Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
844/03.1TBMGR.C2
Nº Convencional: JTRC
Relator: BARATEIRO MARTINS
Descritores: IMPOSSIBILIDADE DO CUMPRIMENTO
DEVER ACESSÓRIO
VIOLAÇÃO
EXTINÇÃO DAS OBRIGAÇÕES
EXONERAÇÃO
EMPREITEIRO
CONTRATOS BILATERAIS
DESCONTO
PREÇO
Data do Acordão: 12/03/2013
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DA MARINHA GRANDE – 3.º JUÍZO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE REVOGADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 790.º/1, 795.º/2, 762.º/2 E 334.º, TODOS DO C. CIVIL
Sumário: 1 - Num contrato de empreitada duma moradia, a agressão (durante a execução contratual) do dono da obra ao empreiteiro, seguida do abandono da obra por parte deste, configura uma verdadeira impossibilidade do empreiteiro concluir a sua prestação – ou directamente por aplicação do art. 790.º/1 do C. Civil ou por aplicação conjugada dos art. 790.º/1, 762.º/2 e 334.º, todos do C. Civil – por violação dos deveres acessórios de conduta (correcção, lealdade e boa fé).

2 - O que, nos termos do art. 790.º/1 do C. Civil, extingue a obrigação assumida pelo empreiteiro, perdendo o dono da obra o direito de exigir a conclusão da prestação do empreiteiro (e não tendo direito à indemnização de quaisquer danos provenientes do não cumprimento); mas continuando o dono da obra, sendo-lhe a impossibilidade da prestação imputável, a ter que efectuar a sua contraprestação (pagar o preço), embora possa descontar nela (art. 795.º/2) o valor do benefício que o empreiteiro teve com a exoneração da conclusão da sua prestação.

3 - Uma coisa – a que se alude no art. 795.º/2 do C. Civil – é o benefício que um profissional da construção retira por não fazer um trabalho que lhe foi pago e que está incluído no âmbito do contrato de empreitada; outra, diversa, é o preço/retribuição que custa a contratação dum profissional da construção para executar esse mesmo concreto trabalho.

4 - Em todo o caso, provando-se defeitos e trabalhos em falta que ascendem a um custo (preço/retribuição) em contratação de profissionais da construção não inferior a € 30.000,00, não repugna considerar que a não execução de tais trabalhos representa para o empreiteiro que os teria que executar (não fosse o efeito exoneratório da sua prestação) uma poupança/benefício nunca inferior a metade de tal montante e operar tal desconto, nos termos do art. 795.º/2, no preço/contraprestação do dono da obra.

Decisão Texto Integral: Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra:

I – Relatório

A... , residente na Rua (...), Marinha Grande, intentou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma ordinária, contra B..., residente em Rua (...), Leiria, pedindo:

 - que o réu seja condenado a efectuar todos os trabalhos em falta discriminados na p. i.;

 - que o réu seja condenado a corrigir todos os defeitos existentes na casa do autor, reparando-a conforme o descrito na p. i.;

ou, em alternativa:

 - que o réu seja condenado a pagar ao autor a quantia de € 26.600,00, relativa ao montante estimado dos trabalhos em falta;

 - que o réu seja condenado a pagar ao autor a quantia de € 38.000,00, valor estimado necessário para efectuar as correcções dos defeitos da casa;

 - que o réu seja condenado a pagar ao autor os juros que se vencerem sobre as quantias referidas em a) e b) desde a citação até integral pagamento, à taxa legal.

 - que o réu seja condenado a reparar todos os defeitos que se venham a verificar na casa do autor, desde a citação até integral cumprimento;

ou, ainda em alternativa:

 - que o réu seja condenado a indemnizar o autor no montante referente às obras necessárias dos defeitos ainda ocultos, em quantia a liquidar em execução de sentença, bem como os juros vincendos sobre essa quantia, desde a citação até integral pagamento à taxa legal;

 - que o réu seja condenado a pagar ao autor a quantia de € 1.214,26 relativos a juros bancários e vistorias despendidas desnecessariamente, em virtude do atraso verificado na execução da obra;

 - que o réu seja condenado a indemnizar o autor na quantia de € 250,00 relativos ao arranjo das rupturas nas casas de banho;

 - que o réu seja condenado a indemnizar o autor na quantia de € 3.500,00 pelos danos verificados nos seus electrodomésticos, veículo automóvel, pedras da casa no rés do chão;

 - que o réu seja condenado a restituir ao autor os bens por si levados, ou em alternativa a indemnizar o autor no montante de € 100,00;

 - que o réu seja condenado a indemnizar o autor no montante despendido em lixívia, produtos de limpeza e mão de obra, no montante de € 250,00;

 - que o réu seja condenado a indemnizar o autor em todas as despesas que este venha a ter, em virtude dos defeitos existentes na casa ou pelos trabalhos em falta, desde a citação, em quantia a liquidar em execução de sentença, bem como os juros vincendos sobre essa quantia, desde a citação até integral pagamento à taxa legal;

 - que o réu seja condenado a indemnizar o autor, em quantia a liquidar em execução de sentença, em todas as despesas que este venha a ter, em virtude da entorse que sofreu no pé;

 - que o réu seja condenado a indemnizar o autor a título de danos não patrimoniais na quantia de € 15.000,00, bem como os juros vincendos sobre essa quantia, desde a citação até integral pagamento à taxa legal;

Alegou para tal, em síntese, que, 18 de Fevereiro de 2000, entregou ao réu a construção duma sua moradia, tendo sido acordado o preço total de 11.183.000$00 sem IVA, a liquidar após a conclusão integral da obra (podendo o autor, caso o entendesse, ir efectuando pagamentos por conta do preço), que o R. se comprometeu a terminar até 16/03/2001, data do termo da licença de construção; tendo sido também acordado que o A. pagaria alguns materiais, sendo o custo destes descontado ao referido preço total, e, ainda, que todo o trabalho que o A. despendesse directamente na obra seria deduzido ao preço (contabilizado nos mesmos termos das horas de trabalho dos trabalhadores da construção civil).

Assim, em execução do acordado (e durante a permanência do R. na obra), o autor pagou, entre 18/04/2001 e 07/08/2001, em diversas prestações, o montante de 7.500.000$00, dos quais o réu não passou qualquer factura; pagou em despesas/materiais utilizados na obra a quantia de 2.861.389$00; e despendeu trabalho em valor que quantifica em 1.644.000$00 + 80.000$00. Razão porque, segundo o A., “somados todos os valores em causa e deduzindo o valor do orçamento sem IVA, verifica-se que o A. tinha um crédito de 902.389$00 sobre a R.”.

Em contrapartida – quanto à parte que no acordado pertencia ao R. – o R., no período de Setembro a Outubro de 2001, abandonou a obra sem dar uma explicação e sem que a mesma estivesse concluída; ascendendo ao valor total de € 26.600,00 os trabalhos (como a pintura da casa, os gradeamentos, a colocação de interfone, a betumagem das pedras, os acabamentos do rés do chão, o isolamento térmico da casa e impermeabilização das paredes e fundações) que se encontravam por fazer.

Ademais, a partir de Maio de 2002, começaram a manifestar-se progressivamente um conjunto variado de defeitos – que longamente descreve – nos trabalhos realizados pelo réu cuja reparação/correcção ascenderá ao montante de € 38.000,00; defeitos esses que, embora reconhecidos pelo R., este não repara.

Finalmente, invocou ainda despesas decorrentes do atraso na obra (de juros e vistorias); estragos e destruições causados pela má execução da obra; e danos não patrimoniais sofridos pelo profundo desgosto que toda a situação lhe provoca.

O R. contestou, peça em que aceitou ter-se obrigado a construir a moradia do A. pelo preço invocado, porém, a ser pago escalonadamente de acordo com o desenvolvimento/execução da mesma, o que, devido às dificuldades do A. em obter um empréstimo, só aconteceu pela 1.ª vez em Abril de 2001, admitindo assim ter recebido do A., em execução do combinado, a referida quantia de 7.500.000$00 (sendo € 31.974,23 de capital e € 5.435,62 de IVA).

Admitiu que o A. tenha comprado alguns materiais por sua conta, mas no essencial por querer algo diferente do orçamentado, nunca tendo sido feita qualquer referência a descontos ao preço combinado; concedeu, porém, que deve ser descontado no preço total a quantia de € 1.167,19, valor pago pelo A. na aquisição de um fogão de sala que competia ao R. suportar, e ainda não mais de € 1.685,94 de materiais vários comprados pelo A. que também ao R. competia pagar.

Negou que haja sido acordado qualquer desconto quanto aos trabalhos que o A. realizou na obra, muitas vezes até contra a vontade do R.

Quanto ao abandono da obra, admitiu tê-lo feito porque, “quando pela enésima vez lhe pediu o dinheiro que lhe devia”, o A. o agrediu, não havendo assim quaisquer condições para continuar a laborar, “pelo menos até que o A. resolvesse pagar o que lhe devia”.

Quanto aos trabalhos que o A. disse estarem em falta, impugnou que alguns deles estivessem incluídos no “orçamento” e todos os valores que o A. indicou para a execução de cada um deles; admitindo que os trabalhos que efectivamente estão em falta não ultrapassarão o valor/custo de € 6.990,00.

Quanto aos defeitos, invocou a caducidade do direito à sua reparação, impugnou muitos deles e o facto de não terem sido corrigidos devido à conduta do A. que, quanto a alguns, foi avisado da sua existência, mas negou tal hipótese, e quanto a outros, dado o abandono da obra da sua parte, motivado por agressão do autor, não os pôde eliminar.

Alegou que não incorreu em qualquer atraso, que lhe seja imputável, na execução da obra – que “se centrava na reparação ou reconstrução do andar de cima, sem intervenção no rés-do-chão, com excepção da pintura” – e em que diversas alterações foram efectuadas, de comum acordo, tendo sido combinado submeter a sua avaliação às tabelas normais da arte, em proporção com o orçamento.

Assim, relativamente a trabalhos que não constavam do “orçamento” – e que foram, durante a execução da obra, solicitados e acordados – alegou ter colocado pedras nas janelas e soleiras no andar de baixo, alumínios novos no rés do chão, ter rebocado um segundo barracão existente no logradouro da casa, colocando-lhes I20 e R10 para assentar telha castanha nova, ter rebocado a parte de trás da oficina, ter colocado pilares e rebocado um muro existente, demolido e rebocado o chão da cozinha, rebocado o escritório da parte de baixo, rebocado o tecto e a cozinha situada no pátio, demolido e feito as paredes da casa de banho do pátio, refito o telheiro com pilares R10 e telha castanha, feito as paredes por cima da placa existente que também rebocou no terraço, feito a canalização da casa de banho do pátio, da cozinha, colocado tubos debaixo do cimentado para várias torneiras e colocado tubagem para aquecimento central, colocado vários tubos de esgoto, colocado azulejos na casa de banho da mãe, refeito o chão na frente da casa, tudo no total, sem IVA, de € 11.734,22 (2.352.500$00).

Concluindo assim que estão por pagar € 35.540,56 (sendo € 23.806,34 do “orçamento inicial”, que era, sem IVA, de 11.183.000$00 / € 55.780,57; e dos trabalhos a mais € 11.734,22 / 2.352.500$00) mais o IVA à taxa legal de € 6.752,71; ao que há que descontar o valor de € 3.353,13, correspondente ao crédito do autor, o que totaliza um crédito final a seu favor no montante global de € 38.940,14.

Assim, termina pedindo que, em reconvenção, se condene o autor:

 - a reconhecer ter tido culpa exclusiva pela não conclusão da obra;

 - no pagamento de € 38.940,14 como resultante da diferença entre o orçamento somado com as alterações efectuadas e os pagamentos por conta do orçamento somados aos valores pagos pelo autor em materiais;

em alternativa, se condene o autor:

 - a reconhecer que os trabalhos em falta se cifram em € 6.990,00;

 - no pagamento da quantia de € 31.950,14 como resultante da diferença entre o orçamento somado com as alterações efectuadas e os pagamentos por conta do orçamento somados aos valores pagos pelo autor em materiais e ao valor dos trabalhos em falta.

O A. replicou, pugnando pela não verificação da arguida caducidade e mantendo o antes alegado, isto é, que não houve alterações ao orçamento, que o réu abandonou a obra somente por sua vontade, etc.; concluindo do mesmo modo que na PI e pedindo a improcedência da excepção e reconvenção deduzidas

A R. treplicou, nada acrescentando ao referido na contestação.

Foi proferido despacho saneador – em que foi declarada a total regularidade da instância, estado em que se mantém, e em que se relegou para final o conhecimento da excepção de caducidade – e organizada a matéria factual com interesse para a decisão da causa.

Veio então o autor deduzir articulado superveniente, alegando um conjunto de novos defeitos e pedindo a sua reparação; ao que o réu respondeu, invocando a caducidade do direito à reparação dos defeitos invocados e a extemporaneidade do articulado superveniente.

Foi então proferida decisão que julgou procedente tal excepção de caducidade e que absolveu o réu dos pedidos do articulado superveniente; decisão esta de que o autor interpôs recurso de agravo que foi admitido com subida diferida e efeito meramente devolutivo.

Instruído o processo, procedeu-se à realização da audiência – em cujo início foi proferida decisão a determinar a impossibilidade do réu proceder à realização das diligências de prova (por não ter pago atempadamente a taxa de justiça subsequente), decisão essa de que o réu interpôs recurso de agravo que foi admitido com subida diferida e efeito meramente devolutivo – após o que a Exma. Juíza de Circulo proferiu sentença, em que julgou a acção parcialmente procedente e a reconvenção essencialmente improcedente.

Inconformado com tal decisão, interpôs o R. recurso de apelação, tendo-se por Acórdão desta Relação de Coimbra (fls. 1154 ss) decidido:

A) Negar provimento ao agravo interposto pelo autor sobre a admissibilidade do articulado superveniente;

B) Negar provimento ao agravo interposto pelo autor sobre a extemporaneidade das alegações de fls. 771 ss;

C) Conceder provimento ao agravo interposto pelo réu sobre a decisão que determinou a impossibilidade da realização das diligências de prova que tenham sido ou venham a ser requeridas pelo réu, e consequentemente, anulam a audiência de discussão e julgamento, ordenando a sua repetição e posterior prolação de nova sentença;

D) Declarar prejudicado o conhecimento do objecto das apelações, em virtude da anulação referida em C).

Acórdão este de que o autor interpôs novo recurso de agravo, que, porém, não foi admitido no STJ.

Assim, regressados os autos de novo à 1.ª instância, foi designado novo dia para audiência.

Nesse ínterim, por requerimento de fls. 1549 e ss. veio o autor ampliar o pedido – invocando o agravamento dos defeitos e dos danos – ao que o réu respondeu por requerimento de fls. 1598 ss.; tendo-se por decisão de fls. 1654/6 indeferido tal pedido de ampliação, decisão de que o autor interpôs recurso, o qual foi admitido como agravo, com subida diferida e com efeito devolutivo.

