Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1545/18.1T8FIG-J.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: VITOR AMARAL
Descritores: RESPONSABILIDADES PARENTAIS
SEU INCUMPRIMENTO
FILHO MAIOR DE 18 ANOS
ALIMENTOS
Data do Acordão: 07/08/2021
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE COIMBRA – JUÍZO LOCAL CÍVEL DE CANTANHEDE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE REVOGADA
Legislação Nacional: ARTº 1905º C. CIVIL; 989º NCPC; LEI Nº 122/2015, DE 01/09.
Sumário: 1. - O processo de incumprimento de regulação do exercício de responsabilidades parentais constitui uma instância incidental, relativamente ao processo principal (de regulação dessas responsabilidades), destinada à verificação quanto a uma situação de incumprimento culposo/censurável de obrigações decorrentes de regime parental estabelecido, bem como à realização de diligências tendentes, designadamente, ao cumprimento coercivo.

2. - Por isso, esse processo não é o adequado a realizar alterações quanto às obrigações decorrentes do regime de regulação do exercício das responsabilidades parentais que se encontre em vigor, o que deverá ser efetuado em específico processo de alteração da regulação do exercício das responsabilidades parentais.

3. - As obrigações decorrentes da regulação do exercício das responsabilidades parentais têm de ser cumpridas, nos precisos termos acordados e objeto de homologação, também quanto a prestações de alimentos e a despesas disciplinadas em sentença respetiva, enquanto tal regulação não for judicialmente alterada.

4. - A obrigação de pagamento da pensão de alimentos a filho menor subsiste – na sequência da entrada em vigor da Lei n.º 122/2015, de 01-09, que alterou os art.ºs 1905.º do CCiv. e 989.º do NCPCiv. – após a maioridade deste e até que complete vinte e cinco anos de idade, mantendo-se de forma automática, exceto nas situações em que o respetivo processo de educação ou formação profissional esteja concluído anteriormente ou tenha sido livremente interrompido ou ainda quando não seja razoável impor ao progenitor tal obrigação.

5. - É sobre o progenitor obrigado que impende o ónus da alegação e prova daqueles fundamentos de inexigibilidade da permanência da obrigação alimentar na maioridade.

6. - Se o regime de regulação do exercício das responsabilidades parentais em vigor – que substituiu/alterou outro regime anteriormente vigente – prevê que ambos os filhos residem exclusivamente com o pai, ficando, por isso, a mãe obrigada a prestação alimentícia aos mesmos, não é a circunstância de um dos filhos ter atingido a maioridade, passando a residir com a mãe, que determina, ipso facto, a alteração das obrigações decorrentes do regime em vigor, pelo que o pai não passa por isso a estar obrigado à prestação de uma determinada quantia mensal de pensão de alimentos ao filho maior, a entregar à mãe, como não o estava quando o menor e vivia consigo, não havendo, por força dessa alteração de circunstâncias, uma repristinação informal do regime originário (sem nova alteração judicial da regulação).

7. - Tal repristinação também não pode ser operada no âmbito dos autos de incumprimento da regulação, designadamente na respetiva sentença, não havendo fundamento para cumprimento coercivo, sobre o progenitor que deixou de ter consigo o filho agora maior, de uma prestação alimentícia pecuniária que deixou de vigorar.

Decisão Texto Integral:






Acordam na 2.ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra:

I – RELATÓRIO

L..., com os sinais dos autos, pai do menor D... e da jovem R..., veio suscitar, quanto a estes seus filhos, o incidente de incumprimento das responsabilidades parentais contra a mãe, S..., também com os sinais dos autos, pedindo o reconhecimento da dívida alimentícia, por parte da Requerida mãe, ordenando-se o desconto da pensão de alimentos devida ao menor D... diretamente do salário daquela, com notificação à respetiva entidade patronal para o efeito.

Para tanto invocou ([1]) que:

- a Requerida vem incumprindo reiteradamente o acordado quanto ao pagamento das despesas de educação e saúde dos seus filhos – que ficaram, por acordo, a residir com o pai –, também não pagando a pensão de alimentos devida ao menor D..., sendo que a filha R... somente em julho de 2020 atingiu a maioridade;

- o incumprimento é deliberado, não decorrendo de qualquer dificuldade económica.

Notificada, a Requerida, impugnando o alegado pela contraparte, invocou, por sua vez, a compensação entre aos alimentos devidos ao menor D... com os devidos à jovem R..., esta, entretanto, já na maioridade e que se encontra a residir, desde julho de 2020, com a mãe, bem como entre as despesas realizadas com um e outro dos filhos ([2]).

O Requerente, pronunciando-se, veio pugnar pela improcedência da argumentação da Requerida, mormente quanto à pretendida compensação de créditos. 

Realizada conferência de pais e na falta de acordo entre Requerente e Requerida, prosseguiram os autos a sua tramitação, com produção de provas em audiência final, após o que foi proferida sentença – datada de 09/04/2021 –, com o seguinte dispositivo:

«Atento o exposto, decide-se:

- declarar verificado o incumprimento da requerida, quanto à pensão alimentícia e à comparticipação em despesas, em benefício da criança D... e da jovem R..., no valor global de €554, 81;

- declarar verificado o incumprimento do requerente, quanto à pensão alimentícia e à comparticipação em despesas, em benefício da jovem R..., no valor global de €762, 75.

(…)

Considerando que ambos os progenitores trabalham por conta de outrem, determina-se se notifiquem as respetivas entidades patronais para, a partir do primeiro processamento de vencimento posterior à notificação deste despacho, proceder à dedução da pensão de alimentos vincenda (€50,00 a favor da R... e €50,00 a favor do D...), acrescida de €50, 00 por conta dos alimentos vencidos (€554,81 no caso da requerida progenitora e €762,75 no caso do requerente progenitor).».

Desta sentença veio o Requerente, inconformado, interpor o presente recurso, apresentando alegação e as seguintes conclusões:

...

Em contra-alegação, o M.º P.º refere ser seu “entendimento que o recurso interposto deverá ser julgado parcialmente procedente, alterando a decisão recorrida”, para o que enfatizou não ser legalmente admissível a compensação invocada, discordar do decidido quanto a diversas despesas e ter a jovem R... completado “os seus 18 anos de idade a 30/07/2020, não tendo sido requerida/alterada/fixada pensão de alimentos a seu favor”.

A Requerida mãe, por sua vez, contra-alegando, conclui pela improcedência do recurso.


***

O recurso foi admitido como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos incidentais e com efeito meramente devolutivo, tendo sido ordenada a remessa dos autos a este Tribunal ad quem, onde foi mantido o regime e efeito assim fixados.

Nada obstando, na legal tramitação, ao conhecimento do mérito do recurso, cumpre apreciar e decidir.

II – ÂMBITO DO RECURSO

Perante o teor das conclusões formuladas pela parte recorrente – as quais definem o objeto e delimitam o âmbito do recurso ([3]), nos termos do disposto nos art.ºs 608.º, n.º 2, 609.º, 620.º, 635.º, n.ºs 2 a 4, 639.º, n.º 1, todos do Código de Processo Civil em vigor (doravante, NCPCiv.), o aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26-06 –, importa saber ([4]):

a) Se a sentença padece nulidade por omissão de pronúncia e por condenação para além do pedido (cfr. conclusões 1.ª a 4.ª do Recorrente);

b) Se é admissível e deve proceder a impugnação da decisão da matéria de facto;

c) Se houve erro na forma de processo, quanto a pedido de fixação de alimentos à filha maior;

d) Se ocorre incumprimento do regime fixado quanto a alimentos, devendo alterar-se a decisão recorrida, para o que cabe conhecer, designadamente, quanto às despesas em discussão e, bem assim, se, relativamente à jovem R..., por ter entretanto atingido a maioridade, não são devidos alimentos.

