Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00123/21.2BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:09/16/2021
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Tiago Miranda
Descritores:DISPENSA DE PRESTAÇÃO DE GARANTIA, ÓNUS DE ALEGAÇÃO E DE PROVA DOS FACTOS INTEGRANTES DA INSUFICIÊNCIA ECONÓMICA.
Sumário:I – O nº 4 do artigo 52º da LGT, interpretado de acordo com os princípios constitucional e legal da justiça nas relações entre a AT e os contribuintes (artigos 266º nº 2 da CRP e 55º da LGT), consagra um direito subjectivo do contribuinte à dispensa da prestação de garantia, uma vez verificados os pressupostos de facto ali previstos.

II – Assim, a dispensa de prestação de garantia em ordem à suspensão da execução fiscal na dedução de oposição à mesma, sendo, embora, uma atribuição da administração tributária, não corresponde ao exercício de um poder discricionário, nem mesmo ao exercício de uma discricionariedade dita imprópria ou técnica.

III - Nestes pressupostos, os direitos fundamentais à tutela jurisdicional efectiva dos direitos e dos interesses legalmente protegidos dos administrados (artigo 268º nº 4 da Constituição e 95º nº 1 da LGT), impõem que assista ao Tribunal a atribuição de sindicar em toda a medida a legalidade material do acto de deferimento ou indeferimento da dita dispensa.

IV – Nos termos da conjugação da norma geral que é o artigo 74º nº 1 da LGT e da especial que é o 170º nº 3 do CPPT, o Requerente da dispensa de prestação de garantia ao abrigo do nº 4 do artigo 52º da LGT tem o ónus de alegar e oferecer, respectivamente, uno actu, todos os factos e todas as provas (documentais) da “insuficiência de bens de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido”, seguindo-se logo, sem necessidade de mais diligências, a apreciação das provas oferecidas e a consequente decisão.

V – Não integra aquela insuficiência o estrito facto, sem mais, de se auferir uma pensão de reforma de 2 870 € mensais, não se possuir bens imóveis nem veículos automóveis e a quantia exequenda e acrescido se cifrarem em €12.063,73.*
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:M.
Recorrido 1:IGFSS, IP
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
*

Relatório

M., NIF (…), com domicílio fiscal na Avenida (…) interpôs o presente recurso de apelação relativamente à sentença proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou improcedente a Reclamação de Actos do Órgão de Execução (artigos 276º e sgs do CPPT) na qual pedia a anulação do despacho que indeferira o seu pedido de dispensa de prestação de garantia para atribuição de efeito suspensivo à oposição por si deduzida no processo de execução fiscal n.º 1301202000073040 e apensos.


Remata a sua alegação com as seguintes conclusões:

1. CONCLUSÕES:
A. Está em causa nos presentes autos uma reclamação de acto do órgão de execução fiscal, que subiu a tribunal imediatamente e nos próprios autos de execução fiscal.
B. Nos processos urgentes, como é o caso, a tramitação da reclamação, com subida imediata e nos próprios autos, tem como um dos corolários igual urgência na tramitação do recurso jurisdicional.
C. Será o mesmo motivo que determinou a subida imediata da reclamação a tribunal que justificará agora que ao presente recurso seja fixado o efeito suspensivo.
D. Assim, o presente recurso jurisdicional, que sobe imediatamente e nos próprios autos, deve ter efeito suspensivo, de harmonia com o disposto no artigo 286.º, n.º 2, in fine, do CPPT.
E. Vem o presente recurso interposto da douta sentença datada de 01/06/2021, que julgou improcedente a reclamação judicial do acto de indeferimento do pedido de dispensa de garantia proferido pelo IGFSS, IP no âmbito do processo de execução nº 1301202000073040 e aps em que é devedora originária a sociedade “P. LDA.”
F. Considerou o Tribunal de 1 ª Instância que o despacho reclamado está devidamente fundamentado e que não é manifesta a escassez de meios económicos da reclamante/recorrente.
G. Entende, porém, a Recorrente, que o Tribunal não fez a correcta apreciação e interpretação dos factos, pelo que a sentença proferida padece de erro de julgamento e vício de lei.
H. O tribunal considerou que “o despacho está fundamentado tendo decidido pela não verificação dos pressupostos da norma citada que sustentou com factos concretos, conforme supra indicado, do mesmo resultando claro o raciocínio que o órgão de execução fiscal fez para chegar a tal decisão, isto é, a falta de prova dos factos alegados por parte da reclamante.”
I. Entende a Recorrente que a sentença proferida faz uma errada apreciação dos vícios alegados.
J. O despacho de indeferimento do pedido de dispensa de garantia, aqui reclamado, apresentou a seguinte fundamentação: “Analisado o proposto, propõe-se o indeferimento do requerimento apresentado em virtude de a requerente M., nif (…), não ter feito prova nos autos da impossibilidade de constituição de garantia, nomeadamente garantia bancária.” (sublinhado nosso)
K. Face à fundamentação apresentada, a Reclamante reclamou judicialmente por considerar que a fundamentação apresentada violava o disposto no artigo 52º da LGT e consequentemente que a mesma era insuficiente e de que estavam preenchidos os requisitos de que dependia a dispensa de garantia.
L. A decisão de indeferimento resultou no entendimento de que a Reclamante não fez prova da impossibilidade de constituição de uma garantia bancária.
M. A lei não impõe a prova da impossibilidade da constituição de uma garantia bancária, mas sim a prova da manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis.
N. No cumprimento do princípio da colaboração previsto na alínea d) do n.º 3 do art. 59º LGT, sempre deveria o SPET ter notificado a recorrente para demonstrar a impossibilidade de constituir a garantia bancária.
O. A sentença proferida entendeu que o despacho reclamado estava devidamente fundamentado, por ser claro o raciocínio que o OEF fez para chegar a tal decisão, no entanto, tal raciocínio está errado e viola o artigo 52º da LGT.
P. No despacho reclamado, a Entidade Exequente não demonstra porque não se encontram preenchidos os requisitos previstos no artigo 52º da LGT.
Q. Do mesmo modo, não demonstra porque (sic) motivo a prova documental não faz prova da insuficiência patrimonial alegada.
R. Não é por não se ter demonstrado a impossibilidade de constituir uma garantia bancária que se conclui que a recorrente não cumpriu com o ónus que lhe competia.
S. Dispõe o art. 52 n. º4 da LGT que a falta de meios económicos é revelada pela insuficiência de bens penhoráveis.
T. A recorrente aufere um vencimento de €2.834,97 e não é proprietária de quaisquer bens.
U. Quanto à não responsabilidade pela situação de insuficiência ou inexistência de bens, no despacho reclamado, não são apresentados quaisquer factos e provas de que tenha havido actuação dolosa da recorrente, não cumprindo assim a Entidade Exequente com o ónus que lhe competia.
V. Face aos factos dados como provados, entende-se estarem preenchidos os pressupostos de que depende o pedido de dispensa de garantia, nomeadamente a insuficiência de bens penhoráveis.
W. Termos em que, face à prova produzida deveria a Reclamação judicial ter sido julgada provada, improcedendo a sentença recorrida de erro de julgamento e violação de lei.

Notificada, a Fazenda Pública não respondeu à alegação do Recorrente.


O Digno Magistrado do Ministério Público apresentou douto parecer no sentido da suficiência da fundamentação e da legalidade material do despacho impugnado e da improcedência do recurso.

Por despacho de 15/01/21, a Mª Juiz a qua atribuiu efeito suspensivo ao recurso.

Dada a natureza urgente do processo, há dispensa de vistos prévios (artigo 36.º, n.º 2 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos ex vi artigo 2.º, n.º 2, alínea c) do Código de Procedimento e de Processo Tributário).

II- Questões a decidir

Conforme jurisprudência pacífica, o âmbito do recurso é delimitado pelo objecto das conclusões das alegações, interpretadas, como é lógico, em função daquilo que se pretende sintetizar, isto é, o corpo das alegações.

Assim, a única questão colocada a este Tribunal consiste em apreciar:
Se a sentença recorrida padece de erro de julgamento violando designadamente, o artigo 52º nº 4 da LGT, por estarem reunidos os pressupostos de facto de uma vinculação legal da Administração Tributária, no sentido da dispensa de prestação de garantia em ordem ao efeito suspensivo da oposição à execução, designadamente a “manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido” (cf. o citado normativo).