Procedeu-se então à realização da nova audiência, após o que a Exma. Juíza de Circulo proferiu sentença, em que (após julgar improcedente a excepção de caducidade deduzida pelo réu) concluiu do seguinte modo:

“ (…) decide-se:

I - Julgar improcedente a acção e em consequência absolve-se o réu dos pedidos contra si formulados;

II - Julgar parcialmente procedente a reconvenção e em consequência:

a)Declara-se que o contrato de empreitada celebrado entre o autor e o réu em 18 de Fevereiro de 2000 foi validamente resolvido pelo réu;

b) Condena-se o autor a restituir ao réu o valor correspondente à obra executada pelo mesmo, cujo montante se relega para o que vier a ser liquidado, fixando-se como limite máximo o valor de € 15.321,19 (55.604-1.167,16-1.685,94-37.409,00).

(…) “

Inconformado com tal decisão, interpôs agora o A. recurso de apelação, visando a sua revogação e a sua substituição por outra que julgue a acção essencialmente procedente e a reconvenção improcedente.

Terminou a sua alegação com uma segunda e idêntica alegação a que chama “conclusões”, que aqui não transcrevemos pela sua redundância e extensão (73 páginas)[1].

Não foi apresentada qualquer resposta.

Colhidos os vistos, cumpre, agora, apreciar e decidir.

*

II – “Reapreciação” da decisão de facto

Como “questão prévia” à enunciação dos factos provados, importa – atento o âmbito do presente recurso, delimitado pelas conclusões da alegação do A/apelante – analisar as questões a propósito da decisão de facto colocadas a este Tribunal.

No caso vertente, os diversos depoimentos prestados em audiência, nos quais a 1ª instância se baseou para decidir a matéria de facto, foram gravados; constando assim do processo todos os elementos probatórios com que aquela instância se confrontou, quando decidiu a matéria de facto, pelo que e é possível modificar aquela decisão, se enfermar de erro de julgamento[2].

Faculdade – de modificar a decisão de facto – em cujo uso, costumamos “avisar”, é nosso dever ser contidos, cautelosos e prudentes, uma vez que existem elementos intraduzíveis e subtis, como a mímica e todo o processo de exteriorização e verbalização dos depoentes, não importados para a gravação, susceptíveis de influir, quase tanto como as suas palavras, no crédito a prestar-lhes. O que, porém – salienta-se e enfatiza-se, para que não haja quaisquer equívocos interpretativos sobre o que se acabou de dizer – não significa que o duplo grau de jurisdição em matéria de facto apenas envolve a correcção de pontuais, concretas e excepcionais erros de julgamento; efectivamente, a Relação, quando aprecia as provas – e pode para tal atender a quaisquer elementos probatórios (cfr. art. 712.º/2 do CPC) – faz um novo julgamento da matéria de facto, vai à procura da sua própria convicção, assegura o duplo grau de jurisdição em relação à matéria de facto (ou seja, a actividade da Relação não se pode/deve circunscrever a um mero controlo formal da motivação efectuada na 1.ª Instância).

Efectuados tais prévios e “tabelares” esclarecimentos, debruçando-nos sobre as concretas questões – tendo presente as posições assumidas pelas partes nos articulados, analisados os documentos juntos e o relatório pericial apresentado e ouvido o registo, efectuado em CD, das várias sessões de julgamento – concluímos, antecipando desde já a solução, que assiste reduzida razão ao A./apelante, isto é, concorda-se com a generalidade das respostas dadas aos mais de 100 quesitos colocados em crise; mas, vejamos, em detalhe:

Quanto ao que foi combinado sobre o momento e forma de pagamento do preço; isto é, quanto aos quesitos 4.º e 5.º[3] (julgados não provados) e 133.º (julgado provado), que, segundo o A/apelante, devem ser julgados exactamente ao contrário.

Na apreciação crítica da prova produzida a tal propósito, escreveu-se na decisão sob recurso que “os factos relacionados com a forma de pagamento acordada, face a depoimentos pouco consistentes, fundamentam-se essencialmente nas regras da experiência comum, uma vez que não é consentâneo com estas o pagamento ser efectuado após a finalização da obra e sim escalonadamente à medida que forem feitos trabalhos, justificando-se deste modo as respostas negativas aos factos 4.º e 5.º e positiva ao facto 133.º”.

Concorda-se inteiramente com tal apreciação.

Ao que se acrescenta que as testemunhas ( C... e D...) indicadas pelo R., falando embora genericamente e do que é normal ser combinado, foram afirmando que o R. não trabalha com o preço a ser pago apenas no final da obra; mais, a testemunha C..., no final da instância da mandatária do A., até referiu (quando se lhe pedia que reportasse os montantes a pagar às fases da obra que havia referido), de forma veemente, que o pagamento só no final da obra “posso dizer que nunca” (trecho este omitido na transcrição feita).

Ademais, ainda, importa não esquecer os 6 pagamentos efectuados, entre Abril e Agosto de 2001, pelo A., o que, naturalmente, incute a ideia de ter havido tal compromisso (cujo início do cumprimento coincide com a obtenção do empréstimo bancário, ou seja, não pode impressionar o facto de só passados 9 meses sobre o início da obra ter efectuado o 1.º pagamento).

Não merecem pois qualquer censura as respostas dadas aos quesitos 4.º, 5.º e 133.º, que assim se mantêm.

Quanto aos materiais incorporados na obra pagos pelo A., conforme o combinado entre ambos; isto é, quanto aos quesitos 10.º e 200.º (julgados não provados) e 139.º (em que se diz que o A. comprou alguns materiais por sua conta por querer algo diferente do orçamentado, julgado provado), que o A/apelante diz que devem ser julgados exactamente ao contrário.

Na apreciação crítica da prova produzida a tal propósito, escreveu-se na decisão sob recurso que, quanto à “matéria relacionada com os custos que o autor teve com materiais, concretamente factos 10 e 200, importa referir que a prova produzida foi vaga e imprecisa no que se refere ao que foi efectivamente contratado entre autor e réu. Para além dos orçamentos a fls. 31 a 33, igualmente pouco precisos, analisados os depoimentos das testemunhas, constatamos que H... e I..., autores do projecto de arquitectura, referem que este apenas se reportava a um primeiro andar que iria ser construído sobre uma moradia térrea. (…) No entanto, resultou do depoimento de várias testemunhas que, após um acordo inicial entre autor e réu e que se referia apenas ao primeiro andar, foi contratada a realização de trabalhos no rés-do-chão. Isso é patente não só do depoimento da testemunha J..., mas também do depoimento de C..., L..., E..., O... e JJ... que elaboraram orçamentos diferentes para o rés do chão e para o primeiro andar, competindo o pagamento de materiais, no primeiro caso ao autor e no segundo ao réu. Deste modo, e não obstante os depoimentos de F..., em confronto com as facturas de fls. 143 a 155 e 1089, de LL... em confronto com fls. 730 a 734, de MM... em confronto com fls. 171 a 174, e das demais facturas juntas aos autos emitidas em nome do autor, que apontam para uma efectiva aquisição de materiais pelo autor, ignoramos a que se destinaram tais materiais, designadamente se os mesmos se referem à execução de trabalhos incluídos na empreitada inicialmente contratualizada com o réu. (…) Em suma, há seguramente prova (…) que o autor adquiriu e pagou, pelo menos alguns materiais. Aquilo que não resulta de toda a prova produzida é se tais materiais e trabalhos foram adquiridos e realizados no âmbito do acordo referido em R) dos factos assentes e para aquilo que o réu foi contratado.

Concorda-se completamente com a essência de tal apreciação crítica.

O A/apelante – resulta da sua atinente argumentação recursiva – equivoca-se completamente sobre o que está em causa nestes quesitos, maxime no quesito 10.º.

Não se pergunta, não se quer saber apenas, se o A. gastou as diversas quantias referidas no quesito 10.º; o que se pergunta, o que se quer saber, em face do quesito estar reportado à alínea R), é se o A. gastou tais quantias em materiais necessários à realização da obra contratada com o R. e em consequência de tal (“gasto” por parte do A.) ter sido combinado com o R.

Ora, quanto a estes dois últimos e decisivos aspectos, a prova produzida foi duma vacuidade total.

Foram efectivamente ouvidos os comerciantes (ou os seus empregados) que venderam ao A. os materiais em causa, porém, naturalmente, revelaram nada saber sobre o combinado entre A. e R. e sobre onde e quando foram utilizados os materiais.

As testemunhas M... (pedreiro) e NN... (electricista) disseram aparentemente um pouco mais; e dizemos “aparentemente”, um vez que, tendo dito que aplicaram alguns dos materiais, referiram também que o fizeram depois do R. já não andar na obra e que efectuaram tais aplicações quer nos anexos quer no R/C, isto é, até “baralharam” a prova que incumbia ao A..

Mais, olhando atentamente para os documentos de fls. 133 e 176 (e para os originais depois juntos), constata-se, em harmonia com o que tais testemunhas referiram sobre a data em que trabalharam para o A., que são inúmeras as facturas de data (bem) posterior[4] ao episódio da agressão (de Setembro de 2001) relatado no quesito 145, isto é, fica-se claramente com ideia – para além de não ser seguro que todos os materiais se destinassem em exclusivo ao 1.º andar da moradia – do A., após a saída da obra do R., ter mandado fazer trabalhos[5], apresentando a “conta” dos materiais que utilizou em tal continuação. Mas, como é bom de ver, o que porventura aconteceu após a agressão e saída do R. da obra não cabe nem entra no que, embora genericamente, possam ter combinado (referido em R) sobre pagamento de materiais por parte do A..

Não merecem pois qualquer censura as respostas negativas dadas aos quesitos 10.º e 200.º; porém, em face da debilidade da prova também apresentada a tal propósito pelo R. – e da dúvida instalada sobre os exactos limites, em termos de obra a executar, quer da extensão de obra contratada quer dos materiais a utilizar – entendemos que também o quesito 139.º deve merecer uma idêntica resposta negativa e, em consequência, altera-se a sua resposta para “não provado”.

Quanto às “recuperações nos valores dos materiais”; isto é, quanto aos quesitos 11.º, 12.º, 15.º e 16.º (julgados não provados) e que, segundo o A/apelante, devem ser julgados exactamente ao contrário.

As respostas negativas aos quesitos 10.º e 200.º, arrastavam e arrastam as inevitáveis respostas negativas a tais 4 quesitos.

Aliás, o A/apelante, não invoca, na alegação recursiva, um único meio de prova próprio e específico para inverter as respostas dadas; argumentando tão só ter conseguido materiais a um custo mais barato que o tido em conta no orçamento do R., sendo a isto que chama “recuperações nos valores dos materiais”.

Sem tal explicação – admitimo-lo – talvez nem sequer chegássemos a perceber o que se pretendia dizer com “recuperações nos valores dos materiais”, mas, sendo assim, sem ultrapassar a sede “factual” em que nos movemos, importa acentuar a inconsistência da argumentação (e das operações aritméticas de que fala). Ou seja, o preço combinado com o R. foi um preço global e não um preço por artigo ou unidade; é certo, que em dois casos (no parquet e nos mosaicos) se alude (nos orçamentos) a um limite de valor/custo dos mesmos, porém, tal não significa – é do mais elementar bom senso – que se tal limite não for/fosse atingido, então há/haveria uma “recuperação” ou um “desconto” no preço.

Não merecem pois qualquer censura as respostas dadas aos quesitos 11.º, 12.º, 15.º e 16.º, que assim se mantêm.

Quanto ao que foi combinado sobre o trabalho do A. na obra e sobre o seu pagamento; isto é, quanto aos quesitos 13.º e 14.º (não provados) e 140.º (provado, na parte em que se diz que o que já consta da alínea U) foi feito “por iniciativa do A.”), que o A/apelante diz que devem ser julgados exactamente ao contrário.

Na apreciação crítica da prova produzida a tal propósito, escreveu-se na decisão sob recurso que, quanto “a matéria relacionada com a prestação de trabalho do autor na sua própria moradia, concretamente facto 140 e correspondente resposta negativa ao facto 13 fundamentam-se no depoimento da testemunha Z... e com as regras da experiência comum, as quais não se coadunam com o pagamento ao próprio dono da obra de trabalhos por si realizados.

Concorda-se com a conclusão de tal apreciação crítica.

Não há uma única testemunha que refira ter conhecimento directo de tal acordo entre A. e R.; apenas a mãe do A., depois de muitas insistências – e após dizer muitas vezes “não me lembro”, “não me recordo”, “não tenho a certeza”, “desde que tive a doença esqueci-me de muita coisa” – disse que “ele trabalhou, pronto, com certeza que por algum acordo”.

Aliás, a argumentação do A/apelante é sintomática – fazendo umas contas/estimativas, em que diz que dá uma média de 2 horas e um quarto por dia e em que sustenta que mesmo que não tivesse sido combinado haveria um enriquecimento sem causa – da total falta de prova dos quesitos 13.º e 14.º; enfim, só do que é invocado pelo A/apelante na alegação recursiva, em que tudo é muito vago e genérico, seria possível concluir pela não prova de tais dois quesitos.

O A., é verdade, procedeu a trabalhos; exacta e rigorosamente quais, em que quantidades e em que termos – se acordados ou por iniciativa do A. – não se sabe; e desconhecendo-se, exactamente, os trabalhos e as quantidades, jamais se poderiam fixar valores[6].

Não merecem pois qualquer censura as respostas negativas dadas aos quesitos 13.º e 14.º; porém, em face da idêntica debilidade da prova também apresentada a tal propósito pelo R. entendemos que ao quesito 140.º se ajusta melhor idêntica resposta negativa e, em consequência, altera-se a sua resposta para “não provado”.

Quanto ao isolamento térmico da casa; isto é, quanto aos quesitos 7.º e 118.º (não provados) e 137.º (provado), que o A/apelante diz que devem ser julgados exactamente ao contrário.

Na apreciação crítica da prova produzida a tal propósito, escreveu-se na decisão sob recurso que, “a aprovação do projecto de arquitectura por parte da Câmara Municipal da Marinha Grande, dependia da apresentação de tais [projecto de instalação de gás e o projecto de isolamento térmico] projectos de especialidades. No que concerne ao projecto de isolamento térmico, como sublinhado pela testemunha I..., não obstante a obrigatoriedade da sua elaboração e apresentação, tal não significa, em abstracto, que se dê cumprimento ao mesmo aquando da construção da obra, desconhecendo a testemunha se efectivamente tal foi feito na obra em questão. No entanto, e a este propósito resultou do depoimento das testemunhas J... e O... que efectivamente não foi feito qualquer isolamento térmico na moradia do autor, o que se deveu, segundo estes depoimentos, ao facto de aquele não ter disponibilidade financeira para o efeito. Cabe dizer que os depoimentos se afiguraram isentos, tanto mais que, como dito pelas testemunhas H... e I... em confronto com o livro de obra, o isolamento térmico tem lugar na altura das fundações e da elevação das paredes, portanto numa fase inicial da obra. Se assim é, e caso tivesse sido acordado entre o autor e o réu, seria lógico que o isolamento térmico estivesse logo previsto no orçamento inicial, o que não se vislumbra no documento de fls. 31 a 33, assim se fundamentando a resposta positiva ao facto 137 e correspondente resposta negativa ao facto 7. O depoimento da testemunha H... focou-se também nas funções que desempenha o isolamento térmico numa moradia, o que nos permitiu em conjugação com os depoimentos de J... e O... responder positivamente ao facto 119 e negativamente ao facto 118 não obstante a resposta ao mesmo dada no relatório pericial.

Mais uma vez se concorda, em face da prova produzida, com o essencial do raciocínio expresso em tal apreciação crítica.