III – FUNDAMENTAÇÃO

          A) Nulidades da sentença

1. - Por omissão de pronúncia

Sob a conclusão 1.ª do Apelante, este argui a nulidade da sentença a que alude o art.º 615.º, n.º 1, al.ª d), do NCPCiv., isto é o vício de omissão de pronúncia, com reporte à não apreciação de invocada exceção dilatória de erro na forma do processo, quanto ao pedido de fixação de pensão de alimentos à jovem R..., já maior, junto da Recorrida.

A Requerida mãe, em contra-alegação, conclui pela inexistência de tal nulidade, esgrimindo que é certo cessar a obrigação de alimentos a favor de menor com o advento da sua maioridade, a não ser que o filho requeira a sua manutenção, o que se verificou no caso, estando demonstradas as necessidades de sustento da maior R..., que se encontra ainda a estudar.

Resulta daquele art.º 615.º, n.º 1, al.ª d), que a sentença é nula quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou, inversamente, conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.

Vêm entendendo, de forma pacífica, a doutrina e a jurisprudência que somente as questões em sentido técnico, ou seja, os assuntos que integram o thema decidendum, ou que dele se afastam, constituem verdadeiras questões de que o tribunal tem o dever de conhecer para decisão da causa ou o dever de não conhecer, sob pena de incorrer na nulidade prevista nesse preceito legal.

De acordo com Amâncio Ferreira ([5]), “trata-se de nulidade mais invocada nos tribunais, originada na confusão que se estabelece com frequência entre questões a apreciar e razões ou argumentos aduzidos no decurso da demanda”.

E, segundo Alberto dos Reis ([6]), “são na verdade coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão”.

Já Luís Correia de Mendonça e Henrique Antunes ([7]), por sua vez, referem que “a observação da realidade judiciária mostra que é vulgar a arguição da nulidade da decisão”, sendo que “por vezes se torna difícil distinguir o error in judicando – o erro na apreciação da matéria de facto ou na determinação e interpretação da norma jurídica aplicável – e o error in procedendo, como é aquele que está na origem da decisão”.

Por seu turno, Antunes Varela([8]) esclarece,
em termos de delimitação do conceito de nulidade da sentença, face à previsão do art.º 668.º do CPCiv., que “não se inclui entre as nulidades da sentença o chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável, o erro na construção do silogismo judiciário (…) e apenas se curou das causas de nulidade da sentença, deixando de lado os casos a que a doutrina tem chamado de inexistência da sentença”.

Na nulidade aludida está em causa o uso ilegítimo do poder jurisdicional em virtude de se pretender conhecer de questões de que não podia conhecer (excesso de pronúncia) ou não se tratar de questões de que deveria conhecer-se (omissão de pronúncia). São, sempre, vícios que encerram um desvalor que excede o erro de julgamento e que, por isso, inutilizam o julgado na parte afetada.

Como já se mencionou, para apuramento quanto ao vício de omissão (ou excesso) de pronúncia cabe perspetivar as questões em sentido técnico, só o sendo os assuntos que integram o thema decidendum, ou que dele se afastam, só esses constituindo verdadeiras questões de que o tribunal tem o dever de conhecer.

Assim, não são, obviamente, questões para este efeito os factos (alegados ou provados), nem os argumentos apresentados pelas partes, nem as razões em que sustentam a sua pretensão ou defesa, nem as provas produzidas, nem a apreciação que delas se faça em termos de formação da convicção do Tribunal.

Ora, dito isto, o Apelante retira – se bem se interpreta o seu acervo conclusivo/recursório – a nulidade que invoca da circunstância de a decisão recorrida não ter emitido pronúncia sobre a mencionada exceção dilatória de erro na forma do processo.

E é certo, por documentado nos autos, que a Requerida mãe, em 08/03/2021, veio “informar que pretende que seja fixada pelo tribunal a contribuição prevista no artigo 989.º, n.º 3, do CPC, a título principal das despesas com a jovem R..., sua filha”.

Ao que respondeu o Requerente pai, em 22/03/2021, argumentando:

- terem, efetivamente, as circunstâncias sofrido alteração, determinando, porém, o n.º 1 do art.º 42.º do RGPTC “que o progenitor com quem a Jovem reside e que pretenda contribuição para as suas despesas, requeira, junto do Tribunal territorialmente competente, nova Regulação das Responsabilidades Parentais”, requerimento esse a dever “ser autuado por apenso aos autos principais, nos termos da al. b) do nº 2 do mesmo art. 42º”;

- não poder, por isso, “ser discutida nestes autos a possibilidade de contribuir para as despesas da jovem R..., devendo ser proposta nova Regulação das Responsabilidades Parentais, por alteração das circunstâncias, em que tudo se irá discutir, designadamente, o regime de visitas em que o progenitor possa ver a filha, o que há largo tempo que não acontece”;

- não se compadecendo a tramitação específica aplicável aos autos de incumprimento “com questões de fixação de regimes de regulação das responsabilidades parentais, como a Recorrida pretende”, existindo, “por isso, manifesto erro na forma processual no requerimento”.

Pediu, assim, “que o Tribunal não atenda, neste Apenso, a pretensão da Requerida e que ordene a abertura de novo apenso para aquele fim”.

Da ata de audiência final, datada de 23/03/2021, apenas consta, após a produção de provas e alegações orais, que o Tribunal “instou os presentes acerca da sua disponibilidade para vir a ser fixada uma contribuição nos termos do disposto no artigo 989.º, n.º 3, do C.P.C.”, tendo o Requerente pai dito não estar disponível “a consensualizar o acordo nos termos do art.º 989.º, n.º 3, do C.P.C.”.

Seguiu-se a sentença, onde pode ler-se, em sede de fundamentação de direito:

«Nesta medida, é como se a alteração da RERP relativamente à R... tivesse inexistido.

Decorrentemente, entendemos que continua a vigorar a RERP homologada no apenso A e mantida no apenso G.

Ora, a pensão de alimentos ascende a €100,00 mensais, pelo que a dívida a esse título ascendia a €800, 00.

Porém, a requerida pugnou pela equivalência entre os valores por si devidos e os a si devidos, o que não é proscrito pelo citado art. 2008º do CC.

Assim, a dívida de pensão de alimentos do requerente à requerida ascende a €350,00.».

Nada mais é dito nesta matéria, não havendo qualquer abordagem expressa, assim, à dita exceção do “erro na forma processual”, tratando-se, obviamente, de questão suscitada nos autos.

Mas poderá entender-se que essa questão ficou implicitamente resolvida na sentença, ao estabelecer-se que a pensão de alimentos, a cargo do pai e com referência ao tempo da maioridade da filha, ascende a €100,00 mensais (ou aos “€50,00 mensais” considerados a final)?