III Apreciação do objecto do Recurso
Da Petição Inicial:

Da petição inicial, transcrevemos as conclusões e o pedido com que a Autora a terminou:
CONCLUSÕES:
A. É apresentada Reclamação contra a decisão proferida pelo instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, IP, Secção de processo de Leiria, no processo de execução fiscal n.º 1301202000073040 e aps, por despacho proferido em 10/12/2020, a indeferir o pedido de dispensa de garantia anteriormente apresentado.
B. Está em causa um acto imediatamente lesivo nos direitos da Reclamante cuja não subida imediata da presente reclamação e com efeitos suspensivos, causará um prejuízo irreparável, assim como a perda de utilidade da reclamação.
C. Se a reclamação deduzida subir a final (ou seja, após a penhora), a decisão da reclamação será absolutamente inútil, pois o eventual deferimento seria de todo inócuo, já que o efeito produzido pelo deferimento do pedido de dispensa de garantia - a suspensão da execução - esgota-se antes da penhora, pois que visa evitá-la.
D. Termos em que, se requer a subida imediata e com efeitos suspensivos da presente reclamação, nos termos do artigo 278º nº 3 do CPPT.
E. Em Outubro/2020 a Reclamante foi citada, na qualidade de revertida, de que era executada no processo de execução nº 1301202000073040 e aps, instaurado pela secção de processo executivo de Leiria do IGFSS, IP, em que é originária devedora a sociedade "P. LDA", NIPC (…), para pagamento da quantia total de €11.973,17, relativo a dívidas de contribuições, cotizações e juros dos períodos de 2019/09 a 2020/04 e para deduzir oposição com base nos fundamentos prescritos no art. 204º do CPPT.
F. No dia 16/11/2020 a Reclamante apresentou oposição judicial contra o referido processo de execução.
G. No dia 26/11/2020 a Reclamante apresentou no SPET de Leiria um requerimento a pedir a dispensa de garantia nos termos do artigo 529 da LGT, cujo teor se da aqui por integralmente reproduzido.
H. No dia 21/12/2020 a Reclamante foi notificada do despacho de indeferimento, aqui reclamado, com a seguinte reduzida fundamentação "Analisado o proposto, propõe-se o indeferimento do requerimento apresentado em virtude de a requerente M., nif (…), não ter feito prova nos autos da impossibilidade de constituição de garantia, nomeadamente garantia bancária."
I. A lei não impõe a prova da impossibilidade da constituição de uma garantia bancária, mas sim a prova da manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis.
J. Considerando a fundamentação apresentada, o despacho de indeferimento do pedido de dispensa incorre em erro por violação de lei.
K. Sem prejuízo, deveria a Reclamante ter sido notificada para realizar essa prova da impossibilidade de obtenção da garantia bancária, no cumprimento do princípio da colaboração previsto na alínea d) do n.s 3 do art. 599 LGT.
L. No despacho reclamado, a Entidade Exequente não demonstra porque (SIC) não se encontram preenchidos os requisitos previstos no artigo 529 da LGT, ou seja, quanto à manifesta de falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis alegada no requerimento e quanto à dissipação dolosa pelo reclamante.
M. Do mesmo modo, não demonstra porque (SIC) motivo a prova documental não faz prova da insuficiência de patrimonial alegada.
N. Constitui dever da Administração fundamentar os actos que pratica, expondo as razões de facto e de direito que a levaram a decidir de determinada forma e não de outra, de tal modo que o destinatário do acto fique ciente das razões que levaram aquela a optar por determinada via.
O. No despacho reclamado, não existe qualquer fundamentação, que permita à Reclamante a percepção do seu conteúdo e das razões, para que os factos e documentos alegados/juntos não demonstram a falta de meios económicos, para que o pedido de dispensa fosse indeferido.
P. Pelo que, deverá o acto reclamado ser anulado, por verificado o vicio de falta de fundamentação e dever de pronuncia.
Q. A norma do art. 52º, nº 4, da LGT, permite a dispensa da prestação de garantia, a requerimento do executado, nos casos de a sua prestação lhe causar prejuízo irreparável, ou perante a manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis, desde que em qualquer dos casos a insuficiência ou inexistência de bens não seja da responsabilidade do executado, cabendo ao executado efectuar tal prova como condição de obter a procedência da sua pretensão.
R. A Reclamante aufere uma reforma de €2.834,74.
S. A reclamante não é proprietária de quaisquer bens.
T. No despacho reclamado, não são apresentados quaisquer factos e prova de que tenha havido actuação dolosa da Reclamante, não cumprindo assim a Entidade Exequente com o ónus que lhe competia.
U. Face ao acima exposto, entende a Reclamante estar verificado o requisito da manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis, um dos requisitos para que lhe seja deferida a dispensa de prestação da garantia.
V. Por todo o exposto, considera-se verificados os pressupostos legais para a concessão da isenção de prestação de garantia, anulando, em consequência, o despacho do órgão de execução fiscal reclamado.