É indiscutível que havia projecto de isolamento térmico e que o mesmo não foi executado pelo R.; talvez por isso, da banda do A., se perguntou recorrentemente às testemunhas, não o que foi combinado entre A. e R. sobre o projecto de isolamento térmico, mas sim se existia tal projecto; evidentemente, a questão, nos quesitos 7.º e 137.º, não é bem esta.

Naturalmente, quer o Eng. Q... (autor de tal projecto de especialidade), quer o técnico de arquitectura e engenharia H... (co-autor do projecto de arquitectura) quer a desenhadora I... (coordenadora do projecto de arquitectura), confirmaram a existência do projecto de isolamento térmico, a sua exigência legal e a sua indispensabilidade numa casa, porém, sobre o que foi efectivamente combinado, não deram qualquer ajuda.

Aliás, com relevo para esta questão, apenas temos os contributos das testemunhas J... e O...[7], que, em termos credíveis, disseram que ouviram o A. dizer ao R. que não queria o isolamento em face do preço que o R. dizia que o mesmo custava; o que, junto com o facto do A. viver à época nos anexos, leva a supor que, se o isolamento constasse do orçamento/acordo/contrato, o A. não deixaria avançar a obra e, evidentemente, teria obrigado o R. a executá-lo (no momento e na fase em que a esferovite é facilmente colocada entre os “panos” da parede, como o técnico H... o explicou).

Não merecem pois qualquer censura as respostas dadas aos quesitos 7.º, 118.º e 137.º, que assim se mantêm.

Quanto à insistência, durante o ano de 2002, para vir acabar a obra; isto é, quanto aos quesito 21.º (não provado), que o A/apelante diz que deve ser julgado exactamente ao contrário.

Estriba-se o A/apelante no depoimento da sua mãe, R..., depoimento que, porém, pela sua confusão e vacuidade, não transmite quaisquer certezas; é certo que das alíneas AJ), AL), AM), AN) e AO) já consta algo a tal propósito, mas, evidentemente, o que se pergunta no quesito 21.º é algo mais além de tais alíneas (que continuarão a conter factos provados, pese embora a resposta negativa ao quesito 21.º).

Não merece pois qualquer censura a resposta negativa dada ao quesito 21.º, que assim se mantêm.

Quanto ao custo (€ 2.000,00) dos gradeamentos, isto é, quanto ao quesito 23.º (não provado), que o A/apelante diz que deve ser julgado exactamente ao contrário.

A testemunha LL..., que à época trabalhava na serralharia PVJ, disse que deu um orçamento no valor de € 2.000,00 para os gradeamentos de toda a casa (R/C e 1.º andar), mas que, depois, o A. só fez parte dos gradeamentos, pelos quais pagou € 300,00; assim, tendo os peritos respondido que as grades em falta custam € 450,00, entendemos que é possível responder, ao quesito 23.º, que os gradeamentos de toda a casa (R/C e 1.º andar) ascendem a € 750,00.

Altera-se pois no sentido acabado de referir a resposta ao quesito 23.º.

Quanto ao isolamento das paredes e fundações e o seu custo (€ 7.500,00), isto é, sobre os quesitos 26.º e 27.º (não provados, ou melhor, prejudicados), que o A/apelante diz que devem ser julgados exactamente ao contrário.

Em favor da inversão das respostas dadas, invoca o A/apelante o testemunho de S..., construtor civil, que a convite do A. visitou a casa deste por duas vezes, “há dois anos e agora” (por reporte a 18/10/2011), tendo em vista poder vir a fazer reparações na mesma, o que ainda não aconteceu; e que, naturalmente, com base em tal “ciência” adquirida nas duas referidas vistas, não deu senão “opiniões/palpites”, vagos e imprecisos, sobre trabalhos em falta e sobre custos, dizendo especificamente sobre os quesitos 26.º e 27.º que “agora não se consegue colocar”, “agora o custo é elevado” e “bastante mais do que seria”.

Evidentemente, a partir dum tal tipo de depoimento – que incidiu sobre factos que suscitam e exigem uma percepção de “especialistas”, tendo os mesmo sido nomeados nos autos – nada pode/deve ser considerado provado[8].

Não merecem pois qualquer censura as resposta negativas dadas ao quesitos 26.º e 27.º, que assim se mantêm.

Quanto aos acabamentos no rés-do-chão, isto é, quanto ao quesito 28.º; que teve um “provado apenas” e que o A/apelante diz que deve ser integralmente provado.

Não tem qualquer interesse, uma vez que, por reporte ao que foi considerado provado – em que se concretiza que falta acabar trabalhos de pintura e pavimentos – e em harmonia com as respostas periciais, deu-se como provado todo o quesito 29.º, em que se perguntava o custo/valor de tal trabalho (de € 8.000,00).

Não merece pois qualquer censura a resposta dada ao quesito 28.º, que assim se mantêm.

Quanto ao modo de reparar a parede interior que está desalinhada e respectivo custo (€ 7.000,00); isto é, quanto aos quesitos 38.º, 39.º e 40.º (não provados e prejudicado), que o A/apelante diz que devem ser julgados exactamente ao contrário.

Em face do que consta do relatório pericial, a fls. 388, têm tais quesitos que ser considerados provados.

Alteram-se pois no sentido acabado de referir, para “provados”, as respostas aos quesitos 38.º, 39.º e 40.º.

Quanto ao custo de substituição dos roupeiros (€ 3.000) e quem os colocou, isto é, quanto aos quesitos 56.º e 57.º (não provados), que o A/apelante diz que devem ser julgados exactamente ao contrário.

Está provado – quesito 55.º – o problema dos roupeiros; o que está em causa é o custo da reparação e saber quem os colocou.

Quanto ao custo, em face do que consta do relatório pericial, a fls. 390, pode dar-se como provado o custo de € 1.500,00.

Quanto ao quesito 57.º, tem que ser considerado provado, em face do depoimento JJ..., carpinteiro contratado pelo R., que colocou os roupeiros; e que acrescentou – sobre a falta de profundidade dos roupeiros – que alertou o A. que, com as portas de correr como ele queria, os roupeiros iam ficar sem profundidade (mas, o A. “disse que queria assim”).

Alteram-se pois no sentido acabado de referir as respostas aos quesitos 56.º e 57.º.

Quanto aos empeno das portas interiores; isto é, quanto aos quesitos 62.º (o provado remete para a alínea AA)), 63.º e 64.º (não provados), que o A/apelante diz que devem ser julgados exactamente ao contrário.

As respostas dadas reflectem o que consta, a fls. 390, do relatório pericial; e o A/apelante só invoca para alterar as respostas uma interpretação que faz de tal exame.

Não merecem pois qualquer censura as respostas dadas aos 3 referidos quesitos, que assim se mantêm.

Sobre o chão junto à entrada se encontrar oco e ao custo com a sua reparação; isto é, quanto aos quesitos 65.º a 70.º (não provados, com excepção do 66.º, em que se diz que é necessário retirar os ladrilhos que se encontram partidos), que o A/apelante diz que devem ser julgados exactamente ao contrário.

As respostas dadas reflectem o que consta, também a fls. 390, do relatório pericial; e o A/apelante invoca para alterar as respostas o “testemunho pericial” do S... e o testemunho do M.... Como já se referiu, quando estão em causa factos que suscitam e exigem uma percepção de “especialistas”, tendo os mesmo sido nomeados e efectuado as suas percepções e apreciações, impõem-se esta às “impressões” das testemunhas.

O fulcro destes 6 quesitos estava, aliás, na insuficiência de cimento e os peritos dizem que “não fica oco com mais ou menos cimento[9].

Aliás, o cunhado do A. (a testemunha G...) disse que no local existia, dantes, um poço, o que, mecanicamente, pode ser a explicação para a desagregação.

Não merecem pois qualquer censura as respostas dadas aos 6 referidos quesitos, que assim se mantêm.

Sobre a má colocação dos ladrilhos da cozinha; isto é, quanto ao quesito 79.º (não provado), que o A/apelante diz que deve ser julgado exactamente ao contrário.

A resposta dada reflecte, a nosso ver, o que consta, a fls. 391, do relatório pericial, onde se diz que “existem imperfeições sem relevância”; ou seja, entende-se que o que foi alegado – e não se provou – foram imperfeições relevantes.

Não merece pois qualquer censura a resposta dada ao quesito, que assim se mantêm.

Quanto ao custo da correcção dos rebocos exteriores e dos alumínios; isto é, quanto aos quesitos 84.º, 85.º e 86.º (não provados), que o A/apelante diz que devem ser julgados exactamente ao contrário

Os quesitos 85.º e 86.º eram relevantes para a caducidade, que já está em definitivo julgada contra o R., pelo que perdeu interesse reapreciá-los.

O quesito 84.º (sobre o custo) não pode ser dado como provado, uma vez que os peritos não indicam qualquer valor[10], sendo completamente anómala a argumentação expendida pelo A/apelante segundo a qual, referindo os peritos “um valor a considerar” e “sendo os valores apresentados pelo A. meramente estimativos, pode afirmar-se com segurança que no mínimo corrigir esses defeitos atinentes a este facto custava € 4.000,00”.

Não merece pois qualquer censura a resposta dada ao quesito 84.º, que assim se mantêm.

Sobre o que gastou com 3 vistorias e sobre o motivo de tal gasto; isto é, quanto ao quesito 92.º (não provado), que o A/apelante diz que deve ser julgado exactamente ao contrário.

Para alterar a resposta, o A. apelante invoca 3 documentos juntos em 29/04/2008; mas, naturalmente, tais documentos só provam que foram feitos os pagamentos que dos mesmos constam.

Altera-se pois a resposta ao quesito 92.º e dá-se como provado que “o A. pagou, por 3 vistorias, a quantia de 31.200$00”.

Quanto às rupturas de águas em Dezembro de 2002, isto é, quanto aos quesitos 93.º, 94.º e 95.º (não provado e prejudicados), que o A/apelante diz que devem ser julgados exactamente ao contrário.

Uma vez que tais rupturas não foram referidas na prova testemunhal e não foi sequer ouvida a pessoa que, segundo o A., a reparou, também entendemos que um cheque dum pagamento a um tal U... é insuficiente para dar tais quesitos como provados.

Não merecem pois qualquer censura as respostas dadas aos 3 referidos quesitos, que assim se mantêm.

Quanto ao tubo de electricidade que passa por baixo do fogão da sala e estragos causados na aparelhagem e televisor; isto é, quanto aos quesitos 96.º e 98.º (não provados, o 96.º na parte em que não se dá como provado que foi o R. que passou o tubo), que o A/apelante diz que devem ser julgados exactamente ao contrário

Nestes quesitos, é bastante esclarecedor o depoimento de L..., pessoa que o R. contratou para fazer a parte eléctrica do piso superior, que referiu ter feito tudo de acordo com as normas, que disse que quando fez o trabalho não havia sequer fogão na sala e que, na sua ausência, o A. “trocava a posição das coisas”, utilizava material eléctrico que a testemunha lá deixava e “colocava tubos por iniciativa dele”.

Em face disto, naturalmente, a resposta restritiva ao quesito 96.º está certa; e, quanto ao 98,º, o documento de fls. 27, a que se alude, é insuficiente para o dar como provado (designadamente, a relação de causa e efeito perguntada).

Não merecem pois qualquer censura as respostas dadas aos quesitos 96.º e 98.º, que assim se mantêm.

Quanto à queda da pedra que se deslocou da sacada e aos estragos causados, isto é, quanto aos quesitos 99.º a 101.º (não provados), que o A/apelante diz que devem ser julgados exactamente ao contrário

Em face do que consta do relatório pericial, a fls. 391, o quesito 99.º pode ser dado como provado, porém, o que se pergunta nos outros dois quesitos não resulta do relatório pericial (único meio de prova invocado pelo A/apelante).

Altera-se pois a resposta ao quesito 99.º para “provado” e mantêm-se as respostas “não provado” aos quesitos 100.º e 101.º.

Quanto ao R. e aos seus auxiliares se haverem apropriado e estragado ferramentas do A. na obra; isto é, quanto aos quesitos 103.º e 104.º (não provados), que o A/apelante diz que devem ser julgados exactamente ao contrário.

Invocando unicamente o A/apelante, para alterar tais respostas, o depoimento vago, impreciso e assumidamente desmemoriado da sua mãe, as respostas não podem senão manter-se.

Quanto ao aspecto estético da casa do A. e à tela nas chaminés; isto é, quanto aos quesitos 112.º e 113.º (não provados), que o A/apelante diz que devem ser julgados exactamente ao contrário.

A prova testemunhal invocada é completamente vaga e opinativa – aliás, como o que se alegou e que foi vertido na BI – as respostas retratam o que resulta, a fls. 392, do relatório pericial e, inclusivamente, sobre o aspecto estético, a testemunha H... afirmou que a casa “parece uma casa bonita” e a “casa é um espectáculo”.

Não merecem pois qualquer censura as respostas dadas aos quesitos 112.º e 113.º, que assim se mantêm.

Quanto à não entrega do mapa de passagem de tubos e colocação incorrecta de interruptores, tomadas e tubos de aquecimento e à sua colocação incorrecta, isto é, quanto aos quesitos 114.º e 115.º (não provados), que o A/apelante diz que devem ser julgados exactamente ao contrário.

A resposta ao quesito 115.º exprime o que resulta, a fls. 392, do relatório pericial; ademais, o depoimento de L..., pessoa (já referida) que colocou a parte eléctrica, foi convincente quanto às interferências do A. na execução da parte eléctrica, acrescentando que não havia projecto da passagem dos tubos nas paredes[11] e que passou sempre a tubagem e as caixas à “medida e com a concordância” do A.

Não merecem pois qualquer censura as respostas dadas aos quesitos 114.º e 115.º, que assim se mantêm.

Quanto às canalizações de água carecerem dum ensaio hidráulico, isto é, quanto ao quesito 116.º (não provado), que o A/apelante diz que deve ser julgado exactamente ao contrário.

A argumentação do A/apelante parece lógica; se o R. “abandonou” e não concluiu a obra, tal ensaio faz sentido que não tenha sido feito; porém, a testemunha T..., canalizador que fez os trabalhos por conta do R., garantiu que fez o ensaio hidráulico e que não havia fugas.

Não se vê pois razão para alterar tal resposta, que assim se mantêm.

Quanto ao o A. ter caído das escadas por falta de corrimão e ter efectuado um entorse no pé direito, isto é, quanto aos quesitos 125.º e 127.º (não provados, embora no 125.º se tenha dado como provado que caiu das escadas), que o A/apelante diz que devem ser julgados exactamente ao contrário.

Em face dos meios de prova invocados pelo próprio A/apelante, apenas se prova – como já resulta da resposta ao quesito 125.º – que o A. caiu, não se estabelecendo a relação com a falta de corrimão e um consequente entorse.

Não merecem pois qualquer censura as respostas dadas aos quesitos 125.º e 126.º, que assim se mantêm.

Quanto ao adiamento do casamento (e profundo desgosto) por causa dos vícios da casa; isto é, quanto aos quesitos 130.º e 131.º (não provados), que o A/apelante diz que devem ser julgados exactamente ao contrário.