É certo, a nosso ver, que deveria o Tribunal recorrido enfrentar, clara e expressamente, a questão suscitada do “erro na forma processual”, retirando as devidas consequências do que nessa sede decidisse.

Porém, se assim não fez, o certo é que o seu posicionamento decisório vai no sentido do deferimento do pretendido pela Requerida mãe, de molde a estabelecer a existência de um crédito, a favor da filha já maior, com referência a alimentos, a cargo do seu pai, crédito esse quantificado e com inerente declaração (judicial) de tal pai estar em situação de incumprimento respetivo, o que motivou a ordem de notificação da entidade patronal (do Requerente pai) para proceder ao desconto/dedução no âmbito salarial.

Ora, um tal deferimento do pretendido pela Requerida mãe equivale, no acolhimento da sua pretensão, neste âmbito processual – com reporte à maior plasticidade de critérios avaliativos e de medidas, sob influência da disciplina dos processos de jurisdição voluntária –, à opção pela improcedência daquela matéria de exceção (decisão tácita/implícita).

Doutro modo, a pretensão aludida, veiculada pela Requerida mãe, nunca poderia merecer acolhimento no quadro dos presentes autos, antes havendo de remeter-se os interessados, como esgrimia o Requerente pai, para “nova Regulação das Responsabilidades Parentais”, a correr “por apenso”.

Em suma, o sentido da sentença proferida dá sinal claro de que o Tribunal recorrido se posicionou de molde a ter como improcedente a dita matéria de exceção ([9]), termos em que, podendo aproveitar-se a decisão em crise, visto o seu sentido implícito, sem prejuízo para os contendores, e atenta a natureza dos autos, bem como os especiais interesses em questão, não é caso de declarar a respetiva nulidade por omissão de pronúncia ([10]).

2. - Por condenação para além do pedido

Pugna ainda o Recorrente por não se ter o Tribunal conformado com o princípio do pedido, condenando o Requerente pai – é deste que se trata – para além do que foi peticionado (no caso, pela Requerida mãe), assim infringindo o disposto no art.º 609.º, n.º 1, do NCPCiv., e incorrendo no vício de nulidade da sentença a que alude a al.ª e) do n.º 1 do art.º 615.º do mesmo Cód..

Assim, invoca que a condenação do Requerente pai a pagar pensões de alimentos desde julho de 2020 contraria o que havia sido requerido/peticionado pela Requerida mãe.

Não, porém, sem que antes tenha expressado o seguinte em sede de alegação recursiva:

«Acontece que, a Recorrida, em 8 de Março de 2021, deu entrada de requerimento em que declara pretender que seja fixado pelo Tribunal a contribuição prevista no nº 3 do art. 989º do C.P.C. no que concerne às despesas da jovem R...

Isto porque, como acima já se aflorou, a jovem R..., filha das partes, atingiu a maioridade em Julho de 2020 e, a partir dessa data, passou a residir com a Recorrida.

Portanto, a Recorrida, aproveitando este apenso, em que a matéria a tratar é um incumprimento, pretendeu que o Tribunal “a quo” fixasse uma pensão de alimentos a pagar à filha maior pelo aqui Recorrente.» (itálico aditado).

Ora, dispõe aquele art.º 989.º, n.º 3, que o progenitor que assume a título principal o encargo de pagar as despesas dos filhos maiores que não podem sustentar-se a si mesmos pode exigir ao outro progenitor o pagamento de uma contribuição para o sustento e educação dos filhos, nos termos dos números anteriores.

E, caso tenha “havido decisão sobre alimentos a menores ou estando a correr o respetivo processo, a maioridade ou a emancipação não impedem que o mesmo se conclua e que os incidentes de alteração ou de cessação dos alimentos corram por apenso” (n.º 2 do mesmo art.º).

Assim, se a Requerida mãe peticionou – de acordo com requerimento que efetivamente formulou – que seja fixada pelo Tribunal a contribuição prevista no n.º 3 do art.º 989º do NCPCiv. no que concerne às despesas da jovem R..., que atingiu entretanto a maioridade, tendo em conta a maior plasticidade (ou menor formalidade) de soluções/trâmites aplicáveis dos processos de jurisdição voluntária, o respetivo pedido existe, permitindo, no seu perímetro, que a 1.ª instância entendesse, como entendeu, que se justificava na maioridade a manutenção do montante mensal que vigorara (outrora) na menoridade.

É certo que o requerimento da Requerida mãe é datado de 08/03/2021, não aludindo expressamente a montantes referentes a meses anteriores, mas também é sabido que, na lógica desse requerimento, por a filha R... continuar a ser estudante, como o era antes, e não poder, por isso, prover, por si própria, ao seu sustento, os alimentos são devidos, se já anteriormente fixados, desde o momento em que o devedor se constitua em mora (art.º 2006.º do CCiv.).

Termos em que não se vê, salvo o devido respeito, e atendendo à natureza dos autos, que tenha o Tribunal recorrido, ao fixar os alimentos à filha R..., na (módica) quantia de €350,00 (em vez dos €800,00 de cálculo aritmético), incorrido em condenação em quantidade superior ao âmbito do pedido.

Em suma, não ocorre nulidade da sentença, improcedendo as conclusões do Apelante em contrário.

B) Matéria de facto

1. - Da impugnação da decisão relativa à matéria de facto

Da leitura das conclusões do Apelante parece poder depreender-se que este pretende impugnar a decisão referente à matéria de facto (no âmbito dado como provado), por via de erro de julgamento de facto, convocando, para tanto, prova documental, mas também testemunhal.

Com efeito, invoca expressamente (conclusão 28.ª) que «o Tribunal recorrido não podia ter considerado provado que o computador foi efetivamente custeado pela Recorrida». Pretende, então, se bem se interpreta, que esse facto seja julgado como não provado, convocando sindicância sobre prova documental (refere ter impugnado o documento/fatura apresentado como sendo referente à compra do computador) e prova testemunhal (cfr. conclusões 25.ª a 27.ª).

No mais, não se deteta qualquer alusão do impugnante, designadamente em sede conclusiva, a algum dos concretos factos enunciados na sentença, como provados ou não provados [cfr. o ónus previsto no art.º 640.º, n.º 1, al.ª a), do NCPCiv.].

Já quanto àquele computador, sendo fácil identificar o facto a que se reporta a impugnação, e por esta assentar também em prova testemunhal, cabe verificar se o Recorrente, na sua alegação recursiva (já que o não faz nas conclusões), identifica essas testemunhas e, bem assim, se indica as concretas/exatas passagens da gravação áudio em que funda a impugnação da decisão da matéria de facto [cfr. os ónus a cargo do impugnante/recorrente a que alude o mesmo art.º 640.º, nos seus n.ºs 1 e 2, al.ª a), consabido tratar-se de norma processual imperativa, que comina com a “rejeição” a inobservância respetiva].

Ora, percorrida tal alegação de recurso, constata-se que o Recorrente não alude, em parte alguma, a que concreta(s) testemunha(s) se refere, nem jamais indica, com exatidão, as passagens da gravação do(s) respetivo(s) depoimento(s) a que se reporta a dita al.ª a) do n.º 2 do art.º 640.º do NCPCiv..

O que logo motiva a rejeição da impugnação da decisão da matéria de facto, se é que o Recorrente a pretendia efetivamente deduzir, posto, por outro lado, que a justificação da convicção exarada na sentença quanto a esta matéria alude expressamente ao “depoimento das testemunhas ...” [cfr. facto 13, al.ª a), e respetiva motivação da convicção positiva].

