Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00789/04 - VISEU
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:04/03/2008
Relator:Fonseca Carvalho
Descritores:IRC - FACTURAS FALSAS - ÓNUS DA PROVA
Sumário:I – Para poder exercer o seu poder de correcção do rendimento colectável é necessário primeiro que a Administração Tributária prove os pressupostos que legitimam o exercício de tal poder.
II – Não tendo a Administração Tributária durante a inspecção constatado factos ponderosos e objectivos fortemente indiciadores de que as facturas que titulam diversas transacções comerciais são falsas, isto é, apenas servem de instrumento formal para com elas se poder deduzir os custos nela referidos não cumpriu com o ónus da prova dos pressupostos, que lhe é exigida e por tal razão não abala a presunção de verdade de que goza a escrita formalmente organizada da impugnante nem determina a inversão do ónus da prova nos termos do artigo 74 da LGT.
III – A actuação correctiva da Administração nas circunstâncias referidas em II deve ter-se por ilegal e por ilegal também o acto administrativo da liquidação decorrente de tal procedimento.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Não se conformando com a sentença do TAF de Viseu que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação de IRC do ano de 1996 bem como derrama e juros compensatórios no montante global de 919.620$00 veio a impugnante Oliveira & Costa, Ldª, dela interpor recurso para o STA 2ª Secção do Contencioso Tributário concluindo assim as suas alegações:
1. As nulidades de processo têm, em princípio, de ser arguidas perante o tribunal onde foram cometidas, no prazo geral previsto no art. 205° do CPC, sendo a esse tribunal que compete, em primeira linha, delas conhecer, ex vi do disposto no art. 202° do CPC.
2. Tais nulidades de processo não podem ser conhecidas e decididas em sede de recurso da Sentença através da notificação da qual a Recorrente tomou conhecimento de que as mesmas haviam sido cometidas.
3. Tendo as nulidades arguidas pela Recorrente ocorrido antes de ter sido proferida a Sentença (pelo que não se verificou a situação tipificada no art. 205°-3 do CPC), e não tendo a mesma sido praticada a coberto de qualquer despacho judicial que autorizasse as formalidades preteridas, a forma adjectivamente correcta de reagir contra essas nulidades era aquela que foi adoptada pela Recorrente, ou seja, a arguição dessa nulidade perante o tribunal a quo, nos termos do disposto nos arts. 201° e 202° do CC, e no prazo previsto no art. 205° deste mesmo diploma.
4. Contrariamente ao que parece pressupor na decisão recorrida, se o Mm.° Juiz do tribunal a quo decidisse conhecer e decidir das arguidas nulidades processuais, ele não estaria a apreciar da matéria da causa, mas antes a exercer as competência que a lei para esse efeito lhe confere expressamente (cfr. arts. 201°, 202° e 205° do CPC, aplicáveis ex vi do disposto no art. 2°/e do CPPT), e não, como erradamente supôs, ao tribunal de recurso.
5. Assim, ao negar-se, com esse fundamento, a conhecer das arguidas nulidades, a decisão recorrida enferma de erro manifesto, de que resultaram violadas as normas que aplicou mal (como é o caso das normas dos arts. 666°-1, e 668°-3-4 do CPC), bem como aquelas que deveria ter aplicado e não aplicou (como é o caso das normas dos arts. 201°, 202 e 205° do CPC — aplicáveis ex vi do disposto no art. 2°/e do CPPT).
6. O tribunal a quo deveria, em cumprimento do disposto nos arts. 156° e 288° do CPC, ter começado por conhecer e decidir da nulidade decorrente da arguida inconstitucionalidade orgânica e formal das normas que atribuíram competência ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu para conhecer dos presentes autos.
7. Apenas caso entendesse não se verificar essa inconstitucionalidade, deveria então o tribunal a quo pronunciar-se sobre a nulidade decorrente da arguida inconstitucionalidade material dessas mesmas normas.
8. Finalmente, e apenas no caso de não concluir pela verificação das arguidas nulidades decorrentes da inconstitucionalidade de tais normas, é que deveria então o tribunal a quo, considerando-se competente, conhecer e decidir do requerimento de recurso.