Não é invocado pelo A/apelante a favor da alteração das respostas um qualquer específico meio de prova; sendo que a alteração – adiar o casamento pelo motivo invocado – não é algo que resulte da normalidade da vida, da experiência comum; muito menos será compreensível que, por causa dos vícios da casa, o A. se mantenha solteiro (foi este o estado civil declarado quando, em 13/09/2011, foi ouvido em depoimento de parte)[12].

Não merecem pois qualquer censura as respostas dadas aos quesitos 130.º e 131.º, que assim se mantêm.

Quanto aos quesitos 135.º e 138.º, em que apenas se deu como provado que “o réu suportou despesas com mão de obra e materiais relacionados com os trabalhos que efectuou na moradia referida em A); quesitos que o A/apelante diz que devem ser julgados integralmente “não provados”.

O que foi dado como provado pela resposta restritiva não é sequer controvertido pelo A., razão porque não se alcança o motivo (e a “legitimidade”) da impugnação; não pode pois a resposta – sem necessidade de qualquer reapreciação – deixar de manter-se.

Quanto a o A. ter solicitado a realização de várias alterações ao projecto inicialmente acordado; isto é, quanto ao quesito 136.º (provado), que o A/apelante diz que deve ser julgado exactamente ao contrário.

Não é invocado qualquer específico meio de prova, mas apenas a circunstância de, na alínea I) se haver dado como provado que “qualquer alteração orçamento seria sempre efectuada com o acordo de ambas as partes”.

Não se entende o racional da argumentação do A/apelante[13]; um acordo/convergência – seja no que for – nasce normalmente (para não dizer sempre) duma solicitação duma parte à contraparte, que, ao concordar com a solicitação, converte a solicitação em acordo.

Mantém-se pois a resposta dada.

Quanto ao local onde o A. vivia enquanto decorreu a execução da obra, isto é, quanto ao quesito 144.º (provado), que o A/apelante diz que deve ser julgado não provado.

Em 1.º lugar, importa referir que, mais uma vez, a argumentação do A/apelante não é racional; uma vez que diz que se provou que vivia nos anexos – fazendo isto parte do quesito – e conclui que o quesito deve ser julgado totalmente não provado.

Em 2.º lugar, que se trata de alteração sem qualquer relevo jurídico, uma vez que sempre significará a proximidade e o acompanhamento, por parte do A., à execução/evolução da obra.

Em todo o caso, assiste razão parcial (na argumentação, mas não na conclusão) ao A/apelante.

O A/apelante disse no seu depoimento de parte que vivia nos anexos (dando até lugar à assentada que consta de fls. 1719) e foi isto que referiram os trabalhadores da R., designadamente, o J... e o C....

Modifica-se pois a resposta ao quesito 144.º, dando-se apenas como provado que, durante a execução da obra, o A. vivia nos anexos.

Quanto à agressão do A. ao R. e de aquele, a partir dali ter deixado de laborar na obra, isto é quanto aos quesitos 145.ºe 146.º (em que se deu como provada a agressão, à frente dos empregados, e que, em consequência de tal facto “e também por o A. se encontrar em dívida de alguns pagamentos, o R. deixou de laborar na obra”), que o A/apelante diz que devem ser julgados como não provados.

Cumpre começar por enfatizar que o A. foi criminalmente condenado por no dia 28/09/2001, na obra, “ (…) ter agredido o R. com uma cabeçada no nariz” e ter-lhe desferido uma pancada na nuca; causando-lhe fractura dos ossos próprios do nariz, edema do lábio superior e lesões na região dorsal superior; agressão essa testemunhada pelo J....

Aliás, segundo esta testemunha, o R. estaria a conversar com o A. e a dizer-lhe que ia parar a obra até receber mais pagamentos (e já tinha dito aos trabalhadores para arrumarem tudo e para suspender os trabalhos), tendo sido neste contexto a agressão (“(…) e nisto a cabeçada (…)”); após o que foram embora e não voltaram mais.

Em face disto, a única controvérsia nas respostas está em o A. estar ou não em dívida nos pagamentos; neste aspecto, já referimos que foram combinados pagamentos escalonados conforme o desenvolvimento da obra, porém, não tendo sido estabelecida (não foi sequer alegada) uma relação precisa entre as fases da obra e os montantes exactos a pagar pelo A., não se pode dizer/concluir com certeza que o A. estava em dívida, mas apenas que o R. dizia que o A. estava em dívida.

Em consequência, modificam-se as respostas dadas no seguinte sentido: quesito 145.º: provado apenas que, em 28/09/2001, quando o R. pedia mais dinheiro ao A., este, à frente dos empregados do R., agrediu-o com uma cabeçada; quesito 146.º: provado apenas que, em consequência de tal facto e também por o R. entender que A. se encontrava em dívida de alguns pagamentos, o R. deixou de laborar na obra.

Quanto à parede exterior fora de esquadria, isto é, quanto aos quesitos 151.º a 153.º (essencialmente provados), que o A/apelante diz que devem ser julgados não provados.

Sustenta o A/apelante que “a prova testemunhal no que tange a estes quesitos não é minimamente credível atendendo à total ausência de bom senso”, isto é, o A/apelante não contesta que os trabalhadores da obra, ouvidos como testemunhas, disseram exactamente o que foi dado como provado.

Efectivamente, tal foi referido pelos J..., C... e O... e duma maneira completamente persuasiva e convincente; mais, é até confirmado pela testemunha do A., I..., ao referir que o desalinhamento “não é um defeito”, mas a continuação do desalinhamento que vinha do R/C[14].

Não merecem pois qualquer censura as respostas dadas aos quesitos 151.º a 153.º, que assim se mantêm.

Quanto à correcção do acimentado, isto é, quanto ao quesito 156.º (essencialmente provado), que o A/apelante diz que deve ser julgado não provado.

O subempreiteiro de que se fala no quesito é a penúltima testemunha ouvida, N..., que disse exactamente o que consta da resposta; disse que com a técnica (“helicóptero”, se bem entendemos) que lhe foi pedida podem ficar irregularidades, mas que se prontificou a tentar corrigi-las (acrescentou mesmo que nem sabe, uma vez que não pôde lá ir, se “dava para corrigir”)

Não merece pois qualquer censura a resposta dada ao quesito 156.º, que assim se mantêm.

Quanto aos quesitos 157.º, 158.º e 161.º (provados e essencialmente provado), que o A/apelante diz que devem ser julgados não provados.

Limita-se o A/apelante a dizer que não foi feita prova dos factos constantes de tais quesitos, porém, tais factos, foram referidos pelos trabalhadores e subempreiteiros do R., designadamente, pelo C..., E..., O... e L...

Não merecem pois qualquer censura as respostas dada a tais 3 quesitos, que assim se mantêm.

Finalmente, quanto aos trabalhos extra e aos seus custos, isto é, quanto aos quesitos 167.º a 194.º (provados ou essencialmente provados), que o A/apelante diz que devem ser julgados não provados.

Na apreciação crítica da prova produzida a tal propósito (e já referida), escreveu-se na decisão sob recurso que, “os factos relacionados com os trabalhos efectuados pelo réu na moradia do autor e respectivos custos fundamentam-se quanto aos primeiros nos depoimentos das testemunhas contratadas pelo réu para a sua realização, concretamente T..., O..., D..., O..., JJ..., V..., N... e P... e ainda no depoimento de J... que trabalhou para o réu do princípio ao fim da obra. Quanto aos custo de tais trabalhos, mormente os que vêm indicados nos factos 173, 175, 177, 179, 181, 183, 185, 187 e 189, as respostas positivas assentam no depoimento da testemunha X... pelas razões já indicadas. (…) tendo-se munido de notas elaboradas à altura dos factos”. Acrescentando-se, ainda, que “resultou do depoimento de várias testemunhas que, após um acordo inicial entre autor e réu e que se referia apenas ao primeiro andar, foi contratada a realização de trabalhos no rés do chão. Isso é patente não só do depoimento da testemunha J..., mas também do depoimento de C..., L..., E..., O... e JJ... que elaboraram orçamentos diferentes para o rés do chão e para o primeiro andar, competindo o pagamento de materiais, no primeiro caso ao autor e no segundo ao réu.

No fundamental – com excepção da valoração que é feita do depoimento do X... – concorda-se com o conteúdo da motivação transcrita.

As partes – ambas as partes – não primaram pela clareza, primeiro, na alegação do conteúdo/extensão contratual; e, depois, na instância das testemunhas sobre os assuntos que pressupunham tal delimitação.

Em todo o caso, ficou claro (do depoimento dos projectistas) que o projecto era uma ampliação – fazer um 1.º andar em cima do R/C – e que, naturalmente, o orçamento/contrato (referido em H) incidia sobre tal ampliação.

Daí que, sem prejuízo da delimitação não ter sido estabelecida de modo perfeito e acabado por ambas as partes, merecessem crédito, com as consequentes ilações em termos de factos provados, as seguintes afirmações:

Do J..., ao referir que foi para lá “para trabalhos no 1.º andar e telhado”; que “tudo o que foi feito no R/C são extras”; e que “há 2 barracões e no contrato não estava nenhum

Do L... (electricista) ao dizer que “só foi contratado pelo R. para o 1.º andar” e que “o A. utilizava o material dele no R/C e que chegou a pedir-lhe 30 contos e ele mandou-o fazer contas com o R.

Do T... (canalizador) ao dizer que “só foi contratado pelo R. para o 1.º andar (para fazer uma cozinha e uma casa de banho); e que fez e que foram extras o que se respondeu aos quesitos 190 e 191.

Do E... (pintor), que disse que o R. lhe pediu um orçamento para a pintura da parte de cima e o A. para os anexos e os muros (acabando por não fazer quaisquer trabalhos).

Da O... (da serralharia que forneceu os alumínios) que disse que o R. lhe pediu para fazer o orçamento da parte de cima e quando foi à obra o A. também lhe pediu o orçamento para a parte de baixo[15]; acrescentando que depois o A. se recusou a pagar e que o R. pagou tudo; confirmando o que foi respondido aos quesitos 170.º e 171.º.

Do JJ... – carpinteiro (o que fez os roupeiros) – que deu o orçamento para tudo, mas não forneceu tudo, acabando por não fazer as portas e roupeiro para baixo; que deu orçamentos separados, um ao R. e outro da parte de baixo ao A.; e que o R. depois lhe disse para não fazer os roupeiros para baixo que não lhos ia pagar, “uma vez que tinha levado na cara do A.”.

Do V... – que trabalhava/tinha a empresa que forneceu os mármores e granitos – e que forneceu material a pedido, primeiro, do R. para a parte de cima e, depois, do A. para a parte de baixo; confirmando o que foi respondido aos quesitos 168.º e 169.º (e que o A. não lhe pagou e que depois o R. lhe pagou)

Assim, em face de tal prova, mas valorando o depoimento da testemunha X... com o mesmo e idêntico critério concedido à testemunha S... – este, como se referiu, deu “opiniões/palpites”, vagos e imprecisos, sobre trabalhos em falta e sobre custos e o X..., munido duma “cábula”, deu semelhantes “opiniões/palpites” e atribuiu valores (coincidentes com os dos quesitos) aos alegados trabalhos “extra” – não vislumbramos razão suficiente para dar como provados os quesitos 173.º, 175.º, 177.º, 179.º, 181.º, 183.º, 185.º, 187.º e 189.º, todos eles sobre valores apenas indicados pelo X... e, em consequência, alteram-se as respostas a tais 9 quesitos para “não provado”; quanto ao quesito 167.º rectifica-se a resposta para “provado que entre A. e R. foram acordadas diversos trabalhos além dos que constavam do orçamento referido em R)” e mantêm-se, em tudo o mais, as respostas dadas aos restantes quesitos (estamos a falar das respostas dadas aos quesitos 167.º a 194.º)[16].

Em face de tudo isto – que a motivação da decisão de facto também refere – e das atinentes regras da experiência, o sentido e a avaliação da prova produzida, em termos de análise crítica, não poderá ser outro senão o que enformou as respostas mantidas e que conduziu às modificações ora introduzidas.

É o que há a dizer e concluir sobre o recurso de facto, que assim improcede e procede nos exactos termos que foram sendo, passo a passo, referidos e estabelecidos.

*

III – Fundamentação de Facto

Os factos provados, lógica e cronologicamente alinhados e incluindo as modificações operadas, são os seguintes:

1-O autor é dono e legítimo possuidor do prédio urbano composto de casa do rés do chão e primeiro andar para habitação, dependência e logradouro, sito na Rua Central, nº 174, (...), freguesia e concelho de Marinha Grande, inscrito na matriz predial urbana da Repartição de Finanças da Marinha Grande sob o artigo 6957, descrito na Conservatória do Registo Predial da Marinha Grande sob o nº 6725 a seu favor.

2-O autor adquiriu o imóvel referido em 1, por contrato de compra e venda que fez com R..., em 26.05.98.

3-Após a aquisição do imóvel, o autor deu entrada de um projecto de construção e beneficiação do mesmo na Câmara Municipal da Marinha Grande, nesse mesmo ano, tendo sido aprovado o projecto inicial em deliberação camarária de 25 de Novembro de 1998.

4-O autor contactou o réu, que lhe havia sido indicado por terceiras pessoas, para que este lhe elaborasse um orçamento para o projecto de construção da sua moradia.

5-O réu em 18 de Fevereiro de 2000 elaborou um orçamento ao autor, o qual foi por este aceite, do qual consta:

“ (...)

Conforme o solicitado por V/Ex junto envio o m/melhor orçamento para a remodelação da vossa moradia, sita em (...) – Marinha Grande.

-Retirar telhado existente e empenas

-Fazer pilares, sapatas e lintel de fundação

-Fazer escada para o primeiro andar e revesti-la em pedra moca ou vidraço

-Colocar lintel em cima da placa

-Fazer paredes e pôr placa

-Colocar telhado com vigamento R.10

-Pôr telha lusa ou equivalente

-Rebocar por dentro e por fora

-Aplicar forrar nas janelas em cima, como no projecto

-Colocar alumínio em cima das janelas, sacadas e porta

-Sectores de alumínio em cima

-Aplicar chão em mosaico na cozinha e casas de banho e azulejo até ao tecto

-Quartos em parquet até ao valor de 4.000$00 m2

-Louças sanitárias marca Indusa ou equivalente

-Torneiras marca Oliva Compacto ou equivalente, na casa de banho

-Electricidade normal na parte nova

-Canalização em tubo PEX

-Fogão de sala de compra até ao valor de 200.000$00 a escolher

-Aros, portas e roupeiros em mogno ou equivalente

-Pintura como no projecto

 (...)

O valor do meu orçamento é de 9.768.000$00 mais IVA”

 (...)

-Colocar cerca de 55 m2 em malha sol e mosaico em cimento só até 1.300$00 m2, no acimentado junto à estrada

-Colocar uma grelha com 3x20x20

-Fazer 4 pilares com 2mx30

-Pôr pedras na varanda com 6x15

-Aplicar mosaico no chão da varanda até ao valor de 2.000$00 m2

O valor do meu orçamento é de 365.000$00 mais IVA

 (...)

-Demolir barracão existente (riscado a esferográfica)

-Retirar o telhado existente

-Fazer cerca de 10x60 m2 com parede em tijolo 15 com lentel

-Fazer lintel em volta com 32 mx20Al.x15larg

-Colocar IS e R10

-Telhar com telha nova

-Acimentar com malha sol

-Rebocar as paredes do mesmo

-o valor do meu orçamento é de 720.000$00 mais IVA

(…)

Só acimentado com malha sol 330.000$00, mais acabamento liso com helicopetros mais IVA”

6-Autor e réu convencionaram que qualquer alteração ao orçamento seria sempre efectuada com o acordo de ambas as partes.