Assim, ainda que o Recorrente pretenda reportar-se a estas duas testemunhas – e devia tê-lo dito de forma expressa [o aludido art.º 640.º, no seu n.º 1, al.ª b), refere-se à especificação dos concretos meios de prova que imponham decisão diversa] –, seguro é que lhe faltou a observância do ónus daquela indicação, com exatidão, das passagens da gravação áudio, com a consequência da mencionada rejeição.

Em suma, permanecendo inalterado o quadro fáctico da causa, definitivo se torna o julgamento da 1.ª instância sobre o factualismo dos autos, sendo a este – e somente a este – que haverá de atender-se para julgamento do recurso.

2. - Quadro fáctico da causa 

2.1. - Factos provados

Decidida a impugnação da decisão relativa à matéria de facto, sem qualquer alteração pela Relação, é a seguinte a factualidade provada:

...

2.2. - Factos não provados:

...

C) Matéria de direito

1. - Do erro na forma de processo quanto ao pedido de fixação de alimentos a filho maior

É sabido que o processo de incumprimento de regulação do exercício de responsabilidades parentais, de acordo com a nossa tradição jurídica, constitui uma instância incidental (tramitada por apenso), relativamente ao processo principal (de regulação dessas responsabilidades), destinada à verificação quanto a uma situação de incumprimento culposo/censurável de obrigações decorrentes de regime parental (provisório ou definitivo) estabelecido, bem como à realização de diligências tendentes, designadamente, ao cumprimento coercivo ([11]).

Já, por sua vez, a alteração desse regime terá, diversamente, de ser obtida em processo de alteração da regulação das responsabilidades parentais (nova regulação), previsto outrora no art.º 182.º da OTM, traduzindo um processo autónomo (novo), e agora, com semelhante natureza processual, no art.º 42.º do RGPTC, com a epígrafe “Alteração de regime” ([12]).

Assim, trata-se de procedimentos diversos, com distinta natureza e finalidade: um (incumprimento) direcionado para a correção de situações em que o regime fixado se encontra em incumprimento, tendo por objeto e função a determinação quanto ao âmbito desse incumprimento e o estabelecimento de medidas tendentes ao cumprimento, designadamente através de meios coercivos; outro (alteração de regime) destinado a obter nova regulação do exercício das responsabilidades parentais, por a anterior não ser cumprida (por ambos os pais, ou por outra pessoa a quem a criança esteja confiada), ou por terem ocorrido circunstâncias supervenientes que imponham alteração ao já estabelecido, no escopo do aperfeiçoamento e atualização do regime de regulação.

Não há, pois, dúvidas quanto à configuração como processo apenso dos ditos autos de incumprimento, como dispõe o n.º 3 do art.º 41.º do RGPTC: “Autuado o requerimento, ou apenso este ao processo, o juiz convoca os pais para uma conferência ou, excecionalmente, manda notificar o requerido para, no prazo de cinco dias, alegar o que tiver por conveniente”.

E também a alteração de regime (nova regulação) corre por apenso, nos termos da al.ª b) do n.º 2 do citado art.º 42.º, se, como in casu, o regime tiver sido fixado pelo tribunal, com o requerimento a ser autuado por apenso ao processo onde se realizou o acordo ou foi proferida decisão final.

Isto é, embora correndo ambos por apenso ao processo principal, trata-se sempre de processos autónomos (o de incumprimento e o de alteração da regulação), com objeto e finalidade diversas, pelo que bem se compreende que não possa regular-se num as matérias que respeitam ao outro, sob pena de confusão dos objetos processuais.

Assim, salvo o devido respeito, não deve aproveitar-se o processo de incumprimento, onde apenas se deve cuidar, como dito, de determinar quanto ao âmbito do concreto incumprimento de deveres (estes previamente fixados, como é claro) ocorrido e às medidas tendentes ao respetivo cumprimento, designadamente em termos coercivos/executórios, para regular matérias que se prendam já com a alteração do regime de regulação estabelecido, de molde a obter ali uma nova regulação.

Esta nova regulação, a ser necessária, designadamente por via de alteração das circunstâncias que presidiram à fixação da regulação inicial, deve ser suscitada e desenvolvida no quadro do processo (apenso) que lhe corresponde legalmente, o de alteração da regulação (previsto, como dito, no art.º 42.º citado), e não no apenso de incumprimento, regulado pelo art.º 41.º.

Mas estaremos, no caso, perante uma nova regulação, traduzida numa alteração do regime anteriormente fixado de regulação do exercício das responsabilidades parentais?

Que ocorreu alteração das circunstâncias, por a jovem R... ter, entretanto, atingido a maioridade, é matéria incontroversa (facto provado 1).

E é perante essa alteração de circunstâncias, conjugada com o facto de tal filha estar a coabitar com a sua mãe – e já não com o Requerente pai –, que a Requerida pretende que seja fixada a contribuição alimentícia a cargo do pai, já que a filha continua a sua formação escolar/profissional, não tendo ainda atingido a autonomia económica, pelo que continua a depender de seus pais, a quem cabe, por isso, o dever de contribuir para o seu sustento.

Assim, o que a Requerida mãe refere pretender é que o Requerente pai continue a contribuir, nos moldes que vigoraram no passado, no âmbito da regulação das responsabilidades parentais, com alimentos para a filha, agora maior, socorrendo-se do disposto no também já citado art.º 989.º, n.º 3, do NCPCiv..

Isto é, aquela Requerida, havendo dois filhos (um maior, a residir com ela, e outro ainda menor, a residir com o pai), e estando ela a assumir a título principal o encargo de pagar as despesas da filha agora maior, que não pode ainda sustentar-se a si mesma, pretende exigir ao outro progenitor (pai) o pagamento de uma contribuição para o sustento e educação dessa filha, com reporte, pois, a alimentos que já pagara, em condições algo similares, na menoridade da filha.

E o Tribunal, como já visto, por estar em causa o sustento da jovem R... (e decorrente sobrevivência), aceitou que pudesse tal questão ser tratada nestes autos de incumprimento, fixando que a pensão de alimentos ascende ao montante de €100,00 (mensais), sendo devida a partir do mês em que ocorreu a maioridade (continuando nos meses seguintes), com referência a um tempo anterior ao requerimento e à fixação, posto se ter considerado que, à data da sentença em crise (09/04/2021), já a dívida ascendia a €800,00, à razão de €100,00 por mês, num total, pois, de oito meses (embora, a final, tenha vido a estabilizar-se o quantum em “€50, 00 mensais”), quando é certo que o pedido era datado de 08/03/2021.

Por isso, na mesma sentença em que fixou o montante da prestação mensal e estabeleceu que o efetivamente devido ascendia a €350,00 – por a Requerida mãe ter pugnado pela equivalência entre os valores por si devidos e os a si devidos –, partiu logo o Tribunal, numa perspetiva de cumprimento coercivo, para a dedução/descontos no vencimento do “devedor” (pai), a partir do primeiro processamento de vencimento posterior à respetiva notificação, e quanto a prestações vencidas e vincendas.

