Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | SÍLVIA PIRES | ||
Descritores: | PROCESSO ESPECIAL DE REVITALIZAÇÃO PRAZO NEGOCIAÇÕES | ||
Data do Acordão: | 10/21/2014 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | TRIBUNAL JUDICIAL DE POMBAL – 2º JUÍZO | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA | ||
Legislação Nacional: | ARTºS 17º-A, 17º-D E 17º-F DO CIRE. | ||
Sumário: | I – Nos termos do n.º 1 do art.º 17º-A do CIRE o processo especial de revitalização destina-se a permitir ao devedor que, comprovadamente, se encontre em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, mas que ainda seja susceptível de recuperação, estabelecer negociações com os respectivos credores de modo a concluir com estes acordo conducente à sua revitalização. II - Dispõe o n.º 5 do art.º 17º-D do CIRE: Findo o prazo para impugnações, os declarantes dispõem do prazo de dois meses para concluir as negociações encetadas, o qual pode ser prorrogado, por uma só vez e por um mês, mediante acordo prévio e escrito entre o administrador judicial provisório nomeado e o devedor, devendo tal acordo ser junto aos autos e publicado no portal Citius. III - O prazo para a conclusão das negociações apenas depende da publicação da lista provisória de créditos no portal Citius, iniciando-se nesse momento o prazo para a respectiva impugnação e findo o prazo para estas serem deduzidas logo se inicia o prazo para a conclusão das negociações. IV - Decorre claramente do art.º 17º-F, n.º 1, do CIRE, que a conclusão das negociações não está dependente da homologação do plano de recuperação aprovado, pois neste preceito está prevista a recusa da sua homologação pelo juiz. V - A aprovação do plano tem de ser efectuada dentro do prazo da fase das negociações, fase esta que comunga do carácter de urgência que é genericamente atribuído ao processo de revitalização pelo art.º 17º-A, n.º 3, do CIRE. VI - Inserindo-se a aprovação do plano de recuperação dentro da fase das negociações, uma vez decorrido o prazo máximo destas sem a aprovação unânime daquele impõe-se a não homologação do plano por ter sido aprovado em violação de norma legal imperativa – n.º 1 do art.º 17º-G conjugada com o n.º 5 do art.º 17º-D, ambos do CIRE. | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam na 3ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra Os Requerentes em 19 de Novembro de 2013 comunicaram ao Tribunal a intenção de iniciarem negociações com os seus credores, conducentes à sua revitalização mediante aprovação de um plano de recuperação, ao abrigo do disposto no artigo 17º-C, nº 3, alínea a), do CIRE. Por despacho proferido a 4.12.2013 foi nomeado o administrador judicial provisório. Em 14.3.2014, na sequência de requerimento apresentado pelo administrador provisório, foi prorrogado o prazo das negociações por mais um mês. Por requerimento que deu entrada em juízo em 10.4.2014, os Requerentes informaram que se tinha concluído a fase do período das negociações, com a elaboração do Plano de Recuperação, revisto de acordo com as condições negociadas, na sua versão definitiva, juntando tal plano e informando que, de acordo com as regras definidas pelo Sr. Administrador Judicial Provisório e nos termos do disposto no artigo 211º do CIRE, aplicável por remissão do nº 4 do artigo 17º-F, tinham fixado o prazo de 10 dias para os credores votarem, sob pena de se ter por conferida a sua adesão ao plano, sendo os votos remetidos ao administrador judicial provisório. De igual forma, o administrador judicial provisório veio em 14.4.2014 informar que se concluiu no dia 10.4.2014 o período das negociações, com a elaboração do Plano de Recuperação, e que tinha sido fixado o prazo de 10 dias para os credores votarem por escrito o Plano. Por requerimento de 9.5.2014, os Requerentes informaram que o Plano de Recuperação apresentado reuniu a maioria dos votos, tal como previsto no nº 2 do art.