7-Autor e réu combinaram que aquele faria pagamentos escalonados de acordo com o desenvolvimento da obra.

8-A aquisição dos materiais de construção seria da responsabilidade do réu e o seu custo já estava incluído no orçamento.

9-Não obstante o facto referido em 8, posteriormente, por acordo entre autor e réu, ficou convencionado que seria aquele a pagar alguns dos materiais necessários para a realização da obra, pelo que todos os montantes pagos pelo autor a título de despesas efectuadas com a obra seriam posteriormente descontados no valor do orçamento.

10-Na sequência do que o autor pagou a Eusébio o fogão de sala no montante de 234.000$00.

11-E pagou pelo menos o chão das varandas (€299,28), o chão da frente (€389,06), o chão da sala e da cozinha (€ 528,73), os azulejos de uma casa de banho (€ 329,21), o chão de outra casa de banho (€ 69,83), e o chão da área de tratamento das roupas (€ 69,83).

12-O autor obteve a primeira licença camarária para construção, cuja validade teve início em 21.03.2000 e termo em 16.03.2001.

13-Em 16.03.2001 a obra estava por concluir e o autor teve necessidade de prorrogar a licença a que se alude em 11, por sete meses.

14-Para concretizar as obras do imóvel, o autor optou por realizar um empréstimo bancário, o qual foi realizado (concedido) em 18 de Abril de 2001.

15-O projecto de construção da moradia do autor tinha, obrigatoriamente, uma instalação de gás e um projecto de isolamento térmico.

16-Autor e réu acordaram que o isolamento térmico dependeria da disponibilidade financeira do autor na altura da realização da obra.

17-O réu suportou despesas com mão-de-obra e materiais relacionadas com os trabalhos que efectuou na moradia referida em 1.

18-O autor procedeu à tirada de terra e entulhos, deu serventia de pedreiro ao réu e auxiliou-o noutros trabalhos, fez trabalhos de electricista, tendo colocado na obra alguns tubos de electricidade, substituiu algum ladrilho do chão junto à estrada, fez demolições, roços e arrumações, fez pinturas, envernizamentos, colocou pedras do pilares exteriores da casa e fez limpezas diversas, trabalhos estes que efectuou por sua iniciativa.

19-Durante a execução da obra, o autor vivia nos anexos.

20- Pelo menos em Junho de 2000, o réu deu início às obras acordadas com o autor.

21-O autor solicitou ao réu a realização de várias alterações ao projecto inicialmente acordado.

22 - E foram acordadas diversos trabalhos além dos que constavam do orçamento referido em R).

23-O réu colocou pedras nas janelas e soleiras do andar de baixo, o que custou € 1.007,57.

24-O réu colocou alumínios novos no rés-do-chão, de forma a não diferenciar em demasia do primeiro andar, tendo os alumínios importado a quantia de € 2.500,00.

25-O réu refez, rebocando, um segundo barracão existente no logradouro da casa (não aquele a que se refere o orçamento suplementar), colocando-lhes I20 e R10, para assentar a telha castanha nova, de acordo com o resto da obra.

26- O réu rebocou a parte de trás da oficina.

27-O réu colocou pilares e rebocou o muro existente, tendo ainda rebocado a parte direita do muro, tanto do lado de dentro como do de fora.

28-O réu demoliu e cimentou o chão da cozinha.

29- O réu rebocou o escritório da parte de baixo.

30-O réu rebocou o tecto e a cozinha, situada no pátio, a que chamavam “cozinha da mãe”.

31-O réu demoliu o chão e fez as paredes da casa de banho do pátio, rebocou-a.

32- O réu refez o telheiro, com pilares R10 e telha castanha.

33-O réu fez paredes por cima da placa existente, que também rebocou no terraço.

34-O réu fez a canalização da casa de banho do pátio, da cozinha, colocou tubos debaixo do cimentado para várias torneiras e colocou tubagem para aquecimento central, o que lhe custou a quantia de € 1.500,00.

35-O réu mandou fazer e colocou caixas de vigia em ferro e refez ainda o chão na frente da casa.

36-A obra padece de humidades e infiltrações e em consequência de tal facto, a casa do autor apresenta o cheiro característico da humidade.

37-Humidades e que também se devem à falta de pintura exterior.

38-A parede da casa de banho e dos quartos está desalinhada mais de 35 cm de uma extremidade a outra da casa.

39-Para corrigir tal defeito, mostra-se necessário retirar os sanitários, o lava mãos, roupeiros, portas e aros das mesmas, farmácias e tubos de electricidade, aquecimento e proteger todas as peças que sejam susceptíveis de vir a ser destruídas com a demoluição da parede e, em seguida, proceder à demolição da mesma e retirar todo o entulho, sendo necessário retirar a placa das casas de banho e dos quartos.

40-É necessário também fazer uma nova parede com pilares de suporte obrigatórios e respectivos acabamentos.

41-O valor destas obras ascende a € 7.000.

42-Em consequência do facto referido em 38, os remates e alinhamentos do telhado não foram bem executados, o que implica nova execução.

43-O cimentado do pátio foi mal efectuado pelo subempreiteiro que contratou, o que pode ser corrigido mediante revestimento ou autonivelamento do pavimento.

44-O réu comunicou ao subempreiteiro que não poderia corrigir tal problema porque o autor não os autorizava a entrar na obra.

45-O réu, quando se preparava com os seus funcionários, para proceder ao enchimento da placa do primeiro andar, verificou que a parede do rés do chão se encontrava desalinhada, pelo que o seguimento em altura dessa parede iria também ficar fora da esquadria.

46-O réu informou o autor de tal facto e este, não obstante o mesmo, deu ordens para que a obra continuasse.

47- As portas interiores estão empenadas.

48- Existia um ladrilho partido junto à caixa de distribuição na casa de banho.

49- O reboco exterior da casa está estalado devido à falta de pintura.

50- Os rebocos interiores estão irregulares e existem algumas fissuras.

51-O chão do pátio apresenta torturas e fissuras e ao lavar-se o chão a água fica depositada em diversas poças.

52-O barracão está fora de “esquadria” e para eliminar tal facto é necessário desmontar parte do telhado, demolir parte da parede e retirar o entulho, devendo a fundação ser suficiente para efectuar nova obra, trabalhos que ascenderão a € 5.000,00.

53- Um casaco nos roupeiros da casa fica a roçar no fundo e entalado na porta.

54-A substituição desses roupeiros por outros com fundos considerados normais ascende a € 1.500.

55-Foi o R. quem colocou os roupeiros na casa.

56-A aplicação dos azulejos da casa de banho apresenta irregularidades e para corrigir tais defeitos é necessário retirar todo o ladrilho da casa de banho, retirar o entulho, preparar as paredes para um bom assentamento de ladrilho e colocar novo ladrilho, o que ascenderá a € 1.750,00.

57-É necessário retirar os ladrilhos que se encontram partidos, sendo que existe uma peça partida no ladrilho da casa de banho de serviço.

58-Existe uma pedra retirada e três pedras deslocadas na porta do primeiro andar, cuja reparação pode ascender a € 400,00.

59-A pedra que se colocou da sacada do quarto principal caiu.

60-Os portões têm ainda cimento agarrado, sendo necessário raspá-los, tratá-los e pintá-los.

61-A pedra da casa de banho do pátio está esfacelada, a qual deve ser substituída e reparada.

62-Retirar a pedra da casa de banho e a colocação de uma outra pode ascender a € 350,00.

63- O fecho da sacada do quarto principal deve ser afinado.

64- As caixas de estores no exterior têm medidas diferentes.

65- As caixas de estores são pré-fabricadas.

66- Alguns alumínios têm retoques.

67- Por baixo do fogão da sala foi colocado um tubo de electricidade.

68-Em consequência das fogueiras feitas no fogão da sala, o tubo referido em 66 ardeu.

69-O réu destruiu ainda diversas pedras junto ao alicerce, ascendendo o seu custo a € 500,00.

70-Devido à falta de isolamento térmico, a casa do autor é bastante quente de Verão e fria de inverno.

71- As janelas da casa de banho são de correr.

72-As telhas estão a ficar todas cheias de verdume, tendo sido o autor quem as escolheu.

73-O A. pagou, por 3 vistorias, a quantia de 31.200$00.

74-Logo após a conclusão da obra, o autor pretendia contrair matrimónio, pensando ter uma casa em condições para oferecer o chamado “copo de água” aos seus convidados e para lhes mostrar a casa.

75-O autor sente profundo desgosto pela situação actual em que se encontra a sua casa, tendo passado diversas noites sem dormir em consequência das irregularidades existentes na moradia referida em 1, o que lhe causa ansiedade e nervos constantes.

76-O autor já caiu das escadas e na queda torceu o pé direito, provocando uma entorse.

77-O réu manifestou ao autor, perante o Sr. Z..., disponibilidade para corrigir irregularidades no telhado e nas paredes.

78- O réu deixou por assinar o livro de obra.

79-O réu recusou-se a terminar os trabalhos da obra alegando que o autor lhe “devia dinheiro”.

80 - Em 28/09/2001, quando o R. pedia mais dinheiro ao A., este, à frente dos empregados do R., agrediu-o com uma cabeçada

81 - Em consequência de tal facto e também por o R. entender que A. se encontrava em dívida de alguns pagamentos, o R. deixou de laborar na obra.

82-O réu deixou por pintar a casa do autor, deixou por colocar gradeamentos na casa, deixou por betumar as pedras e deixou por colocar o corrimão da escada.

83- A pintura exterior da casa referida em 1 ascende à quantia de € 7.500,00.

84 – Os gradeamentos de toda a casa ascendem a € 750,00.

85-Na moradia referida em 1 não existe interfone colocado.

86-A colocação do interfone e o betume das pedras pode ascender ao valor de € 400,00.

87-No rés do chão da moradia referida em 1 encontram-se por terminar vários trabalhos de pintura e pavimentos, ascendendo o valor deste trabalho a € 8.000,00.

88-Se não forem concluídas as pinturas em falta e outros acabamentos é provável que aumente a degradação resultante das humidades e infiltrações.

89-Em 29 de Outubro de 2002, o autor enviou uma carta ao réu onde consta: Uma vez que chegou ao meu conhecimento que o senhor terá tido uma conversa com o Sr. Z..., na qual terá manifestado disponibilidade para ser reunir comigo, venho por este meio comunicar-lhe que estou à sua inteira disposição para tal reunião, carta esta que o réu recebeu.

90-Em 7 de Janeiro de 2003, o autor enviou nova carta ao réu a fim de designar uma nova reunião.

91-Em 25 de Março de 2003, o autor, através do seu aqui patrono, enviou uma carta ao réu, denunciando os defeitos de construção, carta esta que foi recebida pelo réu.

92-Em 18 de Abril de 2001, o autor entregou ao réu o cheque nº 3863791723, sacado sob o Montepio Geral, no montante de 2.000.000$00, por conta do montante do orçamento acima referido, sem IVA

93-Em 19 de Maio de 2001, o autor entregou ao réu o cheque nº 2963791724, sacado sob o Montepio Geral, no montante de 1.000.000$00, por conta do montante do orçamento acima referido, sem IVA.

94-Em 15 de Junho de 2001, o autor entregou ao réu o cheque nº 1163791726, sacado sob o Montepio Geral, no montante de 1.500.000$00, por conta do montante do orçamento acima referido, sem IVA.

95-Em 15 de Junho de 2001, o autor entregou ao réu o cheque nº 0263791727 sacado sob o Montepio Geral, no montante de 900.000$00, por conta do montante do orçamento acima referido, sem IVA.

96-Em 1 de Agosto de 2001, o autor entregou ao réu o cheque nº 4766778934 sacado sob o Montepio Geral, no montante de 1.500.000$00, por conta do montante do orçamento acima referido, sem IVA.

97-Em 7 de Agosto de 2001, o autor entregou ao réu o cheque nº 2966778936 sacado sob o Montepio Geral, no montante de 600.000$00, por conta do montante do orçamento acima referido, sem IVA.

98-O réu emitiu duas facturas em nome do autor nos valores de 2.000.000$00 e 5.500.000$00, datadas respectivamente de 24.09.2001 e 16.12.2001.

*

IV – Fundamentação de Direito

Não se discute – nunca se discutiu – que as partes celebraram um contrato de empreitada; que, por definição legal (art. 1207º C. Civil), é o contrato pelo qual uma das partes se obriga em relação à outra a realizar certa obra, mediante um preço.

Contrato que no caso, é sabido, é inteiramente consensual (219º do CC); mas em que talvez deva ser dito que as partes adoptaram, voluntariamente, a forma escrita que consta dos documentos juntos a fls. 31 a 33.

Forma escrita essa – orçamentos (cujos conteúdos se encontram reproduzidos no ponto 5 dos factos provados) apresentados pelo R/empreiteiro e subscritos, em sinal de concordância, pelo A/dono de obra – que está muito longe de constituir um regulamento contratual preciso, exacto e exaustivo das obrigações e das prestações e contra prestações de cada uma das partes.

E – não é despiciendo salientá-lo – na área dos contratos (em que o princípio da autonomia privada se manifesta em toda a sua plenitude – cfr. art. 405.º do C. Civil) é a vontade das partes que é a principal fonte de determinação da regulamentação contratual; são as partes/contraentes que determinam o “regulamento contratual” segundo as suas conveniências subjectivas, que determinam os chamados elementos essenciais do contrato, os elementos que correspondem aos termos básicos da operação económica levada a cabo; uma vez que, sobre muitos dos aspectos dum regulamento contratual, a lei, em regra, não intervém com previsões substitutivas que tomem o lugar da vontade ausente dos sujeitos privados (e compreende-se que assim seja, uma vez que tratando-se dos elementos que definem a própria lógica da operação, a sua substância e o seu racional económico, é óbvio que a respectiva determinação deve competir, por regra, aos interessados).

Ora, lendo-se o regulamento contratual escrito (documentos referidos e juntos a fls. 31 a 34), de imediato se constata que são muitos os aspectos que – sem contender com a determinabilidade do objecto contratual e com a sua validade (art. 280.º do C. Civil) – o mesmo não contém, não prevê e omite por completo; nada se diz no mesmo quer sobre o prazo da prestação do R/empreiteiro – sobre o início dos trabalhos e sobre o prazo para a conclusão – quer sobre o momento do pagamento do preço por parte do A/dono da obra e tão pouco o conteúdo da prestação do R/empreiteiro está definido com total clareza, exactidão e precisão.

E com isto não se está a querer dizer que, numa empreitada particular (duma moradia), os termos do contrato – mais exactamente, a prestação do empreiteiro – devem estar definidos/contidos num rigoroso caderno de encargos, num cuidadoso mapa de trabalhos, num minucioso projecto de execução (que contenha as referências de todos os materiais a utilizar e as medidas de todos os trabalhos a efectuar); tais peças, compreende-se, representam um encargo que a previsão/plano de custos do dono da obra pode não comportar, porém, se se compreende que não se vá a tal detalhe e pormenor, já mal se compreende que um regulamento contratual escrito nada diga sobre o prazo da prestação do empreiteiro, sobre o momento do pagamento do preço por parte do dono da obra e que vá ao ponto de deixar dúvidas sobre o exacto conteúdo e extensão da prestação do empreiteiro.