Isto é, nos mesmos autos e na mesma sentença, estabeleceu-se o dever de o Requerido pai pagar alimentos, em montante determinado, na maioridade da filha, fixou-se o montante de prestações vencidas (já em dívida/mora) e o de prestações vincendas e ainda se determinou o cumprimento coercivo, através de deduções no vencimento do devedor, quanto a prestações pretéritas (consideradas vencidas) e futuras (vincendas).

Ao assim proceder, o Tribunal recorrido não observou – a partir do requerimento da Requerida mãe, datado de 08/03/2021 – a tramitação prevista no art.º 42.º do RGPTC, que preceitua pelo seguinte modo (quanto ao relevante, designadamente em termos de princípio do contraditório):

«3 - O requerido é citado para, no prazo de 10 dias, alegar o que tiver por conveniente.

4 - Junta a alegação ou findo o prazo para a sua apresentação, o juiz, se considerar o pedido infundado, ou desnecessária a alteração, manda arquivar o processo, condenando em custas o requerente.

5 - Caso contrário, o juiz ordena o prosseguimento dos autos, observando-se, na parte aplicável, o disposto nos artigos 35.º a 40.º.».

Também, do mesmo modo, o aludido requerimento não desencadeou a tramitação a que alude o art.º 41.º do mesmo RGPTC, mormente nos seus n.ºs 3 e segs., nem a prevista nos art.ºs 35.º a 39.º do mesmo compendio legal.

Apenas ocorreu que, por força da notificação entre mandatários, o Requerente pai, assim notificado, veio tomar posição, invocando, no exercício do contraditório, o aludido “vício” processual de “erro na forma processual” e pedindo, consequentemente, a “abertura de novo apenso para aquele fim” (quanto à pretensão da Requerida).

Perante o que o Tribunal logo procedeu à audiência final, em cuja ata consta “tentativa de conciliação”, para os efeitos previstos no art.º 989.º, n.º 3, do NCPCiv., a qual se mostrou infrutífera.

Assim sendo, poderia perspetivar-se que ao Requerido pai – considerado devedor – não hajam sido concedidas, mormente quanto às prestações consideradas vencidas de alimentos a filha maior (mas também quanto às vincendas), as garantias de defesa que lhe deveriam caber se a questão houvesse sido tratada, com autonomia, no âmbito de alteração à regulação, vista a legal tramitação específica deste âmbito incidental, tal como poderia pensar-se faltarem as cabais garantias comuns à esfera legal incidental de incumprimento, quanto às mesmas prestações, não se tendo procedido a qualquer diligência probatória de molde a determinar as necessidades atuais da filha maior (credora dos alimentos), o que tudo poderia alimentar as críticas no sentido da (aliás, invocada, mas, porventura, com excesso) parcialidade do Tribunal recorrido, com reflexos na aceitação da sentença pelos seus destinatários.

Ao invés, oferecida a resposta do Requerente pai – com o que, diga-se, ficou observado o princípio do contraditório –, logo se fixou, na sentença, o montante mensal da prestação devida, o quantum das prestações vencidas e a obrigação quanto às vincendas, partindo-se para a imediata perspetiva executória, com ordem de dedução/descontos no vencimento.

Todavia, pode argumentar-se que a norma do art.º 1880.º do CCiv., em conexão com o art.º anterior (este com a epígrafe “Despesas com o sustento, segurança, saúde e educação dos filhos”), estabelece que se, no momento em que atingir a maioridade, o filho não houver completado a sua formação profissional, manter-se-á a obrigação (de alimentos) na medida em que seja razoável exigir aos pais o seu cumprimento e pelo tempo normalmente requerido para que aquela formação se complete.

E o art.º 1905º do CCiv. (com a epígrafe “Alimentos devidos ao filho em caso de divórcio, separação judicial de pessoas e bens, declaração de nulidade ou anulação do casamento”) dispõe assim (na redação conferida pela Lei n.º 122/2015, de 01-09, aqui aplicável):

«1 - Nos casos de divórcio, separação judicial de pessoas e bens, declaração de nulidade ou anulação de casamento, os alimentos devidos ao filho e a forma de os prestar são regulados por acordo dos pais, sujeito a homologação; a homologação é recusada se o acordo não corresponder ao interesse do menor.

2 - Para efeitos do disposto no artigo 1880.º, entende-se que se mantém para depois da maioridade, e até que o filho complete 25 anos de idade, a pensão fixada em seu benefício durante a menoridade, salvo se o respetivo processo de educação ou formação profissional estiver concluído antes daquela data, se tiver sido livremente interrompido ou ainda se, em qualquer caso, o obrigado à prestação de alimentos fizer prova da irrazoabilidade da sua exigência.» (destaques aditados).

A este respeito, vem sendo entendido nesta Relação e Secção que “a Lei n.º 122/2015, de 1/9, alterou o paradigma probatório nesta temática”, nos seguintes termos:

“(…) antes do contributo legislativo aportado por tal diploma legal, «Embora não houvesse dúvidas de que a obrigação de prestação de alimentos fixada a filho menor não se extinguia automaticamente com a maioridade deste (cfr. art. 989.º, n.º 2, do NCPC; arts. 1880.º e 2013.º do CCiv), na prática, a subsistência dessa obrigação dependia de um impulso processual do filho, já maior, que, em processo especial instaurado contra o progenitor, tinha de demonstrar não ter ainda completado a sua formação profissional e estarem reunidos os demais pressupostos do art. 1880.º do CCiv. Isto porque se considerava que o pedido de alimentos em processo pendente ou formulado na instância renovada de processo findo apenas podia ser apreciado até ao momento da maioridade.

O n.º 2 aditado ao art. 1905.º do C.Civ dispensa o filho maior de alegar e provar tais pressupostos até que complete 25 anos de idade, competindo ao progenitor, atingida a maioridade do seu filho, requerer contra este a cessação ou alteração dos alimentos, nos termos previstos na parte final daquele normativo, uma vez que a continuação da prestação de alimentos para além desse momento é agora automática. É, pois, ao progenitor obrigado que cabe o ónus de alegar e provar os pressupostos que tornam inexigível a permanência da obrigação alimentar.

Isto é, com a alteração introduzida no art. 1905º do C. Civil, mediante o aditamento do nº 2 pela Lei nº 122/2015, os filhos passaram a ter automaticamente direito à pensão de alimentos que lhes foi fixada durante a menoridade, e até que completem 25 anos, sendo que esta obrigatoriedade de pagamento da prestação de alimentos só cessa (i) se o filho maior já tiver completado a sua educação ou formação profissional, (ii) no caso de essa educação ou formação ter sido interrompida por livre iniciativa do filho ou se (iii) o obrigado a alimentos fizer prova da irrazoabilidade da sua exigência.” ([13]).

Concordando-se aqui, integralmente, com este entendimento jurisprudencial, resta, então, dizer, com referência ao caso dos autos, que o Requerente pai continua obrigado, logicamente, a contribuir para o sustento da filha, apesar de esta ter passado a coabitar com a sua progenitora e ter já completado os 18 anos de idade, visto que a mesma ainda se encontra em período de formação escolar/profissional, frequentando o sistema de ensino, como resultou provado [cfr. facto 12].

Como nenhum dos progenitores (designadamente, o imputado devedor dos alimentos) veio requerer contra a filha já maior (credora) a cessação ou alteração dos alimentos, teria de entender-se que a continuação da obrigação/prestação alimentícia é automática. Era, pois, a qualquer dos progenitores que cabia o ónus de alegar e provar os pressupostos que tornassem inexigível a permanência da obrigação alimentar, o que não se mostra ter sido feito.

