, CJ, 1997, Tomo I, p. 223; Tomo II, p. 212; Tomo V, p. 199).

Ora, conforme acima fizemos alusão o custo de construção poderá ser obtido a partir quer do referencial resultante do preço da construção fixado para efeitos do regime de habitação a custos controlados ou de renda condicionada. Tal depende daquele que mais se aproximar do custo de construção em condições normais de mercado. No caso os Srs. Peritos avaliadores que subscreveram o laudo maioritário entenderam que o preço estabelecido no âmbito do regime de renda condicionada servia melhor tal propósito, pelo que acompanhamos tal entendimento.

Assim, atendendo-se à sua capacidade de edificação e tipologia possível, consideramos, conforme o defendido no respectivo laudo maioritário, que o índice de construção bruto médio para a parcela expropriada corresponde a 0,525 m2 para habitação e de 0,25 m2 para garagens/arrumos.

Tomando como referência o valor arbitrado na Portaria nº 1379-A/2004 de 30 de Outubro - 668,49 €/m2 -, e sabendo que o valor de construção do m2 por área útil é de 85%, factor de correcção a introduzir na determinação do valor unitário de construção, então o valor de construção por área útil corresponde: 668,49 €/m2 x 0,85 = 568,22€/m2.

Tendo em conta o referido índice de construção, o valor total de construção por m2 de terreno corresponde a:

0,525 m2 x 568,22€/m2 = 298,32€/m2 de terreno (para habitação);

0,25 m2 x 275€/m2 = 68,75€/m2 de terreno (para garagem/arrumos);

totalizando 367,07€/m2 o valor da construção por m2 de terreno.

Quanto aos critérios previstos nos nº 6 e 7 do art. 26º.

A entidade expropriante entende que a percentagem prevista no n.º 6 do art. 26, do CE não deve ser superior a 7%.

A expropriada defende, por sua vez, que a percentagem prevista no n.º 6 do art. 26, do CE deve ser fixada em 14%.

No que diz respeito a esta percentagem, entenderam os Srs. árbitros fixar tal percentagem 11%; os Srs. Peritos em 10%.

Em nosso entender a percentagem fixada pelos Srs. peritos está devidamente justificada e pondera equilibradamente a localização da parcela, qualidade ambiental e os equipamentos existentes na zona.

Assim, entendemos que o índice de localização, qualidade ambiental e dos equipamentos que servem a parcela expropriada é de 10%, conforme o defendido pelos cinco Peritos.

Assim, entendemos que o índice de localização, qualidade ambiental e dos equipamentos que servem a parcela expropriada é de 10%, a que acresce 1,5% referente ao acesso rodoviário com pavimentação em betuminoso, 1% relativo à rede de abastecimento de água, 1,5% referente à rede de abastecimento de saneamento, 1% referente a rede de distribuição de energia eléctrica, e 1% correspondente à rede telefónica - nº 6 e 7, do art.26º do C.E.

Os Srs. peritos avaliadores do laudo maioritário consideram, ainda, que a parcela era servida de estação depuradora em ligação à rede (art. 26º, nº 7, al. g). Ora, a existência da estação depuradora não resulta do auto de vistoria ad perpetuam rei memoriam.

Não resultando demonstrada a existência de estação depuradora em ligação à rede à data da DUP, necessário se torna retirar esta percentagem dos cálculos efectuados.

Assim, é de 6 % o índice das infra-estruturas previstas no nº7, do art.26º que acresce aos comprovados 10% correspondentes, nos termos do art.26º, nº 6, ao índice de localização, qualidade ambiental e equipamentos que servem a parcela expropriada, o que totaliza 16 %.

Importa ainda referir que o aproveitamento urbanístico da parcela expropriada não implica qualquer sobrecarga, comprovada, para as infra-estruturas existentes. (nº9, do art.26º).

Atentas as razões invocadas por todos os peritos, teremos ainda que aplicar a percentagem de 15% como factor correctivo pela inexistência risco e esforço inerente à actividade construtiva (nº10, do art.26º).

Face ao exposto, resulta que o valor do m2 do terreno é de:

49,92€/m2 (367,07€/m2 x 0,16 = 58,73€/m2 x 0,85).