º 17º-F, do CIRE, e apresentaram o plano aprovado, requerendo a sua homologação. Da acta de abertura de votos efectuada em 7.5.2014 consta que o plano de recuperação foi votado favoravelmente por 72,32% dos votos, tendo votado contra a sua aprovação 27,68%. Veio a ser proferida decisão que recusou a homologação do plano de recuperação, com fundamento em violação não negligenciável de norma imperativa. Inconformados com a decisão os Requerentes interpuseram recurso, formulando as seguintes conclusões: ... Não foi apresentada resposta. 1. Do objecto do recurso Estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões formuladas pelo recorrente, cumpre apreciar a seguinte questão: No processo especial de revitalização a aprovação não unânime do plano de recuperação em data posterior ao fim do prazo das negociações não determina a sua não homologação pelo juiz? 2. Os factos Com interesse para a decisão da causa são de considerar como provados os factos processuais acima relatados. 3. O direito aplicável Nos termos do n.º 1 do art.º 17º-A do CIRE o processo especial de revitalização destina-se a permitir ao devedor que, comprovadamente, se encontre em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, mas que ainda seja susceptível de recuperação, estabelecer negociações com os respectivos credores de modo a concluir com estes acordo conducente à sua revitalização. Este processo inicia-se com a manifestação de vontade do devedor e de, pelo menos, um dos seus credores, por meio de declaração escrita, de encetarem negociações conducentes à revitalização daquele por meio da aprovação de um plano de recuperação – art.º 17º-C, n.º 1 –, declaração essa que será entregue no tribunal competente juntamente com a comunicação de que o devedor pretende dar início às negociações conducentes à sua recuperação, ao que o juiz deverá nomear, de imediato, administrador judicial provisório – art.º 17º-C, n.º 3, a). Após a notificação do despacho de nomeação do administrador judicial provisório, o devedor deve, nos termos impostos pelo n.º 1 do art.º 17º-D do CIRE, comunicar de imediato e por meio de carta registada a todos os seus credores que não hajam subscrito a declaração inicial de encetamento de negociações, que deu início a negociações com vista à sua revitalização, convidando-os a participar, caso assim o entendam, nas negociações em curso. A partir da publicação no portal Citius do despacho de nomeação do administrador judicial provisório os credores têm 20 dias para reclamar créditos, perante o administrador judicial provisório – art.º 17º-D, n.º 2 –, tendo, por sua vez, o administrador judicial provisório cinco dias para elaborar lista provisória de créditos, a qual é imediatamente apresentada na secretaria do tribunal e publicada no portal Citius - n.ºs 2 e 3 do mesmo preceito. A lista provisória de créditos pode ser impugnada no prazo de 5 dias úteis, dispondo o juiz de igual prazo para decidir sobre as impugnações – n.º 3 do art.º 17º-D. Finalmente, dispõe o n.º 5 do art.º 17º-D: Findo o prazo para impugnações, os declarantes dispõem do prazo de dois meses para concluir as negociações encetadas, o qual pode ser prorrogado, por uma só vez e por um mês, mediante acordo prévio e escrito entre o administrador judicial provisório nomeado e o devedor, devendo tal acordo ser junto aos autos e publicado no portal Citius. O prazo para a conclusão das negociações apenas depende da publicação da lista provisória de créditos no portal Citius, iniciando-se nesse momento o prazo para a respectiva impugnação e findo o prazo para estas serem deduzidas, logo se inicia o prazo para a conclusão das negociações.[1] Acresce que decorre claramente do art.º 17º-F, n.º 1, do CIRE, que a conclusão das negociações não está dependente da homologação do plano de recuperação aprovado, pois neste preceito está prevista a recusa da sua homologação pelo juiz. No caso que nos ocupa o período de negociações iniciou-se no dia seguinte ao fim do prazo para a impugnação da lista provisória de créditos, ou seja no dia 11.1.2014 e, considerando a prorrogação que teve lugar, terminou no dia 11.4.2014. O plano de recuperação junto aos autos no decurso daquele prazo – 10.4.2014 – sem que no entanto tivesse sido objecto de votação, estando ainda a decorrer o prazo para a mesma, só tendo ocorrido em 7.5.2014 a contagem dos votos. Face a esta factualidade e como acima referido foi proferida decisão que recusou a homologação do plano, julgando não negligenciável a violação de uma regra procedimental imperativa, o n.