Da sentença recorrida:

Convém transcrever, para melhor entendimento da discussão que segue, os seguintes excertos da sentença recorrida:
Relatório:
(…) alega em síntese que foi citada, na qualidade de revertida, no processo de execução n.º 1301202000073040 e apensos, instaurado pelo IGFSS, IP, contra a sociedade "P. LDA", com o NIPC (…), tendo apresentado oposição judicial e também um requerimento a pedir a dispensa de garantia, alegando para o efeito que não é proprietária de bens imóveis e de veículos e que aufere uma reforma no valor de €62.834,97. Este pedido foi indeferido, padecendo tal decisão dos vícios seguintes:
a) violação de lei porque a decisão de indeferimento resultou do entendimento de que a Reclamante não fez prova da impossibilidade de constituição de uma garantia bancária, sendo que a lei não impõe a prova da impossibilidade da constituição de uma garantia bancária, mas sim a prova da manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis, sendo que a reclamante não foi notificada para juntar mais provas;
b) falta de fundamentação e dever de pronúncia porque o demandado não apresenta qualquer fundamentação para desconsiderar os factos e documentos alegados/juntos, não existindo qualquer fundamentação, que permita à Reclamante a percepção do seu conteúdo e das razões, para que os factos e documentos não demonstrem a falta de meios económicos para que o pedido de dispensa fosse indeferido, não sendo sequer uma situação em que não existe dever se decisão.
c) manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis;
d) não responsabilidade pela situação de insuficiência ou inexistência de bens, pois no despacho reclamado, não são apresentados quaisquer factos e prova de que tenha havido actuação dolosa da Reclamante.
(…)
O Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social IP - Secção de Processo de Leiria, para responder, o que fez, sustentando, em síntese, que a reclamante não demonstrou que a prestação de garantia lhe iria causar um prejuízo irreparável, bem como, não demonstrou que a insuficiência ou inexistência de bens não era da sua responsabilidade. Ademais, não comprovou não ser titular de contas bancárias, nem demonstrou que não poderia apresentar uma garantia bancária, concluindo que o pedido de dispensa de garantia não foi instruído com a prova documental necessária. Mais refere, que a reclamante alega que aufere uma pensão mensal no valor líquido de €2.834,97 valor este que, por si só, não é revelador de “manifesta falta de meios económicos”, pelo contrário, este é um valor bem acima do rendimento médio mensal do país. Termina pugnando pela improcedência da reclamação.
(…)
Saneamento Processual
(…)
Considerando o teor do normativo em causa e atenta a matéria em análise nos presentes autos, temos que, no que tange ao regime da subida da reclamação, deverá ser deferido o pretendido pela Reclamante, ou seja, a subida imediata da reclamação.
Desde logo, porque não obstante a literalidade do normativo citado, é entendimento jurisprudencial firme que o artigo 278, n.º 3, do CPPT assume uma natureza meramente enunciativa, no sentido de que se imporá a remessa e o conhecimento imediato da reclamação sempre que o diferimento da apreciação jurisdicional lhe retire toda a utilidade ou possa causar um prejuízo irreparável.
Nessa medida, a retenção da presente reclamação tornaria o meio inútil, pois com a subida apenas a final, a apreciação da verificação dos pressupostos da isenção de garantia, perderia utilidade pois, no caso de o Tribunal dar razão à Reclamante, já não faria sentido prestar ou não a garantia, na medida em que o processo de execução fiscal já estaria findo, tornando-se assim impossível a obtenção do pretendido pela Reclamante, que passa, precisamente, pela suspensão do processo de execução fiscal em apreço.
(…)
FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.
Com relevância para a decisão da causa, consideram-se provados os factos seguintes:
1) No âmbito do processo de execução fiscal n.º 1301202000073040 e apensos, instaurado pelo IGFSS, IP, contra a sociedade "P. LDA", com o NIPC (…), foi determina(da) a reversão das dívidas contra a ora reclamante, na qualidade de responsável subsidiária - fls. 223;
2) A reclamante M. foi citada na qualidade de revertida e deduziu oposição, que foi autuada no Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria - fls. 251;
3) O valor em dívida no processo de execução fiscal em apreço é de €12.063,73 - cfr. fls. 20;
4) O valor exigido como garantia é de €14.184,17 - cfr. fls. 20;
5) A reclamante requereu junto do exequente a dispensa de apresentação de garantia, para suspensão do processo executivo - fls. 251;
6) Do referido requerimento consta o seguinte (fls. 251):
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

7) Com tal requerimento juntou print do portal da Administração Tributária do qual consta que não tem veículos nem imóveis - cfr. fls. 253 e ss.;
8) Por despacho de 11.12.2020, foi indeferido o requerimento - fls. 19 a 21;
9) Do despacho de indeferimento consta o seguinte (fls. 19 a 21):
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