9. E isto porque da procedência da nulidade fundada na inconstitucionalidade das referidas normas resultaria, salvo o devido respeito, imediatamente prejudicado o conhecimento do requerimento de interposição de recurso, porquanto o tribunal se julgaria, em tal caso, absolutamente incompetente para conhecer e decidir os presentes autos.
10. Dentro do prazo de 10 dias contados da notificação que lhe foi efectuada da Sentença, estava na disponibilidade da Impugnante suscitar ou não suscitar as questões referidas no seu requerimento de arguição de nulidades, bem como introduzir em juízo o requerimento de recurso da Sentença, e, tendo decidido fazê-lo, era a ela quem, em primeira linha, competia escolher a ordem pela qual as mesmas deveriam ser conhecidas e decididas.
11. É certo que, no uso dos respectivos poderes-deveres, o Mm.° Juiz do tribunal a quo podia alterar essa ordem, mas com respeito pelas determinações legais e cumprindo o dever de fundamentação, o que não aconteceu (cfr. art. 158° do CPC e 205°-1 da CRP).
12. O sentido com que, no entender da Recorrente, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão recorrida deveriam ter sido interpretadas e aplicadas, é o de que, salvo na situação prevista no art. 205°-3 do CPC, bem como nos casos em que prática ou a omissão do acto ou da formalidade estejam a coberto de um despacho judicial que as tenha autorizado, as nulidades de processo devem ser arguidas perante o juiz do tribunal onde as mesmas tenham sido cometidas, devendo por este ser conhecidas e decididas, e não através de recurso para o tribunal superior.
13. Pelo exposto, o tribunal a quo não devia ter aplicado as normas dos arts. 666°-1 e 668.°, mas sim as normas dos arts. 201°, 202° e 205° do mesmo diploma, ex vi do disposto no art 2°/e do CPPT.
Nestes termos, deverá ser dado provimento ao presente recurso e revogar-se a decisão recorrida, devendo a mesma ser substituida por outra que determine ao Mm° Juiz do tribunal a quo que conheça e decida das nulidades que perante ele foram arguidas pela ora Recorrente, com legais consequências, como é de direito.
Apenas para o caso de o presente recurso não subir nos próprios autos, requer que, para além da certidão da decisão recorrida, o presente recurso seja instruído com certidão da Sentença proferida em 25/05/2004, do requerimento através do qual a Recorrente arguiu nulidades (remetido ao TAF de Viseu, via fax, em 21/06/2004), e ainda do requerimento através do qual a Recorrente interpôs recurso da Sentença (remetido ao TAF de Viseu, também via fax, em 21/06/2004).
A recorrente recorre igualmente para o TCAN da sentença do Tribunal «a quo» formulando as seguintes conclusões:
a) Não foram notificados à recorrente os documentos nos quais a Mm.a Juiz fundamentou a sua decisão da matéria de facto, pelo que não lhe foi permitido, na altura em que tais documentos terão sido juntos aos autos, que se pronunciasse sobre eles, não os pôde tomar em conta na instrução dos autos, nem pôde aquilatar sobre eles nem sobre a sua relevância para a decisão agora proferida.
b) A necessidade dessa notificação está expressamente consagrada no art. 115.°-3 do CPPT, preceito este que, no caso dos autos, foi violado.
c) De todo o modo, sempre essa falta de notificação se traduz numa violação clara do princípio do contraditório (cfr. art. 3.°-3 do CPC, aplicável ex vi do art. 2.°/e) do CPPT).
d) Tal falta constitui, salvo Ó devido respeito, nulidade insuprível susceptível de influir no exame e na decisão da causa (cfr. art. 201.°-1 do CPC) e tem como consequência a anulação dos termos subsequentes do processo que dependem absolutamente daquela omissão, incluindo a douta decisão recorrida (cfr. art. 201.°-2 do CPC), o que se requer
Sem conceder, e por cautela de patrocínio:
e) No procedimento adinistrativo que conduziu às liquidações impugnadas (e como é afirmado no douto parecer do M.P.), a administração tributária não podia ter legalmente procedido à aplicação de métodos indiciários, pois não foram encontrados “... não foram indicados quaisquer indícios fundados relativamente à existência de proveitos ou custos que não pudessem ser objecto de comprovação directa e exacta pela análise da contabilidade e dos documentos justificativos do lançamento das operações económicas”.
