Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
903/11.7TBFND.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: MARIA DOMINGAS SIMÕES
Descritores: ACÇÃO PAULIANA
REQUISITOS
ÓNUS DA PROVA
Data do Acordão: 03/10/2015
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE CASTELO BRANCO - CASTELO BRANCO - INST. CENTRAL - SECÇÃO CÍVEL - J2
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ART.º 5.º DO NCPC E ART.º 610.º, 611.º DO CÓDIGO CIVIL
Sumário: I. O art.º 5.º do NCPC, continua a fazer recair sobre as partes o ónus da alegação dos “factos essenciais que constituem a causa de pedir e [d]aqueles em que se baseiam as excepções invocadas” (vide n.º 1).

II. Valendo assim plenamente o princípio da disponibilidade objectiva no que respeita a estes factos, vedada está ao tribunal a sua consideração quando não tenham sido alegados pelas partes.

III- Objecto da acção pauliana são os actos dos quais resulte diminuição da garantia patrimonial do crédito, exceptuados os de natureza pessoal, sendo requisitos gerais de procedência, nos termos do art.º 610.º do Código Civil: a anterioridade do crédito ou, tratando-se de acto anterior, quando se prove que foi realizado dolosamente com o fim de impedir o direito do futuro credor (vide al. a); resultar do acto para o credor a impossibilidade de facto de satisfazer integralmente o seu crédito mediante execução, ou o agravamento dessa impossibilidade, tendo por referência a data do acto impugnado (al. b).

IV. Demonstrada a anterioridade do crédito, dispensada estava a credora de fazer prova do dolo do devedor (cf. art.º 610.º, al. a), irrelevando do mesmo passo a ausência de má-fé, quer do transmitente, quer do donatário adquirente, consoante resulta do art.º 612.º, n.º 1, na sua parte final.

V. Demonstrados pela credora a existência e montante do seu crédito, aos RR devedores e terceiro beneficiado incumbia provar que, depois do acto, os primeiros dispunham ainda no seu património de bens penhoráveis suficientes para solver aquele crédito, consoante resulta da repartição do ónus da prova consagrada no art.º 611.º.

VI. A suficiência do património que releva para o assinalado efeito é a que respeita ao devedor, irrelevando que outros devedores solidários tenham no seu património bens bastantes para assegurarem o pagamento da dívida.

Decisão Texto Integral:
Processo n.º 903/11.7TBFND.C1

Documentos de fls. 166 a 233: Nada tendo a ver com os presentes autos, tendo a sua junção ficado a dever-se a manifesto lapso da autora, conforme deu conta ao Tribunal através do seu requerimento de fls. 235 (cf. ainda fls. 348), desentranhe e restitua à apresentante.

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I – Relatório
Caixa A..., c.r.l., com sede na Rua (...) , no Fundão, instaurou acção declarativa constitutiva contra B... e mulher, C..., residentes na (...) , Fundão, e D... , solteiro, maior, a residir na Travessa (...) Fundão, pedindo a final que, na procedência da acção, fosse decretada a ineficácia em relação à autora da doação efectuada pelos primeiros ao segundo réu, tendo por objecto o imóvel identificado na escritura outorgada no dia 4 de Janeiro de 2007, devendo ser ordenada ao réu adquirente a restituição do aludido bem, de modo a que a autora se possa fazer pagar à custa do mesmo ou, no caso de o haver alienado, a restituição do respectivo valor.
Em petição inicial aperfeiçoada alegou, em síntese, que no desenvolvimento da sua actividade bancária, concedeu aos 1.ºs RR, em 20/3/2008 e 23/4/2009, empréstimos nos valores de, respectivamente, €38 500,00 e €71 000,00, ambos vencidos no ano de 2010, encontrando-se em dívida os montantes de €19 627,75 no que respeita ao primeiro e € 82 903,26 atinente ao segundo, pendendo acções executivas tendentes à cobrança coerciva das referidas quantias.
Os mesmos RR, na qualidade de sócios-gerentes, avalizaram livranças titulando empréstimos concedidos às sociedades E... , Lda., e F..., Lda., nos montantes de €40 300,00 e €314 000,00 os concedidos à primeira, e €354 000,00 o contraído pela segunda, igualmente vencidos no ano de 2010, encontrando-se igualmente pendentes acções executivas tendo em vista a cobrança coercitiva dos montantes em dívida.
Mais alegou que os discriminados empréstimos se destinaram ao pagamento de outros anteriormente contraídos, os quais identificou, contratos todos eles celebrados em data anterior ao ano de 2007, de modo que aqueles não se traduziram na disponibilização efectiva de quaisquer quantias mas antes na reformulação de dívidas já vencidas.
Sendo deste modo os 1.ºs RR devedores à demandante do montante global de €931 402,46, fizeram doação ao 2.º réu, seu filho, do imóvel identificado em escritura outorgada em 4/1/2007 -no qual residiam e onde, aliás, continuaram a residir após a celebração do dito negócio- assim alienando aquele que era o mais valioso dos bens que integravam o seu património. Actuaram os devedores com a clara intenção de obstar a que a autora pudesse satisfazer efectiva e integralmente o seu crédito, resultado que se veio a verificar, uma vez que os bens que integram o seu património, em razão dos ónus que sobre os mesmos incidem, não chegam para garantir nem metade do montante global em dívida, com o que se acham reunidos os requisitos da impugnação pauliana.
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Regularmente citados, contestaram todos os RR em peça única, na qual contrariaram o alegado pela autora quanto à circunstância dos empréstimos aqui em causa terem resultado, todos eles, da reestruturação e consolidação da dívida proveniente de outros contratos de mútuo anteriormente celebrados. Por assim ser, tendo o negócio objecto de impugnação sido celebrado em data muito anterior, falece um dos requisitos exigidos pela lei, precisamente o da anterioridade do crédito.
Mais impugnaram o montante que pela autora foi indicado como estando em dívida, tendo ainda invocado a existência, no património da devedora F..., Lda., de bens imóveis em montante mais do que suficiente para assegurar o pagamento das responsabilidades por esta assumidas perante a demandante.
 Alegaram finalmente que por sentença proferida no âmbito do processo 278/10.1 TBFND, transitada em julgado em 14/10/2010, foi declarada a insolvência da devedora E..., Lda., ali tendo a autora reclamado créditos no valor global de € 367 257,93, nele se incluindo o montante de €314 000,00 titulado pela livrança avalizada pelos primeiros RR. Tendo tal crédito sido reconhecido e graduado pelo Tribunal como crédito privilegiado, defenderam não lhes poder ser imputada a responsabilidade pelo seu pagamento, posto que garantido por hipoteca incidente sobre o imóvel onde a insolvente tinha a sua sede social e instalações fabris.
Finalmente aduziram que sendo o valor do imóvel doado manifestamente irrelevante para os efeitos pretendidos pela autora, sempre a acção, em seu entender, teria que improceder.
A autora replicou, mantendo o alegado.