10) A Reclamante aufere um vencimento mensal de €2.834,97 - acordo;
11) Não são conhecidos veículos ou imóveis registados em nome da reclamante - acordo.
*
Nada mais foi provado com interesse para a decisão em causa, atenta a causa de pedir.
*
MOTIVAÇÃO.
(…)
FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.
(…) A Reclamante invoca, em síntese, que a decisão reclamada incorreu em vício de violação de lei, em falta de fundamentação e dever de pronuncia, que é manifesta a falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis e a ausência de responsabilidade pela situação de insuficiência ou inexistência de bens.
Cumpre apreciar e decidir.
Nos termos do artigo 169, n.º 1, do CPPT, a execução fiscal fica suspensa até à decisão do pleito em caso de reclamação graciosa, impugnação judicial ou recurso judicial que tenham por objecto a legalidade da dívida exequenda, desde que tenha sido constituída garantia nos termos do artigo 195 ou prestada nos termos do artigo 199, ou a penhora garanta a totalidade da quantia exequenda e do acrescido.
De igual forma, dispõe o artigo 52, n.º 2, da LGT que a cobrança da prestação tributária se suspende nos termos do n.º 1 do mesmo normativo legal, ficando dependente da prestação de garantia idónea nos termos das leis tributárias.
Para esse efeito, determina o artigo 199, do CPPT o seguinte:
1 - Caso não se encontre já constituída garantia, com o pedido deverá o executado oferecer garantia idónea, a qual consistirá em garantia bancária, caução, seguro-caução ou qualquer meio susceptível de assegurar os créditos do exequente.
2 - A garantia idónea referida no número anterior poderá consistir, ainda, a requerimento do executado e mediante concordância da administração tributária, em penhor ou hipoteca voluntária, aplicando-se o disposto no artigo 195.º, com as necessárias adaptações.
3 - Se o executado considerar existirem os pressupostos da isenção da prestação de garantia, deverá invocá-los e prová-los na petição.
4 - Vale como garantia, para os efeitos do n.º 1, a penhora já feita sobre os bens necessários para assegurar o pagamento da dívida exequenda e acrescido ou a efectuar em bens nomeados para o efeito pelo executado no prazo referido no n.º 7.
5 - No caso de a garantia apresentada se tornar insuficiente, a mesma deve ser reforçada nos termos das normas previstas neste artigo.
6 - A garantia é prestada pelo valor da dívida exequenda, juros de mora contados até ao termo do prazo de pagamento voluntário ou à data do pedido, quando posterior, com o limite de cinco anos, e custas na totalidade, acrescida de 25 % da soma daqueles valores, sem prejuízo do disposto no n.º 13 do artigo 169.º
7 - As garantias referidas no n.º 1 serão constituídas para cobrir todo o período de tempo que foi concedido para efectuar o pagamento, acrescido de três meses, e serão apresentadas no prazo de 15 dias a contar da notificação que autorizar as prestações, salvo no caso de garantia que pela sua natureza justifique a ampliação do prazo até 30 dias, prorrogáveis por mais 30, em caso de circunstâncias excepcionais.
8 - A falta de prestação de garantia idónea dentro do prazo referido no número anterior, ou a inexistência de autorização para dispensa da mesma, no mesmo prazo, origina a prossecução dos termos normais do processo de execução, nomeadamente para penhora dos bens ou direitos considerados suficientes, nos termos e para os efeitos do n.º 4.
9 - É competente para apreciar as garantias a prestar nos termos do presente artigo a entidade competente para autorizar o pagamento em prestações.
10 - Em caso de diminuição significativa do valor dos bens que constituem a garantia, o órgão da execução fiscal ordena ao executado que a reforce ou preste nova garantia idónea no prazo de 15 dias, com a cominação prevista no n.º 8 deste artigo.
11 - A garantia poderá ser reduzida, oficiosamente ou a requerimento dos contribuintes, à medida que os pagamentos forem efectuados e se tornar manifesta a desproporção entre o montante daquela e a dívida restante.
12 - As garantias bancárias, caução e seguros-caução previstas neste artigo são constituídas a favor da administração tributária por via electrónica, nos termos a definir por portaria do Ministro das Finanças.
Dos termos dos mencionados números 1 e 2 do artigo 199, do CPPT resulta que a garantia pode consistir em garantia bancária, caução, seguro-caução ou qualquer outro meio susceptível de assegurar os créditos do exequente, nomeadamente o penhor e a hipoteca voluntária, nestes últimos casos mediante concordância da administração tributária.
Constitui jurisprudência pacifica que a enumeração das garantias referidas no artigo 199, ns. 1 e 2, do CPPT não é taxativa nem gradativa, mas meramente exemplificativa, o que significa que a fiança poderá ser reconhecida como garantia idónea, sempre competindo ao OEF aferir, caso a caso, da idoneidade da fiança apresentada (cf., nesse sentido, por todos, Acórdão do STA de 18.06.2014, Proc. n.º 0507/14).
Nos termos do disposto no art. 170, n.º 3, do CPPT: O pedido a dirigir ao órgão da execução fiscal deve ser fundamentado de facto e de direito e instruído com a prova documental necessária.
Na verdade, o ónus da prova dos factos alegados para obter o benefício pretendido incumbe ao interessado, pelo que a falta de prova dos factos alegados tem necessariamente de contra si ser valorada.