f) Tendo, apesar disso, procedido às correcções consubstanciadas nas liquidações impugnadas, a administração tributária violou, v.g., o disposto nos arts. 104.°, art.° 2, 268.°, n.° 3, e 266.°, n.°s 1 e 2 da CRP, arts. 3.º/1, 4.°, 6.°, 56.°, 87.°/1, 124.° e 125.° do CPA, art. 77.° da LGT, arts. 16.°/3 e 51.°/2 do CIRC na redacção em vigor à data dos alegados factos,
g) E, assim, designadamente, os princípios, constitucional e legalmente consagrados, da legalidade, da justiça, do inquisitório, da busca da verdade material, do respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos (cfr. art. 266.°, 1 e 2 da CRP, arts. 3.°-1, 4.°, 6.°, 56.° e 87.° do CPA), bem como o princípio da tributação pelo lucro real (art. 104.°, n.° 2 da CRP).
h) Ao fazê-lo sem ter fundamentado devidamente a sua decisão — pois, no caso dos autos, a fundamentação administrativa não é clara, nem coerente e lógica, nem suficiente —, violou o dever de fundamentação (cfr., v.g., art. 268.°-3 da CRP, 124.° e 125.° do CPA e 77.° da LGT), incorrendo em falta de fundamentação (cfr. art. 125.°/2 do CPA), falta essa que invalida a decisão, por nulidade em virtude de faltar ao acto um dos seus elementos essenciais (cfr. art. 133.°/1 CPA), ou, ainda que assim não se entendesse, por anulabilidade (cfr. art. 135.° do CPA).
i) Ao fazê-lo sem ter demonstrado os pressupostos legais dos quais decorria a sua actuação, tendo apenas “concluído, por presunção”, que as facturas em causa não corresponderiam a transacções efectivas, para partir para a aplicação de “métodos indiciários”, a administração tributária fez ainda errada aplicação do n.° 3 do art. 16.° e do n.° 2 do art. 51.° do CIRC, tendo violado dessa forma o princípio da tributação pelo lucro real (cfr. art. 104.°, n.° 2, da CRP).
j) Cabia à Administração Fiscal demonstrar que, relativamente à impugnante (e não, por exemplo, a algum dos seus fornecedores), se verificara alguma das circunstâncias (pressupostos) que poderiam legitimar a aplicação daqueles métodos, o que não fez, apenas tendo presumido o que deveria ter demonstrado.
k) A invalidade da actuação administrativa no caso dos autos deveria ter sido decretada pela douta decisão recorrida; não tendo isso acontecido, esta, salvo o devido respeito, incorreu em erro de julgamento, com violação das disposições, regras e princípios acima referidos, os quais deveriam ter sido interpretados e aplicados com o sentido expresso nas precedentes alegações e conclusões.
Sempre sem conceder,
1) A douta decisão recorrida incorreu em erro de julgamento da matéria de facto ao ter de forma incorrecta e infundada desvalorizado totalmente as provas trazidas aos autos pela recorrente, e ao conferir força probatória a informações oficiais não devidamente fundamentadas, de acordo com critérios objectivos, como exige o artigo 115.° do CPPT.
m) E fez ainda, sempre com o devido respeito, errada aplicação das regras do ónus da prova, porquanto, antes de se poder onerar a recorrente com a prova de que as facturas em causa correspondiam a transacções efectivas, era à administração tributária que cabia demonstrar que tais facturas diziam respeito a operações simuladas, ou que se verificava qualquer outra situação que pudesse fundar legalmente o recurso aos “métodos indiciários”, necessidade essa de prova que decorre, v.g., dos artigos 16.°-3 e 51.°/2 do CIRC, e está de acordo com a regra geral de repartição do ónus da prova (art. 342.° do Código Civil) e com a presunção de veracidade das declarações dos contribuintes (cfr. art. 75.° da LGT).