Tanto mais que se há matéria em que a prova testemunhal é aleatória, contingente e, acima de tudo, improfícua[17] é justamente aquela em que as partes visam, com tal prova testemunhal, preencher e integrar as lacunas do regulamento contratual escrito.

Tudo isto para dizer que, quanto à fase estática e estipulativa do contrato de empreitada celebrado, nada temos de verdadeiramente relevante além do regulamento contratual escrito reproduzido no ponto 5; do qual já dissemos estar muito longe de constituir um regulamento contratual preciso, exacto e exaustivo das obrigações e das prestações e contra prestações de cada uma das partes.

Ignoramos pois qual o prazo concedido/acordado para a conclusão da obra; sabemos que a obra se iniciou “pelo menos em Junho de 2000” e que, em 28/09/2001, quando o R/empreiteiro esteve pela última vez na mesma, esta não estava concluída, porém, não temos qualquer elemento factual que permita dizer e concluir que ele se atrasou na sua conclusão e que estava incurso em mora (na referida data de 28/09/2001) no cumprimento da sua prestação contratual.

E estamos exactamente na mesma quanto à prestação do A/dono da obra, isto é, os elementos factuais provados não permitem dizer que este se encontrasse no referido momento em mora no pagamento do preço; é certo que se provou que “ autor e réu combinaram que aquele faria pagamentos escalonados de acordo com o desenvolvimento da obra”, porém, isto para o caso é totalmente imprestável, uma vez que não se reportam pagamentos/montantes precisos a fases concretas da obra e não se alega/demonstra, a seguir, que na execução da obra já estavam concluídas fases que não estavam “cobertas” pelos pagamentos efectuados[18].

E não estamos muito melhor, em termos do que foi a estipulação contratual, quanto ao conteúdo e extensão da prestação do R/empreiteiro; como se explicou na decisão sobre a impugnação de facto – corroborando o essencial da apreciação feita na decisão de facto recorrida – não ficou completamente claro, em relação a certos trabalhos executados pelo R/empreiteiro, se os mesmos estavam incluídos no plano inicial convencionado ou se resultaram de alterações (trabalhos a mais) acordadas; assim como – e pela mesma razão – não ficou completamente claro se os materiais adquiridos pelo A/dono da obra se destinavam a ser incorporados na obra convencionada ou em qualquer “obra nova” por ele decidida fazer. Enfim, em face do que consta dos 3 referidos orçamentos (juntos a fls. 31 a 33), único regulamento contratual escrito pelas partes, ninguém poderá dizer, com precisão, quais os trabalhos, na sua exacta medida e extensão, que preenchiam e correspondem ao cumprimento pontual da prestação do R/empreiteiro.

O que – inexactidão e imprecisão do regulamento contratual escrito – não constituía ou constitui um obstáculo intransponível.

Efectivamente, não estavam/estão as partes limitadas ao que constava (ou não constava) de tal regulamento contratual escrito; podiam alegar e provar tudo o que, para além do que ficou escrito, havia sido estipulado entre ambas[19]; sucede, porém, que – além do incompleto regulamento contratual escrito – foram parcas em tais alegações e ainda mais escassas na prova das suas parcas alegações.

Mais do que falar/alegar sobre a fase estática e estipulativa do negócio, as partes – é quase sempre assim – vêm logo com a fase executiva, com as imputações dos mais diversos incumprimentos ocorridos nesta fase, parecendo esquecer que um incumprimento – uma prestação indevida – é sempre reportado ao que é “devido” e este relaciona-se, via de regra, com algo que ficou estabelecido na fase estática e estipulativa do negócio.

Seja como for, isto dito, expostas as fragilidades estipulativas que os autos encerram, importa referir que as mesmas acabam por ter um relevo jurídico-prático limitado na economia da solução jurídica do litígio sub-judice.

Na fase executiva do contrato de empreitada, ocorreu um evento que, a nosso ver, “marca” a relação contratual, traçando o desfecho dos autos e a solução do litígio.

Estamos naturalmente a referir-nos ao evento relatado nos pontos 80 e 81 dos factos provados da sentença, ou seja, à circunstância de, em 28/09/2001, quando o R. pedia mais dinheiro ao A., este, à frente dos empregados do R., o ter agredido com uma cabeçada, tendo, em consequência de tal facto, e também por o R. entender que A. se encontrava em dívida de alguns pagamentos, o R. deixado de laborar na obra, nunca lá tendo regressado após tal data, não a tendo concluído, nem reparado os defeitos que a mesma apresentava/apresenta.

Evento este que mereceu na sentença recorrida a seguinte apreciação:

 (…) como obrigações principais do contrato de empreitada, temos como direito principal do dono da obra, o aqui autor, o direito de exigir do empreiteiro a obtenção do resultado a que este se obrigou e como contraponto a sua obrigação principal na prestação do preço acordado.

Porém, como em qualquer contrato, para além dos direitos e obrigações principais, surgem na constituição e desenvolvimento do programa contratual um conjunto de deveres laterais e acessórios de conduta que se impõem a ambas as partes.

Com efeito, como referido no Ac. RC de 06.11.20074 polarizando-se a relação jurídica obrigacional em torno de uma ou mais prestações típicas – deveres principiais ou primários da prestação – o seu âmbito alarga-se, no entanto, aos deveres acessórios, secundários ou complementares de conteúdo diversificado, sujeitando ainda às partes à “ordem envolvente da interacção negocial”, ou seja a critérios normativos de razoabilidade e de boa fé, com uma função integrativa e reguladora das condutas dos contraentes.

Estes deveres laterais, como referido por Mota Pinto, são deveres de adopção de determinados comportamentos impostos pela boa fé em vista do fim do contrato, dada a relação de confiança que este fundamenta, comportamentos variáveis com as circunstâncias concretas da situação e caracterizam-se por uma função auxiliar de realização positiva do fim contratual e de protecção à pessoa e aos bens da outra parte contra os riscos de danos concomitantes.

Também Antunes Varela sublinha a importância destes deveres acessórios de conduta, dizendo que não interessando directamente à prestação principal, nem dando origem a qualquer acção autónoma de cumprimento (…) são todavia essenciais ao correcto processamento da relação obrigacional em que a prestação se integra, relevando que, de um modo geral nas relações bilaterais, onde os deveres acessórios mais avultam, cada um dos contraentes tem o dever de tomar todas as providências necessárias para que a obrigação a seu cargo satisfaça o interesse do credor da prestação.

Alega o autor que o réu não realizou um conjunto de trabalhos, encontrando-se, de facto provado, que este deixou por pintar a casa do autor, deixou por colocar gradeamentos na casa, não betumou as pedras e não colocou o corrimão da escada. (…)

Quanto aos trabalhos não realizados e que eram da incumbência do réu, (…), o réu não pôs em causa que os deixou por fazer, admitindo assim que deixou por concluir a obra, pretendendo no entanto que seja reconhecido que esta sua conduta se deveu a facto imputável ao autor, uma vez que este o agrediu. Por essa razão pede a título principal que se condene o autor a reconhecer ter tido culpa exclusiva pela não conclusão da obra.

(…) Temos provado que o autor agrediu o réu à frente dos empregados e que, em consequência de tal facto e também porque o autor se encontrava em dívida com alguns pagamentos, aquele abandonou a obra.

Traduzindo-se a obrigação principal do empreiteiro, como dissemos supra, na realização da obra, é inequívoco que houve incumprimento contratual da sua parte.

Por outro lado, o seu abandono da obra não poderá deixar de ser entendido como uma recusa inequívoca desse cumprimento, equivalente, por isso, à resolução contratual. Este pedido não é concretamente feito pelo réu, mas entendemos que o mesmo resulta da pretensão da imputação do abandono da obra a conduta do autor, bem como do pedido de condenação do autor na diferença entre o valor do orçamento e trabalhos a mais realizados e os pagamentos feitos pelo autor. (…)

O direito de resolução, por princípio terá que ver com o incumprimento das obrigações principais. Porém, nada impede que seja conferido tal direito, face ao incumprimento de deveres acessórios de conduta que como referimos atrás, também impendem sobre as partes quer na constituição quer no desenvolvimento do contrato firmado.

(…) Como já referido, ficou provado que o réu abandonou a obra em consequência da agressão de que foi alvo pelo autor à frente dos seus empregados e também porque o mesmo se encontrava em dívida com alguns pagamentos.

Quanto a esta última causa, traduzindo-se ela na obrigação principal do autor, não é, todavia, causa bastante para justificar a resolução contratual pelo réu, não só porque não sabemos exactamente qual o valor que se encontrava em dívida, como também, tratando-se de uma obrigação pecuniária, ainda que o autor se encontrasse em mora, a prestação devida continuaria a revestir todo o interesse para o réu.

O mesmo já não diremos quanto à agressão levada a cabo pelo autor. Tal conduta, violadora dos mais elementares princípios da cooperação e boa fé contratual, afigura-se-nos de tal maneira grave que inquestionavelmente perturba a manutenção do vínculo contratual e justifica a resolução do contrato pelo réu, por causa imputável ao autor.

É certo que a faculdade que o art. 801º/1 reconhece ao credor de resolver o contrato, em caso de incumprimento culposo do devedor assenta no pressuposto de que este incumprimento foi total. O caso dos autos não se ajusta a esta hipótese porque, como vimos, nem sequer se trata de incumprimento da obrigação principal de pagamento do preço, que até foi parcialmente cumprida, mas sim do incumprimento de um dever acessório de conduta.

No entanto, admite a lei, em caso de incumprimento parcial, a resolução do contrato, salvo se o não cumprimento parcial tiver escassa importância para o interesse do credor (cf. art. 802º/1 e 2).

Dada a gravidade do dever acessório incumprido, entendemos que o réu não dispunha de condições para continuar a laborar na obra, pelo que os montantes que poderia haver com a conclusão da obra e que se traduziriam no cumprimento da parte do contrato de empreitada que faltava nunca justificariam a manutenção do vínculo contratual.

Apreciação com que se concorda, excepto na parte em que se considera e conclui que o R. procedeu à resolução contratual[20].

Pelo seguinte:

A resolução contratual (exercício dum direito potestativo extintivo dependente dum fundamento) é um meio de extinção do vínculo contratual através duma declaração unilateral duma parte à contraparte; declaração que, sendo receptícia, produz os seus efeitos quando chega ao poder ou ao conhecimento da contraparte, momento a partir do qual esta já não pode cumprir e a parte declarante deixa de poder exigir o cumprimento.

Ou seja, atento o modo como funciona e os efeitos que produz no vínculo contratual, é algo que exige e pressupõe transparência e clareza declarativas; que não pode/deve resultar, em princípio, por interpretação de “silêncios” e/ou outros “tacitismos” comportamentais, designadamente quando estes não são absolutamente concludentes e quando admitem e consentem outras interpretações (que não apenas a declaração resolutiva).

O que – entendermos que o R. não procedeu à resolução contratual e que, em consequência, não a podemos reconhecer – não é, no caso e para uma solução útil dos autos e do litígio, assaz relevante.

Efectivamente, embora se diga que a resolução tem uma dupla função – liberatória e restitutória – os seus efeitos só ganham significado próprio e específico quando se assume e entra na função restitutória, quando se entra na “relação de liquidação” (na verdade, pressupondo a resolução uma prévia situação de incumprimento definitivo, deste resulta – sem necessidade do exercício da faculdade alternativa do art. 801.º/2 do CC – a função liberatória, a eficácia liberatória das obrigações ou prestações ainda não executadas); e, no caso, não há pedidos que se situem no âmbito do que seria a função restitutória (caso a resolução tivesse sido declarada e produzisse os seus efeitos), uma vez que não é necessário “reconhecer” a resolução contratual para “chegar” e concluir pela exoneração/desvinculação do R..

Ou seja, a agressão do A. ao R. e o abandono da obra por parte deste não podem ser configurados como uma resolução contratual, porém, podem/devem ser configurados como uma impossibilidade de cumprimento – ou algo com efeitos semelhantes – não imputável ao R. ou mais exactamente imputável ao A.; produzindo a exoneração do R. do dever de concluir a sua prestação e de reparar os defeitos da parte executada.

Expliquemo-nos:

Quanto à impossibilidade de cumprimento, afirma-se no o art. 790.ºdo C. Civil que a obrigação se extingue quando a prestação se torna impossível; impossibilidade esta, com efeito exoneratório, em que o padrão legal adoptado, não o ignoramos, é a impossibilidade objectiva, absoluta, definitiva e total[21].

Efectivamente, há casos em que o devedor, não estando impossibilitado de cumprir, tem que, para cumprir, suportar sacrifícios ou dificuldades, de ordem factual, económica ou pessoal; hipótese em que, diz-se, não estamos perante uma verdadeira impossibilidade objectiva e definitiva (que o exonere do cumprimento da obrigação), mas apenas perante uma impossibilidade relativa. Uma coisa, acrescenta-se, é a impossibilidade da prestação e outra a mera difficultas praestandi (e a impossibilidade absoluta não é equiparável à impossibilidade relativa).

Na esteira da doutrina alemã do “limite de sacrifício”, chegou Vaz Serra a propor no seu projecto que, caso a prestação se haja tornado excessivamente difícil, em condições que seria gravemente contrária à boa fé reclamar o cumprimento, pode o devedor exonerar-se da obrigação ou obter uma modificação desta – dito doutro modo o “dever de prestar, não se impondo em termos cegos e indiscriminados ao obrigado, tem/teria como limite, segundo esta concepção [doutrina do limite do sacrifício], o sacrifício razoavelmente exigível do devedor, à luz dos princípios da boa fé, para satisfazer o interesse do credor”[22]mas tal doutrina não ficou consagrada na versão definitiva do C. Civil[23].

Em todo o caso – é a questão – será que não há casos em que uma impossibilidade subjectiva e relativa não pode/deve ser equiparada à impossibilidade objectiva e absoluta? Será que não podem/devem ser invocados, quer o princípio da boa fé consagrado no art. 762.º/2 (que “apela” para que o credor tenha uma conduta cooperante com o seu devedor, não agravando as condições do cumprimento), quer a via do abuso de direito, para, em certos casos, determinar tal equiparação? Será que, quando a exigência do cumprimento, em face das circunstâncias, exceder manifestamente os limites impostos pela boa fé, o devedor não pode legitimamente faltar ao cumprimento, ou por impossibilidade da prestação, ou por abuso no exercício do direito do credor?

Propendemos para pensar que sim.

Há casos em que se verificam elementos estranhos, circunstâncias exteriores, que integram ou condicionam de tal modo a actuação do obrigado que a sua falta ou a sua verificação (conforme o caso) geram uma verdadeira impossibilidade da prestação; há casos, em contratos em que há uma execução/relação continuada, em que a perda de confiança entre os contraentes, a violação de deveres acessórios de conduta (como se refere na sentença recorrida) – de correcção, lealdade e boa fé – a ocorrência de circunstâncias, factos ou situações, em face das quais e segundo a boa fé não é exigível a uma das partes a continuação da relação contratual, devem ser considerados como integrantes duma “espécie” de justa e legítima causa de falta ao cumprimento, de impossibilidade da prestação.