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Dispensada a realização da audiência preliminar, prosseguiram os autos com selecção dos factos assentes e organização da base instrutória, peça a que veio a ser aditado no decurso da audiência de julgamento, por nisso terem as partes acordado, um novo artigo, a par da alteração da redacção do art.º 17.º, na qual igualmente acordaram, conforme consignado nas actas que fazem fls. 528 a 532 e 784 a 786 dos autos.
Teve lugar audiência de discussão e julgamento com observância do legal formalismo que da acta consta, em cujo termo veio a ser proferida sentença que, na improcedência da acção, absolveu os RR do pedido.
Inconformada, apelou a autora e, tendo apresentado as necessárias alegações, rematou-as com as seguintes conclusões:
“1.ª A MM Juiz “a quo” errou na valoração que deu à prova testemunhal produzida sobre o quesito 16.º da base instrutória.
2.ª De facto, dos dois únicos depoimentos relativos ao referido quesito só poderá resultar um julgamento de provado;
3.ª Atendendo a que um deles assim o considerou e o segundo considerou num primeiro momento que haveria um prédio de igual valor, mas quando referida a existência duma hipoteca, referiu que esta lhe retirava valor.
4.ª A MM Juiz “a quo” errou ainda ao considerar provado, principalmente como o fez, o quesito 17.º da base instrutório.
5.ª De facto, nunca a MM Juiz a quo poderia considerar provado que na data da doação impugnada nos presentes autos os 1.ºs RR possuíam património imobiliário onerado com garantias para assegurar o pagamento das suas responsabilidades.
6.ª Isto porque simplesmente os 1ºs RR nada alegaram a esse respeito.
7.ª Mas nem tão pouco poderia considerar provado que a empresa F... Lda. possuía património imobiliário onerado com garantias para assegurar o pagamento das suas responsabilidades.
8.ª Atendendo a que nenhum depoimento foi prestado quanto a esta matéria que fosse suficientemente claro ou sólido para dele retirar tal certeza.
9.ª E depois porque estamos perante matéria apenas susceptível de ser provada com documentos – certidões de registo predial, avaliações e outras.
10.ª Errou ainda a MM Juiz a quo ao fundamentar a douta sentença ora recorrida em dois factos:
11.ª Porque a Autora e aqui Recorrente não provou que do acto impugnado resultou a impossibilidade total ou parcial da Autora satisfazer o seu crédito, nem provou que os 1ºs RR agiram com o intuito de impedir a Autora de satisfazer o seu crédito.
12.ª A aqui recorrente entende que não teria que provar nenhum deles.
13.ª Primeiro porque a prova da existência do crédito e da sua anterioridade relativamente à doação faz presumir que do acto resulta a impossibilidade total ou parcial da Autora satisfazer o seu crédito.
14.ª Depois porque a má-fé dos RR é irrelevante, atendendo a que o acto impugnado constitui uma doação.
15.ª Assim, provada que foi a existência do crédito da Autora e a sua anterioridade relativamente ao acto impugnado, teriam que ser os primeiros RR a alegar que possuíam bens de valor igual ou superior ao das dívidas – e não o fizeram.
16.ª Alegaram apenas que a sociedade comercial com a firma F... Lda. possuía bens de valor igual ou superior ao das dívidas.
17.ª Não tendo feito qualquer prova do assim alegado, pois não apresentaram nenhum documento idóneo do qual se concluísse isso mesmo, nem os depoimentos prestados foram suficientemente sólidos para que deles se pudesse extrair tal conclusão.
18.ª Sendo que, ainda que tal prova tivesse sido realizada, teria ainda assim a presente acção de proceder pois os 1ºs RR não alegaram que possuíam bens de valor igual ou superior ao das dívidas.
19.ª Não o tendo feito, presume-se que do acto impugnado resultou a impossibilidade total ou parcial da Autora cobrar o seu crédito.
20.ª Foram assim violadas as seguintes normas: artigos 607.º, nº. 4 e 5º, nº. 3, do Código de Processo Civil, 610.º a 612.º do Código Civil”.
Com os aludidos fundamentos, pugnaram pela revogação da decisão proferida e sua substituição por outra que julgue a presente acção totalmente procedente.
Contra alegaram os recorridos, pugnando naturalmente pela manutenção do decidido
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Assente que pelo teor das conclusões se define e delimita o objecto do recurso, as questões submetidas à apreciação deste Tribunal são as seguintes:
i. da impugnação da matéria de facto:
ii. da verificação dos requisitos da pauliana, estando em causa um acto de natureza gratuita e do erro de julgamento quanto à repartição do ónus da prova respectiva.
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i. A apelante impugnou a matéria de facto, no que respeita às respostas que mereceram os artigos 16.º e 17.º.
Perguntava-se nos artigos em causa:
Art.º 16.º:
O prédio referido em D) [prédio rústico sito em (...) , (...) e (...) , composto de pomar de pessegueiros e pomar de cerejas, com a área de 5 mil metros quadrados, inscrito na matriz sob o artigo 295º e descrito na CRP do Fundão sob o n.º 374][1] era o bem mais valioso de que os RR eram proprietários?
Art.º 17.º (com o seguinte teor, na sequência da modificação que por acordo das partes lhe foi introduzida já em sede da audiência de discussão e julgamento):
A firma “ F... possui e possuía, na data da escritura de doação, património imobiliário no valor de, pelo menos, €8 040 020,49 para assegurar o pagamento das suas responsabilidades?
Ao assim perguntado deu a Mm.ª juíza “a quo” as respostas de, respectivamente, “Não provado” e “Provado que os 1.ºs RR. e a sociedade F..., Lda., na data da celebração da escritura de doação supra referida, possuíam património imobiliário, onerado com garantias, incluindo à A., para assegurar o pagamento das suas responsabilidades.”
Em sede de motivação, e para o que ora releva, justificou a Mm.ª juíza a convicção alcançada pelo seguinte modo:
“De salientar a vasta documentação junta aos autos, nomeadamente bancária e registral, essencialmente para prova do tipo de operações bancárias havidas entre A. e RR., no âmbito dos vários mútuos celebrados entre ambas, e em que estes intervieram, ainda património imobiliário dos RR.
Dos depoimentos das várias testemunhas salientam-se, criticamente, e sem pretensões de os reproduzir integralmente, apenas alguns aspectos mais pertinentes.
Do rol apresentado pela A. foram ouvidos:
I..., coordenador geral desta, desde 1986
(…) Em 2007, o R. tinha outros bens, nomeadamente:
Fls. 134 e ss. – Quinta do (...) avaliada em 2008 em 1.100.000,00 Euros, hipotecado por empréstimo de cerca de 800.000,00 Euros; vendida posteriormente.
Fls. 140 e ss. – Lotes avaliados em 150.000,00 Euros, em 2008.
Já foi paga cerca de metade da dívida, desde 2007, também porque certos imóveis na venda não tiveram a rentabilidade expectável, por exemplo, o imóvel onde laboravam os trabalhadores, que entrou em processo de falência, e no qual estes tiveram privilégio creditório, para além do valor da venda ter sido inferior ao da avaliação.
G..., responsável de balcão da A., desde 1995, actualmente faz parte da administração, apresentou um depoimento similar ao anterior.
J..., desde 1991, no departamento de crédito da A., apresentou um depoimento similar aos anteriores. Acrescentando que: considera o R. pessoa séria; o imóvel objecto da doação, em 2007, não era o bem mais valioso do património dos RR.