Ainda sem conceder,
n) Ainda que a administração tributária tivesse tido dúvidas, deveria ter procurado esclarecê-las, para poder fundamentar devidamente a sua decisão, ou abster-se de proceder às correcções e liquidações ora impugnadas;
o) Sempre com o maior respeito, a Mm.a Juiz do tribunal a quo deveria ter feito a análise acima descrita e, em consequência da aplicação das regras gerais de repartição do ónus da prova (v.g., art. 342.° do Código Civil), ter anulado as liquidações impugnadas.
p) Mas, sem conceder e ainda que dúvidas lhe subsistissem — e, ainda que a prova produzida não tivesse proporcionado à Mm.a Juiz certezas, ao menos deveria ter-lhe suscitado uma séria ou fundada dúvida sobre a actuação e as conclusões da administração —, tais dúvidas sempre deveriam ter levado a Mm.a Juiz a anular o acto impugnado, nos termos do art. 100.°/1 do CPPT, art. 75.° da LGT, art. 104.°/2 da CRP, e arts. 16.°/3 e 51.°/1/2 do CIRC.
Sempre sem conceder,
q) Sempre seria de julgar inconstitucional, por violação dos princípios da legalidade da actuação administrativa, do respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, da justiça e da boa fé, bem como do princípio da tributação pelo lucro real (cfr. art. 104.°/2 da CRP), uma interpretação do n.° 3 do artigo 16.°, conjugado com os n.°s 1 e 2 do art. 51.° do CIVA que fosse no sentido de atribuir ao contribuinte o ónus de provar que as operações postas em causa pela administração tributária correspondiam a operações efectivas, antes de a mesma administração tributária demonstrar de forma fundamentada e suficiente que tais operações seriam simuladas ou não corresponderiam a transacções efectivas.
r) E, também com este fundamento, sempre seria de anular a decisão recorrida e as liquidações impugnadas.
Ainda sem conceder,
s) Não foram dados como provados na douta sentença factos concretos suficientes para retirar a conclusão de que estavam reunidos os pressupostos para o recurso aos métodos indiciários no que respeitava à impugnante/ recorrente.
t) Ao decidir de forma diferente, e salvo o devido respeito de forma infundada, foi violado o disposto, v.g., nos arts. 16°/3 e 52.°/1/2 do CIRC, bem como no artigo 104.°, n.° 2, da CRP.
Sem conceder,
u) Os factos dados como provados são contraditórios quanto à circunstância de as facturas em causa nos autos “titularem” transacções efectivas.
v) E também a fundamentação de direito é contraditória, afirmando, por um lado, que no caso dos autos, foram aplicados métodos indiciários, e, por outro lado, que as correcções teriam consistido em “não terem sido consideradas” em concreto tais facturas (métodos correctivos).
w) Tais contradições, salvo o devido respeito, são causa de nulidade da sentença, que se invoca (cfr. art. 668.°/1/c) do CPC).
Por último e sem conceder,
x) Ainda que houvesse — e não há, no caso dos autos — razão para aplicação de métodos indiciários, sempre se deveria considerar que a Administração Fiscal tomou neste caso a decisão de aplicação de tais métodos com violação, no procedimento, do princípio do inquisitório e da verdade material, bem como do dever de fundamentação.
y) Deste modo, e sempre salvo o devido respeito, a decisão recorrida incorreu em erro de julgamento também quanto à apreciação que fez da decisão de aplicação de métodos indiciários por parte da Administração Fiscal, a qual deveria ter considerado ilegal por violação, v.g., dos artigos 56.°, 87.°/1, 124.° e 125.° do CPA, arts. 52.° e 53.° do CIRC, e arts. 104.°/2 e 268.°, n°s 3 e 4 da CRP.
Nestes termos, e com o douto suprimento de V. Ex.as, que se invoca, deverá o presente recurso ser julgado provado e procedente e, em consequência:
a) Decretar-se a nulidade acima invocada, nulidade insuprível susceptível de influir no exame e na decisão da causa (cfr. art. 201.°-1 do CPC) e, em consequência, os termos subsequentes do processo que dependem absolutamente da omissão de notificação à recorrente, incluindo a douta decisão recorrida (cfr. art. 201.°-2 do CPC).
Sem conceder, mas ainda que assim não se entendesse,
b) Sempre seria de anular a douta decisão recorrida, de acordo com os fundamentos constantes das precedentes alegações e conclusões,
Tudo com as legais consequências, assim fazendo V. Ex.as JUSTIÇA!
Não houve contra alegações.
O M.º P.º pronuncia-se improcedência do recurso.
Colhidos os vistos cumpre decidir.
