Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
8114/12.8YIPRT.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: FERNANDO MONTEIRO
Descritores: INJUNÇÃO
ACÇÃO ESPECIAL
TAXA DE JUSTIÇA
Data do Acordão: 10/15/2013
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso:
COMARCA DO BAIXO VOUGA - ALBERGARIA-A-VELHA - JUÍZO DE MÉDIA E PEQ. INST. CÍVEL
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTS. 150-A, 476, 486-A, 685-D CPC, DL Nº 269/98 DE 1/9
Sumário: Na acção declarativa transmutada do procedimento de injunção, decorrido o prazo previsto no artigo 7º, nº 4, do Regulamento das Custas Processuais, sem que o autor comprove o pagamento dessa taxa de justiça, deve o tribunal recorrer aos mecanismos previstos nos nºs 3 e 5 do artigo 486º-A, do Código de Processo Civil (anterior à Lei 41/2013) e só esgotados estes, sem eficácia, aplicar o disposto no artigo 20º do Regime Anexo ao DL nº 269/98, de 1 de Setembro.
Decisão Texto Integral: Acordam na 2ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra:

O presente recurso incide sobre a decisão proferida a 28.9.2012, tendo esta determinado o desentranhamento do requerimento de injunção, por falta de pagamento da taxa de justiça devida pela transmutação da injunção em acção especial, e a extinção da instância por impossibilidade superveniente da lide.

O recorrente apresenta as seguintes conclusões de recurso:

            a. Nos termos do Regulamento das Custas Processuais, se o procedimento de injunção seguir como acção declarativa especial, é devida taxa de justiça, pelo autor e pelo réu, a pagar no prazo de 10 dias a contar da data da distribuição.

b. Esta solução, que tem as suas origens nas alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 32/2003, de 17 de Fevereiro, veio alterar substancialmente o regime original e criar alguns problemas interpretativos, mormente, no actual artigo 20.º do regime anexo.

c. Por força do Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro, o regime do pretérito artigo 19.º de epígrafe ”custas” desapareceu por completo, constando um singelo artigo 20.º de epígrafe “documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça”, com uma redação que actualmente estipula que “na falta de junção do documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça, é desentranhada a respectiva peça processual”.

d. É com base na eliminação dos n.ºs 3 e 4 do artigo 19.º, que a sentença em crise considera que ao réu aplica-se o regime do artigo 486.º-A do CPC e ao autor o n.º 20 do regime anexo, sem mais, uma vez que deixou de haver na nova lei remissões expressas para o cálculo e liquidação nos termos do Código das Custas Judiciais (agora Regulamento das Custas Processuais) e aplicação das normas do CPC relativas à contestação.

e. Sucede porém que o n.º 4 do artigo 7.º do RCP, ao conter a indicação de que o pagamento das taxas de justiça é feito “nos termos gerais do presente regulamento”, remete expressamente para o n.º 1 do artigo 13.º do mesmo diploma, clarificando que o pagamento é feito nos termos fixados no Código de Processo Civil.

f. Assim, a cominação prevista no actual artigo 20º, aplica-se às acções transmutadas em processo comum ou especial, e a sua cominação, apenas opera após esgotadas as válvulas de segurança previstas no CPC, que, no caso do Autor, encontram-se previstas nos n.ºs 1 e 3 do artigo 150.º-A do CPC ou do n.º 1 artigo 685.º-D do CPC, consoante o entendimento.

g. Certo é porém, que o entendimento jurisprudencial dos tribunais superiores não admite, sem mais, a aplicação da cominação prevista no artigo 20.º do regime anexo ao Decreto-Lei n.º 269/98, à falta de pagamento da taxa de justiça, devendo ser sempre dada a hipótese às partes de realizarem o pagamento extemporaneamente acrescido de multa.

h. Qualquer decisão que permita ao Réu socorrer-se do CPC para realizar o pagamento mas não o permita ao Autor, viola o principio da igualdade previsto no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa e no artigo 3.º-A do Código de Processo Civil, conforme decidido pelo Tribunal da Relação de Lisboa no Acórdão 39357/10.8YIPRT.L1-1 de 30-11-2010.

i. Não podendo ser defensável que as partes, notificadas de igual modo para procederem ao pagamento da taxa devida, tenham regimes diferentes para o fazer, com consequências díspares, especialmente quando, no CPC, os regimes para o pagamento extemporâneo nas acções declarativas são semelhantes (artigos 150.º-A, n.º 3 e 486.ºA).

j. Em conclusão, é manifesta a procedência do presente recurso, tendo a decisão recorrida violado, assim, a correcta interpretação do artigo 20.º do regime anexo ao Decreto-Lei n.º 269/98 e do n.º 4 do artigo 7.º e n.º 1 do artigo 13.º do Regulamento das

Custas Processuais pelo que deverá ser revogada, permitido-se ao Autor proceder ao pagamento, prosseguindo a acção com as legais consequências.