Indicados pelo RR. foram ouvidos:
(…)
H..., amigo dos RR. há cerca de 20 anos, e sempre com convívio muito próximo e frequente.
A doação foi feita para compensar o filho, já que à filha haviam doado uma casa em Lisboa, e faziam tenções de doar ainda uma outra.
A R. mulher não gostava de viver no imóvel objecto da doação, situado fora da cidade, até mesmo porque não conduzia; pensava vir morar para aqui, mais precisamente na avenida, numa fracção de imóvel ali construído pelo R. marido e adaptado pela R. mulher; trata-se de um duplex luxuoso. Terá o mesmo valor do imóvel objecto da doação.
Em 2007 os RR. tinham um património considerável, constituído, além do mais, pela quinta do (...) , escritórios, loja na Av.ª (...) , fracções no Souto da Casa, fracções na Praça Velha, na cidade do Fundão, fracções na Covilhã, e lotes para construir. Não se levantava sequer a hipótese do “império desmoronar”.
Tinham algumas dificuldades de tesouraria, mas com património muito superior, daí as garantias reais prestadas à CGD, CCAM Fundão e Sabugal, Totta e outros bancos. A crise só começou em finais de 2008, e o património imobiliário estaria avaliado em cerca de 500.000,00 Euros. Mesmo com 2 hipotecas à CGD no valor de 100.000,00 Euros o património era suficiente para pagar todas as dívidas.
Neste contexto, e relativamente à matéria de facto não provada, não foi feita qualquer prova, testemunhal ou outra, convincente”.
Argumenta a apelante que o artigo 16.º merecia resposta positiva, atentos os testemunhos prestados por G... e H..., únicas testemunhas que a tal matéria se reportaram, nas passagens que situa. Defenderam os apelados a decisão, invocando os depoimentos das testemunhas I..., G... e J..., sublinhando ainda a importância do documento de fls. 134 e seguintes.
Antes de mais, cumpre precisar que o momento relevante pressuposto no artigo em causa é obviamente o da doação, acto que a apelante pretende impugnar. E assim sendo, a verdade é que do documento de fls. 134 a 139, ao qual os apelados aludem na contra alegação e que a Mm.ª juiz também mencionou na motivação -relatório de avaliação imobiliária da responsabilidade da própria apelante- resulta que, com referência a Dezembro de 2008, o prédio rústico denominado Quinta do (...) , inscrito a favor de ambos os RR, foi avaliado em €1 800 000,00, constando do mesmo relatório que “a certidão de teor facultada, completa, com duas páginas, sem data de emissão, possui averbadas duas hipotecas e uma servidão administrativa”.
Acresce que, ouvido na sua totalidade o depoimento do indicado G..., testemunha que exerceu funções de gerente no balcão do Fundão durante vários anos, foi a mesma peremptória na afirmação de que, com referência a 2007, a referida Quinta do (...) era prédio que “valia muito dinheiro, mais do que a vivenda” tendo os RR, com a sua venda, feito entrega à apelante de elevada quantia em dinheiro. É certo que a mesma testemunha, convidada pela Mm.ª juiz a fazer um exercício comparativo entre o valor da vivenda doada e um apartamento no Fundão, declarou atribuir maior valor à primeira. Todavia, a tal opção, quando o opinante reconheceu desconhecer a vivenda e não ter experiência em avaliações, sendo certo que nada se especificou quanto às características do tal apartamento, não pode obviamente atribuir-se o valor pretendido pela apelante.
No que se refere ao igualmente convocado testemunho prestado por H..., advogado de profissão e amigo chegado dos 1.ºs RR desde há mais de 20 anos, também ele aludiu a uma diversidade de bens que, com referência à data relevante, seriam, em seu entender, bastantes para solver as responsabilidades daqueles. Todavia, a propósito das declarações prestadas por esta testemunha impõe-se referir que não distinguiu de modo claro entre os bens que integrariam o património dos RR e aqueles que fariam parte do património das sociedades por eles geridas. Veja-se, a título de exemplo, e à semelhança aliás do que ocorreu com a Mm.ª juiz, a referência a uns lotes sitos em Flandres, Covilhã, quando pelo menos em relação ao lote a que se reportam fls. 140 e seguintes, mencionado na motivação, dos documentos referenciados resulta claro que a proprietária do mesmo era a sociedade F..., Lda., e não os 1.ºs RR.
De todo o modo, convidada a testemunha a dizer qual dos bens, em seu entender, seria mais valioso -se a vivenda doada, se a fracção autónoma de que os 1.ºs RR eram proprietários na cidade do Fundão- ressalvando a sua inabilitação como avaliador, acabou por dizer que tal dependia da preferência dos eventuais compradores, atribuindo, ainda assim, valor idêntico a um e outro imóveis, justificando tal equivalência com a circunstância da fracção em causa ter boa localização, excelente área e acabamentos que qualificou de luxuosos. E se é verdade ter reconhecido que a existência de hipotecas sobre esta última, se não pagas as quantias em dívida, é susceptível de afectar negativamente o seu valor de venda, certo é também que a testemunha desconhecia a natureza e valor de tais eventuais ónus.
Sendo esta a prova convocada pela apelante nem valerá a pena recorrer aos depoimentos invocados pelos apelados, por serem aqueles manifestamente insuficientes para que se conclua pela existência de erro de julgamento; pelo contrário, atento o teor da questão colocada no artigo em causa -que apelava à totalidade do património dos RR, incluindo portanto a mencionada Quinta do (...) - nada nos indicados meios de prova evidencia que a resposta devesse ter sido outra, mantendo-se assim a de não provado, por manifestamente adequada à prova produzida.
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No que respeita à resposta que mereceu o art.º 17.º, acusa-a a apelante de excessiva, por em lado algum os RR terem alegado serem eles próprios possuidores de património com valor suficiente para o pagamento das suas responsabilidades. Mais alega ser a prova produzida a este respeito insuficiente para que se dê como provado o facto em causa, ainda que limitado à sociedade F..., Lda., única a que se reportavam os termos da alegação, porquanto, tendo algumas testemunhas aludido efectivamente à suficiência do património desta, necessário seria que os bens em causa se mostrassem concretamente identificados e avaliados, com junção das pertinentes certidões registrais e apuramento rigoroso dos ónus que sobre os mesmos recaíam, o que não ocorreu.
Apreciemos, pois, este fundamento de impugnação.
No art.º 27.º da contestação os RR haviam alegado que “(…) A sociedade F... possuía e possui ainda, património imobiliário mais do que suficiente que assegura o pagamento das responsabilidades que esta tem para com a autora”.
Não obstante o assim alegado, face à apresentação posterior do requerimento de fls. 90[2] e documentos que o acompanhavam, o art.º 17.º da base instrutória, que acolheu a alegação, foi formulado em termos algo diversos, aí se questionando se “A firma F... possui ainda património imobiliário no valor de, pelo menos, €1 208 139,24 para assegurar o pagamento das suas responsabilidades” (é da nossa responsabilidade o destaque em itálico).