Foi a seguinte matéria de facto que o Tribunal «a quo» deu como provada:
A) A impugnante exerce a actividade de “indústria, comércio, importação e exportação de produtos de cortiça”, encontrando-se enquadrada, para efeitos de IRC, no regime geral de tributação, dispondo de contabilidade regularmente organizada (cfr. fls. 98 dos autos dos autos cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido);
B) Na sequência de uma acção de fiscalização cruzada a Administração Fiscal procedeu à liquidação adicional de IRC, derrama e juros compensatórios, referente ao período de 1996, com fundamento em correcções por métodos indiciários, dado que as facturas emitidas por AVELINO à ora impugnante tiveram, de acordo com o relatório da fiscalização “... por objectivo titular, pelo menos em parte, compras reais efectuadas a outro(s) fornecedor(es) sem liquidação de IVA, pelo que não é tecnicamente correcto cortar todos os custos suportados pelas referidas facturas, sob pena de se apurar, nalguns casos, e neste em particular, rentabilidade fiscal muito superiores ao que é normal para o sector de actividade em que se insere o contribuinte, pondo em causa a sua própria sobrevivência, razão pela qual optamos pela aplicação dos métodos indiciários para o cálculo do apuramento do lucro tributável, em relação aos exercícios (...) 1996 (...) já que se verifica a falsificação de documentos e se constata que a escrita do contribuinte não reflecte a exacta situação patrimonial e o resultado efectivamente obtido, sendo impossível determina-lo com exactidão por não ser possível saber em concreto o valor das existências consumidas (...) o critério que propormos para o seu calculo consiste na aceitação dos valores dos proveitos e dos custos declarados, com excepção do custo das existências vendidas e consumidas, e estimar este em 90% do valor das vendas das mercadorias declarado e em 75% do somatório dos valores de vendas de produtos e de variação da produção. Isto é, considera-se que a taxa de lucro bruto é de 10% nas vendas de mercadorias e de 25% na venda de produtos fabricados pela empresa, taxas estas consideradas normais na actividade desenvolvidas pelo contribuinte.. .“(negrito e sublinhado nossos; cfr. fls. 68 a 108, sobretudo fls. 103 [nomeadamente ponto 8., 8.1. e 8.2.] a 108 [nomeadamente ponto 8.2.1.5.] dos autos dos autos cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido);
C) As facturas com os n.°1225, 1270, 1286 e 1279, emitidas por AVELINO à ora impugnante, não correspondem à efectiva prestação de serviços (cfr. fls. 7, 98, 100 a 108; fls. 68 a 108 todas dos autos cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido);
D) Em 1997-12-16, a impugnante reclamou para a Comissão de Revisão do Lucro Tributável em IRC, a qual veio a ser indeferida com os fundamentos da decisão se encontram (cfr. fls. 10, 16 a 19; 31 a 40 e 41 dos autos dos autos cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido);
E) Em 1999-11-26, o Administrador Tributário, proferiu despacho no sentido de manter o acto tributário impugnado, considerando em síntese que “...as facturas n.°1225, 1270, 1286 e 1279, emitidas por AVELINO , não reflectem operações comerciais verdadeiras (...),
b) Em corroboração dessa situação são apontados pela Inspecção Tributária factos concretos (...),
c) Tais irregularidades não são desmentidas nem é apresentado qualquer meio de prova que coloque em causa as conclusões e as provas carreadas pela Inspecção Tributária para aquele seu Relatório, nomeadamente sobre a entrada de mercadoria nas suas instalações, existências e efectiva utilização no processo produtivo.
2.2. Dai que sofram de falta de sustentação os argumentos trazidos pela impugnante.
3.1. Por tudo isto, dá-se por reproduzido o relatório da Inspecção Tributária que condensa o conjunto de indícios e de meios de prova que fundamentam as suas conclusões no sentido da necessidade da tributação oficiosa por recurso a métodos indiciários, já que se conclui que o expediente do recurso a facturas falsas se determinou a encapotar aquisições a intermediários/fornecedores de cortiça em prancha em quantidades que tapassem o fosso com as vendas verdadeiras de produtos fabricados e que a não se ter deitado mão dessas facturas falsas abrir-se-ia o fosso entre proveitos e custos e dar-se-ia o surgimento de margens brutas de lucro impróprias para o sector, pelo que a Inspecção Tributária foi obrigada então a proceder ás correcções ajustáveis e estimou em 90% o valor da vendas do custo das existências e a considerar o valor da taxa do lucro bruto em 10% e de 25% a taxa de venda de produtos fabricados.
