Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
242/11.3TBNZR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: CATARINA GONÇALVES
Descritores: CONTRATO DE MEDIAÇÃO
NÃO EXCLUSIVIDADE
RETRIBUIÇÃO
Data do Acordão: 12/17/2014
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: INSTÂNCIA LOCAL DA NAZARÉ – SEC. DE COMP. GENÉRICA (J1)
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: DEC. LEI Nº 211/2004 DE 20/08
Sumário: I – O direito da mediadora à retribuição acordada no âmbito de um contrato de mediação imobiliária pressupõe, por regra e sem prejuízo das excepções previstas na lei, que a mediadora tenha desenvolvido uma concreta actividade no sentido de angariar um interessado para a celebração do negócio, que o negócio visado pelo contrato de mediação tenha sido concretizado e que este negócio tenha sido celebrado com um terceiro angariado pela mediadora, de tal modo que se possa afirmar que a conclusão do contrato foi o resultado da actividade desenvolvida pela mediadora em virtude de esta se integrar na cadeia de factos que deram lugar ao negócio pretendido, ainda que não tenha sido a única causa.

II – Para que a mediadora tenha direito à remuneração acordada não basta, no entanto, que o interessado com quem vem a ser celebrado o negócio a tenha contactado, tal como não basta que o tenha acompanhado numa visita ao imóvel, ainda que tenham sido esse contacto e essa visita que despoletaram nesse terceiro o interesse no negócio que, mais tarde, se veio a concretizar.

III – Para que a mediadora tenha direito a tal remuneração será ainda necessário que tenha apresentado esse interessado ao seu cliente (ainda que seja pelo mero fornecimento da identificação das pessoas que a contactam e às quais proporciona uma visita ao imóvel) ou que, de qualquer forma, tenha potenciado ou facilitado o contacto entre ambos, promovendo a sua aproximação, já que é este o cerne da mediação e o conteúdo essencial da prestação a que se obrigou pelo contrato de mediação.

IV – Assim, se, no âmbito de um contrato de mediação em regime de não exclusividade, o proprietário do imóvel celebra o negócio visado na mediação com um terceiro que o contacta directamente, não obstante já ter contactado a mediadora e visitado o imóvel por intermédio desta, e não tendo ficado provado que tenha sido a mediadora a apresentar – por qualquer meio – esse interessado ao seu cliente ou que a mediadora tenha informado oportunamente o seu cliente de que tal interessado a havia contactado e que, por intermédio dela, havia visitado o imóvel e não estando sequer provado que, à data da celebração do negócio, o proprietário (cliente da mediadora) tivesse conhecimento daquele contacto e visita, não estão reunidos os necessários pressupostos para que possa ser reconhecido à mediadora o direito à retribuição acordada no contrato de mediação.

Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

I.

A..., Ldª, com sede na Av. (...), Lisboa, intentou a presente acção, sob a forma de processo sumário, contra B... e mulher, C... , residentes na Rua (...), Nazaré, alegando, em suma, que: em 04/03/2008, foi celebrado, entre Autora e Réus, um contrato de mediação imobiliária tendo em vista a venda de um imóvel pelo preço de 480.000,00€, tendo ficado estipulado que a Autora auferiria, a título de comissão, uma percentagem de 5% sobre o preço da venda, acrescida de IVA; não obstante as diligências efectuadas, não foi possível vender o imóvel pelo preço que se encontrava estabelecido, razão pela qual esse preço veio a ser sucessivamente reduzido até ao valor de 390.000,00€; na sequência das diligências que efectuou, a Autora foi contactada – no dia 06/02/2010 – por D... e mulher que estavam interessados na aquisição de uma casa; a Autora, através do seu angariador, mostrou-lhes o imóvel aqui em causa, tendo os mesmos mostrado interesse na sua aquisição pelo valor de 335.000,00€ e tendo subscrito a respectiva proposta de compra e reserva; a Autora transmitiu aos Réus a aludida proposta, mas o Réu reiterou que apenas venderia por 390.000,00€ e por essa razão a Autora continuou a diligenciar no sentido de conseguir interessados; no dia 06/05/2010, a Ré deslocou-se à loja da Autora para proceder ao levantamento das chaves, tendo a Autora tomado conhecimento que os Réus haviam vendido o imóvel aos interessados que havia angariado (os referidos D... e mulher) pelo preço de 356.000,00€.

Com estes fundamentos e sustentando que o negócio foi concretizado com os interessados que havia angariado – o que lhe dá direito à retribuição acordada – pede que os Réus sejam condenados a pagar-lhe a quantia de 17.800,00€, a título de remuneração/comissão, acrescida de IVA e de juros vencidos e vincendos desde a data da celebração do negócio (02/11/2010).

Os Réus contestaram, impugnando alguns dos factos vertidos na petição inicial e alegando, em suma, que foram contactados directamente pelos referidos D... e mulher sem qualquer intervenção da Autora e sem que a Autora alguma vez lhes tivesse comunicado a existência dos aludidos interessados.

Assim e sustentando que a Autora não cumpriu com os deveres de informação a que estava legal e contratualmente obrigada – já que omitiu o contacto, a visita e a proposta efectuada pelo Eng. D... – concluem que a mesma não tem o direito de reclamar o pagamento da retribuição, devendo a acção ser julgada improcedente.

A Autora respondeu e requereu a intervenção principal de D... e mulher, E... , pedindo que estes sejam também condenados a pagar à Autora a quantia de 17.800,00€ acrescida de IVA e de juros vencidos e vincendos.

A aludida intervenção veio a ser indeferida por despacho proferido em 04/11/2011.

Foi proferido despacho saneador e foi elaborada a selecção da matéria de facto assente e base instrutória.

Após realização da audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença que, julgando a acção improcedente, absolveu os Réus do pedido.

Inconformada com tal decisão, a Autora veio interpor o presente recurso de apelação, formulando as seguintes conclusões:

1. Discutiu-se nestes Autos se, no âmbito do contrato celebrado entre as partes, era devida pelos Réus uma comissão à Autora, no valor de 5% do preço da compra e venda, pela prestação de serviços de mediação imobiliária, designadamente, pela angariação de comprador para o imóvel dos Réus.

2. Ficou provado que a Autora realizou todas as diligências de promoção daquele imóvel que lhe cabiam no âmbito do contrato de mediação celebrado entre as partes.

3. Ficou provado que os Srs. D... e E... , tiveram conhecimento e visitaram pela primeira vez, o imóvel com a Autora, ou seja, que foi esta quem angariou estes potenciais compradores.

4. Ficou provado estes potenciais compradores subscreveram e entregaram à Autora uma proposta de compra do imóvel pelo preço de € 335.000,00

5. Ficou provado que uma colaboradora da Autora deu conhecimento do valor dessa proposta aos Réus e que estes não a aceitaram.

6. Não ficou Provado que a Autora através dessa colaboradora tivesse também comunicado aos Réus a identificação desses potenciais compradores (artº 13º da BI), pelo contrário ficou provado que tal não aconteceu (artº 14º da BI).

7. E ficou provado que esses potenciais compradores vieram a adquirir efetivamente esse imóvel aos Réus pelo preço de €356.000,00 e que essa aquisição teve lugar sem conhecimento da Autora.

8. O Tribunal a quo absolveu os Recorridos do pedido por entender que estes agiram de boa-fé na venda dado que não ficou provado que soubessem que os compradores em causa tivessem sido angariados pela Recorrente, concluindo que por isso “a atividade de mediação da Recorrente não foi causa adequada do negócio concluído pelos Réus”.

9. Entende a Recorrente, antes de mais, que o Tribunal a quo fez uma errada interpretação da prova testemunhal produzida ao considerar não provado que a Autora através da sua colaboradora tivesse comunicado aos Réus a identificação dos potenciais compradores D... e E... .

10. Tal comunicação teria sido prestada, em chamada telefónica, pela Dª F..., colaboradora da Autora, diretamente ao Réu marido. Ou seja, apenas estas duas pessoas poderiam saber se tal aconteceu ou não.