Enfim, como começámos por referir, concordamos com o modo como a sentença recorrida apreciou/valorou a agressão levada a cabo pelo A.; ou seja, também entendemos que tal conduta, violadora dos mais elementares princípios da cooperação, confiança e boa fé contratuais, é grave e perturbadora da manutenção da obrigação contratual do R./agredido, justificando – não a resolução contratual, por nem sequer haver sido declarada pelo R. ao A. – a extinção da obrigação do R. por a prestação se tornar impossível por causa que lhe não é imputável[24]; ou directamente por aplicação do art. 790.º/1 do C. Civil ou por aplicação conjugada dos art. 790.º/1, 762.º/2 e 334.º, todos do C. Civil.

E isto – o que se acaba de afirmar e concluir – traça o destino dos diversos pedidos formulados na acção e na reconvenção.

Quanto aos pedidos principais da acção (realização dos trabalhos em falta e reparação dos defeitos existentes) e também quanto aos pedidos de pagamento dos montantes necessários à execução por terceiros dos trabalhos em falta e reparação dos defeitos, desencadeado o duplo efeito referido – ou seja, extintivo para a obrigação assumida e exoneratório para o R. – fica imediatamente (sem necessidade de entrar em detalhadas apreciações sobre a existência ou não de trabalhos em falta e de defeitos) prejudicada a possibilidade dos mesmos poderem ser julgados procedentes.

Quanto aos demais pedidos da acção e reconvenção, é no quadro legal oferecido pelo art. 795.º do C. Civil que a sua solução, a nosso ver, deve ser procurada.

Vejamos, então:

Nos termos do art. 790.º/1 do C. Civil, a obrigação (unilateral), cujo cumprimento se torna impossível, extingue-se, ficando o devedor exonerado sem incorrer em qualquer responsabilidade (uma vez que o dever de prestar não se converte em dever de indemnização). A principal consequência da impossibilidade (superveniente) da prestação não imputável ao devedor é pois a extinção da obrigação, perdendo o credor o direito de exigir a prestação e não tendo, por conseguinte, direito à indemnização dos danos provenientes do não cumprimento[25].

Mas – é a questão – e o que é que acontece à obrigação da outra parte? O que é que acontece quando, como é o caso, estamos perante contratos bilaterais, que geram obrigações para ambas as partes?

“Nos contratos com obrigações interdependentes (…), o regime da impossibilidade de cumprimento é mais complexo na medida em que, para lá da extinção da obrigação do devedor (…), há que repartir por ambos os contraentes o risco da impossibilidade superveniente de cumprimento, ou seja, há que determinar se o credor, apesar da impossibilidade, continua ou não adstrito à satisfação da contraprestação. (…). Nos contratos com simples efeitos obrigacionais, o 795.º/1 reparte o risco da impossibilidade de cumprimento de forma igualitária se pensarmos que o credor perde o direito à prestação mas que o devedor, por seu turno, também perde o direito à contraprestação, arcando, em regra, com as despesas que, porventura haja já realizado. À forçosa extinção da obrigação assumida pelo devedor, corresponde, por força do sinalagma existente, a desobrigação do credor. (…). Como quer que seja, não se mostra necessária qualquer declaração de resolução, tendo em conta que, a existir, apenas iria confirmar o efeito de libertação do credor, não justificaria a recuperação da contraprestação paga por antecipação (a parte final do n.º 1 do art. 795.º manda aplicar as regras do enriquecimento sem causa e não as da eficácia retroactiva da resolução) e teria por último significado o desejo de o credor não pretender o “commodum” de representação.”[26]

É o que resulta do art. 795.º/1 do C. Civil, em que se dispõe que, “quando no contrato bilateral uma das prestações se torne impossível, fica o credor desobrigado da contraprestação e tem o direito, se já a tiver realizado, de exigir a sua restituição, nos termos prescritos para o enriquecimento sem causa”.

Preceito que, porém, não se fica por esta “regra”, dizendo-se também no n.º 2 que “se a prestação se tornar impossível por causa imputável ao credor, não fica este desobrigado da contraprestação, mas, se o devedor tiver algum benefício com a exoneração, será o valor do benefício descontado na contraprestação”.

Efectivamente – importa decompor – tanto é impossibilidade da prestação por causa não imputável ao devedor a que resulte de circunstâncias fortuitas ou de força maior, como é a que resulta de facto de terceiro, como, inclusivamente, é a que resulta dum facto do próprio credor; sendo apenas esta última que a lei prevê expressamente, quando, a propósito dos contratos bilaterais, alude (art. 795.º/2) à impossibilidade da prestação por “causa imputável ao credor”, que, não se podendo dizer que haja, para o credor, o dever primário de aceitar a prestação ou de não impedir o cumprimento, significa e exige uma mera conduta voluntária e livre do credor, que, ao “optar” por impossibilitar o cumprimento, fica obrigado a pagar a contraprestação.

O que significa, na economia global do art. 795.º do C. Civil, que a perda ou não do direito à contraprestação, por parte do credor, depende da causa da impossibilidade decorrer ou não duma sua conduta voluntária e livre.

Assim:

Na 2.ª hipótese – não ser a impossibilidade imputável ao credor – fica o credor desonerado da contraprestação[27]; mas, se já a tiver realizado, tem o direito de exigir a sua restituição; atendendo, porém, à falta de culpa do devedor, a restituição far-se-á segundo as regras mitigadas do enriquecimento sem causa.

Na 1.ª hipótese – ser a impossibilidade imputável ao credor – o credor tem que efectuar a contraprestação, embora possa descontar nela (art. 795.º/2) o valor do benefício que o devedor eventualmente tiver com a exoneração; ou seja, o credor, não obstante a extinção da obrigação a cargo do devedor, mantém-se adstrito à contraprestação.

É justamente esta última a hipótese dos autos.

O R., como já referimos por diversas vezes, está exonerado/desvinculado/liberto da sua prestação (não tem que acabar a obra, que reparar os defeitos, que entregar os montantes necessários à conclusão da obra ou à reparação dos defeitos, que indemnizar o A.), mas o A. não está desobrigado da sua contraprestação; em todo o caso, como não se quer que o devedor fique melhor do que ficaria se tivesse podido cumprir, a parte final do art. 795.º/2 prevê o desconto relacionado com os benefícios que o R/devedor retirou da exoneração, ou seja, o A/credor tem que pagar o preço (a sua contraprestação), abatido do lucro que o devedor teve por não haver concluído perfeita e totalmente a sua prestação, abatido do aproveitamento do tempo que doutro modo gastaria com o “acabamento” da prestação acordada (da poupança nos custos que deixou de efectuar ou nos ganhos que obteve com serviços possibilitados pelo tempo que não dedicou ao cumprimento impossibilitado).

E, “liquidando” o que vimos de dizer, temos:

Quanto ao preço (à contraprestação do A/credor), ascendendo o mesmo ao montante de € 52.927,44 [€ 55.780,57/11.183.000$00 – (1.167,19/234.000$00[28] +1.685,94[29]) e tendo o A. já pago ao R. o montante de € 37.409,84/7.500.000$00, estão ainda aparentemente em falta, a tal (contraprestação do A/credor) título, € 15.517,60[30].

E quanto ao benefício (que o R/devedor retirou da exoneração) a descontar, nos termos da parte final do art. 795.º/2 do C. Civil?

Numa perspectiva rigorosa (e porventura “formalista”), a solução fácil e imediata é a de dizer que nada foi alegado (e, em consequência, nada ficou provado) na óptica do art. 795.º/2 do C. Civil, isto é, do benefício a descontar.

Efectivamente, sendo-se rigoroso, pode dizer-se que o A. não alegou que o R., ao não concluir, total e perfeitamente, a obra, teve poupanças de custos com a obra e ganhos noutros trabalhos que, em vez da conclusão da obra, andou a executar; e, naturalmente, não quantificou tais poupanças e ganhos.

A óptica do A. foi/é indiscutivelmente outra: o A. alegou os trabalhos em falta e os defeitos a corrigir e pediu, em alternativa à sua execução/reparação pelo próprio R., que este seja condenado a pagar/indemnizá-lo no montante necessário para mandar executar/reparar por terceiro o que pertencia contratualmente ao R..

Não são, evidentemente, uma e a mesma coisa.

Uma coisa – o aludido no art. 795.º/2 do C. Civil – é o benefício que um profissional da construção retira por não fazer um trabalho que lhe foi pago e que está incluído no âmbito do contrato de empreitada; outra, diversa, é o preço/retribuição que custa a contratação dum profissional da construção para executar esse mesmo concreto trabalho.

Entre uma coisa e outra estão a margem bruta de lucro do empreiteiro (desde logo), as despesas “logísticas” que a execução dum pequeno e isolado trabalho representam (no confronto com o que representam quando esse mesmo trabalho é executado no âmbito de outros e mais vastos trabalhos); está – pode estar – inclusivamente a circunstância de o trabalho não executado corresponder à não aplicação de material já previamente adquirido ou à não laboração de trabalhadores antecipadamente adstritos/contratados para o trabalho não executado.

Enfim, podem colocar-se as mais diversas e estremas hipóteses demonstrativas da diferença que vai – ou pode ir – entre o preço dum trabalho/obra e o benefício que o empreiteiro retira pela não execução desse mesmo trabalho/obra.

Em todo o caso – cientes que não são uma e a mesma coisa e que o A. não alegou as poupanças de custos com a obra e os ganhos noutros trabalhos – não pode deixar de impressionar, a nosso ver, a dimensão/extensão do que, a propósito de defeitos e de trabalhos em falta, se provou; designadamente, provou-se que:

A obra padece de humidades e infiltrações e em consequência de tal facto, a casa do autor apresenta o cheiro característico da humidade; humidades que também se devem à falta de pintura exterior.

A parede da casa de banho e dos quartos está desalinhada mais de 35 cm de uma extremidade a outra da casa; para corrigir tal defeito, mostra-se necessário retirar os sanitários, o lava mãos, roupeiros, portas e aros das mesmas, farmácias e tubos de electricidade, aquecimento e proteger todas as peças que sejam susceptíveis de vir a ser destruídas com a demoluição da parede e, em seguida, proceder à demolição da mesma e retirar todo o entulho, sendo necessário retirar a placa das casas de banho e dos quartos; é necessário também fazer uma nova parede com pilares de suporte obrigatórios e respectivos acabamentos; e o valor destas obras ascende a € 7.000[31]. Em consequência, os remates e alinhamentos do telhado não foram bem executados, o que implica nova execução.

O cimentado do pátio foi mal efectuado, o que pode ser corrigido mediante revestimento ou autonivelamento do pavimento.

As portas interiores estão empenadas; existia um ladrilho partido junto à caixa de distribuição na casa de banho; o reboco exterior da casa está estalado devido à falta de pintura; os rebocos interiores estão irregulares e existem algumas fissuras; o chão do pátio apresenta torturas e fissuras e ao lavar-se o chão a água fica depositada em diversas poças.

O barracão está fora de “esquadria” e para eliminar tal facto é necessário desmontar parte do telhado, demolir parte da parede e retirar o entulho, devendo a fundação ser suficiente para efectuar nova obra, trabalhos que ascenderão a € 5.000,00.

Um casaco nos roupeiros da casa fica a roçar no fundo e entalado na porta; a substituição desses roupeiros por outros com fundos considerados normais ascende a € 1.500.

A aplicação dos azulejos da casa de banho apresenta irregularidades e para corrigir tais defeitos é necessário retirar todo o ladrilho da casa de banho, retirar o entulho, preparar as paredes para um bom assentamento de ladrilho e colocar novo ladrilho, o que ascenderá a € 1.750,00.

É necessário retirar os ladrilhos que se encontram partidos, sendo que existe uma peça partida no ladrilho da casa de banho de serviço.

Existe uma pedra retirada e três pedras deslocadas na porta do primeiro andar, cuja reparação pode ascender a € 400,00.

A pedra que se colocou da sacada do quarto principal caiu.

Os portões têm ainda cimento agarrado, sendo necessário raspá-los, tratá-los e pintá-los.

A pedra da casa de banho do pátio está esfacelada, a qual deve ser substituída e reparada; retirar a pedra da casa de banho e a colocação de uma outra pode ascender a € 350,00.

O fecho da sacada do quarto principal deve ser afinado.

As caixas de estores no exterior têm medidas diferentes.

Alguns alumínios têm retoques.

O réu destruiu ainda diversas pedras junto ao alicerce, ascendendo o seu custo a € 500,00.

O réu deixou por pintar a casa do autor, deixou por colocar gradeamentos na casa, deixou por betumar as pedras e deixou por colocar o corrimão da escada.

A pintura exterior da casa ascende à quantia de € 7.500,00.

Os gradeamentos de toda a casa ascendem a € 750,00.

Na moradia não existe interfone colocado.

A colocação do interfone e o betume das pedras pode ascender ao valor de € 400,00.

No rés-do-chão da moradia encontram-se por terminar vários trabalhos de pintura e pavimentos, ascendendo o valor deste trabalho a € 8.000,00[32].

Defeitos cujo concreto custo da reparação não ficou em todos os casos/defeitos provado (o que, naturalmente, não significa que não haja um custo de reparação), mas que, tendo presente o que sobre os defeitos se provou e somando-lhe o que se provou sobre trabalhos em falta – mesmo admitindo que de alguns deles não seja pacífico que façam parte, em toda a sua extensão, dos “orçamentos” – dá um custo (preço/retribuição) em contratação de profissionais da construção seguramente não inferior a € 30.000,00.

E é justamente aqui, neste ponto do raciocínio, sabendo-se que ao R. assiste, em termos de contraprestação do A/credor, o montante de € 15.517,60, que impressiona que se “feche os olhos” ao benefício que o R. seguramente teve por não ter que concluir trabalhos e reparar defeitos que custam, em termos de preços da construção civil, não menos de € 30.000,00.

Enfim, entendemos que não constituirá grande estultícia – e será certamente justo, em face da globalidade dos factos – pensar e considerar que a não execução dos referidos trabalhos, que a preços normais custam € 30.000,00, representa para o empreiteiro que os teria que executar (não fosse o efeito exoneratório supra referido) uma poupança/benefício nunca inferior a metade de tal montante[33] e neste contexto e linha de raciocínio – é a conclusão final e definitiva – considerar que o benefício do R./empreiteiro com a exoneração (da conclusão perfeita da sua prestação) é de montante equivalente (pelo menos) ao referido montante de € 15.321,19, que lhe assistiria em termos de preço/contraprestação do A.[34]

O que, rematando, assim operado o “desconto” a que alude a parte final do art. 795.º/2 (efectuada uma como que “espécie” de compensação), conduz a que A. e R. não sejam mútua e reciprocamente credores de quaisquer montantes pecuniários (de qualquer prestação e contraprestação).

*

Concluindo – sobre o mérito/fundo dos autos/recurso – a extinção da obrigação do R./empreiteiro (por a sua prestação se tornar impossível por causa imputável ao A.) delimita as questões que, a partir daí, cumpre conhecer na presente apelação; havendo apenas, como se fez, que apurar quer a contraprestação do A. quer o montante do benefício do R. que deve ser descontado à contraprestação do A.; ficando assim prejudicadas todas as demais questões, quer as imanentes à completa vigência do contrato, quer as decorrentes da liquidação contratual por efeito da sua resolução.