E também se poderia compreender, à primeira vista, que o montante dos alimentos ascendesse, quanto a prestações vincendas ([14]), ao quantum já fixado no passado para o caso de a filha R... estar a viver com a mãe (cfr. facto 2), posto nada mostrar que o âmbito das necessidades da filha – todavia, estudante – tenha diminuído.

Daí que pudesse, sempre à primeira vista, afigurar-se adequada, em equidade (cfr. art.º 987.º, dispondo quanto ao “critério de julgamento”), a quantificação da contribuição alimentícia a cargo do Requerente pai na maioridade da filha. E, se aquele, eventualmente, entendesse não poder a sua obrigação ser quantificada desse modo – por dever a pensão de alimentos a seu cargo ascender a montante inferior –, sempre poderia lançar mão do incidente de alteração do regime de regulação.

A esta luz, e visto o especial interesse da jovem, credora dos alimentos, também não pareceria que devesse considerar-se ter sido inobservada a tramitação processual adequada, nem, afinal, que tenham resultado prejudicadas as garantias de defesa do respetivo devedor. Esta nos parece ter sido a subjacente ponderação do Tribunal recorrido.

No entanto, não pode nunca olvidar-se a factualidade que resulta claramente provada: (i) o regime de regulação em vigor – aliás, estabelecido por sentença homologatória, datada de 09/07/2020 e transitada em julgado [proferida no apenso H)], no âmbito de “alteração de RERP”, como provado sob o facto 4 – impõe que ambos os filhos residam exclusivamente com o pai, sendo, por isso, à mãe, e só a ela, que cabe prestar quantia alimentícia [“a mãe contribui com €50,00 de alimentos para cada um dos filhos”]; (ii) a filha R..., que nasceu em 30/07/2002 (pelo que completou 18 anos em igual dia e mês do ano de 2020), encontra-se a viver com a mãe, desde julho de 2020, sendo esta progenitora, por isso, que suporta todas as suas despesas diárias, escolares e de alimentos [cfr. factos provados 1 e 11].

Tendo a filha R... atingido a maioridade, não se vê obstáculo a que, por opção sua – livre e esclarecida –, tenha decidido deixar de morar com o seu pai, abraçando a ideia de ir residir com a mãe.

Mas outra coisa é a obrigação de alimentos, esta a cargo da progenitora, no pressuposto – é certo – de a filha residir com o pai.

No campo obrigacional, em matéria de regulação do exercício de responsabilidade parentais, não pode alterar-se o regime alimentício unilateralmente, e segundo as conveniências de algum dos interessados, muito menos de molde a deixar à margem a pessoa que se considera ser a obrigada a pagar.

É que os termos da regulação do exercício das responsabilidades parentais têm de ser cumpridos, nos precisos termos acordados e homologados, nomeadamente no que respeita ao pagamento do montante da prestação de alimentos fixada, enquanto não for judicialmente alterada ([15]).

Em suma, se é certo que as obrigações dos pais, no campo dos alimentos, subsistem automaticamente após o atingimento da maioridade dos filhos, nos moldes legalmente definidos e antes aludidos, também é claro que as obrigações decorrentes da regulação do exercício das responsabilidades parentais não podem ser informal e unilateralmente alteradas, antes havendo de ser pontualmente cumpridas até que ocorra a sua válida alteração, sabido que o regime judicialmente fixado só pelo Tribunal, em alteração pelo modo legal, pode ser modificado.

Assim sendo, se o regime em vigor estabelece que é a mãe a devedora de pensão de alimentos à filha (o que valia para a menoridade e transita para a maioridade), não pode merecer cobertura a alteração deste regime – fosse na menoridade da filha ou seja na sua maioridade –, sem mais, em sede de autos incumprimento, não sendo admissível, sem a alteração do regime estabelecido e em vigor, a imposição ao pai de uma pensão de alimentos contrária a tal regime vigente, nem a imediata adoção de medidas tendentes ao cumprimento coercivo (executório) do montante de uma pensão que contraria o regime de alimentos ainda em vigor.

Termos em que, não tendo sofrido modificação, que se veja, o regime fixado no apenso H) – o último a ser estabelecido, por sentença de 09/07/2020, isto é, poucos dias antes de a jovem R... ter atingido a maioridade, sentença essa transitada e não objeto de alteração –, não pode aderir-se, salvo o devido respeito, ao entendimento, adotado na sentença em crise ([16]), no sentido de ser “como se a alteração da RERP relativamente à R... tivesse inexistido”, continuando “a vigorar a RERP homologada no apenso A e mantida no apenso G”, de molde a que “a pensão e alimentos ascend[a] a €100,00 mensais, pelo que a dívida a esse título ascendia a €800,00” (a cargo do pai).

Um tal entendimento incorre na inobservância do dito regime de alimentos em vigor, o por último estabelecido, tal como fixado no apenso H, com o qual se devem conformar, até sua válida alteração, os sujeitos processuais e o próprio Tribunal, não podendo este – com todo o devido respeito –, também no gravoso campo coercivo/executivo, ter como “inexistente” a “alteração da RERP” por último homologada (mediante sentença transitada em julgado), de molde a que as obrigações ali estabelecidas deixassem de valer (sem mais), o que contraria também, naturalmente, as expetativas das partes/sujeitos envolvidos, de nada valendo invocar, num tal horizonte, se bem se vê, a figura substantiva do abuso do direito, tal como prevista no art.º 334.º do CCiv. ([17]) ([18]).

Tudo visto, tem de revogar-se, por demonstrado erro de julgamento de direito, a sentença recorrida no tocante à imputada obrigação alimentícia do Requerente pai à filha R... e decorrente cumprimento coercivo, quanto às aludidas prestações vencidas (montante total de €350,00) e vincendas.

2. - Do incumprimento do regime fixado quanto a alimentos

2.1. - Quanto a despesas em discussão a cargo da Recorrida

Começa o Recorrente pai por referir que a Requerida mãe assentiu no pagamento de despesas extra-curriculares, se com elas concordasse, incluindo equitação, catequese e explicações, pelo que deve ser responsável pela despesa referente a explicação (conclusão 7.ª).

Na sentença entendeu-se, em contrário, serem de afastar despesas com “explicações, porquanto não foi demonstrado o acordo da progenitora para aquelas ora apresentadas a comparticipação, além de o progenitor não haver demonstrado sequer a necessidade das explicações e a imprestabilidade do apoio ao estudo escolar”.

Ora, compulsada a factualidade provada – a única agora a atender para decisão de direito do recurso –, constata-se que apenas vem provado, com referência a despesas extra-curriculares (tendo em perspetiva as “explicações”, e para além dos montantes documentados como despendidos a esse título), que:

- «11) Cada um dos progenitores suportará metade das despesas médicas, medicamentosas, escolares tidas com o D..., bem assim extracurriculares acordadas pelos primeiros, sendo que, até ao final do corrente ano letivo, ambos se comprometem a assumir metade da mensalidade da escola» (no concernente ao regulado no âmbito do apenso A, com sentença homologatória de 20/03/2019); e

- «- a mãe comparticipa em 50% nas despesas médicas e medicamentosas na parte não comparticipada pelo SNS e, na mesma proporção, nas despesas escolares e extracurriculares, estas últimas se com as mesmas concordar, devendo o progenitor comunicar os documentos respetivos para o email sandraisabeljesussantos@gmail.com, pertencente à requerida.» (no concernente, quanto a ambos os filhos, ao regulado no âmbito do apenso H, com sentença homologatória de 09/07/2020).