11. Sendo que uma dessas pessoas, o Réu marido, não foi chamado a depor, e apenas foi ouvida, como testemunha, a referida F... .

12. O depoimento desta testemunha revelou-se seguro, consistente e credível, tendo por diversas vezes esse depoimento confirmado que a Autora, através da própria testemunha, comunicou ao Réu marido a identificação daqueles proponentes que mais tarde viriam a adquirir o imóvel.

13. Mais, essa testemunha reiterou que tinha a certeza de o ter feito porque o faz sempre e os procedimentos internos da Autora, onde trabalha desde 2007, assim o determinam.

14. O Tribunal a quo em parte alguma da sentença recorrida põe em causa a credibilidade ou seriedade desta testemunha.

15. O Tribunal a quo deveria pois ter considerado provado o artº 13º e não provado o artº 14º da Base Instrutória, no sentido de que tal comunicação da identidade dos potenciais compradores aconteceu efetivamente aquando do telefonema em que a testemunha apresentou a proposta de compra no valor de €335.000,00 efetuada pelos compradores.

16. Não faz sentido nenhum que o Tribunal, baseado apenas no depoimento dessa testemunha – cuja credibilidade nunca questionou - tenha considerado provado que a mesma tenha transmitido ao Réu marido a proposta de compra do casal D... e E... , e simultaneamente tenha considerado não provado que lhe tenha transmitido também o nome dos proponentes, quando a testemunha expressamente e por várias vezes confirmou ter feito ambas as coisas.

17. Corrigida a apreciação da prova produzida nestes termos, e considerando-se provado que os Réus sabiam que as pessoas a quem acabaram por vender o imóvel eram as mesmas que tinham sido angariadas pela Autora e que inclusivamente já tinham concretizado uma proposta de compra através daquela, cai por terra a argumentação da sentença recorrida no sentido de que os Réus agiram de boa-fé e que a atividade da mediadora não foi a causa adequada da venda.

18. Só restando um desfecho possível para a lide que era o da condenação dos Réus a pagar, nos termos do contrato de mediação celebrado, uma comissão à Autora equivalente a 5% do preço da venda efetivamente concretizada (€ 356.000,00), acrescida de IVA à taxa legal.

Ainda que assim não se entenda,

19. Ficou provado que as partes celebraram os contratos de mediação imobiliária juntos aos autos.

20. O n.º 3 da cláusula 5ª dos referidos contratos dispõe o seguinte: “Caso a venda do imóvel se venha a concretizar fora do período de vigência deste contrato e a entidade compradora tenha sido formal ou materialmente apresentada pela Mediadora durante o mesmo, ser-lhe-á, a esta, devida a remuneração.”

21. Esta cláusula não viola qualquer disposição do regime legal da mediação imobiliária, pelo que não está em causa a sua aplicabilidade – que deve ter uma aplicação objetiva.

22. Ficou provado que os compradores do imóvel em causa, D... e E... – tiveram conhecimento da existência deste imóvel através da Recorrente.

23. Assim, verificaram-se os factos que acionam o previsto na referida disposição contratual e, designadamente o facto de que materialmente foi através da mediadora, ou seja da Autora, que os compradores tiveram conhecimento de que o imóvel se encontrava para venda e, consequentemente, se apresentaram aos respetivos proprietários – os Réus.

24. Nem se diga que a boa-fé dos Réus na sua conduta aconselharia a sua absolvição do pedido. Com efeito a haver boa-fé dos Réus, houve ainda com mais segurança boa-fé da Autora.

25. A Autora, que agiu de boa-fé e obteve com sucesso, através dos seus esforços de divulgação, a angariação dos compradores do imóvel, não pode ela sim ser prejudicada por um comportamento menos correto de terceiros.

26. Nesta ótica, quem teria agido de má-fé seriam os compradores, D... e E... , que ocultaram premeditadamente aos Réus que tiveram conhecimento e visitaram o imóvel através da Autora a quem inclusive entregaram uma proposta de compra.

27. Ora, a ser assim, sempre assiste aos Réus o direito, no âmbito do instituto da responsabilidade pré-contratual, a ver ressarcido pelos compradores o prejuízo que para si resulte daquela omissão grosseira, designadamente o valor da comissão que têm agora de pagar à Autora.

Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente e em consequência ser revogada a sentença recorrida e substituída por outra que condene os réus na totalidade do pedido conforme formulado na p.i.

Os Réus apresentaram contra-alegações, formulando as seguintes conclusões:

a) Defende a A. que em virtude do acordo celebrado com réus com vista a conseguir interessado na compra de prédio de que estes eram proprietários tem direito à remuneração estipulada no acordo por este ter sido vendido a pessoa por si angariada.

b) Insurgindo-se contra a decisão recorrida por entender que o Tribunal a quo fez uma errada interpretação da prova testemunhal produzida ao considerar não provado que a Autora, através da sua colaboradora, tivesse comunicado aos Réus a identificação dos potenciais compradores D... e E... .

c) Alicerçando a sua posição apenas e tão só no depoimento da testemunha F... , o qual, na perspetiva da recorrente, se revelou “ seguro, consistente e credível, tendo por diversas vezes esse depoimento confirmado que a Autora, através da própria testemunha, comunicou ao Réu marido a identificação daqueles proponentes que mais tarde viriam a adquirir o imóvel “;

d) Omitindo, voluntariamente, que esse depoimento, e neste particular da alegada identificação dos potenciais compradores, foi induzido através duma pergunta feira pela Exma. Advogada da Recorrente que, na própria pergunta, sugeriu a resposta;

e) Sendo que, num 1º momento, a resposta dada pela dita testemunha, apenas confirmou ter indicado aos RR. o valor da proposta em apreço, proposta esta imediatamente recusada pelos vendedores, deixando assim de fazer qualquer sentido a posterior identificação dos proponentes;

f) Confirmando, mais tarde, que o que nestes casos importa mesmo é o valor.

g) Estriba-se ainda na circunstância da testemunha F... ter afirmado “ que tinha a certeza de o ter feito porque o faz sempre e os procedimentos internos da Autora, onde trabalha desde 2007, assim o determinam “, omitindo que a própria testemunha confessou, após grande resistência, não ter dado cumprimento aos procedimentos internos da Autora quando não deu a ficha de visita a assinar à R. mulher, em circunstâncias que a outra testemunha da A.. o mediador Mário, qualificou como “ Aí a coisa pinta doutra maneira.”

h) E omitindo que a dita testemunha tem interesse idêntico aos da A. na procedência da presente acção, pois que, nos termos acordados com a A., o valor peticionado, a comissão, seria repartida, em proporções que se desconhecem, entre a A. e a testemunha F... .

i) A credibilidade / seriedade da referida testemunha, ainda que não directamente posta em causa pelo Tribunal a quo, fica inapelavelmente comprometida pelas circunstâncias antes mencionadas e pelo seu depoimento titubeante, vago e fugidio sempre que lhe eram colocadas questões que comprometiam a tese trazida aos autos pela A.

j) A própria A. perdeu credibilidade, quando numa manobra digna do melhor trapezista, e após ter prescindido do por si requerido depoimento de parte dos RR., presentes na audiência de julgamento, vem defender que o depoimento da testemunha F... apenas poderia ser confirmado / desmentido pelo Réu marido, pelo que não tendo este sido chamado a depor, só há que aceitar como bom o único depoimento prestado.

k) Comportamento processual este que, no mínimo, é revelador da má fé com que a recorrente actuou para o apuramento da verdade material, não estando interessado no seu real apuramento.

l) Na verdade, não é só o comportamento processual da testemunha F... que é fortemente censurável, mas também o comportamento da A. é de elevada censurabilidade quando omite ter prescindido do depoimento de parte dos RR, para, depois, argumentar em seu favor a circunstância dos RR. não terem deposto.

m) Inequivocamente, pois, nenhuma censura merece a resposta dada pelo Tribunal quando considerou provado que a A. apenas comunicou aos RR. o valor da proposta apresentada pelos interessados D... e mulher, não tendo nunca procedido à identificação destes junto dos RR.