Assim, o valor da parcela é de €32.647,68 (654 m2 x 49,92€/m2).” – fim de transcrição.

Considerando o discurso argumentativo da sentença recorrida e as objecções que a recorrente coloca, vejamo-las ponto por ponto.

2.1. Diz a recorrente que os peritos aplicaram a Portaria incorrecta para apurar o valor do solo apto para construção, tendo ainda acrescentado a este valor as percentagens determinadas no nº 6 e 7, do art. 26º, duplicando assim o valor do solo (conclusões 3ª e 4ª).

Dispõe o nº 5, do art. 26º, do CE, que:

«Na determinação do custo da construção atende-se, como referencial, aos montantes fixados administrativamente para efeitos de aplicação dos regimes de habitação a custos controlados ou de renda condicionada.».

Tal critério não é fixado de modo impositivo, para ser aplicado inelutavelmente, mas antes tem de ser, por princípio ou via de regra, perspectivado a título meramente referencial, como factor indiciário (vide J. P. Melo Ferreira, CE Anotado, 3ª ed. pág.140).

Mas poderá não o ser se existirem elementos no processo que o possam afastar ou postergar. O que só poderá verificar-se se, perante tais elementos, se concluir que ele efectivaria uma indemnização injusta e iníqua, ou seja, porque o valor atingido pela sua aplicação não corresponderia ao valor real e corrente dos bens, numa situação normal de mercado (art. 23º, nº 5, do CE).

Podendo, então, para obviar a tal, ser tal critério referencial postergado ou corrigido pela consideração e aplicação de outros elementos ou critérios (vide Ac. Rel. Coimbra, de 30.11.2010, Proc.3029/08.7TBVIS, em www.dgsi.pt).

Existe, assim, neste particular, alguma margem de prudente discricionaridade de todos os intervenientes processuais, desde os peritos ao julgador, para melhor se poder atingir a justiça do caso concreto.

Aliás, apesar de estarem mencionados em alternativa, não há razões que impeçam a aplicação conjunta dos valores fixados administrativamente. Inclusive a determinação do custo de construção possível através dos referidos valores tem sido alvo de várias críticas considerando que o valor alcançado fica aquém do valor real e corrente de mercado. Assim, importante será que o resultado da avaliação seja o valor real e corrente da parcela expropriada (vide P. Elias da Costa, Guia das Expropriações, 2ª Ed., pág. 299/300).

Os 4 peritos do laudo maioritário consideraram o valor de 668,49 €/m2, correspondente à Zona I, de Viseu, nos termos da Portaria 1379-A/2004, de 30.10, que fixa os montantes do preço da habitação para efeitos de cálculo da renda condicionada a que se refere o nº 1 do art. 4º do DL 329-A/2000, de 22.12, para vigorar em 2005. Por seu turno o perito da expropriante considerou o valor de 521,30 €/m2, correspondente à zona de Viseu, nos termos da Portaria 233/2005, de 25.2, que fixa o montante do preço da habitação por m2, para efeitos de valor actualizado do fogo para alienação dos fogos de habitação social propriedade do Estado, previsto no DL 141/88, de 22.4.

Os 4 peritos maioritários expenderam, como justificação, que o valor por si levado em conta “se consideram ajustados à realidade dos custos de construção praticados na região, tendo em atenção a qualidade média das construções que estão disponíveis no mercado” e ainda que “tendo em atenção as características e tipologia das construções idênticas”, pois “a utilização de qualquer outro não conduziria portanto à obtenção da justa indemnização” – vide fls. 5 do relatório de peritagem, a fls. 166 dos autos, e fls. 8 dos esclarecimentos prestados, a fls. 216 dos autos.

A recorrente defendeu inicialmente que o valor a considerar era o de 492 €/m2, embora não justificasse onde ia buscar tal valor. Agora no presente recurso já aceita o valor e fundamento apontados pelo perito que indicou, com o argumento de que a portaria da renda condicionada se reporta a um valor que já inclui as construções erigidas no solo e já valoriza os factores ambientais e infra-estruturais previstos no nº 6 e 7 do art. 26º do CE, pelo que aquele valor não dever abranger os «terrenos limpos» sob pena de tal duplicar a valorização do solo.

Cremos, todavia, que não lhe assiste razão.