*

Daí também que se tenha deixado para o fim a apreciação do agravo interposto da decisão, de fls. 1654/6, que indeferiu o pedido de ampliação do pedido, formulado pelo A. a fls. 1549 e ss.

Como é expectável – doutro modo, não faria qualquer sentido deixá-lo para o fim – tal agravo só pode ser não provido.

Desde logo, importa registar que tal ampliação do pedido do A. (formulada em 13/05/2011) é uma cópia fiel do indeferido articulado superveniente de 07/11/2007, decisão essa confirmada pelo Acórdão desta Relação de 24/11/2009, em que se ponderou e concluiu que “por força do disposto no art. 506.º/1 e 4 do CPC, não deve ser admitido o novo articulado apresentado pelo autor como articulado superveniente, no qual alega que os novos defeitos foram detectados desde a data da propositura da acção e não alega que são supervenientes em relação à réplica, mais alegando danos morais em repetição do que com eventual relevância já fora alegado na petição inicial”.

Daí que se haja referido e bem, na decisão ora agravada, que “o A. pegou na peça já apresentada, nos mesmos factos e exactamente nos mesmos valores e pretende agora “fazer entrar pela janela” aquilo que foi impedido de “fazer entrar pela porta”.

É exactamente isto.

Em 1.º lugar, não se vislumbra o “racional”, em termos processuais, de apresentar, com uma nova e diferente designação, um requerimento de conteúdo idêntico a um anteriormente indeferido (por este Tribunal da Relação, em confirmação do decidido em 1.ª instância).

Em 2.º lugar, o conteúdo do requerimento não é uma mera ampliação do pedido, mas uma simultânea ampliação da causa de pedir e do pedido – daí a designação, correcta, do requerimento que cerca de 4 anos antes havia sido apresentado – pelo que, na falta de acordo, só até à réplica (ou em articulado superveniente, quanto aos factos que assim forem: supervenientes), ocorrida 8 anos antes (em 25/06/2001), tal ampliação simultânea poderia ser efectuada.

Em 3.º lugar – ainda que o chamado pedido de ampliação do pedido formulado a fls. 1549 e ss. não fosse intempestivo (por não ser uma mera ampliação do pedido, mas uma simultânea ampliação do pedido e da causa de pedir) – sempre estaríamos caídos na previsão do art. 710.º/2 do CPC e, actualmente, na previsão do art. 660.º do NCPC; ou seja, ainda que houvesse sido cometida infracção (e não foi) na decisão sob agravo, o provimento deste não iria, em face de tudo o que se expendeu sobre o mérito/fundo do litígio[35], ter qualquer influência/repercussão no exame e decisão final da causa, pelo que, também por esta razão, o agravo não poderia ser provido.

*

V - Decisão

Pelo exposto:

Decide-se negar provimento ao agravo (interposto a fls. 1700) e, consequentemente, mantém-se a decisão recorrida (fls. 1654/6).

Decide-se julgar parcialmente procedente a apelação interposta e, consequentemente, revoga-se a decisão recorrida na parte em que julgou resolvido o contrato de empreitada e em que julgou parcialmente procedente o pedido reconvencional, partes essas (agora revogadas) que se substituem por decisão a declarar extinta a obrigação do R. (realização da obra) por causa imputável ao A. e a absolver o A do restante pedido reconvecional; mantendo-se, em tudo o mais, a decisão recorrida.

Custas do agravo pelo A/agravante.

Em relação à apelação, as custas da acção, em ambas as instâncias, são pelo A.; e, as da reconvenção, em ambas as instâncias, são por A. e R. na proporção de 1/4 e 3/4.

*

Coimbra, 03/12/2013

(Barateiro Martins - Relator)

 (Arlindo Oliveira)

 (Emídio Santos)

[1] Ao arrepio do disposto no então art. 690.º/1 do CPC em que se diz que o recorrente “ (…) concluirá, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão”. Deficiência que, é verdade, dá lugar a convite a aperfeiçoamento (cfr. art. 690.º/4 do CPC), mas que não conduzindo, em boa verdade, a uma imediata e efectiva sanção processual – razão pela qual já “desistimos” do convite ao aperfeiçoamento – leva a que, hoje em dia, rara seja a alegação cujas conclusões não se apresentem como um claro desrespeito (de que o caso em apreço é um exemplo refinado) pela referida “forma sintética” imposta pela lei.
[2] Cfr. Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 2000, pág. 154 e António Santos Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, II Volume, 1997, pág. 254.
[3] O A/apelante anuncia também a divergência com a resposta dada ao 6.º – que não tem exactamente a ver com o momento e forma de pagamento do preço – mas depois nada diz/argumenta sobre o conteúdo do quesito 6.º.
[4] Cuja data, como se diz em várias delas, reflecte o dia em que a viatura do vendedor descarrega o material no local indicado pelo comprador.
[5] A testemunha do A., H..., referiu, ao ser-lhe exibido o livro de obra, que “há mais coisas feitas
[6] O A/apelante fala no uso da equidade, mas – além desta não ser a sede própria – o uso da equidade não é discricionariedade/arbitrariedade absoluta, isto é, não se pode usar a equidade se não houver um quid material mínimo conhecido que sirva de incidência/suporte para o uso da mesma.
[7] Esta última testemunha foi bastante veemente a dizer que assistiu o A. a dizer ao R. que não punha o isolamento por ser muito caro (70 contos).
[8] Sempre que está em causa o esclarecimento de factos que envolvem e exigem conhecimentos especiais – designadamente, técnicos – e sempre que, justamente por isso, são chamadas a pronunciar-se no processo – a referir as sua percepções e a fazer as suas apreciações – pessoas que é suposto possuir tais conhecimentos (o que se lhes reconhece com a sua nomeação como peritos), as percepções e as apreciações que estas pessoas/peritos tenham produzido no processo não podem – como regra, isso é, sem fortes, consistentes e explícitas razões – ser abaladas por meros depoimentos testemunhais, mais ou menos “impressionistas”, sobre os mesmo factos. A nomeação definitiva de peritos – o requerimento da peritagem e o cumprimento das formalidades preparatórias da peritagem – significa que estamos perante factos que suscitam e exigem uma percepção de “especialistas” e, por outro lado, que estamos perante pessoas com idoneidade e competência. De tal modo que, sendo-se severo e rigoroso, sobre os factos por eles percepcionados e apreciados não pode/deve admitir-se produção de prova testemunhal – que, por natureza, se destina a esclarecer factos passados que as testemunhas tenham presenciado e não a fazer apreciações sobre factos (passados ou presentes). O pragmatismo na condução da audiência – e a circunstância da distinção entre testemunha e perito, clara em teoria, não se apresentar assim tão nítida, por vezes, na prática – acaba por, compreensivelmente, permitir que se pergunte às testemunhas “tudo e mais alguma coisa” e que estas a tudo respondem, comprometendo-se em afirmações pretensamente seguras sobre factos que exigem conhecimentos técnicos complexos, sem se dar conta que, assim, com tal ligeireza afirmativa, apenas estão a revelar, abertamente, o modo interessado como se colocam perante o litígio.

[9] Aliás, o cunhado do A. (a testemunha G...) disse que no local existia, dantes, um poço, o que, mecanicamente, pode ser a explicação para a desagregação.

[10] Assim como o testemunho pericial do S....
[11] A testemunha do A., H..., referiu que “só para o gás é que é obrigatório o mapa ao dono da obra
[12] Vale o que vale, mas o cunhado, G..., 1.ª testemunha do R., disse que o A. “tinha uma companheira, mas não pensavam em casar”.
[13] Mais, é pacífico que há alterações; a projectista I... (que, assim como o H..., não acompanhou a execução da obra) disse: “fui à obra, agora, em meados de Julho de 2011, porque o A. me pediu”, “por fora falta pintar”; “por dentro, há alterações”; “não sei quem pediu tais alterações”. Ora, havendo alterações e vivendo o A. nos anexos, não é minimamente crível que hajam sido feitas sem a sua vontade, concordância, aquiescência ou pedido.

[14] Acrescentando/justificando que não mandou fazer um levantamento topográfico (do que já lá existia construído) quando fez o projecto de ampliação (fazer um 1.º andar em cima do R/C).

[15] Esclarecendo a instâncias da advogada do A. que “os alumínios de baixo lhe foram solicitados pelo A. quando foi tirar medidas para o orçamento do R.”.

[16] A dado momento, o A/apelante sustenta – sem o explicar – que a prova de tais quesitos “se faz através de documento”; como princípio, as convenções adicionais posteriores ao conteúdo do documentos também não podem ser provadas por testemunhas (ex vi art. 394.º/1 do C. Civil), porém, no caso, em face da pouca clareza na alegação do conteúdo/extensão contratual, nem sabemos se estamos exactamente perante “convenções adicionais”; mais, foi o próprio A/apelante que invocou convenções contrárias aos “orçamentos” (como o pagamento por si de materiais, sendo o custo destes descontado ao referido preço; como ter trabalhado na obra, sendo o valor do seu trabalho despendido ao preço), que pretendeu/pretende provar por testemunhas, com o que assumiu a existência de alterações ao que ficou escrito nos “orçamentos” e dispensa especiais exigências a propósito do “princípio de prova por escrito” para tornar admissível a prova testemunhal sobre os quesitos em apreciação.

[17] Via de regra e como é da natureza das coisas da vida – costuma dizer-se que “o segredo é a alma do negócio” – não é na presença de terceiros, estranhos e alheios ao negócio, que os seus preliminares, as negociações e a conclusão ocorrem.

[18] E, salienta-se, provou-se o que se havia alegado, ou seja, o R. só alegou pagamentos escalonados e não a concreta e exacta relação entre os pagamentos e as fases da obra.

[19] Estamos a falar de estipulações verbais a que é aplicável o art. 222.º do C. Civil, que a “lei não sujeita à forma escrita”; não se colocando por isso nenhum problema de validade de tais estipulações e quanto à limitação de meios de prova (cfr. 393.º e 394.º do C. Civil), em face das posições processuais de ambas as partes, fácil seria/é tornear a regra da “inadmissibilidade” da prova testemunhal.

[20] Há situações – invertendo um pouco o que deve ser o raciocínio que preside à elaboração duma decisão judicial – em que um certo tratamento jurídico se apresenta como imperativo, estando a dificuldade/dúvida na exacta qualificação/percurso para lá chegar.

[21]A prestação torna-se impossível quando, por qualquer circunstância (legal, natural ou humana), o comportamento exigível do devedor, segundo o conteúdo da obrigação, se torna inviável” - Antunes Varela – Obrigações – 2.º Vol., pág. 67.

[22] Brandão Proença, Lições de cumprimento e não cumprimento, pág. 171.

[23] A relevância jurídica dos casos de sacrifício ou custo excessivo da prestação restringe-se, diz-se, v. g., ao disposto nos artigos 437.º, 566.º, 762.ºe 812.º do C. Civil.

[24] Não descaracterizando a gravidade da conduta e a extinção da obrigação quer o facto de o R. também invocar que o A. se encontrava em dívida de alguns pagamentos (e de isto não se haver provado positivamente, como já explicámos) quer o facto de não se haver especificamente perguntado (e de por isso não estar provado positivamente) se foi a agressão do A. que motivou a saída do R. da obra; o que interessa (para além do facto do R. nunca mais haver regressado à obra) é o relevo e a repercussão que uma tal conduta, na sua objectividade, causa à manutenção duma relação contratual em que é suposto haver respeito e cooperação mútuos.

[25] Aqui se incluindo os danos não patrimoniais invocados, uma vez que os defeitos e irregularidades se mantêm (e por isso causam desgosto) porque não estão reparados; mas, é o óbice, não foram reparados por causa imputável ao A.

[26] Brandão Proença, Lições de cumprimento e não cumprimento, pág. 181/3.

[27] É, como já se referiu, a consequência normal do mecanismo do sinalagma próprio do contrato bilateral; sem ser necessário pedir a resolução do contrato.
[28] Montante referido no facto 10.
[29] Montante correspondente à soma do que consta do facto 11; e o que resulta da improcedência da modificação das respostas dadas aos quesitos 10.º e 200.º. Assim como – não haver mais montantes a subtrair ao preço – a improcedência da modificação das respostas dadas aos quesitos 11.º, 12.º, 13.º, 14.º, 15.º e 16.º.

[30] A propósito dos invocados (e reconvencionalmente pedidos) trabalhos a mais (alterações) não terem sido considerados no preço global, há que respeitar o considerado na sentença recorrida e que – não tendo o R. recorrido – transitou em julgado; escreveu-se, a tal propósito, na sentença recorrida:

“ (…) O réu alegou um conjunto de trabalhos efectuados extra orçamento, tendo ficado provado que o autor solicitou ao réu a realização de várias alterações ao projecto inicialmente acordado, tendo sido acordadas diversas alterações ao orçamento.

De acordo com o art. 1216º, as alterações conferem ao empreiteiro o direito ao aumento do preço estipulado, correspondente ao aumento de despesas e trabalho, permitindo, por outro lado, ao dono da obra deduzir ao preço da empreitada o que foi poupado em despesas pelo empreiteiro com as alterações.

Importa, no entanto, considerar que dada a natureza indivisível da obra realizada pelos réus, a eficácia retroactiva da resolução deve também estender-se a tais alterações, pelo que destruída a relação contratual ficaram também extintos aqueles direitos.

Assim, por força da destruição do contrato de empreitada, à semelhança do que expendemos a propósito da restituição do preço pelo réu e valor correspondente à obra a restituir pelo autor, impenderia sobre o réu a obrigação de restituir ao autor o valor que recebeu por conta das alterações e impenderia ao ao autor a obrigação de restituir o valor correspondente às alterações efectuadas pelo réu.

Porém, se de facto temos provado que foram solicitadas alterações ao projecto inicialmente acordado, resulta também das respostas limitativas aos factos 168 a 190 e 198 da base instrutória que não ficou provado que os trabalhos aí referidos se reportassem a alterações, nem que qualquer das quantias pagas pelo autor se reportassem ao pagamento de trabalhos efectuados para além do orçamento (…)”.

Ou seja, não se viu em quaisquer factos/respostas a prova positiva e concludente de exactos e concretos trabalhos a mais; interpretou-se o que consta dos factos 23 a 35 deste acórdão como sendo insuficiente para considerar tais trabalhos como “extras”, cujo custo/preço acresceria ao preço inicial dos “orçamentos”.
[31] Tratar-se-ia, por certo, de caso de aplicação do art. 1221.º/2 do C. Civil, isto é, dum caso específico em que a doutrina do limite do sacrifício tem um afloramento legal.

[32] Não se mencionou, designadamente, o defeito referido no facto 45, em face do que consta no facto 46; e não se aludiu à falta de isolamento térmico, uma vez que se provou que o mesmo não fazia parte do contrato.
[33] Dito doutra forma, a margem bruta de lucro não é superior a 50% do custo/preço do trabalho.

[34] Lembra-se aqui, conforme se referiu no relatório, que o R/empreiteiro admitiu que os trabalhos que efectivamente estão em falta atingirão o valor/custo de € 6.990,00.

[35] Como se explicou – sendo a necessidade desta explicação prévia que nos fez deixar a apreciação do agravo para o fim – o R. está exonerado/desvinculado/liberto da sua prestação; não tem que acabar a obra, que reparar defeitos, que entregar os montantes necessários à conclusão da obra ou à reparação dos defeitos, que indemnizar o A..