n) Situação esta que a própria A., contraditoriamente, aceita, quando admite ter havido ocultação do comprador aos Réus ( assim, nº 26 da Conclusões ). Ora, a haver ocultação, como a própria A. admite, é porque os RR. nada sabiam daquela identidade através da A.

o) E sendo certo que o n.º 3 da cláusula 5ª dos referidos contratos dispõe que “Caso a venda do imóvel se venha a concretizar fora do período de vigência deste contrato e a entidade compradora tenha sido formal ou materialmente apresentada pela Mediadora durante o mesmo, ser-lhe-á a esta, devida a remuneração.” é absolutamente claro que a A. nunca apresentou, formal e materialmente, os RR. aos interessados D... e mulher, ou estes aos RR.

p) Tendo, igualmente, ficado claro que foi o interessado D... quem apurou a identidade do Réu marido, quem o contactou, com quem ajustou uma visita ao imóvel, quem no decurso dessa visita omitiu já conhecer a fracção em causa, tendo-se comportado como se estivesse a fazer uma 1º visita, tendo sido na sequência deste contacto, da exclusiva iniciativa do Interessado D... , que este e o Réu marido acertaram entre si as condições pelas quais vieram, mais tarde, a firmar o contrato de permuta.

q) E se dúvidas inexistem quanto ao comportamento dos RR., insuscetível de ser qualificado doutra forma que não absolutamente honorável, dúvidas igualmente não assistem de que esta iniciativa do interessado D... não pode, em circunstância alguma, ser qualificada, como uma actuação de má fé.

r) Na verdade, o facto dos compradores, D... e E... , terem ocultado aos Réus que tinham visitado o imóvel através da Autora e de lhe terem entregue uma proposta de compra, não pode ser interpretada senão como uma pequena astúcia, própria de quem negoceia, astúcia essa absolutamente inócua caso a A. tivesse dado cumprimento ao seu dever de informar os RR. Da identificação daqueles interessados, não podendo agora a A. prevalecer-se em sua defesa ( já o fez com o depoimento de parte dos RR. por si prescindido! ) dum comportamento cujas consequências só a si se devem, e que, em si mesmo, configura uma omissão do dever de informação que sobre a A. impendia.

s) Mas, ainda que se considerasse que os compradores D... e E... agiram de má fé, então só estes poderiam ser responsabilizados pela A. e nunca os RR. desde logo porque para haver responsabilidade pré-contratual teria de haver um comportamento dos RR., ainda que omissivo, gerador dessa responsabilidade, não podendo os RR. serem responsabilizados pela alegada má fé que a A. imputa aos compradores.

t) Em suma, a Douta Sentença proferida não merece qualquer reparo, o mesmo não se podendo dizer das alegações de recurso apresentadas pela recorrente, as quais, para além das omissões, vícios de raciocino e justificação supra indicados, esquecem, no que respeita à impugnação da decisão sobre a matéria de facto e em sede de Conclusões, o disposto no art. 640 nº1 al. b) e nº2 al. a) do CPC, incumprindo o aí determinado.

Termos em que, deve o recurso da recorrente ser julgado de não provado e improcedente, mantendo-se a Douta Sentença proferida sem qualquer alteração.


/////

II.

Questões a apreciar:

Atendendo às conclusões das alegações da Apelante – pelas quais se define o objecto e delimita o âmbito do recurso – são as seguintes as questões a apreciar e decidir:

• Saber se existiu erro na apreciação da prova e se, em função disso, importa ou não alterar – e em que termos – a decisão proferida sobre a matéria de facto no que respeita aos pontos impugnados;

• Saber, em função da matéria de facto provada, se estão reunidos os pressupostos necessários para que possa ser reconhecido à Autora/Apelante o direito à retribuição que ficou estabelecida no contrato de mediação imobiliária que celebrou com os Réus.


/////

III.

Na 1ª instância, considerou-se provada a seguinte matéria de facto:

1) A autora encontra-se registada na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa, sob o NIPC (...), com o objecto de “mediação imobiliária e prestação de serviços conexos”, conforme doc. fls.14 e ss, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido – alínea a) dos factos assentes.

2) Por acordo escrito denominado “Contrato de Mediação Imobiliária n.º 2194”, datado de 04/03/2008, a autora, na qualidade de mediadora, obrigou-se perante os réus, na qualidade de segundos contratantes, a diligenciar no sentido de conseguir interessado na compra, pelo preço de 480.000,00€, da fracção autónoma “H”, do prédio urbano, destinado a habitação, sendo constituído por 5 divisões assoalhadas, com uma área total de 175m2, sito na Alameda das Linhas de Torres, nºs. 122-3ºEsq., Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob a ficha nº2352, com a licença de construção/utilização nº18, emitida pela Câmara Municipal de Lisboa, em 27.07.2004 e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 3765, da freguesia de Lumiar, desenvolvendo, para o efeito, acções de promoção e recolha de informações sobre os negócios pretendidos e características dos respectivos imóveis, cfr. doc. de fls.31 e ss, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido – alínea b) dos factos assentes.

3) Consta do acordo referido em 2) que os réus acordaram com a autora em regime de não exclusividade – alínea c) dos factos assentes.

4) Acordaram ainda autora e réus que o acordo mencionado em 2) tinha a validade de 6 (seis) meses contados a partir da data da sua celebração renovando-se automaticamente por iguais e sucessivos períodos de tempo, caso não fosse denunciado por qualquer das partes contratantes através de carta registada com aviso de recepção ou outro meio equivalente, com a antecedência mínima de 10 (dez) dias, a contar da data de assinatura do acordo – alínea d) dos factos assentes.

5) Nos termos do referido acordo, pela prestação dos serviços mencionados em 1), os réus obrigaram-se a pagar à autora, a título de remuneração:

“ (…) 1 – A quantia de 5% (cinco por cento) calculada sobre o preço pelo qual o negócio é efectivamente concretizado, acrescida de IVA à taxa legal de 21%.

2 – O total de remuneração aquando da celebração do contrato-promessa.

3 – Caso a venda do imóvel se venha a concretizar fora do período de vigência deste contrato e a entidade compradora tenha sido formal ou materialmente apresentada pela Mediadora durante o mesmo, ser-lhe-á, a esta, devida a remuneração. (…)”, cfr. doc. de fls.31 e ss, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido – alínea e) dos factos assentes.

6) Após a celebração do acordo identificado em 2), a autora diligenciou a promoção do prédio para angariação de um comprador – alínea f) dos factos assentes.

7) Por email de 13/06/2008, os réus informaram a autora de que tinham decidido baixar o preço da fracção mencionada em 2) para 460.000,00€ e que esta podia anunciar a venda por esse valor – alínea g) dos factos assentes.

8) Não obstante o referido em 7), não foi possível encontrar interessado na compra da fracção autónoma pelo preço aí referido – alínea h) dos factos assentes.

9) Em consequência do referido em 8), em 13/12/2008, por documento escrito denominado “Contrato de Mediação Imobiliária n.º2194”, a autora obrigou-se perante a ré a diligenciar no sentido de conseguir interessado na compra da fracção autónoma mencionada em 2), pelo preço de 405.000,00€, cfr. doc. de fls.34 e ss, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido – alínea i) dos factos assentes.

10) …Acordaram ainda que o acordo era celebrado em regime de exclusividade, prestando a autora serviços de mediação nos termos gerais do “Compromisso de Serviço ERA”, cuja cópia foi nesse acto entregue aos réus – alínea j) dos factos assentes.

11) …Tendo tal acordo uma validade de 3 meses contados a partir da data da sua celebração renovando-se automaticamente por iguais e sucessivos períodos de tempo, caso não fosse denunciado por qualquer das partes contratantes através de carta registada com aviso de recepção ou outro meio equivalente, com a antecedência mínima de 10 (dez) dias, a contar da data de assinatura do mesmo – alínea k) dos factos assentes.