Acresce que, a reclamação dos actos do órgão de execução fiscal é um recurso de mera anulação, ou seja, a isenção da prestação de garantia consubstancia um ato administrativo em matéria tributária e, nessa medida, encontra-se na margem de livre apreciação da administração, estando subtraído da apreciação do Tribunal.
Trata-se de um poder que é atribuído à administração tributária, enquanto tal, pelo que não pode ser exercido pelo tribunal em substituição daquela, tendo de resumir-se à verificação da ofensa ou não dos princípios jurídicos que condicionam toda a actividade administrativa e será um controlo pela negativa não podendo o tribunal substituir-se à Administração na ponderação das valorações que se integram nessa margem.” (cfr. CAMPOS, Diogo Leite, RODRIGUES, Benjamim Silva, SOUSA, Jorge Lopes de Sousa, Lei Geral Tributária Anotada e Comentada, 4ª edição, Lisboa, 2012, p. 429).
No mesmo sentido, o Doutor Casalta Nabais refere que os actos praticados no órgão de execução fiscal não são actos judiciais semi-executória já que a execução corre em parte na administração tributária, pelo que cabe à administração tributária a prática de todos e demais actos (cfr. NABAIS, Casalta, Direito Fiscal, 5ª edição, Coimbra, Almedina, 2009, p.340/341 e 253)].
A discricionariedade resulta de um conflito entre o princípio de estado de direito (2, CRP) e de separação de poderes (111, CRP). Entende-se que a lei deverá abranger o máximo de situações para trazer segurança jurídica às relações jurídicas, no entanto como a administração é um órgão de soberania deve ser-lhe dada uma margem de decisão nas situações em que se tenha de averiguar qual a melhor solução para o caso em concreto atendendo à salvaguarda do interesse público. Não é um mal necessário mas um poder dever concedido pelo legislador à administração (concessão legislativa; lei pressuposto) de optar pela solução mais atenta ao interesse público para o caso em concreto. O controlo contencioso ficará limitado aos momentos extrínsecos, isto é, à competência, ao fim e à legitimidade e, aos momentos intrínsecos, ou seja, à inexistência de erro manifesto ou grosseiro sobre os pressupostos de facto, desvio de poder e violação dos princípios gerais de actuação administrativa.
Em suma, embora a decisão sobre as questões da prestação de garantia para suspensão da execução fiscal sejam actos administrativos em matéria tributária, cuja análise se encontra na margem de livre apreciação da Administração Tributária, o Tribunal encontra-se incumbido de apreciar a legalidade deste acto, designadamente a sua fundamentação. Assim, a ponderação do “interesse legítimo na substituição” e do “prejuízo para o credor tributário”, a que se refere o artigo 52, 7, da LGT, encontram-se na margem de livre apreciação da Administração Tributária. Por seu turno, caberá ao Tribunal analisar a conformidade com a lei, designadamente com os princípios jurídicos aplicáveis e com a fundamentação legalmente exigida. O que aliás resulta inequívoco do art. 170, n.º 5, do CPPT.
Posto isto, importa analisar a fundamentação que serviu de base ao indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia.
(…)
Nestes termos, consideramos que a decisão reclamada está fundamentada.
Com efeito, a isenção da prestação de garantia implica, nos termos do disposto no art 52, n.º 4, da LGT a verificação dos pressupostos seguintes: A administração tributária pode, a requerimento do executado, isentá-lo da prestação de garantia nos casos de a sua prestação lhe causar prejuízo irreparável ou manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido, desde que em qualquer dos casos a insuficiência ou inexistência de bens não seja da responsabilidade do executado.
Ora, retornando ao caso em apreço, verifica-se que o despacho está fundamentado tendo decidido pela não verificação dos pressupostos da norma citada que sustentou com factos concretos, conforme supra indicado, do mesmo resultando claro o raciocínio que o órgão de execução fiscal fez para chegar a tal decisão, isto é, a falta de prova dos factos alegados por parte da reclamante.
Na verdade, conforme resulta do probatório para sustentar a sua pretensão a reclamante alegou junto do órgão de execução fiscal que não tinha veículos ou imóveis e que auferia mensalmente o montante de €2.834,97.
Impendendo sobre si o ónus da prova do direito que pretende fazer valer, consideramos que efectivamente não o logrou alcançar.
Como bem refere a exequente o rendimento mensal da reclamante está acima da média dos portugueses, não tendo sido apresentadas despesas ou extractos de contas bancárias que atestem que não tem outros rendimentos e que demonstrassem a insuficiência de meios económicos, como alegado.
A reclamante cingiu a sua argumentação à falta de veículos ou imóveis e ao valor da pensão, não tendo alegado que não podia prestar fiança nem apresentar outros bens móveis, não sujeitos a registo.
Por conseguinte, resta concluir que a exequente apreciou os elementos e fundamentos apresentados pela reclamante e fez uma correcta apreciação dos mesmos, fundamentando o sentido da sua decisão.
Também resulta, pelo exposto, que não é manifesta a escassez de meios económicos da reclamante.
*
DECISÃO.
Termos em que, pelos fundamentos expostos, julgo a presente Reclamação improcedente, por não provada, mantendo o despacho reclamado.»