Em primeiro lugar porque a letra da lei – art. 26º, nº 5, do CE – não permite acolher tal argumento. Havendo, pois, que chamar à colação o disposto no art. 9º nº 2, do CC.

Em segundo lugar porque o acolhimento de tal entendimento importaria o reconhecimento de um valor, propugnado pela recorrente, que não se mostraria o mais adequado para a prossecução da justiça do caso concreto.

É que, como se viu, são os peritos maioritários que referem serem os valores da Portaria 1379-A/2004 os mais ajustados à realidade dos valores de construção praticados na região. Ora esta posição não se vislumbra censurável, já que é de presumir terem os peritos conhecimento da realidade e do custo e valor da construção na zona da parcela. E inexistindo nos autos elementos que a infirmem ou contrariem.

Valendo, pois, aqui o expendido na sentença recorrida que se transcreveu, sobre o valor, credibilidade e reconhecimento da peritagem maioritária.

Ou seja, o apelo à referida Portaria 1379-A/2004, de 30.10, que fixou o preço de habitação por metro quadrado da área útil, para efeitos de cálculo da renda condicionada a que se refere o nº 1 do art. 4º do DL 329-A/2000, de 22.12, é um mero referencial auxiliar para avaliação do carácter especulativo, ou não, do valor do mercado encontrado. Contudo, os valores referenciados nessa portaria não deverão ser atendidos se, comprovadamente, não corresponderem ao custo da construção na zona onde se localiza a parcela, o que na circunstancialmente não é o caso (Ac. Rel. Lisboa, de 12.5.2011. Proc.4860/06.3TMSNT, no mesmo sítio).

Improcede este ponto das conclusões de recurso.

2.2. Diz, também, a recorrente que relativamente aos índices urbanísticos aplicados na peritagem a mesma violou o disposto no regulamento do PDM de Viseu (conclusão 5ª).

Assim, rebate a recorrente, tratando-se de uma propriedade não urbanizada o índice de construção a aplicar é o de 0,45 m2/m2 e não outro, pois que o índice de 0,6 m2/m2 é utilizado para construção em banda contínua.

O índice de construção bruto utilizado pelos peritos, agora unanimemente, foi de 0,525 m2/m2 de terreno, como explicaram no relatório (vide fls. 4 do relatório de peritagem, e fls. 165 e 175 dos autos) pois “a tipologia adaptável à parcela e coerente quer com as definições do PDM quer com as características urbanas da zona envolvente corresponde à habitação unifamiliar definida em moradias isoladas ou em banda com dois pisos acima do solo destinados a habitação (R/c e andar). Na secção III, artigo 30º, nº 2, alíneas a) e b), do PDM de Viseu encontram-se definidos os parâmetros urbanísticos correspondente às tipologias referidas tendo-se para o caso concreto optado pelo valor médio”, ou seja um icb= (0,6 m2/m2, para as moradias em banda contínua, + 0,45 m2/m2, para as moradias isoladas) /2=0,525 m2/m2 de terreno.

Posteriormente a pedido de esclarecimento da recorrente, responderam que (vide fls.210/213), “…quando se pretende determinar o valor de um terreno é apenas e só esta capacidade que está em causa, independentemente da forma e tipologia. (…) à data da DUP o expropriado poderia licenciar no seu terreno dois tipos de construção a saber:

-a) Moradias unifamiliares em banda contínua

-b) Moradias familiares isoladas.

Qualquer uma destas soluções era possível e enquadrável nas normas regulamentadoras que o PDM institui para a parcela expropriada. A opção por uma ou por outra seria sempre da exclusiva responsabilidade do expropriado, sendo certo que se optasse pela construção de moradias em banda contínua o índice de construção bruto máximo seria de 0,6 enquanto que se optasse pela construção de moradias isoladas o índice de construção bruta máximo seria de 0,45. (…) Assim, as boas regras do planeamento urbano não só aconselham e promovem que estas duas tipologias de construção partilhem os mesmos espaços territoriais. Conscientes desta realidade, os peritos entenderam, e continuam a entender, correcto e ajustado que o índice de construção bruto ponderado para a parcela seja o resultante da média aritmética dos propostos para as duas tipologias possíveis de enquadrar no terreno da parcela”. Também o perito da expropriante, no esclarecimento que prestou (vide fls. 228) manteve a posição que, neste particular, por todos foi tomada. Igualmente P. Elias da Costa (ob. cit., pág. 297/298) propugna que o índice de ocupação do solo deve ser efectuado casuisticamente, devendo ser adoptado um índice de ocupação do solo que corresponda a um aproveitamento económico normal, tendo em conta, nomeadamente as disposições do PDM, que no caso de preverem um índice de ocupação do solo, tem este de ser conjugado com a análise, por exemplo, das construções existentes na área envolvente.