12) Nos termos do referido acordo, pela prestação dos serviços mencionados em 1), a ré obrigou-se perante a autora nos exactos termos já mencionados em 5) – alínea l) dos factos assentes.

13) A partir de 13/12/2008, a autora continuou a diligenciar, a promoção da venda do prédio identificado em 2), agora pelo preço de 405.000,00€, através da distribuição de folhetos, revistas e anúncios e jornais, publicidade na internet e no site www.era.pt/lumiar, anúncios na montra da sua loja e através da actividade dos seus colaboradores/vendedores – alínea m) dos factos assentes.

14) A solicitação da ré, por documento escrito datado de 09/09/2009, denominado “Contrato de Mediação Imobiliária”, a autora obrigou-se perante a ré a diligenciar no sentido de conseguir interessado na compra da fracção autónoma identificada em 2), pelo preço de 405.000,00€, e em regime de não exclusividade, cfr. doc. de fls.36 e ss, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido – alínea n) dos factos assentes.

15) Acordando ainda autora e ré, no que concerne à duração do acordo e retribuição da primeira, nos mesmos termos constantes das alíneas 4) e 5) – alínea o) dos factos assentes.

16) Por escrito datado de 01/12/2009, denominado “Aditamento ao Contrato de Mediação Imobiliária n.º2194”, autora e ré acordaram que o preço acordado para a compra e venda da fracção autónoma mencionada em 2) seria, a partir de então, de 390.000,00€, ficando sem efeito o anterior valor, cfr. doc. de fls.38, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido – alínea p) dos factos assentes.

17) No período compreendido entre 04/03/2008 e Maio de 2010, a autora levou vários interessados a visitar o prédio identificado em 2) – alínea q) dos factos assentes.

18) Quando a autora procedeu às visitas mencionadas nos documentos de fls.215 a 229 e 231 a 239, elaborou a respectiva ficha de visita, a qual foi dada a assinar aos réus, aos quais foi entregue o respectivo duplicado – resp. art. 16.º da base instrutória.

19) Em virtude das diligências que a autora se obrigou perante os réus para promoção da fracção autónoma identificada em 2), em data não posterior a 06/02/2010 a mesma foi contactada por D... e E... , que pretendiam adquirir uma casa nova, eventualmente aquela fracção – resp. art.1.º da base instrutória.

20) Em 06/02/2010 a autora levou-os a visitar a referida fracção autónoma – resp. art.2.º da base instrutória.

21) Por email datado de 11/02/2010, D... solicitou à autora uma proposta de compra e reserva daquela fracção autónoma pelo preço de 335.000,00€ - resp. art.3.º da base instrutória.

22) Em 12/02/2010, nas instalações da autora e por documento escrito denominado “Proposta de compra e reserva”, E... obrigou-se a comprar o prédio identificado em 2), pelo preço de 335.000,00€, devendo o contrato-promessa de compra e venda ser celebrado até 08/03/2010 e a respectiva escritura pública até 08/06/2010 – resp. art.4.º da base instrutória.

23) Em data não concretamente apurada dos meses de Fevereiro ou Março de 2010, a autora deu conhecimento ao réu do preço da proposta mencionada em 21) – resp. art.5.º da base instrutória.

24) …A qual não foi por este aceite, alegando que apenas venderia a fracção pelo preço de 390.000,00€ – resp. art.6.º da base instrutória.

25) Em consequência do referido em 24), a autora continuou a diligenciar pela obtenção de interessados na compra do imóvel identificado em 2) pelo valor de 390.000,00€ – resp. art.7.º da base instrutória.

26) Em dia não concretamente apurado mas anterior a 06/05/2010, mediante contacto telefónico, D... questionou o réu sobre se a fracção identificada em 2) se encontrava à venda e qual o seu valor – resp. art.10.º da base instrutória.

27) O referido D... obteve a identificação do réu numa visita que efectuou ao referido prédio dias antes da data referida em 26) através de informação dada por moradores daquele prédio com quem falou e, subsequentemente, através da internet – resp. art.11.º da base instrutória.

28) O réu ajustou com o referido D... dia e hora para visita ao mencionado prédio, o que veio a ocorrer – resp. art.12.º da base instrutória.

29) Em 06/05/2010, a ré deslocou-se à loja da autora e levantou as chaves da fracção autónoma identificada em 2) – alínea r) dos factos assentes.

30) Aquando do referido em 29), a ré informou a funcionária da autora, F..., que já tinham encontrado um comprador para a fracção autónoma – resp. art.15.º da base instrutória.

31) O acordo referido em 16) terminou em Maio de 2010 – alínea u) dos factos assentes.

32) Por título de permuta e mútuo com hipoteca de 02/11/2010, os réus declararam ceder a D... e E... , o prédio identificado em 2), a que atribuíram o valor de 356.000,00€, e estes declararam ceder àqueles a fracção autónoma inscrita na matriz sob o artigo 3612 e descrita na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o n.º2376-AS, a que atribuíram o valor de 160.000,00€, declarando ainda os referidos intervenientes que no negócio não interveio qualquer sociedade de mediação imobiliária, cfr. doc. de fls.19 e ss dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido – alínea s) dos factos assentes.

33) O prédio mencionado em 2) encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa, freguesia do Lumiar, sob o n.º2352/20040716-H, e a titularidade inscrita a favor de D... e E... mediante a Ap.446 de 02/11/2010, por permuta com os réus – cfr. Doc. De fls.185 e ss, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.


/////

IV.

Matéria de facto

A Apelante começa por impugnar a decisão proferida sobre a matéria de facto, sustentando que o ponto 13º da base instrutória deveria ter sido considerado provado e que o ponto 14º da base instrutória deveria ter sido considerado não provado.

Os citados pontos da base instrutória tinham a seguinte redacção:

13º

Sempre que a autora tinha um interessado na compra da fracção autónoma disso dava conhecimento aos réus, identificando-os?

14º

…O que não sucedeu com D... e E... ?

O Tribunal respondeu a essa matéria nos seguintes termos:

Ponto 13º - Provado apenas o que consta da resposta ao artigo 16º (ou seja, que quando a autora procedeu às visitas mencionadas nos documentos de fls. 215 a 229 e 231 a 239, elaborou a respectiva ficha de visita, a qual foi dada a assinar aos réus, aos quais foi entregue o respectivo duplicado).

Ponto 14º - Não Provado.

Refira-se, desde já, que é incompreensível a posição da Apelante relativamente ao ponto 14º, já que a resposta que propõe relativamente a essa matéria é precisamente aquela que lhe foi dada pelo Tribunal (não provado).

E, ao contrário do que a Apelante afirma na 6ª conclusão das suas alegações, não é verdade que tenha ficado provado (pela resposta dada ao art. 14º ou a qualquer outro) que a Autora não tenha comunicado aos Réus a identificação daqueles potenciais compradores. Como decorre da resposta negativa ao ponto 14º, não ficou provado que tal comunicação não tenha sido efectuada.

Conforme decorre das suas alegações, aquilo que a Apelante pretende ver inserido na matéria de facto provada é que, aquando da realização do telefonema em que deu conhecimento ao Réu da proposta que havia sido apresentada por D... e mulher, também lhe foi dado conhecimento da identificação dos proponentes.

Mas, salvo o devido respeito, a inserção desse facto na matéria de facto provada nunca poderia resultar das respostas propostas pela Apelante relativamente aos citados pontos 13º e 14º, já que, atendendo à redacção desses pontos, nunca deles resultaria (quer a resposta fosse positiva, quer fosse negativa) que a Autora tivesse transmitido aos Réus o nome dos aludidos proponentes, já que o que se perguntava no ponto 14º não era se tal comunicação havia sido efectuada mas sim se ela não havia sido efectuada.

De qualquer forma e independentemente dessa questão, parece-nos que a prova produzida não permitiria que se considerasse provado que, no aludido telefonema, a colaboradora da Autora transmitiu aos Réus a identificação dos proponentes.