Transcrito o essencial da sentença em crise, nos aspectos relevantes para a crítica que lhe vem feita, apreciemos a questão acima enunciada:

É mister apreciar se a sentença recorrida padece de erro de julgamento violando designadamente, o artigo 52º nº 4 da LGT, por estarem reunidos os pressupostos de facto de uma vinculação legal da Administração Tributária, no sentido da dispensa de prestação de garantia em ordem ao efeito suspensivo da oposição à execução, designadamente “a manifesta falta de meios económicos” – para prestar a garantia, deduz-se – da Requerente e aqui Recorrente.

O equacionar da questão já revela que não acompanhamos o discurso geral e abstracto que antecede a fundamentação de direito, em concreto, da sentença recorrida, quando – algo contraditoriamente com esta – sustenta a inadmissibilidade, salvo erro grosseiro, de um juízo sobre o mérito do acto impugnado, dada uma suposta ampla margem de discricionariedade, dita imprópria, da Administração na apreciação da pretensão da Requerente de dispensa de prestação de garantia ou do conteúdo do conceito de “manifesta falta de meios económicos”.

Com efeito, nem é inerente à natureza de todo e qualquer acto administrativo a ausência, em regra, de uma vinculação legal estrita, como parece, a Mª Juiz a qua, dar de barato, nem o uso de conceitos indeterminados nas normas administrativas corresponde forçosamente a uma atribuição de exclusividade à administração, do poder/dever de os interpretar correctamente, nem, em qualquer caso, esse acto administrativo praticado no âmbito do processo tributário de execução, que é a dispensa de prestação de garantia nos termos do dos artigos 52º nº 4 da LGT, pode ser entendido como um acto insindicável, em regra, no seu mérito, por praticado no uso de um poder discricionário à boleia da natureza aberta dos conceitos utilizados na norma, sob pena de se estar a violar os direitos liberdades e garantias do acesso à justiça, consagrado no artigo 20º nº 1, e da tutela jurisdicional efectiva dos direitos perante a administração, consagrado no artigo 268º nº 4, ambos da Constituição.
Aliás, atento desígnio legislativo de justiça material que os pressupostos da concessão da dispensa, nos termos do artigo 52º nº 4 citado, revelam, a dispensa de prestação de garantia surge outrossim como o objecto de um direito subjectivo do executado contribuinte. Ora o reconhecimento de um direito subjectivo não pode ficar dependente de uma decisão, sem apelo nem agravo, da Administração, mormente quando ela é o próprio exequente.
A própria sentença recorrida, aliás, acaba por apreciar o mérito da decisão administrativa impugnada, fazendo-o por via de uma reiteração da argumentação da Administração, isto é, confirmando e aderindo às proposições de facto e de valor formulados por esta, e não, digamos, pela negativa, isto é, constatando apenas a inexistência de qualquer erro crasso em matéria de facto ou a violação manifesta de qualquer princípio fundamental.