Já em sede de audiência de discussão e julgamento, no reconhecimento de que o momento relevante para se aquilatar do valor do património do devedor é o da prática do acto prejudicial ao credor foi, por acordo, alterada a redacção do artigo em causa, nele se perguntando, na sua formulação definitiva, se “A firma F... possui e possuía na data da escritura de doação, património imobiliário no valor de, pelo menos €8 040 020,29 para assegurar o pagamento das suas responsabilidades”. E foi à pergunta assim formulada que a Mm.ª juiz deu a resposta ora impugnada, cujo teor aqui se relembra “Provado que os 1.ºs RR. e a sociedade F..., Lda., na data da celebração da escritura de doação supra referida possuíam património imobiliário, onerado com garantias, incluindo à A., para assegurar o pagamento das suas responsabilidades.”
Resulta da transcrição vinda de fazer que entre o artigo da base instrutória em causa -que acabou por acolher, em essência, os termos da alegação- e a resposta que lhe foi dada, existe uma diferença substancial, por nesta ter sido incluída a menção aos 1.ºs RR, sendo certo que, conforme a apelante sublinha, nada tinha sido alegado na contestação quanto à existência de bens no património destes últimos capazes de assegurarem o pagamento da dívida. Ademais, faz-se notar, referindo-se a resposta dada à existência de bens no património dos 1.ºs RR e da sociedade F..., Lda., sem discriminação daqueles que integravam à data o património de uns e outros e respectivos valores, dela não poderia validamente extrair-se que o património dos primeiros fosse, por si, suficiente para assegurar o pagamento das dívidas à autora, credora impugnante.
De todo o modo, admitindo que tal facto -a existência de bens no património dos 1.ºs RR- possa ter emergido da prova produzida nos autos, cabe contudo indagar dos limites à sua consideração, atento o princípio do dispositivo -enquanto “liberdade das partes na decisão de propositura da acção e sobre os exactos limites do seu objecto (tanto quanto à causa de pedir e pedidos, como quanto às excepções peremptórias) (…)”[3]- que ainda vigora claramente na nossa lei processual civil (cf. o art.º 3.º e n.º 1 do art.º 5.º do NCPC).
O citado art.º 5.º, epigrafado de “Ónus de alegação das partes e poderes de cognição do tribunal”, continua a fazer recair sobre as partes o ónus da alegação dos “factos essenciais que constituem a causa de pedir e [d]aqueles em que se baseiam as excepções invocadas” (vide n.º 1). Os factos essenciais que constituem a causa de pedir devem ser alegados pelo autor na petição inicial e, mantendo-se o princípio de que toda a defesa deve ser deduzida na contestação, também o réu está obrigado a alegar nesta peça os factos essenciais que consubstanciam as excepções. Tal é o regime normativo que resulta do disposto nos art.ºs 552.º, 572.º, al. c) e 573.º, n.ºs 1 e 2 do NCPC e que, de resto, nenhuma alteração de relevo introduziu no regime cessante (cf. art.ºs 264.º, n.º 1 e 664.º, 2.ª parte do CPC cessante), posto que se mantém o efeito preclusivo quanto aos factos essenciais. Valendo assim plenamente o princípio da disponibilidade objectiva no que respeita a estes factos, vedada está ao tribunal a sua consideração quando não tenham sido alegados pelas partes[4].
No caso em apreço, sendo a presente acção de caracterizar como de impugnação pauliana, consoante resulta do disposto no art.º 611.º, este do Código Civil, recai sobre o devedor ou terceiro interessado na manutenção do acto o ónus da prova de que o obrigado possui, após a prática do mesmo, bens penhoráveis de valor igual ou superior ao montante da dívida. Tratando-se inequivocamente de facto de natureza exceptiva, essencial portanto à defesa dos demandados, sobre estes recaía o ónus da respectiva alegação (art.º 264.º, n.º 1 do CPC 1961 em vigor à data da apresentação da contestação e 5.º n.º 1 do NCPC). Deste modo, e em síntese, não tendo o facto sido alegado, vedada estava ao Tribunal a sua consideração, conforme com razão defende a apelante. Daí que se imponha a restrição do aludido ponto da matéria de facto, de modo a conformá-lo com os termos da respectiva alegação, eliminando-se a referência aos 1.ºs RR.
Não obstante, pretende a apelante que mesmo limitada à sociedade F..., Lda., a resposta dada não encontra apoio na prova produzida, por insuficiente, dado que, argumenta, “não foram alegadas ou sequer provadas as responsabilidades desta sociedade; não está identificado o património com referência a certidões de registo predial; não consta dos autos qualquer avaliação credível a esse património; não estão identificados os montantes dos ónus inscritos sobre os prédios em causa, o que lhes altera o valor.”
Considerando o teor do facto ora impugnado, parecem justas as objecções opostas pela recorrente, sendo de lhe reconhecer razão, ainda que não inteiramente.
Com vista a fazer prova do perguntado procederam os apelados à junção aos autos, já no decurso da audiência, de diversas certidões de teor relativas a prédios cujo valor patrimonial, no seu conjunto, ultrapassava os € 8 000 000,00 e cujo titular seria a sociedade F..., isto tendo por referência o ano de 2007.
Ora, para lá de, efectivamente, apenas em relação a meia dúzia de prédios constar actualmente como titular a referida sociedade, aceitando, conforme esclarecem os apelados, que tal se ficou a dever à circunstância dos imóveis em causa terem sido entretanto vendidos a terceiros -o que seria até do conhecimento da apelante, atendendo a que uma parte do produto das vendas foi afectada ao pagamento de créditos dos quais era titular- a verdade é que, efectivamente, não se conhecem os ónus que sobre as mesmas fracções incidiam, sendo certo que, conforme decorre da audição das testemunhas, garantiriam créditos de outras instituições bancárias, nomeadamente da CGD e Banco Totta & Açores. De todo o modo, do que não há dúvida é que no ano de 2008 foi constituída hipoteca para garantia de um crédito da apelante sobre a dita sociedade até ao montante de €157 500,00, a qual incidiu sobre o prédio urbano correspondente ao lote de terreno para construção urbana designado por lote n.º 22, sito em Flandres, freguesia da Conceição, concelho da Covilhã, de que a dita F... era ainda a proprietária, tal como resulta da escritura de rectificação cuja cópia consta de fls. 140 a 142 dos autos, documento não impugnado.
Deste modo, e independentemente da relevância do facto, de que por ora se não curará, em conformidade com a prova constante dos autos e a que se fez referência, altera-se a resposta ao artigo em causa, que passará a ser a seguinte: “Provado apenas que à data da escritura de doação, a sociedade F..., Lda. era a titular do rendimento de diversos imóveis, cujo valor patrimonial global ascendia a cerca de € 8 000 000,00, tendo sido constituída em data posterior pelo menos uma hipoteca a favor da autora para garantia de um crédito no montante máximo de €157 500,00 incidindo sobre um dos mencionados prédios”.
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II. Fundamentação
De facto
Estabilizada a matéria de facto, é a seguinte a factualidade a atender:
1. A A. é uma instituição de crédito, dedicando-se à prática de todos os actos típicos da actividade bancária (al. A).
2. Os primeiros Réus, na qualidade de sócios-gerentes das sociedades comerciais com as firmas F... Lda. e E... Lda. avalizaram livranças que titulam os seguintes mútuos:
a) celebrados com a sociedade F... Lda.