Na perspectiva da Apelante, a prova desse facto teria resultado do depoimento da testemunha, F... , que considera isento e credível. Com efeito – diz – a chamada telefónica em causa foi efectuada pela aludida testemunha ao Réu e, como tal, apenas essas duas pessoas poderiam ter conhecimento desse facto, sendo certo, no entanto, que o Réu não foi chamado a depor, razão pela qual apenas se poderá atender ao depoimento da referida testemunha.

Refira-se, desde já, que, se é verdade que o Réu não prestou depoimento, também é verdade que foi a própria Autora, ora Apelante, quem prescindiu desse depoimento. Com efeito, tendo a Autora requerido oportunamente o depoimento de parte do Réu, este foi convocado para comparecer à audiência e aí compareceu efectivamente, sendo certo, no entanto, que a Autora prescindiu do seu depoimento. Assim sendo, não poderá agora pretender retirar qualquer ilação da circunstância de esse depoimento não ter sido prestado e para dizer que as declarações prestadas pela testemunha, F... , terão que conduzir à prova do aludido facto por não ter sido ouvida a única pessoa que a poderia contrariar.

E a verdade é que, analisando o depoimento prestado pela testemunha, F... , não nos parece que o mesmo seja bastante para que aquele facto se considerasse provado.

Refira-se, em primeiro lugar, que a testemunha em causa – como resulta, clara e expressamente da parte final do seu depoimento – terá direito a uma parte da comissão que eventualmente seja devida à Autora relativamente ao negócio em causa nos autos e isso significa que a aludida testemunha tem evidente interesse na decisão da causa. Ora, esta circunstância não poderá deixar de implicar algumas reservas no que toca à isenção e credibilidade do depoimento, importando notar que o facto em questão não é confirmado por nenhum outro meio de prova.

A referida testemunha declara ter telefonado ao Réu, com o objectivo de o informar da proposta que havia sido efectuada por D... e E... , mais declarando que, nesse contacto telefónico, transmitiu o valor da proposta e o nome dos interessados, sendo que o Réu a informou que só venderia por 390.000,00€. Declara ter a certeza de ter transmitido a identificação dos interessados, mas quando lhe é perguntada a razão dessa certeza, declara ter a certeza porque é sempre isso que faz. A testemunha alude à existência de um guião e a um conjunto de regras que devem adoptar e entre as quais se incluem a elaboração de fichas referentes às visitas efectuadas ao imóvel que são assinadas pelo cliente e pelo proprietário, mais referindo que, sempre que têm uma proposta, ligam ao proprietário a informar que têm uma proposta, indicando o nome do interessado e solicitando a marcação de uma reunião, mais declarando que foi isso que fez neste telefonema.

Ou seja, ao que nos pareceu, a testemunha não depõe sobre aquilo que sabe e que se recorda ter acontecido – sendo que não referiu qualquer pormenor dessa conversa que nos leve a acreditar ter a memória exacta do teor desse telefonema que havia ocorrido há três anos – mas sim sobre aquilo que é normal acontecer, declarando ter a certeza de ter prestado aquela informação por ser isso que faz sempre que tem uma proposta.

Mas, salvo o devido respeito, isso não nos dá a segurança bastante para criar a convicção de que assim tenha sucedido efectivamente, já que, ainda que seja esse o procedimento normal, nada garante que tal procedimento tenha sido efectivamente adoptado neste caso.

Refira-se que, de acordo com o depoimento da testemunha, a elaboração de fichas referentes às visitas efectuadas ao imóvel também era um procedimento normal, tal como era um procedimento normal que essas fichas fossem levadas ao conhecimento do proprietário que nelas apunha a sua assinatura. Mas, não obstante ser um procedimento habitual (que faria parte do conjunto de regras que compõem o guião a que alude a testemunha), a ficha referente à visita efectuada por D... e mulher não está assinada pelos Réus (cfr. fls. 30). Quando questionada sobre a omissão desse procedimento, a testemunha justificou-se, dizendo que nunca mais tinha conseguido contactar e reunir com os Réus. Não obstante, acaba por reconhecer que esteve com a Ré na ocasião em que esta se deslocou à loja para ir buscar a chave (em 06/05/2010) e, não tendo tentado obter nessa ocasião a assinatura em falta, começa por justificar esse facto, dizendo que, nessa data, o contrato já havia sido rescindido (circunstância que, na nossa perspectiva, não obstaria ao cumprimento das regras que impunham a assinatura das fichas referentes às visitas efectuadas durante a vigência do contrato) e, reconhecendo, de algum modo, a insuficiência dessa justificação, acaba por dizer que, afinal, não solicitou essa assinatura porque não estava preparada para o efeito, apesar de as fichas se encontrarem na loja.

Ora, perante o incumprimento dessa regra – que, como declara a testemunha, também era habitual – nada nos garante que as demais regras ou procedimentos habituais tenham sido respeitados e, portanto, o depoimento em causa não é bastante para concluir que, no aludido telefonema, a testemunha tenha actuado de acordo com o seu procedimento habitual, dando a conhecer ao Réu a identificação dos interessados que haviam efectuado aquela proposta.

Importa notar, além do mais, que, conforme declara a testemunha, a referida proposta foi liminarmente recusada pelo Réu, que terá respondido “eu só vendo por 390.000”. Mas, se o Réu respondeu logo nestes termos e analisando esta conversa à luz das regras de experiência e senso comum, não poderemos deixar de admitir com grande probabilidade que não tenha chegado a ser mencionada a identidade dos interessados que efectuavam a proposta, já que, não existindo qualquer interesse no valor proposto para o negócio, não teria grande relevância, naquele momento e naquele contexto, o nome da pessoa que efectuava a proposta liminarmente rejeitada.

Não nos parece, portanto, que o aludido depoimento seja suficiente para que aquele facto possa ser considerado provado.

E não se argumente – como faz a Apelante – que “Não faz sentido nenhum que o Tribunal, baseado apenas no depoimento dessa testemunha – cuja credibilidade nunca questionou - tenha considerado provado que a mesma tenha transmitido ao Réu marido a proposta de compra do casal D... e E..., e simultaneamente tenha considerado não provado que lhe tenha transmitido também o nome dos proponentes, quando a testemunha expressamente e por várias vezes confirmou ter feito ambas as coisas”.

Refira-se que o facto de o tribunal atribuir credibilidade a alguns pontos do depoimento, não implica, evidentemente, que tenha que aceitar o seu conteúdo integral. Com efeito, cada um dos depoimentos é analisado em conjugação com a demais prova produzida e com outros elementos ao dispor do julgador, atendendo, designadamente, às regras de experiência e senso comum. Ora, sabendo nós que existiu uma proposta de negócio, o normal seria que, nessas circunstâncias, a Autora – ou qualquer um dos seus colaboradores – comunicasse aos Réus a existência dessa proposta e, portanto, não custará aceitar o depoimento da aludida testemunha quando afirma ter comunicado essa proposta, já que é esse o comportamento que se tem como adequado e que é esperado e previsível quando uma mediadora obtém uma proposta de negócio. Mas, tendo em conta essas mesmas regras de experiência e senso comum, já não será razoável admitir com muita probabilidade que, tendo o Réu recusado liminarmente o valor que lhe era proposto para o negócio, tivesse existido ainda a preocupação de, nesse momento e nesse contexto, o informar acerca da identidade da pessoa que havia efectuado essa proposta. Não é, naturalmente, impossível que tal tenha acontecido, mas, não sendo um comportamento normal e previsível naquelas circunstâncias, não poderá ser considerado provado sem que exista qualquer elemento que aponte nesse sentido a não ser o depoimento de uma testemunha que, além do mais, tem manifesto interesse na decisão da causa.

Assim, e no que toca a esta questão, improcede o recurso, mantendo-se a decisão proferida sobre a matéria de facto.

Direito

Conforme decorre da matéria de facto provada, a Autora celebrou com os Réus um contrato de mediação imobiliária, por via do qual se obrigou a diligenciar no sentido de conseguir interessados na compra de uma fracção autónoma de que os Réus eram proprietários.

