Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
877/13.0TTVIS.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: AZEVEDO MENDES
Descritores: MÁ FÉ
EMPREGADOR
DATA
ACIDENTE DE TRABALHO
Data do Acordão: 05/19/2016
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE VISEU – VISEU – INST. CENTRAL – 1ª SEC. DE TRABALHO – J2
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTº 542º DO NCPC.
Sumário: I – Refere o nº 2 do artº 542º do nCPC, na sua alínea b), que ‘diz-se litigante de má-fé quem, com dolo ou negligência grave, tiver alterado a verdade dos factos’.

II – Alegando o empregador, em oposição com o alegado pelo autor (sinistrado), que o acidente ocorreu em data de plena vigência de contrato de seguro laboral, o que veio a provar-se não corresponder à verdade, age aquele em litigância de má fé, por ter pretendido alterar, em juízo, a verdade dos factos.

Decisão Texto Integral:

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

I. Em processo emergente de acidente de trabalho, o autor intentou acção pedindo a condenação do réu a pagar-lhe a quantia de € 412,08 a título de indemnização por ITA, com juros de mora a contar da alta médica, bem como € 1.500,00 por litigância de má fé.

Alegou, em síntese, que sofreu incapacidade temporária absoluta durante 17 dias, na sequência de acidente sofrido a 26 de Julho de 2013, quando, trabalhando para o empregador demandado – que não havia transferido, para qualquer seguradora, a sua responsabilidade pelos acidentes de trabalho – caiu de um escadote. Alegou ainda que o empregador, maliciosamente, lhe instaurou um processo disciplinar sem motivo, e que lhe deve subsídios de férias e de Natal, além de ter férias para gozar. E que o réu agiu de má-fé, tentando “protelar o trânsito em julgado da decisão”.

O réu contestou, alegando que no dia 26 o autor não trabalhava para si, que ambos acordaram, a 29, que o autor passasse a trabalhar no dia seguinte, momento em que sofreu um acidente, devidamente participado à seguradora, pois que logo nesse dia 29, em contacto com o seu mediador, celebrou contrato de seguro por acidente de trabalho referente ao aqui autor, pelo que é ele quem litiga de má-fé. Conclui pedindo a sua absolvição.

Por despacho proferido no processo, foi determinada a intervenção da seguradora acima identificada.

Esta, chamada a intervir, apresentou contestação, na qual alegou que o acidente ocorreu no dia 26 de Julho, tendo o autor sido assistido em unidade hospitalar a 27, enquanto que o contrato de seguro celebrado o foi a partir do dia 30. Concluiu pedindo a sua absolvição.

O réu empregador respondeu à contestação da seguradora, reafirmando o que já havia alegado no seu próprio articulado.

Prosseguindo o processo os seus regulares termos veio a final a ser proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e, consequentemente, condenou o réu R... a pagar ao autor a quantia de € 328,71, bem como juros, à taxa legal, desde a data da alta e até integral pagamento, e ainda, a título de litigância de má-fé, na multa de 5 UCs e € 500,00 de indemnização a favor do autor. No mais, absolveu o mesmo réu de tudo o mais contra ele pedido.

Inconformado, o 1.º réu interpôs a presente apelação e, nas correspondentes alegações, apresentou as seguintes conclusões:

[…]


Apenas o autor apresentou contra-alegações, pugnando pela manutenção do julgado.
O Ex.mo  Procurador-Geral Adjunto nesta Relação, no seu parecer, pronunciou-se pela improcedência do recurso.


*

II- A. Os factos considerados provados pela 1.ª instância:

[…]


*

III. Apreciação

É pelas conclusões das alegações que se delimita o âmbito da impugnação.

Decorre do exposto que as questões a apreciar são as seguintes:

- se a decisão sobre a matéria de facto merece alteração;

- mediante essa reapreciação, saber se se verifica o direito do autor à reparação de acidente de trabalho a cargo do apelante e se foi adequada a condenação do mesmo nos termos efectuados na sentença recorrida, designadamente como litigante de má fé.

A) A impugnação da decisão sobre a matéria de facto:

[…]

B) A questão de saber se se verifica o direito da autor à reparação de acidente de trabalho a cargo do apelante e se este deveria, como foi, ser condenado como litigante de má fé:

O recurso dependia nesta parte, de acordo com a sua formulação, da alteração da matéria de facto provada no que toca à data do evento qualificável como acidente de trabalho.

Ora, mantivemos provado que o acidente ocorreu no dia 26 de Julho, data em que o apelante não tinha transferida a sua responsabilidade emergente de acidente de trabalho com o autor para seguradora.

E, como se disse na sentença recorrida:

«Questão fulcral no presente processo, qual seja a de saber quem seria o responsável pelo pagamento da indemnização, essa, foi integralmente resolvida pelo julgamento de facto. Fixada a data do acidente como o dia 26, não estava válido qualquer contrato de seguro respeitante ao aqui autor, pelo que, sem mais, importa afirmar a responsabilidade do empregador».

Esta conclusão é de manter, ante o insucesso nesta parte da impugnação da decisão relativa à matéria de facto.

O mesmo se diga quanto à condenação em litigância de má fé.

Como também se disse na sentença recorrida:

«Pede ainda o autor a condenação do empregador como litigante de má-fé, em indemnização, que fixou em € 1.500,00. Refere o art.º 542º do código de processo civil, no seu nº 1, que “tendo litigado de má-fé, a parte é condenada em multa e numa indemnização à parte contrária, se esta a pedir”.

Refere o nº 2 do mesmo art.º 542º, na sua alínea b), que “diz-se litigante de má-fé quem, com dolo ou negligência grave, tiver alterado a verdade dos factos“. E, a esse respeito, importa atender ao seguinte: em perfeita oposição com o que alegou o autor, e com o que se provou, alegou o empregador que o acidente em causa ocorreu no dia 30, em plena vigência de contrato de seguro. Acresce que, atento o que se provou, jamais o empregador poderia ignorar que, ao contrário do que trouxe a juízo, não são verdadeiros os factos atinentes à data do sinistro. Logo, importa concluir que o autor alterou, em juízo, a verdade dos factos, pelo que, assim, litigou de má-fé; e deve, portanto, ser condenado em multa e, porque se mostra pedida, também em indemnização à parte contrária».

Mantendo-se nos pressupostos da condenação os factos considerados, está correcta a condenação do apelante como litigante de má fé,

Por conseguinte, a apelação tem de improceder.

                                                     *

IV- DECISÃO

Termos em que delibera julgar improcedente a apelação.

Custas a cargo do apelante.


*

  


 (Azevedo Mendes)

 (Felizardo Paiva)

 (Paula do Paço)