3.3. Com o expediente, voluntário e doloso a impugnante falseou saldo da expressão do lucro tributável obtive! em função dos custos verdadeiros e devidamente documentados e os lucros efectivamente obtidos na sua actividade.
3.4. Com este procedimento voluntário, doloso e ilícito a impugnante causou prejuízo ao Estado, levando à componente custos os valores das transacções que não se realizaram e cujo valor foi ilegalmente deduzido à expressão do lucro real efectivamente obtido que diferentemente devia ter constado da sua declaração periódica modelo n.° 22 a que se refere o art. 94° e ss do CIRC... (cfr. fls.43 e 44, 68 a 108 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
FACTOS NÃO PROVADOS:
Não se provaram quaisquer dos factos alegados na douta petição — se bem que quase todas as asserções aí insertas constituam antes meras considerações pessoais e conclusões de facto e/ou direito —, em resultado da ausência e/ou da contraditoriedade da prova produzida, pois atendendo ao apurado em sede de fiscalização, incumbia à impugnante demonstrar que, não obstante, as aludidas transacções haviam realmente sido realizadas.
Foi perante a factualidade que o M.mo Juiz «a quo» ponderando as questões que lhe foram postas e que se prendiam com decidir:
1º Da legitimidade do recurso a métodos indiciários para determinação da matéria colectável.
2º Da existência ou não de erro na quantificação do montante apurado pela AF. Considerou que tendo a impugnante invocado a inexistência de facto tributário importava desde logo analisar a contabilidade e escrita a impugnante de modo a concluir se em primeiro lugar ela se deveria ter como regularmente organizada e se reflectia a realidade da empresa relativamente ao exercício em análise.
Assim de tal inspecção poderia resultar uma das três seguintes situações:
1º Ou a contabilidade se encontrava devidamente organizada e reflectia a situação real da empresa e teria que dar-se razão á impugnante por não haver lugar a tributação por inexistência de facto tributário donde resultava a ilegalidade dos métodos indirectos em causa.
2º Ou a escrita continha erros ou omissões tais que por força delas não podia a AF de modo exacto e directo apurar o montante tributável o que a impugnante repudia.
3º Ou as anomalias da escrita eram de molde a corrigir-se sem manifesto esforço o que determinaria mera correcção aritmética sendo sempre desnecessário o recurso aos métodos indirectos.
No caso dos autos o M.mo juiz «a quo» julgou verificarem-se os pressupostos legitimadores do recurso a métodos indiciários por do relatório da inspecção resultarem factos designadamente os relevados nas alineas A) a E) do probatório e relativos às facturas emitidas por Avelino que porque titulando embora transacções reais essas transacções eram imputadas na totalidade ao mesmo fornecedor o Avelino quando relativamente a este só algumas diziam respeito e mesmo essas não correctamente especificadas nem suportadas por documento adequado sendo as restantes relativas a outros fornecedores não igualmente discriminadas e especificadas e sem que tivesse havido a prévia liquidação de IVA.
E essa falta de discriminação quer dos montantes fornecidos pelo Avelino quer dos restantes fornecedores impossibilitava a quantificação directa e exacta do montante tributável. Daí que a AF tivesse necessidade de socorrer-se dos métodos indiciários para apuramento do imposto em falta.
A recorrente como se vê do teor das suas conclusões não se conforma com a decisão e desde logo questiona a falta da notificação dos documentos cuja junção foi ordenada pelo M.mo Juiz «a quo» e nos quais o M.mo juiz teria a fundamentado a decisão o que constitui preterição de formalidade legal por violação do artigo 115 /3 do CPPT e violação do princípio do contraditório nos termos do nº 3 do artigo 3º do CPC.
Integrando mesmo tal preterição nulidade susceptível de influir na decisão da causa cfr. artigo 201º do mesmo diploma legal.
E é esta questão que o TCAN terá imediatamente de decidir.
Consta efectivamente dos autos que a M.mo juiz ordenou a junção aos autos do relatório da inspecção e da reclamação para a comissão de revisão e considerou não ser necessária a notificação da impugnante por segundo a M.mo juiz a impugnante ter conhecimento já destes documentos cfr. despacho de folhas 121.