Por força das sucessivas reduções do preço que os Réus entenderam efectuar, foram subscritos vários contratos de mediação imobiliária.

Sendo irrelevante a questão de saber se estamos perante contratos autónomos ou meras alterações ao contrato inicial, o que importa reter é que, nos termos do último contrato ou alteração, a Autora estava obrigada a diligenciar no sentido de conseguir interessado na compra do imóvel pelo preço de 390.000,00€, em regime de não exclusividade, tendo ficado estabelecida uma remuneração correspondente a 5% do preço pelo qual o negócio fosse concretizado, acrescida de IVA, mais se estabelecendo que essa remuneração seria devida ainda que a venda do imóvel se viesse a concretizar fora do período de vigência do contrato, no caso de o comprador ter sido, formal ou materialmente, apresentado pela mediadora.

Como decorre da matéria de facto provada, os Réus vieram a vender o imóvel, sustentando a Autora/Apelante – em desacordo com a sentença recorrida – que lhe é devida a remuneração contratualmente estabelecida em virtude de o imóvel ter sido vendido a pessoa que a Autora havia angariado no período de vigência do contrato de mediação imobiliária que havia celebrado com os Réus.

Vejamos se assim é.

O exercício da actividade de mediação imobiliária está actualmente regulado pela Lei nº 15/2013, de 08/02, diploma que, no entanto, não será aplicável ao caso sub judice, na medida em que a vigência do contrato aqui em causa ocorreu integralmente em momento anterior ao da entrada em vigor daquele diploma.

Importará, pois, atender ao Dec. Lei nº 211/2004 de 20/08, já que era este o diploma que, antes da citada Lei nº 15/2013, regulava o exercício da actividade de mediação imobiliária.

De acordo com o disposto no art. 2º nº 1 do citado diploma legal, o contrato de mediação imobiliária é aquele em que a entidade mediadora se obriga a diligenciar no sentido de conseguir interessado na realização de negócio que vise a constituição ou aquisição de direitos reais sobre bens imóveis, a permuta, o trespasse ou o arrendamento dos mesmos ou a cessão de posição em contratos cujo objecto seja um bem imóvel, desenvolvendo para o efeito acções de prospecção e recolha de informações que visem encontrar o bem imóvel pretendido pelo cliente ou desenvolvendo acções de promoção dos bens imóveis sobre os quais o cliente pretenda realizar negócio jurídico, designadamente através da sua divulgação, publicitação ou da realização de leilões.

Conforme resulta dessa definição legal, a prestação essencial da mediadora consiste em conseguir interessado para determinado negócio, aproximando esse interessado da outra parte, facilitando, dessa forma, a celebração do negócio e obrigando-se, naturalmente, a desenvolver um conjunto de acções que tenham idoneidade para atingir esse objectivo e, mais especificamente, as acções a que alude a norma supra citada.

Importa notar, no entanto, que o direito à retribuição pelos serviços prestados no âmbito desse contrato não se basta com a execução dos actos materiais e com as acções desenvolvidas no sentido de encontrar um interessado no negócio. Com efeito, ainda que essa actuação ou actividade tenha sido relevante, em termos quantitativos e qualitativos, e ainda que ela evidencie que foram efectuados todos os esforços que eram possíveis no sentido de encontrar um interessado na celebração do negócio, isso não basta para que o mediador adquira o direito à retribuição.

De facto, o mediador obriga-se, como referimos, a conseguir um interessado na realização do negócio e interessado, para esse efeito, é apenas – segundo dispõe o art. 2º, nº 4, alínea a), “…o terceiro angariado pela empresa de mediação, desde que esse terceiro venha a concretizar o negócio visado pelo contrato de mediação”. Significa isso, portanto, que a obrigação assumida pela mediadora apenas se considera integralmente cumprida se o negócio visado pelo contrato de mediação vier a ser concretizado com um terceiro que tenha angariado, já que só aí se poderá afirmar que a mediadora angariou um interessado, nos termos em que este é definido na norma supra citada.

Isso mesmo resulta também do art. 18º do citado diploma, onde se dispõe expressamente que a remuneração só é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação, apenas se ressalvando a possibilidade de as partes acordarem no pagamento da remuneração com a celebração do contrato-promessa ou a situação em que, estando em causa um contrato de mediação em regime de exclusividade, o negócio visado não vem a ser celebrado por culpa do cliente da mediadora.

Assim, por regra e ressalvando as excepções consagradas no citado art. 18º, nº 2, o direito à remuneração pressupõe: que a mediadora tenha desenvolvido uma concreta actividade no sentido de angariar um interessado para a celebração do negócio; que o negócio visado pelo contrato de mediação tenha sido concretizado e que este negócio tenha sido celebrado com um terceiro angariado pela mediadora, de tal modo que se possa afirmar que a conclusão do contrato foi o resultado da actividade desenvolvida pela mediadora. 

No caso sub judice, é indiscutível que a Autora, na qualidade de mediadora, desenvolveu uma concreta actividade no sentido de angariar um interessado na aquisição do imóvel, divulgando e publicitando o imóvel e levando várias pessoas a visitá-lo. É também indiscutível que o negócio visado pelo contrato de mediação foi concretizado, porquanto os Réus venderam efectivamente o imóvel a que se reportava aquele contrato.

Mas, poder-se-á concluir que a conclusão desse contrato resultou da actividade que a Autora desenvolveu?

No sentido de apurar se o terceiro foi efectivamente angariado pela mediadora e se a conclusão do contrato foi o resultado da actividade que esta desenvolveu, a doutrina e a jurisprudência têm apelado à necessidade de existência de um nexo de causalidade entre a actividade do mediador, dizendo-se que o negócio visado pela mediação é concretizado devido à actuação da mediadora quando existe uma relação causal entre a actuação do mediador e a conclusão e perfeição do contrato (não sendo sequer necessário que a actuação do mediador tenha sido a única causa da conclusão do negócio)[1].

Conforme se refere no citado Ac. da Relação do Porto de 20/09/2001, citando o acórdão do STJ de 31/03/98 [BMJ nº 475, pág. 686], “o juízo positivo a formular sobre esta relação de causa e efeito deve assentar na verificação de um nexo de causalidade adequada, é preciso que a actividade do mediador, embora não sendo a única causa do resultado produzido, se integre de forma idoneamente determinante na cadeia de factos que deram lugar ao negócio pretendido pelo comitente”.

Há mesmo quem entenda – e assim já foi entendido pelo STJ (cfr. Ac. de 20/04/2004, processo 04A800[2]) – que, para ter direito à comissão, é suficiente o mediador ter-se limitado a dar o nome de uma pessoa disposta a realizar o negócio, pondo o comprador em contacto com o vendedor e que isso tenha influído na realização do contrato.

A resposta à questão de saber se, no caso sub judice, é possível afirmar a existência desse nexo de causalidade não é, de modo algum, linear, dada a circunstância de os intervenientes nesse contrato (adquirentes do imóvel) terem contactado a Autora (na sequência e em resultado das diligências que esta efectuou), manifestando-lhe interesse na aquisição do imóvel depois de a Autora os ter acompanhado numa visita ao mesmo (chegando mesmo a efectuar uma proposta concreta), sendo certo que, posteriormente, encetaram contactos directos com os proprietários (ora Réus) com quem negociaram e com quem vieram a celebrar o contrato á revelia da Autora.

Sob pena de indevido e ilícito aproveitamento da actividade das mediadoras, não poderá ser admitido, como regra, que a mera circunstância de as negociações finais e a celebração do contrato terem ocorrido directamente entre o proprietário e o interessado no negócio e à revelia da mediadora seja bastante para desonerar o cliente da mediadora do pagamento da remuneração a que se vinculou no contrato de mediação.

Mas também não poderemos esquecer que, designadamente nos casos em que o contrato de mediação não é celebrado em regime de exclusividade, o proprietário pode efectuar diligências no sentido de encontrar, ele próprio, um interessado no negócio, tal como pode contratar outras mediadoras com essa finalidade.