Assim sendo, à míngua de outros factos provados de suporte, resta concordar que, quanto a explicações, não resulta demonstrado o acordo da progenitora para aquelas ora apresentadas a comparticipação, além de o progenitor não haver demonstrado sequer a necessidade das explicações e a imprestabilidade/insuficiência do apoio ao estudo escolar.

Donde, assim, a improcedência do recurso nesta parte.

Quanto agora a despesas com psicólogo particular (conclusões 8.ª e 9.ª), dir-se-á que também aqui é deficitária a base fáctica provada.

Efetivamente, não se vê onde, nos factos provados, esteja previsto acordo no sentido de a Requerida mãe ter concordado em os filhos frequentarem o psicólogo particular, de molde a suportar também a respetiva despesa.

Com efeito, não se trata de despesa médica, posto o psicólogo não ser obviamente um médico, um profissional da medicina ([19]), com todo o respeito – apesar da discordância – pela argumentação em contrário do Recorrente em sede de alegação de apelação.

Assim, nada a alterar nesta parte à ocorrida desconsideração da respetiva despesa para efeitos de comparticipação pela Recorrida mãe.

Já quanto a despesas com o medicamento “Levitan” (conclusões 9.ª a 14.ª), consta da fundamentação jurídica da sentença, como justificação para a respetiva exclusão do rol de despesas sujeitas a comparticipação pela Requerida:

«(…) resulta nas contraindicações «Não está recomendado para crianças com menos de 12 anos».

Por outro lado, não foi apresentada receita médica, assumindo o requerente que a mesma não existia, tendo resultado a toma da iniciativa do próprio, ainda que com algum sugestionamento. Que se foi mantendo.

Sucede que a mãe se opôs à toma sem receita médica, sendo que se trata de medicação não indicada para menores de 12 anos. Ora, o D... apenas perfará os 12 anos a 20.09.2021.

São estas as razões para que não se possa considerar tal despesa (…).».

Em contrário, esgrime o Recorrente que se trata de medicamento, prescrito por médico, mediante receita eletrónica, por hoje os médicos já não emitirem receitas em papel, cabendo ao Tribunal, se dúvidas tiver, em jurisdição voluntária, obter a prova que considere necessária.

Ora, é certo que consta como não provado [al. C) da parte fáctica da sentença] que «O medicamento Livetan foi prescrito ao menor D... no Hospital Pediátrico de Coimbra aquando de uma ida do Requerente com o mesmo à urgência, há cerca de um ano. Foi prescrito pelo médico pediatra psiquiatra que atendeu o menor na altura, por descompensação de cariz psicológico.».

Tal facto persiste com o julgamento de “não provado”, desde logo por o Recorrente não o ter impugnado, pelo modo legal, na vertente recursiva.

Daí que, sem necessidade de outras considerações, não possa, na sindicância da decisão de direito, acolher-se a pretensão do Recorrente quanto a esta despesa.

2.2. - Quanto a despesas em discussão a cargo do Recorrente

Discorda o Recorrente da sua responsabilização por metade do preço de um computador, cuja aquisição importou na alegada quantia de €745,00.

Não obstante a discordância do impugnante, continua provado – mesmo após sindicância consequente à impugnação da decisão referente à matéria de facto – que:

«A Requerida despendeu com a sua filha R..., desde a altura em que a mesma foi viver com ela, as seguintes despesas (…) escolares:

a) Aquisição de um computador: 745,00 € (setecentos e quarenta e cinco euros);

(…)» (cfr. facto 13).

Assim sendo, estando provada a realização desta despesa, bem como a sua envolvência escolar, não se vê como, com recurso a juízos de equidade, e tendo em conta o acordado e o interesse da filha, esta ainda em formação (cujo percurso escolar, possivelmente, não acabará no imediato, sendo previsível que venha a frequentar o ensino superior, horizonte em que continuará a necessitar do computador, como imprescindível ferramenta de pesquisa/trabalho/estudo), possa isentar-se o Recorrente da respetiva comparticipação ([20]), nem como, atento o nível de escolaridade em que a jovem R... se encontra (cfr. facto 12), com as inerentes exigências, haja de considerar-se o comprovado preço de aquisição excessivo.

Em suma, improcede também esta vertente recursiva, não se notando que tenha havido, neste âmbito, desigualdade de tratamento pelo Tribunal recorrido, designadamente em desfavor do Requerente pai.

***

IV – SUMÁRIO (art.º 663.º, n.º 7, do NCPCiv.):
1. - O processo de incumprimento de regulação do exercício de responsabilidades parentais constitui uma instância incidental, relativamente ao processo principal (de regulação dessas responsabilidades), destinada à verificação quanto a uma situação de incumprimento culposo/censurável de obrigações decorrentes de regime parental estabelecido, bem como à realização de diligências tendentes, designadamente, ao cumprimento coercivo.
2. - Por isso, esse processo não é o adequado a realizar alterações quanto às obrigações decorrentes do regime de regulação do exercício das responsabilidades parentais que se encontre em vigor, o que deverá ser efetuado em específico processo de alteração da regulação do exercício das responsabilidades parentais.
3. - As obrigações decorrentes da regulação do exercício das responsabilidades parentais têm de ser cumpridas, nos precisos termos acordados e objeto de homologação, também quanto a prestações de alimentos e a despesas disciplinadas em sentença respetiva, enquanto tal regulação não for judicialmente alterada.
4. - A obrigação de pagamento da pensão de alimentos a filho menor subsiste – na sequência da entrada em vigor da Lei n.º 122/2015, de 01-09, que alterou os art.ºs 1905.º do CCiv. e 989.º do NCPCiv. – após a maioridade deste e até que complete vinte e cinco anos de idade, mantendo-se de forma automática, exceto nas situações em que o respetivo processo de educação ou formação profissional esteja concluído anteriormente ou tenha sido livremente interrompido ou ainda quando não seja razoável impor ao progenitor tal obrigação.
5. - É sobre o progenitor obrigado que impende o ónus da alegação e prova daqueles fundamentos de inexigibilidade da permanência da obrigação alimentar na maioridade.
6. - Se o regime de regulação do exercício das responsabilidades parentais em vigor – que substituiu/alterou outro regime anteriormente vigente – prevê que ambos os filhos residem exclusivamente com o pai, ficando, por isso, a mãe obrigada a prestação alimentícia aos mesmos, não é a circunstância de um dos filhos ter atingido a maioridade, passando a residir com a mãe, que determina, ipso facto, a alteração das obrigações decorrentes do regime em vigor, pelo que o pai não passa por isso a estar obrigado à prestação de uma determinada quantia mensal de pensão de alimentos ao filho maior, a entregar à mãe, como não o estava quando o menor e vivia consigo, não havendo, por força dessa alteração de circunstâncias, uma repristinação informal do regime originário (sem nova alteração judicial da regulação).
7. - Tal repristinação também não pode ser operada no âmbito dos autos de incumprimento da regulação, designadamente na respetiva sentença, não havendo fundamento para cumprimento coercivo, sobre o progenitor que deixou de ter consigo o filho agora maior, de uma prestação alimentícia pecuniária que deixou de vigorar.
V – DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal da Relação, na parcial procedência do recurso, em alterar a decisão apelada:

a) Declarando, em consequência, verificado o incumprimento do Requerente/Recorrente, quanto, apenas, à comparticipação em despesas, em benefício da jovem R..., sua filha (agora maior), no valor global de €412,75;

b) Revogando a determinação de dedução no vencimento do Requerente/Recorrente de montantes para pagamento de pensão de alimentos a favor da filha R... (prestações vencidas e vincendas);

c) Mantendo no mais a sentença impugnada.   