E mais adiante, a propósito de uma objecção da ora apelante, acerca da necessidade de promoção prévia de lotes para construções de moradias em banda e consideração dos implícitos encargos com a execução do loteamento, explicitaram os peritos que “os peritos não concordam com o pressuposto de que a implantação da capacidade construtiva considerada implicasse, obrigatoriamente, a necessidade de promoção de um loteamento, sendo certo que, ainda assim, tal facto não condiciona em nada a avaliação feita. Efectivamente lembra-se que com a peritagem o que se pretende avaliar é o terreno tal qual se encontrava na altura da declaração de utilidade pública. Não podem nem devem, por isso, ser-lhe imputados nem encargos nem proveitos inerentes ao acto de promoção imobiliária que pode não ser, e normalmente não é, sequer desenvolvido pelo expropriado. De qualquer forma é claro que, uma vez realizados esses encargos, e em sua consequência, resulta sempre, para o terreno, uma mais valia que se reflecte no valor do seu metro quadrado. Se pretendêssemos retirar ao valor do terreno, antes de loteado, os encargos com o loteamento, teríamos de concluir que um terreno, depois de loteado, vale menos do que antes de o ser, o que transformaria os investidores imobiliários em beneméritos ou potencialmente falidos. (…) Ora o Código das Expropriações determina, e bem, que o cálculo do valor de um solo apto para construção deve ter por base a sua capacidade “aedificandi” valorizada com base nos custos da construção. Ao tomar este valor como referência deixa, naturalmente, de fora todos os encargos e mais valias que estão associadas ao acto de lotear e que, por isso, se reflectem não no custo da construção mas no valor de alienação final que é, como se sabe, muito superior. De outra forma, no entendimento dos peritos, não ficaria garantido o conceito de justa indemnização na medida em que não se pode retirar ao custo de construção encargos que ele não comporta e que estão antes incluídos no valor de venda da construção, que como se constata, não foram utilizados”. Neste aspecto, igualmente, o perito da expropriante, no esclarecimento que prestou (fls. 229) revelou a mesma posição de concordância, esclarecendo que “O valor da comercialização de uma construção é o somatório do valor do solo, do valor da construção, do valor dos encargos (taxas, licenças, projectos, etc.) e do valor do lucro. Considerando para o cálculo do valor do solo apenas o valor da construção, não se percebe porque motivo se deve deduzir os encargos referidos”.  

Do exposto, a opção dos 5 Peritos, note-se que todos eles são engenheiros, encontra-se totalmente justificada, sendo perfeitamente compreensível e atendível, certo, ainda, que foi tomada por unanimidade, o que é de relevar dada a sua especial aptidão e conhecimentos técnicos. Diga-se, aliás, como elemento reforçador, que esta já tinha sido a opção dos árbitros, lavrado por outros 3 engenheiros (vide fls. 43/44).

Não vemos, por isso, motivo para dar razão à recorrente.

2.3. Diz, ainda, a recorrente que a consideração pela peritagem da área destinada a garagens/anexos/arrumos, viola também o disposto no regulamento do PDM de Viseu (conclusão 6ª).

Concretizando, rebate a apelante que foi adicionado, erradamente, mais um índice de construção de 0,25 m2/m2 para garagens e arrumos, que não existe no PDM, sendo que os índices que existem são para toda a construção acima do solo, como é o caso também das garagens e arrumos, pelo que tem de se incluir no índice referido de 0,45 m2/m2, previsto para o local. 