Não será fácil concluir que, no caso que analisamos, a actividade da mediadora tenha sido totalmente alheia ou irrelevante para a conclusão do contrato. De facto, ainda que a celebração do negócio tenha tido outros contributos – designadamente as negociações efectuadas directamente entre os intervenientes no negócio que conduziram a uma redução do preço que era anunciado pela Autora – a verdade é que foi através das diligências efectuadas pela Autora que os interessados tomaram conhecimento de que aquele imóvel estava à venda, foi por intermédio da Autora que eles visitaram o imóvel e foi em consequência desses factos que eles se interessaram pelo negócio, chegando mesmo a apresentar uma proposta à Autora (de valor inferior ao que estava anunciado) e que foi logo recusada pelos proprietários.

Parece, portanto, que a actividade da Autora se integra de forma idoneamente determinante – como se diz no aludido Acórdão – na cadeia de factos que deram lugar ao negócio pretendido, ainda que não tenha sido a única causa.

Mas será isso bastante para que se possa afirmar que a Autora tem direito à remuneração acordada?

Na nossa perspectiva, isso será bastante sempre que a aproximação das partes outorgantes tenha sido promovida pela mediadora, já que, nesse caso, será indiscutível que a mediadora cumpriu aquela que era a sua obrigação fundamental – angariando um interessado, aproximando-o da outra parte e facilitando, dessa forma, a celebração do negócio – tornando evidente e perceptível para o cliente da mediadora que aquele interessado foi angariado pela mediadora e que a actividade por esta desenvolvida contribuiu (ainda que não exclusivamente) para o negócio que venha a concluir com esse interessado.

O que dizer, porém, nas situações em que a contribuição da mediadora para a celebração do negócio não é perceptível e não é conhecida do seu cliente, designadamente nos casos em que a mediação foi celebrada em regime de não exclusividade?

É que esse contributo da mediadora para a verificação do resultado pretendido (a conclusão do negócio) será apreendido facilmente pelo terceiro que está interessado no negócio já que ele saberá, naturalmente, que foi através da actividade da mediadora e através da publicidade que esta efectuou que tomou conhecimento da possibilidade de negócio, tal como sabe que foi a mediadora quem lhe mostrou o imóvel e sabe, portanto, que foi isso que despoletou o seu interesse na celebração do negócio. Mas, não obstante saber tudo isso, esse interessado, sabendo já – através da actividade da mediadora – da possibilidade de negócio e sendo já conhecedor dos demais elementos e informações que esta lhe prestou, poderá tentar obter, por outra via, a identidade dos proprietários, contactando-os directamente e omitindo o seu contacto com a mediadora, na perspectiva de que, sem a intervenção da mediadora e sem que haja lugar ao pagamento da respectiva remuneração, o negócio venha a ser celebrado por um preço que lhe seja mais conveniente. E, numa situação dessas, o proprietário poderá não ter a percepção de que está a negociar e contratar com um interessado que a mediadora havia angariado, dispondo-se, por isso, a celebrar o negócio por preço inferior, na convicção de que a conclusão do contrato é alheia à actividade desenvolvida pela mediadora e que, como tal, não terá que lhe pagar qualquer remuneração.

Parece-nos, na verdade, que a prestação da mediadora terá que incluir uma efectiva aproximação entre as partes e, portanto, terá que estabelecer o contacto entre elas, o que supõe, naturalmente, a identificação de cada uma delas à outra e a forma ou o local onde poderão encontrar-se para prosseguirem as negociações e pressupondo, no mínimo, que a mediadora entregue ao seu cliente os elementos necessários (identificação e contacto) referentes a potenciais interessados que a tenham contactado a propósito daquele negócio. Importa notar que o cerne da mediação consiste precisamente em promover a aproximação entre os sujeitos de um potencial negócio cuja celebração se tem em vista; a prestação essencial da mediadora consiste, assim, em pôr o seu cliente em contacto com o terceiro que angariou através das acções e diligências que efectuou, promovendo, dessa forma, uma efectiva possibilidade de negociação que possa vir a culminar na celebração do almejado negócio.

 Parece-nos, de facto, que a causalidade que possa existir entre a actuação da mediadora e a conclusão do negócio tem que ser perceptível para o cliente da mediadora, de modo a que, quando celebra o contrato saiba – ou deva saber – que está a contratar com um interessado que foi angariado pela mediadora e que, como tal, a conclusão do contrato implica a obrigação de pagar a remuneração a que se vinculou no contrato de mediação. Ora, se é verdade que a circunstância de ser a mediadora a promover a aproximação e o contacto das partes é perfeitamente idónea para que o seu cliente tome conhecimento de que o interessado com quem vai contratar lhe foi indicado e apresentado pela mediadora e que, como tal, foi por ela angariado, já não se poderá afirmar que o mesmo tem – ou pode ter – esse conhecimento se essa aproximação não for efectuada pela mediadora e se o interessado se apresentar desacompanhado daquela.

Para que a mediadora tenha direito à remuneração acordada não bastará, portanto, que o interessado com quem vem a ser celebrado o negócio a tenha contactado, tal como não basta que o tenha acompanhado numa visita ao imóvel, ainda que tenham sido esse contacto e essa visita que despoletaram nesse terceiro o interesse no negócio que, mais tarde, se veio a concretizar. Para que a mediadora tenha direito à remuneração acordada será ainda necessário que a mediadora tenha apresentado esse interessado ao seu cliente, ainda que seja pelo mero fornecimento da identificação das pessoas que a contactam e às quais proporciona uma visita ao imóvel. Só nesse caso se poderá afirmar que a celebração do negócio foi, de algum modo, propiciada ou facilitada pela aproximação das partes contratantes por parte da mediadora – aproximação essa que, como se referiu, constitui o cerne da sua prestação – e só nesse caso se poderá afirmar que o cliente da mediadora está na posse dos elementos que lhe permitiam ter a percepção de estar a contratar com um interessado angariado por determinada mediadora e de agir e negociar em função dessa realidade.

Não foi isso que aconteceu no caso sub judice.

Com efeito, ainda que os interessados com quem os Réus vieram a celebrar o contrato tenham tido conhecimento do imóvel através das acções promovidas pela Autora, ainda que tenham tido conhecimento das exactas características do imóvel através da visita que a Autora lhes proporcionou e ainda que se admita que foi isso que despoletou o seu interesse no negócio (interesse que os levou a apresentar uma proposta concreta que não foi aceite), a verdade é que a Autora não logrou fazer a prova de que tenha promovido alguma aproximação entre esses interessados e os Réus. Não foi através da Autora que aqueles interessados obtiveram a identificação e contacto dos Réus, mas sim através dos moradores do prédio do qual fazia parte a fracção a vender, e não foi a Autora que promoveu o encontro daqueles interessados com os Réus, sendo que aqueles, através do contacto que haviam obtido, contactaram directamente os Réus. Por outro lado, a Autora nem sequer provou que tenha fornecido aos Réus a identificação destes potenciais interessados no negócio. Importa notar que a Autora tinha como prática elaborar fichas sempre que levava interessados a visitar o imóvel, sendo que essas fichas eram posteriormente assinadas pelos Réus a quem era entregue um duplicado. Todavia, como decorre de documento junto aos autos, a ficha referente à visita efectuada pelo interessado que veio a celebrar o negócio não se encontra assinada pelos Réus e, como decorre da resposta negativa ao ponto 17º da base instrutória, a Autora não provou ter entregue aos Réus a ficha comprovativa dessa visita. Refira-se que, ainda que se provasse, como pretendia a Apelante, que o nome desses interessados havia sido indicado ao Réu no contacto telefónico que havia sido efectuado com o objectivo de lhe dar conta da proposta que os mesmos haviam efectuado, sempre subsistiriam dúvidas relativamente ao facto de a indicação efectuada nesses termos – a propósito de uma proposta cujo valor foi liminarmente recusado – assumir alguma idoneidade para que o Réu retivesse aquele nome a ponto de o reconhecer posteriormente quando aqueles interessados o contactaram, tanto mais que, sendo prática da Autora, a elaboração e entrega de fichas correspondentes às visitas, não existiria qualquer preocupação em reter esse nome por ser previsível que o mesmo viesse a constar das fichas que lhe eram entregues.