- €40.300,00 (quarenta mil e trezentos euros), concedido em 30-06-2009, identificado nos serviços internos da Autora com o nº. 59062834723.
- €314.000,00 (trezentos e catorze mil euros), concedido em 23 de Abril de 2009, identificado nos serviços internos da Autora com o nº. 58018768227.
b) celebrado com a sociedade E...Lda.
- €354.000,00 (trezentos e cinquenta e quatro mil euros), concedido em 23 de Abril de 2009, identificado nos serviços internos da Autora com o nº. 58018766639 (al. B).
3. Os mútuos referidos em 2. encontram-se vencidos desde 30 de Junho de 2010, 23 de Abril de 2010 e 23 de Abril de 2010, respectivamente (al. C).
4. No âmbito da sua actividade e mediante proposta dos primeiros Réus, a Autora concedeu-lhes, em 20.03.2008, o mútuo no valor de €38.500,00 identificado nos serviços internos da Autora com o n.º 56041805025 (resposta ao art.º 1.º da base instrutória).
5. O qual serviu, essencial e maioritariamente, para pagar outro, previamente concedido aos dois primeiros RR em 26.09.2007, no montante de €23.000,00 que, por sua vez, serviu para pagar parcialmente uma prestação no valor de €37.662,93 do mútuo identificado nos serviços internos da Autora com o n.º 56034691502, que àqueles havia igualmente sido concedido em 10.02.2006 (resposta ao art.º 2.º da BI).
6. E ainda um outro, concedido aos mesmos RR em 20.10.2007, no montante de €22.000,00, o qual, por sua vez, serviu para pagar uma prestação de €23.931,05 do mútuo identificado nos serviços internos da Autora com o nº. 59006705040, concedido igualmente aos primeiros Réus em 24.10.1997 (resposta ao art.º 3.º da BI).
7. De igual forma, no âmbito da sua actividade e mediante proposta dos primeiros Réus, a Autora concedeu-lhes em 23.04.2009 o mútuo no valor de €71.000,00, identificado nos serviços internos da Autora com o nº. 58018765523 (resposta ao art.º 4.º da BI).
8. O qual serviu, essencial e maioritariamente, para pagar o mútuo nº. 56040163590, concedido aos dois primeiros RR em 4.10.2007, no montante de €65.000,00, o qual, por sua vez, serviu para pagar uma prestação no valor de €3 362,37 do mútuo nº. 56039240577, concedido aos primeiros Réus em 29.06.2007, a prestação de um mútuo concedido em 29.03.2006 à sociedade F... Lda., no valor de €4.688,83, empréstimo garantido por aval dos primeiros Réus, e ainda quatro letras descontadas à E... Lda., todas depois de Janeiro de 2007, no valor global de €43.920,01, as quais se encontravam avalizadas pelos primeiros RR (resposta ao art.º 5.º).
9. E ainda para pagar o empréstimo nº. 56033217102, no montante de €17.431,85, concedido aos primeiros Réus em 2.09.2005 (resposta ao art.º 6.º).
10. O primeiro dos mútuos referenciados em 2. serviu essencial e maioritariamente para pagamento de várias letras descontadas a pedido da sociedade comercial com a firma F... Lda., todas depois de Janeiro de 2007, no montante global de €40.334,41, as quais se encontravam avalizadas pelos primeiros RR (resposta ao art.º 7.º).
11. O segundo dos mútuos referenciados em 2. serviu essencial e maioritariamente para pagar os seguintes mútuos:
-n.º 59061280588, no valor de €19.887,92, concedido em 16.12.2008 e garantido por aval dos primeiros Réus; que por sua vez serviu para pagar uma prestação do mútuo nº. 59059621094 no valor de €20.830,76, concedido em 30.05.2008 e também avalizado pelos primeiros Réus o qual, por seu turno, servira para pagar parcialmente dois mútuos com os nºs. 56040072470 e 56040970031, no valor global de €28.721,24, concedidos em 26.09.2007 e 31.12.2007, respectivamente; o primeiro destes, por sua vez, foi concedido para pagamento do mútuo nº. 56035592583, no montante global de €89.254,18, também concedido à sociedade F... Lda. em 19.05.2006 e também garantido por aval dos primeiros Réus;
-n.º 56040970031, no valor de €197.348,83, concedido em 31.12.2007 e igualmente avalizado pelos primeiros Réus; que por sua vez serviu para liquidar o mútuo n.º 56035131103, no montante de €219.485,58, concedido em 29.03.2006 e igualmente avalizado pelos primeiros Réus;
-n.º 56040072470, no valor de €54.267,27, concedido em 26.09.2007, também avalizado pelos primeiros Réus, que serviu para pagar um mútuo no montante de €89.254,18, concedido em 19.05.2006 e igualmente avalizado pelos primeiros Réus;
-n.º 56042616971, no valor de €33.460,97, concedido em 5.06.2008, igualmente garantido por aval dos primeiros Réus (resposta ao art.º 8.º).
12. O terceiro dos mútuos referenciados em 2. serviu essencial e maioritariamente para pagar os seguintes mútuos:
-n.º 59061281210, no valor de €13.004,54, concedido em 16.12.2008 e avalizado pelos primeiros Réus, o qual, por sua vez, servira para pagar o mútuo n.º 59059615911, no valor de €13.593,08, concedido em 30.05.2008 e igualmente avalizado pelos primeiros Réus, que servira para pagar uma prestação de cada um dos mútuos nºs. 56037126127 e 56040953335, no valor global de €19.743,93, o primeiro concedido em 15.11.2006 e o segundo em 28.12.2007, ambos garantidos por aval dos primeiros Réus; sendo que este último serviu para pagar o mútuo nº. 56035132788, no valor de €254.043,93, concedido em 29.03.2006 e também garantido por aval dos primeiros Réus;
-n.º 56041445331, no montante de €88.392,25, concedido em 20.02.2008 e garantido pelo aval dos primeiros Réus, que serviu para pagar o mútuo n.º 56039664029, concedido em 09.08.2007, no valor de €88.891,93, garantido por aval dos primeiros Réus o qual, por sua vez, serviu para pagar o mútuo nº. 56034557462, no montante de €90.919,69, concedido em 27.01.2006 e garantido por aval dos primeiros Réus;
-n.º 56040953335, concedido em 28.12.2007, no valor de €241.437,37, também avalizado pelos primeiros Réus, o qual serviu também para pagar o mútuo nº. 56035132788, no valor de €254.043,93, concedido em 29.03.2006 e igualmente garantido por aval dos primeiros Réus;
-n.º 56037126127, no valor de €24.141,31, concedido em 15.11.2006 e garantido por aval dos primeiros (resposta ao art.º 9.º).
13. Em resultado de qualquer um destes empréstimos, os mutuários em causa ficaram com as quantias à sua disposição, após o respectivo crédito em conta (resposta ao art.º 10.º).