Cita em seu abono o Ac. da Relação do Porto de 13.7.2006, Proc.0632987, em www.dgsi.pt, assim sumariado “Embora como regra apenas deva ser considerada, na avaliação de um solo, apenas a construção implantável acima do solo, pode haver lugar à consideração da construção possível abaixo do solo no caso de se pretender edificar fazer cave total ou parcialmente desafogada e integrada numa habitação, ou numa loja”, decisão esta que menciona uma outra semelhante, de 9.1.2003, da mesma Relação, no indicado sítio, que apenas reconhece para avaliação de um solo a construção possível de implantar acima do mesmo, e uma em sentido contrário, da mesma Relação, de 2.3.99, Proc.9920160, assim sumariada no mesmo sitio “Sendo uma cave importante quer para parqueamento automóvel, para arrumos, para sala de jogos ou de festas de miúdos, no cálculo da indemnização deve entrar a área de construção, ao nível do subsolo, de uma cave adequada ao volume da construção acima do solo”.

Tal índice de 0,25 m2 foi explicado pelos peritos no aludido relatório (vide fls. 4 do mesmo, e fls. 165 e 175 dos autos), pois “tiveram em atenção, na determinação da capacidade de construção do terreno, que o índice de construção bruto se refere apenas à construção implantada acima do solo, que consideram destinada a habitação, tendo ainda acrescido a essa capacidade áreas destinadas a garagens e arrumos, em construção separada, ou em cave e/ou aproveitamento de sótão, cuja existência, para além de comum, resulta de imposição legal” e que “para a construção das garagens e arrumos foi considerado um valor unitário ajustado às características desses espaços e correspondente a cerca de metade do valor unitário determinado para habitação”.

Posteriormente, a pedido da expropriante esclareceram que (vide fls. 214/215) a “obrigatoriedade de previsão de garagens para estacionamentos resulta do Decreto-Lei nº 555/99 de 16 de Dezembro na redacção que lhe foi conferida pela Lei nº 60/2007, de 4 de Setembro e da Portaria nº 216-B/2008 de 3 de Março. Por definição o índice de construção bruto refere-se apenas à área bruta de construção destinada a habitação excluindo as áreas relativas a caves e sótãos quando destinados a garagens e arrumos. (…) Quer isso dizer que a capacidade construtiva limitada no PDM se reporta à construção para a habitação acima do solo excluindo as garagens e arrumos em cave. Ora, referindo-se a tipologia a moradias (isoladas ou em banda), a solução normal e existente no local corresponde à prevista de:

-rés-do-chão e andar para habitação

-cave para garagens e arrumos

Tendo os peritos, pelas razões já citadas, considerado um índice de construção médio bruto de 0,525, resulta óbvio que a cave e/e ou o sótão correspondam a 0,25 de construção que acresce ao índice previsto para os pisos de habitação acima do solo. Os encargos associados à construção das caves são, do ponto de vista da lógica avaliativa, equiparados aos encargos com a construção da habitação. De facto, existindo em qualquer dos casos, têm uma repercussão positiva no valor final do edificado. Situação diferente dos encargos previstos no nº 8 do artigo 26º do C.E. que se reporta a custos não habituais relacionados com as condições específicas do local. Cita-se, apenas como exemplos mais comuns, a necessidade de prever fundações especiais em consequência das condições de instabilidade do solo, fortes inclinações do terreno que sejam condicionantes da implantação do edificado ou a existência de maciços rochosos cujo desmonte se revele imprescindível. Em qualquer destes casos estamos perante encargos não reprodutivos que aumentam de forma excepcional o custo da construção e que, por isso, devem ser autonomamente considerados. Percebe-se bem a diferença para os normais encargos com a construção de caves para garagens e arrumos que, para além de, no caso, não serem excepcionais, promovem uma unanimemente reconhecida mais valia”. Também o perito da expropriante, no esclarecimento que prestou (vide fls. 230/231) revelou a mesma posição de concordância esclarecendo ainda que “O PDM define como área bruta de construção (ab) o somatório de todas as áreas de pavimentos a construir acima e abaixo da cota de soleira, com excepção das áreas em cave destinadas a estacionamento…Assim para além da área de habitação, é possível construir os referidos espaços. O valor do solo da parcela foi portanto calculado considerando a construção que nele seria possível efectuar. (…) No presente caso considerou-se que a construção para a habitação fosse apenas efectuada acima da cota da soleira, sendo as garagens e arrumos construídas abaixo da referida cota”.