Certo é, portanto, que a Autora não logrou fazer a prova de ter efectuado qualquer aproximação entre as partes e tão pouco logrou fazer a prova de ter fornecido aos Réus a identificação daqueles interessados ou qualquer outro elemento que lhes permitisse reconhecê-los como tendo sido angariados pela Autora.

Nessas circunstâncias, e sendo indiscutível que era à Autora que cabia fazer a prova dos factos constitutivos do seu direito, não lhe poderá ser reconhecido o direito à remuneração acordada.

Neste sentido e apontando o superveniente factor de desequilíbrio a que ficaria sujeita a “economia” do contrato, caso se considerasse que a remuneração era devida à mediadora ainda que, por omissão desta, o seu cliente desconhecesse a existência de qualquer contacto entre a mediadora e a pessoa com quem está a contratar, veja-se o Acórdão da Relação de Coimbra de 12/01/2012 (citado na sentença recorrida)[3].

De facto, estando em causa, como se referiu, um contrato de mediação em regime de não exclusividade, nada impedia os Réus de procurarem eles próprios, pelos meios que entendessem, um interessado para o negócio, e, nessas circunstâncias, sendo contactados directamente pelos referidos interessados, desacompanhados da mediadora e sem que tivessem conhecimento (ou, pelo menos, sem que tivesse ficado que o tinham) de que os mesmos já haviam contactado a mediadora e já haviam visitado o imóvel por intermédio desta e não lhes sendo, por isso, exigível que ponderassem a possibilidade de tais interessados terem sido angariados pela Autora, ter-se-ão disposto a negociar e a celebrar o contrato por preço inferior na expectativa de que não iriam pagar qualquer comissão. Nesse circunstancialismo, o pagamento da comissão corresponderia, efectivamente, a uma importante alteração nos pressupostos em que, eventualmente, fundaram a sua decisão de contratar, nos termos em que o fizeram, alteração com a qual não contavam, porquanto não haviam sido oportunamente informados de que aqueles interessados já haviam contactado a Autora e que, em consequência, o contrato que com eles viessem a celebrar implicaria a obrigação de pagamento da comissão à Autora.

Refira-se, aliás, que ficou clara e expressamente consignado no contrato de mediação o seguinte:

Caso a venda do imóvel se venha a concretizar fora do período de vigência deste contrato e a entidade compradora tenha sido formal ou materialmente apresentada pela Mediadora durante o mesmo, ser-lhe-á, a esta, devida a remuneração. (…)”.

De acordo com essa cláusula, caso a venda do imóvel se concretizasse fora do período de vigência do contrato – como aconteceu efectivamente, já que, como resulta da matéria de facto, o contrato de mediação terminou em Maio de 2010 e o negócio visado pela mediação apenas se veio a concretizar em Novembro do mesmo ano – a remuneração apenas seria devida se a entidade compradora tivesse sido formal ou materialmente apresentada pela Autora durante a vigência do contrato de mediação.

Ao contrário do que sustenta a Apelante, a mera circunstância de os compradores terem tido conhecimento do imóvel através da sua actuação não é bastante para integrar a previsão da aludida cláusula, porquanto o que ali se exige é a apresentação (formal ou material) desses compradores aos Réus.

Ora, nada resulta da matéria de facto que permita afirmar que os compradores tenham sido, formal ou materialmente, apresentados aos Réus pela Autora. Não se provou que a Autora tenha promovido qualquer encontro ou reunião entre eles e, independentemente da questão de saber se isso correspondia ou não a uma apresentação formal ou material, nem sequer se provou que a Autora tenha fornecido aos Réus, a qualquer título (seja como potenciais interessados no negócio, seja como meros visitantes do imóvel), a identificação daqueles compradores.

Sabendo que não tinha exclusividade na mediação e querendo prevalecer-se da aponta cláusula para o efeito de exigir a retribuição caso o negócio viesse a ser celebrado com um qualquer interessado por si angariado, deveria a Autora ter acautelado essa possibilidade, apresentando aos Réus os possíveis interessados que a contactavam ou comunicando-lhes, pelo menos, a identificação das pessoas que a contactavam e que, através dela, visitavam o imóvel (procedimento que, aliás, adoptava por regra, através da entrega das fichas de visitas ao imóvel, mas que não provou ter adoptado no que toca ao contacto e visita efectuados pelos concretos interessados que vieram a celebrar o negócio com os Réus).

Em razão do exposto, impõe-se a confirmação da sentença recorrida, improcedendo o recurso.


******

SUMÁRIO (elaborado em obediência ao disposto no art. 663º, nº 7 do Código de Processo Civil, na sua actual redacção):

I – O direito da mediadora à retribuição acordada no âmbito de um contrato de mediação imobiliária pressupõe, por regra e sem prejuízo das excepções previstas na lei, que a mediadora tenha desenvolvido uma concreta actividade no sentido de angariar um interessado para a celebração do negócio, que o negócio visado pelo contrato de mediação tenha sido concretizado e que este negócio tenha sido celebrado com um terceiro angariado pela mediadora, de tal modo que se possa afirmar que a conclusão do contrato foi o resultado da actividade desenvolvida pela mediadora em virtude de esta se integrar na cadeia de factos que deram lugar ao negócio pretendido, ainda que não tenha sido a única causa.

II – Para que a mediadora tenha direito à remuneração acordada não basta, no entanto, que o interessado com quem vem a ser celebrado o negócio a tenha contactado, tal como não basta que o tenha acompanhado numa visita ao imóvel, ainda que tenham sido esse contacto e essa visita que despoletaram nesse terceiro o interesse no negócio que, mais tarde, se veio a concretizar.

III – Para que a mediadora tenha direito a tal remuneração será ainda necessário que tenha apresentado esse interessado ao seu cliente (ainda que seja pelo mero fornecimento da identificação das pessoas que a contactam e às quais proporciona uma visita ao imóvel) ou que, de qualquer forma, tenha potenciado ou facilitado o contacto entre ambos, promovendo a sua aproximação, já que é este o cerne da mediação e o conteúdo essencial da prestação a que se obrigou pelo contrato de mediação.

IV – Assim, se, no âmbito de um contrato de mediação em regime de não exclusividade, o proprietário do imóvel celebra o negócio visado na mediação com um terceiro que o contacta directamente, não obstante já ter contactado a mediadora e visitado o imóvel por intermédio desta, e não tendo ficado provado que tenha sido a mediadora a apresentar – por qualquer meio – esse interessado ao seu cliente ou que a mediadora tenha informado oportunamente o seu cliente de que tal interessado a havia contactado e que, por intermédio dela, havia visitado o imóvel e não estando sequer provado que, à data da celebração do negócio, o proprietário (cliente da mediadora) tivesse conhecimento daquele contacto e visita, não estão reunidos os necessários pressupostos para que possa ser reconhecido à mediadora o direito à retribuição acordada no contrato de mediação.


/////

V.
Pelo exposto, nega-se provimento ao presente recurso e, em consequência, confirma-se a sentença recorrida.
Custas a cargo da Apelante.
Notifique.

Maria Catarina Ramalho Gonçalves (Relatora)

Maria Domingas Simões

Nunes Ribeiro


[1] Cfr. neste sentido e entre outros, os Acórdãos do STJ de 27/05/2010 e de 15/11/2007, processos  nºs  9934/03.0TVLSB.L1.S1e 07B3569, respectivamente e os Acórdãos da Relação do Porto de 01/07/2014, proc. nº 19005/12.2YIPRT.P1, de 03/04/2014, proc. nº  247773/11.9YIPRT.P1e  de 20/09/2001, nº convencional JTRP00030913, todos disponíveis em http://www.dgsi.pt.
[2] Disponível em http://www.dgsi.pt.
[3] Proferido no processo nº 486/10.5T2OBR.C1 e disponível em http://www.dgsi.pt