Está também demonstrado que a impugnante não foi notificada de tal junção pois no seguimento dela apenas foi ordenada a notificação das partes para querendo alegarem.
Ora este comportamento não pode deixar de ser entendido como preterição de formalidade legal por violadora do artigo 115/3 do CPPT e ainda dos artigos 539 do CPC aplicável ex vi do preceituado no artigo 2º do CPPT al. e) e mesmo violadora do principio do contraditório a que alude o artigo 3/3 do CPC.
Esta omissão é susceptível de influir a boa decisão da causa pelo que constitui nulidade nos termos do artigo 201 do CPC até porque foi nesse relatório que o M.mo juiz «a quo» se estribou para fixar os factos pertinentes á decisão tomada.
Daí que em princípio este TCAN devesse dar como verificada tal nulidade anulando todo o processado posterior.
Mas como já se decidiu no acórdão deste TCAN de 20/01/2006 in recurso decisão onde interviemos como adjunto tal solução embora legal não passaria de uma decisão formal e ao mesmo tempo impeditiva de ver a recorrente conhecer do mérito da causa produzindo-se uma solução minimalista.
Dai que como ali se escreveu importe também aqui «arquitectar uma solução que privilegie o mérito e não a forma».
Por tal razão o TCAN considera dever-se sobrestar e se for o caso afinal não declarar a nulidade invocada prosseguindo com o conhecimento do recurso.
No fundo e como se pode ver das conclusões l) m) s) e t) a recorrente questiona a decisão por a mesma enfermar de erro de julgamento quanto à matéria de facto e em abono deste juízo afirma que o tribunal não valorizou igualmente a prova testemunhal inflacionando o valor dos factos do relatório da inspecção.
E sem bem atentarmos no relatório da inspecção junto aos autos relativamente ao exercício de 1996 a Administração não verificou facto algum susceptível de por si ou acompanhados de outros elementos da escrita da impugnante fazer cessar a presunção de verdade de que goza a escrita da impugnante que se diz correcta e formalmente organizada.
O que a AT releva e a sentença confirma em sede de IRC é uma mera convicção do agente fiscalizador exarada a folhas 192 dos autos no ponto 7.2.5.1 do relatório onde afirma ser sua convicção que o Avelino vendeu as facturas que a sociedade impugnante necessitava para titular a compras de cortiça que fez a outros sem liquidação de IVA. Mas não apresenta facto algum que confirme essa convicção.
Sucede por outro lado que a confissão do Avelino de alguns factos donde se pretende retirar essa venda se refere apenas aos anos de 1991 e 1995 altura em que foi ouvido e nada disse como é óbvio sobre o exercício de 1996 que é posterior.
Constata-se do exposto que do relatório de fiscalização não resultam factos indiciadores de simulação de vendas de cortiça á impugnante no exercício de 1996.
Não logrou assim a Administração Tributária cumprir com o ónus de provar os pressupostos de facto que a legitimassem a corrigir o IRC desse exercício pelo que a sua actuação deve ter-se por ilegal.
No caso dos autos a M.ma Juiz deu como provado que as facturas emitidas pelo Avelino eram falsas por não titularem transacções comerciais, mas não há elemento algum constado onde possa alicerçar-se tal convicção.
Decorre do exposto que não havendo causa para fazer cessar a presunção de verdade de que goza a escrita da impugnante a correcção efectuada pela AF ao rendimento colectável do exercício de 1996 se tem de haver por ilegal.
O que conduzindo à procedência da impugnação determina que o TCAN deixe de conhecer das restantes questões por prejudicadas.
Face ao exposto e sem necessidade de mais considerações acordam os juízes do TCAN em reformular a redacção da alínea C) do probatório que passará ater a seguinte redacção:
«A Administração Tributária não carreou para os autos elementos suficientemente indiciadores de que as facturas discriminadas na Alina c) do probatório da sentença recorrida não titulassem verdadeiras transacções comerciais .»
Por todo o exposto acordam os juízes do TCAN:
A) Em dar provimento ao recurso e revogar a sentença recorrida e em substituição julgar a impugnação procedente.
B) Em não conhecer do objecto do recurso para o STA por dada a solução tomada o mesmo se encontrar prejudicado.
Sem custas.
Notifique e registe.
Porto, 03/04/2008
José Maria da Fonseca Carvalho
Moisés Rodrigues
Dulce Neto