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            Não foram apresentadas contra-alegações.

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            A questão a decidir é a de saber se em processo de injunção, quando o procedimento siga como acção e falte o pagamento da taxa de justiça pelo autor, há fundamento legal para desentranhar de imediato o requerimento transmutado em petição.

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Os factos:

A injunção inicial foi transmutada para acção declarativa especial.

No prazo legal, após a distribuição desta, o requerente não juntou comprovativo do pagamento da taxa de justiça devida.

O tribunal ordenou o desentranhamento do requerimento inicial e, por falta dele, julgou extinta a instância.


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No caso, nos termos dos arts.16º, nº 1, do Regime Anexo ao Decreto-Lei nº 269/98, de 1 de Setembro e 7º, nº 4, do Regulamento das Custas Processuais, era devido o pagamento de taxa de justiça pelo autor, no prazo de 10 dias a contar da data da distribuição.

Este pagamento é imposto a ambas as partes.

Trata-se agora do início de uma instância declaratória jurisdicional, sendo certo que o requerente já liquidou antes a taxa relativa ao procedimento injuntivo.

Apesar do início daquela instância, o processo não está propriamente na fase da petição. No caso inclui já a oposição.

Considerando válida a argumentação do recorrente e seguindo de perto a jurisprudência dos acórdãos da Relação de Lisboa, de 30.11.2010, 8.2.2011 e 26.6.2012, nos processos nºs 39357/10.82YIPRT.L1-1, 214835/09.2YIPRT-L1-7 e 157518/11.4YIPRT.L1-7, em www.dgsi.pt, podemos sintetizar do seguinte modo a argumentação contrária à decisão sob recurso, aquela que aceitamos:

Sendo certo que o artigo 11º, nº 1, alínea f), do Regime Anexo ao DL nº 269/98, quanto ao requerimento de injunção, já comina com a sua recusa a hipótese de se não

mostrar paga a taxa devida, o art.20º deste Regime, colocado onde está, só pode estar a referir-se ao momento seguinte à transmutação do requerimento em acção. (Porém, o valor deste argumento esbate-se quando encontramos no artigo anterior uma norma relativa à entrega do requerimento de injunção, momento que estaria aqui já ultrapassado.)

Poderá dizer-se que o referido art.20º resulta da eliminação dos anteriores nºs 4 e 5 do art.19 e o desentranhamento imediato estava ali previsto para a peça inicial do autor. Porém, a mudança pode ser interpretada no sentido da solução ser agora idêntica para ambas as partes. A lei nova fez desaparecer a diferença aparente entre a falta do autor e a falta do réu. Assim, ajustando a lei especial à lei geral expressa no Código de Processo Civil, sendo certo que após a transmutação a posição das partes é idêntica (tendo o autor já antes liquidado o devido pela injunção), os mecanismos de reacção processual devem ser idênticos para as partes – solução adequada ao princípio da igualdade.

Nas últimas reformas sobre custas, o legislador procurou localizar nas leis de processo as suas regras fundamentais. Os referidos mecanismos de reacção processual deverão encontrar-se naquelas leis de processo.

Também nas opções que o legislador vem fazendo nos sistemas processual e tributário-judicial, ele tem procurado assegurar a eliminação de “preclusões de índole tributária” (porque são de ordem puramente formal), introduzindo diversas possibilidades para as partes cumprirem ainda as suas obrigações (ver arts. 150º-A, 476º, 486º-A, 685º-D, todos do Código de Processo Civil anterior à Lei 41/2013; nesta nova lei, de teor idêntico, ver os arts.145º, 560º, 570º e 642º).

Estas soluções são mais consentâneas com a defesa do acesso ao Direito.

Sendo assim, se os referidos mecanismos de salvaguarda estão previstos na lei geral, se as partes estão colocadas em patamar idêntico aquando da transmutação da injunção em acção, então o art.20º, que se manteve no Regime Anexo ao DL nº 269/98, não pode ser de aplicação imediata e apenas contra o autor.

(Conforme o art.5º, nº3, da Lei 41/2013, de 26.6, o novo Código de Processo Civil não é aplicável.)


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Decisão.

Julga-se a apelação procedente, revoga-se a decisão recorrida e ordena-se o seguimento da acção, impondo-se a notificação do apelante nos termos do artigo 486º-A, nº 3, do Código de Processo Civil (anterior à Lei 41/2013).

Custas pela parte vencida a final.

Coimbra, 2013-10-15


 Fernando de Jesus Fonseca Monteiro ( Relator )

 Luís Filipe Dias Cravo

 Maria José Monteiro Guerra