Daqui já se evidencia que a opção dos 5 Peritos se encontra cabalmente justificada, sendo perfeitamente compreensível e atendível, certo, ainda, que foi tomada por unanimidade, o que é de relevar, como atrás dito, dada a sua especial aptidão e conhecimentos técnicos. Diga-se, aliás, de novo, como elemento reforçador, que esta já tinha sido a opção dos árbitros (vide fls. 43/46).

Outrossim, a opção dos peritos, perante a possibilidade de construção de caves, destinadas a estacionamento, abaixo da cota da soleira, conferida pelo aludido PDM, confirma as regras da experiência e do senso comum, pois que é consabido que a construção que tenha estacionamento automóvel - maxime em cave, já que aqui os veículos ficam mais seguros e a salvo das intempéries, bem como se torna mais cómoda para os seus donos - é muito mais valorizada no comércio imobiliário. Valorização esta que, salvo casos excepcionais, nos quais não se demonstra ou sequer indicia estar o presente incluído, sobreleva os custos de tal construção.

Nesta conformidade se concluindo que tal tipo de construção se mostra um efectivo, ou, pelo menos, muito provável, factor de valorização da parcela e, como tal, deve ser considerado. (vide no mesmo sentido o Ac. Rel. Porto, de 16.9.2008, Proc.0822734, indicado sítio).

Deste modo, inexistindo nos autos elementos que infirmem a sua razoabilidade, a posição unânime dos peritos, neste particular aspecto, foi bem sufragada pela decisão recorrida.

Não vemos, assim, que assista razão à recorrente.

3. Sumariando (art. 713º, nº 7, do CPC):

i) Para determinação do custo da construção deve atender-se, liminar e preferentemente, ex vi do disposto no art. 26º, nº 5, do CE, aos montantes fixados administrativamente para efeitos de aplicação dos regimes de habitação a custos controlados ou de renda condicionada, apenas podendo tais critérios ser postergados ou mitigados se tal se revelar necessário para a prossecução da justiça do caso concreto, hipótese que imporá convincente justificação;

ii) O apelo à Portaria 1379-A/2004, que fixou o preço de habitação por metro quadrado da área útil, para efeitos de cálculo da renda condicionada a que se refere o nº 1 do art. 4º do DL 329-A/2000, de 22.12, é um mero referencial auxiliar para avaliação do carácter especulativo, ou não, do valor do mercado encontrado, valor esse que não deverá ser atendido se, comprovadamente, não corresponder ao custo da construção na zona onde se localiza a parcela;

iii) Sendo o custo da construção possível de fixar através do recurso aos valores fixados administrativamente, o importante será que o resultado da avaliação seja o valor real e corrente da parcela expropriada;

iv) É correcto e ajustado que o índice de construção bruto ponderado para a parcela expropriada seja o resultante da média aritmética dos definidos no PDM para as duas tipologias de construção possíveis de enquadrar no terreno dessa parcela, por corresponder a um aproveitamento económico normal;

v) O Código das Expropriações determina que o cálculo do valor de um solo apto para construção deve ter por base a sua capacidade “aedificandi” valorizada com base nos custos da construção, não implicando, obrigatoriamente, a necessidade de promoção de um loteamento, pois o que se pretende avaliar é o terreno tal qual se encontrava na altura da declaração de utilidade pública;

vi) Ao tomar tal valor como referência deixa, naturalmente, de fora todos os encargos e mais valias que estão associadas ao acto de lotear não devendo, por isso, ser imputados nem encargos nem proveitos inerentes ao acto de promoção imobiliária que pode não ser, e normalmente não é, sequer desenvolvido pelo expropriado;

vii) Se o PDM permite a construção de caves, destinadas a estacionamento, abaixo da cota da soleira, o normal é o aproveitamento para garagens/arrumos, devendo tal custo de construção ser considerado para efeito de cálculo do valor do solo da parcela expropriada.

IV – Decisão

Face ao exposto, julga-se o recurso improcedente, confirmando-se a decisão recorrida.

*

Custas pela expropriante/recorrente.

 

Moreira do Carmo ( Relator )

Carlos Marinho

 Alberto Ruço