º 5 do art.º 17º-D do CIRE. Defendem os Recorrentes que o prazo fixado no art.º 17º-D, n.º 5, do CIRE para as negociações – num máximo de três meses após o fim do prazo para a impugnação da lista provisória de créditos – não é um prazo peremptório, pois, prolongando-se aquelas justificadamente para além do mesmo, desde que seja alcançado o acordo de credores, não existe fundamento para a recusa da homologação do plano aprovado. Do que acima se expôs não nos restam dúvidas que a aprovação do plano tem de ser efectuada dentro do prazo da fase das negociações, fase esta que comunga do carácter de urgência que é genericamente atribuído ao processo de revitalização pelo art.º 17º-A, n.º 3.[2] A propósito da natureza deste prazo escrevem, na obra referida, Carvalho Fernandes e João Labareda: Nos termos em que está concebido, trata-se de um prazo de caducidade, razão pela qual, se o acordo só for obtido para além dele, não pode já ser homologado por violação não negligenciável da lei – art.º 215º, aplicável por imperativo do art.º 17º-F, n.º 5. Aliás, segundo a disposição expressa do art.º 17º-G, n.º 1, o processo negocial é encerrado se for ultrapassado o prazo aqui estabelecido. Por esta mesma ordem de razões, para poder ser válido e eficaz, o acordo de prorrogação entre o devedor e o administrador terá de ser concluído antes de terminado o prazo inicial, exactamente porque doutra forma há a caducidade que não é reversível. Nos autos a aprovação do plano de recuperação não foi efectuada por acordo unânime dos credores, só se podendo a mesma considerar perfeita com o encerramento da votação e subsequente contagem dos votos, conforme decorre do disposto no art.º 17º-F, n.º 3 [3], e da parte final do n.º 2, do mesmo artigo [4], sendo, pois, forçoso concluir que aquela ocorreu fora do prazo máximo das negociações, ou seja em data posterior a 10.4.2014. Inserindo-se, assim, a aprovação do plano de recuperação dentro da fase das negociações[5], uma vez decorrido o prazo máximo destas sem a aprovação unânime daquele, impunha-se, tal como decidido na 1ª instância, a não homologação do plano por ter sido aprovado em violação de norma legal imperativa – n.º 1 do art.º 17º-G conjugada com o n.º 5 do art.º 17º-D, ambos do CIRE. Face ao exposto, improcede o recurso. Decisão Nos termos expostos, julgando-se improcedente o recurso confirma-se a decisão recorrida. Custas pelos Recorrentes. Coimbra, 21 de Outubro de 2014.
Sílvia Pires (Relatora) Henrique Antunes Artur Dias
[1] Neste sentido os acórdãos: do T. R. C., de 26.2.2013, relatado por Arlindo Oliveira, do T. R. G., de 10.10.2013, relatado por Isabel Rocha, e do T. R. L., de 13.3.2014, relatado por Jorge Leal, todos acessíveis em www.dgsi.pt e Carvalho Fernandes e João Labareda, in Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, pág. 161, 2ª ed. 2013, Quid Juris. [2] Carvalho Fernandes e João Labareda, ob. e pág. citadas.
[3] Considera-se aprovado o plano de recuperação que reúna a maioria dos votos prevista no n.º 1 do artigo 212º, sendo o quorum deliberativo calculado com base nos créditos relacionados contidos na lista de créditos a que se referem os n.ºs 3 e 4 do artigo 17º-D, podendo o juiz computar os créditos que tenham sido impugnados se considerar que há probabilidade séria de tais créditos deverem ser reconhecidos, caso a questão ainda não se encontre decidida.
[4] A este respeito, Carvalho Fernandes e João Labareda, ob. cit. pág. 172: Vê-se, em todo o caso, da parte final do n.º 2 que o plano remetido ao tribunal para homologação deve estar já aprovado o que significa que o processo de aprovação é necessariamente anterior à remessa e, consequentemente, decorre sem nenhuma intervenção do tribunal, [5] Neste sentido os acórdãos dos T. R. de Coimbra e Lisboa citados na nota 1 e o do T. R. P. de 12.11.2013, relatado por João Diogo Rodrigues. |