14. Os dois primeiros mútuos referidos em 2. apresentam como saldo em dívida a quantia de €410.489,03 (resposta ao art.º 14.º).
15. O terceiro mútuo aí referido apresenta como saldo em dívida a quantia de €418.382,42 (resposta ao art.º 15.º).
16. No dia 4 de Janeiro de 2007, Cartório Notarial do Fundão a cargo do Notário Dr.M..., os primeiros Réus declararam doar ao seu filho, aqui segundo Réu, por conta da quota disponível deles doadores, o prédio rústico sito em (...) , (...) e (...) , composto de pomar de pessegueiros e pomar de cerejas, com a área de 5 mil metros quadrados, inscrito na matriz sob o artigo 295º e descrito na CRP do Fundão sob o n.º 374, doação que o segundo declarou aceitar (al. D).
17. O prédio referido em 16. é também composto por casa de habitação de cave, rés-do-chão e 1.º andar (resposta ao art.º 11.º).
18. O prédio identificado em 16. era aquele onde os 1.ºs RR. tinham e ainda têm instalada a casa de morada de família e onde ambos, após a escritura, continuam a habitar (resposta ao art.º 13.º).
19. A doação referida em 16. foi efectuada com o propósito de compensar o filho dos RR. de anterior doação feita à outra filha destes (resposta ao art.º 18.º).
20. À data da escritura de doação, a sociedade F..., Lda. era titular do rendimento de diversos imóveis, cujo valor patrimonial global ascendia a cerca de € 8 000 000,00, tendo sido constituída em data posterior pelo menos uma hipoteca a favor da autora para garantia de um crédito no montante máximo de €157 500,00 incidindo sobre um dos mencionados prédios (resposta ao art.º 17.º).
*
De Direito
ii. da verificação dos requisitos da pauliana, estando em causa um acto de natureza gratuita, e do erro de julgamento quanto à repartição do ónus da prova respectiva.
Nos termos do artigo 610.º do Código Civil[5] “Os actos que envolvam diminuição da garantia patrimonial e não sejam de natureza pessoal, podem ser impugnados pelo credor, se concorrerem as circunstâncias seguintes:
a) Ser o crédito anterior ao acto ou, sendo posterior, ter sido o acto realizado dolosamente com o fim de impedir a satisfação do direito do futuro credor;
b) Resultar do acto a impossibilidade, para o credor, de obter a satisfação integral do seu crédito ou o agravamento dessa impossibilidade.”.
A impugnação pauliana é ainda um meio conservatório de garantia patrimonial e, sendo distinto da acção anulatória (ainda que à acção pauliana não obste a nulidade do negócio, solução consagrada no art.º 615.º), o negócio impugnado não enferma, via de regra, de qualquer vício genético sendo, em si mesmo, válido e eficaz. Daí que, procedendo a acção pauliana, e ao invés do que ocorre na sequência da declaração de nulidade, os bens não regressam ao património do devedor, referindo o n.º 1 do artigo 616.º do Código Civil que a execução ocorre “no património do obrigado à restituição” e reconhecendo-se no art.º 818.º que os bens pertencem a um terceiro. Os seus efeitos limitam-se ao credor que a requereu e não a todos os credores, como ocorre na acção anulatória procedente, sendo que a sua finalidade não é a restituição do bem indevidamente alienado, mas antes a irrelevância da transmissão na medida em que se revelar incompatível com o direito de crédito do impugnante.
Deste modo, e em suma, a despeito da validade do acto, verificados os pressupostos que enuncia, através da impugnação pauliana permite a lei o constrangimento do direito do adquirente em ordem a satisfazer o interesse do credor tutelado, mas apenas na medida do interesse deste.
Estão em causa, consoante expressa o transcrito art.º 610.º, actos dos quais resulte diminuição da garantia patrimonial do crédito, exceptuados os de natureza pessoal, sendo requisitos gerais de procedência, a saber: a anterioridade do crédito (isto atendendo a que, razoavelmente, os credores só poderão contar com os bens existentes no património do devedor à data da constituição do seu crédito) ou, tratando-se de acto anterior, quando se prove que foi realizado dolosamente com o fim de impedir o direito do futuro credor[6] (vide al. a); e que do acto tenha resultado para o credor a impossibilidade de facto de satisfazer integralmente o seu crédito mediante execução, ou o agravamento dessa impossibilidade, tendo por referência a data do acto impugnado (al. b).
Segundo prescreve o n.º 1 do art.º 612.º, tratando-se de acto oneroso a impugnação pauliana só o atinge no caso de ambas as partes terem agido de má-fé; sendo o acto gratuito, a impugnação procede, ainda que um e outro tenham agido de boa-fé.
Finalmente, num desvio à regra geral mas consagrando uma justa repartição do ónus da prova, segundo o regime consagrado no art.º 611.º incumbe ao credor a prova do montante das dívidas[7], competindo ao devedor ou ao terceiro interessado na manutenção do acto a prova de que possui bens penhoráveis de valor igual ou superior, relevando para este efeito o momento da prática do acto impugnado. “A especialidade introduzida por este preceito significa, em termos práticos, que provada pelo impugnante a existência e a quantidade do direito de crédito e a sua anterioridade em relação ao acto impugnado, se presume a impossibilidade de realização do direito de crédito em causa ou o seu agravamento”[8].
De volta ao caso dos autos, cumpre desde logo assinalar que está em causa um acto gratuito[9], o que não se questiona. Daqui decorre, pois, a dispensa do requisito da má-fé, tal como se considerou na decisão apelada e não vem questionado.
No que respeita ao pressuposto da anterioridade do crédito, resulta da factualidade apurada que os mútuos identificados nos pontos 2. e 4., a despeito das datas em que foram celebrados, se destinaram essencialmente a liquidar créditos anteriormente constituídos e há muito vencidos, traduzindo-se numa reestruturação da dívida global que os devedores aqui 1.ºs RR mantinham para com a apelante, quer por via de empréstimos contraídos em seu nome pessoal, quer por força dos avales prestados às sociedades das quais eram sócios e gerentes[10]. As excepções são constituídas pelo mútuo no valor de €40 300,00 celebrado em 30/6/2009 a que se refere o ponto 10., mútuo n.º 56042616971, no valor de €33.460,97, concedido em 5.06.2008, referenciado no último parágrafo do ponto 11., e o montante de € 43 920,01 proveniente do desconto de quatro letras sacadas pela E... Lda., todas em data posterior a Janeiro de 2007, as quais se encontravam avalizadas pelos primeiros RR, dívida para cuja liquidação (ou parte dela) foi por estes contraído em 23.04.2009 o mútuo no valor de €71.000,00 identificado nos serviços internos da Autora com o nº. 58018765523 (cf. pontos 7. e 8. da matéria de facto).
Atendendo, pois, a que a quase totalidade do crédito de que a autora impugnante é titular se constituiu antes da data da outorga da escritura de doação, justifica-se que se dê por verificado o requisito da anterioridade[11]. A este propósito cumpre ainda referir que nada parece obstar a que a doutrina do n.º 1 do art.º 612.º seja aplicável às situações previstas na al. a) do art.º 610.º, ou seja, estando em causa um acto gratuito, encontrando-se embora o devedor e o terceiro de boa-fé, a pauliana procede, quer se trate de acto anterior, quer posterior à constituição do crédito[12], solução que encontra justificação na maior protecção que merece o interesse do credor (que procura evitar prejuízos) em confronto com o interesse do terceiro adquirente (que procura vantagens).