Custas da apelação por Recorrente e Recorrida, na proporção de metade para cada um (sem prejuízo de benefício de apoio judiciário).

Coimbra, 08/07/2021

Escrito e revisto pelo Relator – texto redigido com aplicação da grafia do (novo) Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (ressalvadas citações de textos redigidos segundo a grafia anterior).

Assinaturas eletrónicas.

Vítor Amaral (Relator)

          Luís Cravo

Fernando Monteiro


([1]) Segue-se, por economia de meios, o relatório da decisão recorrida.
([2]) Sustenta a Requerida que, com a alteração da residência da filha R... para junto daquela, “cada um dos progenitores ficou a suportar os encargos do filho que se encontrava a seu cargo, ocorrendo, assim, uma distribuição equitativa das despesas, motivo pelo qual não é devida qualquer quantia a título de alimentos.” (art.º 4.º do respetivo articulado).
([3]) Excetuando, logicamente, questões de conhecimento oficioso, não obviado por ocorrido trânsito em julgado.
([4]) Caso nenhuma das questões resulte prejudicada pela decisão das precedentes.
([5]) Cfr. “Manual dos Recursos em Processo Civil”, 9.ª ed., p. 57.
([6]) Vide “Código de Processo Civil, Anotado”, vol. V, p. 143.
([7]) In “Dos Recursos”, Quid Júris, p. 117.

([8]) Cfr. “Manual de Processo Civil”, p. 686.
([9]) Se tal posicionamento é correto ou errado é matéria de que se conhecerá a jusante.
([10]) Embora – reitera-se, com todo o devido respeito – o Tribunal a quo pudesse (e devesse) emitir pronúncia expressa sobre uma tão expressa matéria de exceção de erro na forma de processo.
([11]) Cfr. o art.º 41.º (com a epígrafe “Incumprimento”) do RGPTC (Regime Geral do Processo Tutelar Cível, aprovado pela Lei n.º 141/2015, de 08-09), cujo n.º 1 dispõe assim: «Se, relativamente à situação da criança, um dos pais ou a terceira pessoa a quem aquela haja sido confiada não cumprir com o que tiver sido acordado ou decidido, pode o tribunal, oficiosamente, a requerimento do Ministério Público ou do outro progenitor, requerer, ao tribunal que no momento for territorialmente competente, as diligências necessárias para o cumprimento coercivo e a condenação do remisso em multa até vinte unidades de conta e, verificando-se os respetivos pressupostos, em indemnização a favor da criança, do progenitor requerente ou de ambos».
([12]) Cujo n.º 1, por sua vez, estabelece: «Quando o acordo ou a decisão final não sejam cumpridos por ambos os pais, ou por terceira pessoa a quem a criança haja sido confiada, ou quando circunstâncias supervenientes tornem necessário alterar o que estiver estabelecido, qualquer um daqueles ou o Ministério Público podem requerer ao tribunal, que no momento for territorialmente competente, nova regulação do exercício das responsabilidades parentais».
([13]) Cfr. o recente Ac. TRC de 22/06/2021, Proc. 2351/06.1TBFIG-F.C1 (Rel. Luís Cravo), disponível em www.dgsi.pt, em que intervieram os aqui Ex.mos Adjuntos (com destaques aditados). E, no mesmo sentido, veja-se ainda, inter alia, o Ac. TRC de 01/06/2021, Proc. 54/03.8TBSCD-E.C1 (Rel. Luís Cravo), também em www.dgsi.pt.
([14]) Para as vencidas foi estabelecido o módico montante total já aludido.
([15]) Cfr., por todos, o Ac. TRE de 10/05/2018, Proc. 77/09.3TBALR-B.E1 (Rel. Tomé Ramião), em www.dgsi.pt.
([16]) Veja-se a respetiva fundamentação de direito.
([17]) Cfr., mais uma vez, o exarado na sentença, em sede de fundamentação jurídica respetiva.
([18]) O facto de a jovem R..., por já ser maior, ter passado – unilateralmente e em contrário ao regime por último fixado – a viver com a mãe, ficando a cargo desta, não tem a virtualidade de “arruinar” o regime de regulação em vigor (quanto a alimentos), por judicialmente homologado, mesmo se, “quando passou a vigorar (…), já a R... não residia com o pai, sendo tal o pressuposto da respetiva vigência”. Com efeito, se o “pressuposto” sofreu tão rápida mutação, apenas restava nova alteração, do mesmo modo, ao regime ali fixado, posto todas as alterações ao estabelecido pelo Tribunal, nesta matéria de alimentos a cargo dos progenitores, terem de ser pelo Tribunal definidas/fixadas, na sede própria. Doutro modo, estaria aberta a porta a todo o tipo de alterações unilaterais e informais ao regime de regulação do exercício de responsabilidades parentais e alimentos aos filhos.
([19]) É bem sabido que a “psicologia” – estudo da “psique”, ou ciência que se dedica “ao estudo dos factos psíquicos, quer encarados subjetivamente (factos de consciência), quer objetivamente (factos de comportamento)”, de acordo com a enunciação, manifestamente simplificada, do Dicionário da Língua Portuguesa, Porto Editora, Porto, a propósito daquela palavra –, ao contrário da psiquiatria, não é um dos ramos da medicina, não sendo, pois, os psicólogos profissionais da medicina. Assim, o psicólogo – um especialista em psicologia – não é um médico, não podendo, por isso, exercer a medicina.
Como pode ver-se em Wikipédia (https://pt.wikipedia.org/wiki/Psicologia), a propósito do mesmo termo: «Psicologia é uma profissão, disciplina académica e ciência que trata da mente, do estudo e análise de seus processos e comportamento de indivíduos e grupos humanos em diferentes situações. A psicologia tem como objetivo imediato a compreensão de grupos e indivíduos tanto pelo estabelecimento de princípios universais como pelo estudo de casos específicos, e tem, segundo alguns, como objetivo final o benefício geral da sociedade. Um pesquisador ou profissional desse campo é conhecido como psicólogo, podendo ser classificado como cientista social, comportamental ou cognitivo. (…) // A psicologia é a ciência que estuda o comportamento e os processos mentais dos indivíduos (psiquismo). É geralmente definida como o estudo científico do comportamento e dos processos mentais, isto é, estuda todos os actos e reacções observáveis, mas também processos como os sentimentos, as emoções e as representações mentais que não podem ser observadas directamente.».
([20]) Que sempre lhe caberia, do mesmo modo, em termos de desembolso/custo, se a filha maior continuasse a viver consigo (proporção de 50% para cada progenitor nas despesas escolares, como resulta do facto 4).