Aceitando, a nosso ver com acerto, a aplicação ao caso do regime do anterioridade do crédito, passou a Mm.ª juiz a indagar da verificação do segundo requisito -ter resultado do acto a impossibilidade para o credor de obter a satisfação plena do seu crédito- tendo consignado a propósito que, sendo relevante a data da prática do acto impugnado, “se nessa data o obrigado ainda possuía bens de valor bastante superior ao do crédito, a impugnação deve ser julgada improcedente”. E tendo discorrido sobre o critério aferidor dessa impossibilidade, adoptando o da “avaliação patrimonial do devedor” depois do acto, sendo “o peso comparativo do montante das dívidas e o valor dos bens conhecidos do devedor que indicará se desse acto resultou a mencionada impossibilidade”[13], veio a concluir pela inverificação do assinalado pressuposto. Tal decisão assentou num duplo fundamento: por um lado, não ter resultado provado que o imóvel objecto da doação fosse o bem mais valioso do património dos RR. e, por outro, que o acto tenha sido realizado com o propósito de tornar impossível a satisfação do crédito da A., antes tendo ficado apurado que visava compensar um dos filhos de doação anteriormente feita à outra filha. E acrescentou a Mm.ª juiz: “Não se deve ignorar que se a A. optou por não executar o património dos RR., antes continuando a conceder-lhe empréstimos, fosse qual fosse o destino destes, e por maioria de razão, tratando-se de operações bancárias essencialmente para fazer face a anteriores mútuos, aceitando garantias reais e pessoais, é porque mesmo esta instituição bancária certamente não as considerava operações de risco.
Acresce que a crise fez baixar o valor dos imóveis património dos RR. e das empresas de que eram sócios, e alterações legislativas modificaram o regime dos privilégios creditórios (no caso, na graduação dos créditos no processo de insolvência), factos independentes da vontade dos devedores e imprevisíveis à data da celebração da doação, e que foram determinantes para que a dívida à A. não fosse paga integralmente”.
Pois bem, antes de mais, tendo-se concluído na sentença apelada -a nosso ver correctamente- pela anterioridade do crédito, dispensada estava a credora apelante de fazer prova do dolo do devedor (cf. art.º 610.º, al. a), irrelevando do mesmo passo a ausência de má-fé, quer do transmitente, quer do donatário adquirente, consoante resulta do art.º 612.º, n.º 1, na sua parte final.
Depois, e no que respeita à exigência legal que do acto resulte a impossibilidade do credor obter a integral satisfação do seu crédito ou o mero agravamento dessa impossibilidade, é certo não ter a autora logrado fazer prova de que o bem doado era o mais valioso dos que integravam à data o património dos RR devedores. No entanto, conforme deflui do que se deixou exposto, a prova desse facto não corresponde a um ónus que sobre aquela recaísse e assim tivesse resultado incumprido, arcando com as consequências do incumprimento. Com efeito, tendo a apelante feito prova do montante do seu crédito, incluindo obviamente a dívida da sociedade declarada insolvente E..., Lda. pela qual os 1.ºs RR respondem solidariamente, atenta a sua qualidade de avalistas[14] e, bem assim, da anterioridade da constituição do mesmo, tendo por referência o acto de disposição do bem -acto gratuito, relembra-se- aos RR devedores e terceiro beneficiado incumbia provar que, depois do acto, os primeiros dispunham ainda no seu património de bens penhoráveis suficientes para solver aquele crédito, consoante resulta do supra citado art.º 611.º. Ónus da prova de que se não desincumbiram, para além do mais, porque tais factos nem sequer alegados foram[15].
Por outro lado, a suficiência do património que releva para o assinalado efeito (aqui funcionando como excepção) é a que respeita ao devedor, irrelevando que outros devedores solidários tenham no seu património bens bastantes para assegurarem o pagamento da dívida[16]. Por assim ser, mesmo a ter sido feita prova de que no património da também devedora sociedade F..., Lda,[17] existiam à data bens suficientes para a satisfação integral do crédito da autora -prova que, em todo o caso, não foi feita, por se desconhecerem os valores reais de tais bens e os ónus que sobre eles incidiam- tal facto não seria relevante, sendo certo ainda que nunca tal património responderia pelas dívidas contraídas pelos 1.ºs RR, quer em seu nome pessoal, quer na qualidade de avalistas da sociedade E..., Lda. Neste contexto, irrelevam os argumentos aduzidos pela Mm.ª juíza -ademais assentes em factualidade não adquirida para os autos- para concluir pela ocorrência de “factos independentes da vontade dos devedores e imprevisíveis à data da celebração da doação, e que foram determinantes para que a dívida à A. não fosse paga integralmente”.  Procedem assim as conclusões 10.ª a 20.ª.
Em suma, tendo a autora logrado fazer prova da existência e montante do crédito de que é titular, bem como da anterioridade da sua constituição em relação à data da doação efectuada pelos 1.ºs ao 2.º R tendo por objecto o imóvel identificado nos autos, e não tendo os demandados feito prova de que remanesceram no património dos devedores bens suficientes para a satisfação integral daquele crédito da autora, impõe-se a procedência da acção, sendo de declarar a ineficácia do acto em relação a esta, tal como pedira.
*
III Decisão
Em face a todo o exposto, e na procedência do recurso interposto pela autora, acordam os juízes da 1.ª secção cível deste Tribunal da Relação de Coimbra em revogar a sentença recorrida e declarar a ineficácia em relação à Caixa A..., c.r.l. da doação titulada pela escritura outorgada no dia 4 de Janeiro de 2007 no Cartório Notarial do Fundão a cargo do Notário Dr.M..., tendo por objecto o prédio nela identificado, reconhecendo-lhe o direito a executar o identificado bem no património do 2.º R adquirente.
Custas nesta e na 1.ª instância a cargo dos RR.
                                                                     *
Maria Domingas Simões (Relator)
Nunes Ribeiro
Helder Almeida

Sumário:
I. O art.º 5.º do NCPC, continua a fazer recair sobre as partes o ónus da alegação dos “factos essenciais que constituem a causa de pedir e [d]aqueles em que se baseiam as excepções invocadas” (vide n.º 1).
II. Valendo assim plenamente o princípio da disponibilidade objectiva no que respeita a estes factos, vedada está ao tribunal a sua consideração quando não tenham sido alegados pelas partes.
III- Objecto da acção pauliana são os actos dos quais resulte diminuição da garantia patrimonial do crédito, exceptuados os de natureza pessoal, sendo requisitos gerais de procedência, nos termos do art.º 610.º do Código Civil: a anterioridade do crédito ou, tratando-se de acto anterior, quando se prove que foi realizado dolosamente com o fim de impedir o direito do futuro credor (vide al. a); resultar do acto para o credor a impossibilidade de facto de satisfazer integralmente o seu crédito mediante execução, ou o agravamento dessa impossibilidade, tendo por referência a data do acto impugnado (al. b).
IV. Demonstrada a anterioridade do crédito, dispensada estava a credora de fazer prova do dolo do devedor (cf. art.º 610.º, al. a), irrelevando do mesmo passo a ausência de má-fé, quer do transmitente, quer do donatário adquirente, consoante resulta do art.º 612.º, n.º 1, na sua parte final.
V. Demonstrados pela credora a existência e montante do seu crédito, aos RR devedores e terceiro beneficiado incumbia provar que, depois do acto, os primeiros dispunham ainda no seu património de bens penhoráveis suficientes para solver aquele crédito, consoante resulta da repartição do ónus da prova consagrada no art.º 611.º.
VI. A suficiência do património que releva para o assinalado efeito é a que respeita ao devedor, irrelevando que outros devedores solidários tenham no seu património bens bastantes para assegurarem o pagamento da dívida.
                                                                            *     


[1] De notar que apesar da referência à natureza rústica do prédio em causa, não se questiona nos autos que nele se mostre edificada uma vivenda, que era e é a residência dos 1.ºs RR há cerca de 20 anos.
[2] Curiosamente apresentado pela F..., Lda., arrogando-se a qualidade de ré (cf. fls. 90), o que se terá ficado a dever a lapso manifesto.
[3] Prof. Dr.ª Mariana França Gouveia, “O princípio dispositivo e a alegação de factos em processo civil: a incessante procura da flexibilidade processual”, in “Estudos em Homenagem aos Profs. Palma Carlos e Castro Mendes”, acessível on-line.
[4] Cf. neste sentido, ac. desta mesma Relação de 5/11/2013, processo n.º 2167/09.3 TBPBL.C1, acessível em www.dgsi.pt.

[5] Diploma a que pertencerão as demais disposições legais que vierem a ser citadas sem menção da sua origem.
[6] Estão em causa as situações ditas de fraude pré-ordenada, em que o devedor, para obter o crédito, faz dolosamente crer ao credor que certos bens por ele alienados ou onerados ainda pertencem ao seu património, como bens livres de quaisquer encargos – vd. Prof. A. Varela, “Das obrigações em geral”, vol. II, 4.ª ed., pág. 439.
[7] Estará em causa a prova do passivo do devedor e não apenas do crédito de que seja titular o credor impugnante, o que se adequa à exigência formulada na al. b) do art.º 610.º (cf. A. Varela, ob. cit., nota 2, pág. 437 e, no mesmo sentido, Almeida e Costa, “Direito das Obrigações”, 9.ª ed., nota 1, pág. 803). Todavia, e como é bom de ver, se face à prova pelo credor do crédito de que é titular não opõe o devedor (ou o terceiro) a prova da suficiência do seu património para o solver, demonstrado estará o assinalado requisito.
[8] Neste sentido, acórdão desta Relação de 24/2/2015, processo n.º 176/07.6 TBVLF.C1, e ainda o STJ de 8/11/2007, processo 07 B 3586, acessíveis em www.dgsi.pt.
[9] Doação, segundo a noção que nos é dada pelo art.º 940.º do CC, é o contrato pelo qual uma pessoa, por espírito de liberalidade e à custa do seu património, dispõe gratuitamente de uma coisa ou de um direito, ou assume uma obrigação, em benefício do outro contraente. Não existindo qualquer contrapartida monetária como contrapartida do acto, que importa sacrifício económicos apenas para o doador, a doação (ainda que com encargos) é, sem dúvida, um acto gratuito (cf. Menezes Leitão, Direito das Obrigações”, vol. iii, 4.ª ed., pág. 175.
[10] De resto, e conforme resulta claro do disposto nos art.ºs 857.º e 859.º do CC, a vontade de contrair uma nova obrigação em substituição da antiga terá de ser expressamente manifestada.
[11] Decidiu-se pela procedência da impugnação pauliana, ainda na ausência de prova da anterioridade de alguns dos débitos do mesmo devedor, o STJ em aresto de 15/6/1994, in CJ, acórdãos do STJ, tomo 2.º, págs. 142 e seguintes, citado por Almeida e Costa – Direito das Obrigações, 9.ª ed., pág. 800, nota 2.
[12] Cf. Prof. Almeida e Costa, Direito das Obrigações, 9.ª ed., nota 3, 2.ª parte, pág. 803.
[13] Citando João Cura Mariano, “Impugnação Pauliana”, pág.167 e 168, e acórdão do STJ de 8/10/2009, www dgsi.pt
[14] Tanto mais que nenhum elemento trouxeram os RR aos autos no sentido da autora ter visto satisfeito, ainda que parcialmente, o seu crédito no âmbito do aludido processo de insolvência, apontando a prova produzida precisamente em sentido contrário.
[15] O que não se terá ficado a dever a lapso mas antes ao reconhecimento da insuficiência desse património. Com efeito, da prova produzida nos autos resulta que, para além da denominada Quinta do (...) , os 1.ºs RR seriam então proprietários de uma fracção no Fundão, cujo valor patrimonial, com referência ao ano de 2012, ascendia a cerca de €207 000,00 (cf. fls. 523-524) e da vivenda objecto do negócio impugnado, referindo ainda a autora na réplica a existência de uma loja no Fundão, hipotecada a seu favor (cf. art.º 28.º). De todo o modo, e apesar da dita Quinta ter sido avaliada no ano de 2008 pelos serviços da própria autora no montante de €1800 000,00, no relatório de avaliação é referido que sobre o imóvel incidiam já, à data, duas outras hipotecas, à semelhança do que ocorreria com a fracção autónoma, também hipotecada para garantia de dois empréstimos, ao que foi referido, no montante de € 100 000,00 cada. Ora, desconhecendo-se o(s) beneficiário(s) de tais hipotecas e os montantes globais garantidos, que sempre incluem juros, sabe-se porém que, vendida a Quinta, remanesceu o crédito da autora aqui demonstrado, sendo certo que terá beneficiado de parte do produto da venda. Aliás, considerando a data da prática do acto, se é verdade que os RR teriam outros bens, nomeadamente a referida Quinta, não é menos certo que, conforme resulta dos documentos juntos pela autora de fls. 525 a 527, também o seu crédito era de montante muito mais elevado, vindo a ser parcialmente satisfeito através do produto da alienação de bens pertença dos diversos obrigados. Tais factos, todavia, ao invés do que defendem os RR, apontam antes para a insuficiência do património dos RR devedores para solver na íntegra, como se impunha, o crédito da autora, justificando a opção feita no sentido da invocação na contestação da suficiência do património da sociedade F..., Lda., co-devedora de parte do crédito aqui em causa. De todo o modo, permanece o facto, incontornável e determinante, dos demandados não terem alegado factos tendentes à demonstração da suficiência do património dos 1.ºs RR devedores.
[16] Neste sentido, os acórdãos desta mesma Relação de Coimbra de 24/2/2015 antes citado, e de 20/11/2012, proferido no processo n.º 5148/03. TBLRA.C1, ambos acessíveis em www.dgsi.pt.
[17] Que não é parte no processo, apesar dos diversos requerimentos apresentados nos quais a mesma se arroga a qualidade de ré.