Note-se, por fim, para evitar qualquer equívoco, que neste juízo de proscrição de qualquer margem exclusiva de atribuição da Administração, não nos estamos a referir ao juízo de idoneidade da garantia requerida, mas sim e apenas ao da dispensa da sua prestação nos termos do nº 4 do artigo 52º da LGT.

Posto isto, vejamos, então, se a sentença recorrida, ao confirmar o acto administrativo de indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia, violou o direito a essa dispensa, que, alegadamente assistia à Recorrente.

Desde já se adianta que, ante os factos alegados e provados, quer ante a Administração, quer ante o Tribunal, se impunha a decisão, tomada pela Mª Juiz a qua, de manutenção do acto reclamado na ordem jurídica.

Recordemos:
A Recorrente pediu a dispensa alegando, em conclusão, a manifesta falta de meios económicos (para prestar a garantia ou pagar a quantia exequenda e os acréscimos legais) e, quanto a factos disso integrantes, apenas que auferia uma reforma de 2 834,97 € mensais e não possuía bens imóveis nem veículos.
Como prova documental disso (cf. artigo 170º n 3 do CPPT), a Recorrente apresentou uma declaração do próprio Fisco em como não tem veículos nem imóveis.
A decisão do Fisco foi de indeferimento, cf. supra, essencialmente com fundamento em que dos factos alegados não resultava a manifesta insuficiência de meios económicos da requerente (para prestar a garantia ou pagar os valores exequendo e acrescido) atento, desde logo, o valor, bem acima da média, da sua reforma, sem que tivessem sido alegados e provados especiais encargos com ela supridos, e bem assim na falta de demonstração da impossibilidade de apresentação de garantia bancária.

A sentença recorrida aderiu, essencialmente a estes juízo e fundamentos, designadamente a falta de demonstração da manifesta insuficiência económica.

A recorrente insurge-se, nesta sede recursiva, alegando que demonstrou tal insuficiência económica mediante a inexistência de imóveis e automóveis, e que, a entender-se que não, sempre impendia sobre a Administração Tributária o dever de notificar a requerente para oferecer os factos e as provas tidos em falta, no sentido da conclusão pela insuficiência económica, bem como que nada na lei consagra como pressuposto da dispensa de prestação de garantia a impossibilidade de obtenção de garantia bancaria.
É certo que a recusa, pelos bancos, da emissão de garantia bancária não é, em si mesma, um pressuposto da concessão da dispensa de prestação de garantia nos termos do artigo 52º nº 4 da LGT. Porém, a alusão a uma falta de alegação e de prova desse facto pode entender-se como sendo uma referência a um facto instrumental porque indiciador de não ocorrer manifesta insuficiência de meios económicos para o pagamento da quantia exequenda e dos acréscimos legais.
De qualquer modo, é obvio que, de se auferir, de rendimento, “apenas” uma pensão de reforma no valor de 2 834 € mensais sem que se possua bens imóveis nem veículos não resulta, sem mais, a insuficiência económica de quem quer que seja para o pagamento da divida exequenda e acrescido, ainda que em referência a um valor exequendo na ordem dos 12 000 €. Desde logo, a própria pensão de reforma é um bem penhorável, até certo limite (artigo 738º nº 1 do CPC), e pode ser sucessivamente penhorada, prestação a prestação, até perfazer a quantia exequenda. Depois, fica-se sem saber se e que depósitos bancários ou investimentos mobiliários possui a requerente, já que a alegação de facto junto da AT, quanto a bens móveis, se ficou pela referência a automóveis.

Enfim, a Recorrente não alegou nem provou, perante o fisco, os factos suficientes a um juízo de insuficiência de meios económicos para a prestação da garantia.

Tão pouco o fez, supervenientes ou não, perante o Tribunal. Veja-se o teor da PI, acima relatado, mormente as alíneas R a T. É certo que desta feita a Requerente alegou não possuir “quaisquer bens” – não apenas imóveis e automóveis – mas também o é que não apresentou disso, designadamente de depósitos bancários, aquela prova documental.

Ora, é do requerente de dispensa de prestação de garantia o ónus de apresentar todas as provas documentais, devendo fazê-lo com a apresentação do pedido, após o que a administração decidirá em 10 dias. A primeira afirmação sempre decorreria das regras gerais, designadamente do artigo 74º nº 1 da LGT. Já o mais resulta dos nºs 3 e 4 do artigo 170º do CPPT, que tem o seguinte teor:
Artigo 170.º
Dispensa da prestação de garantia
1 - Quando a garantia possa ser dispensada nos termos previstos na lei, deve o executado requerer a dispensa ao órgão da execução fiscal no prazo de 15 dias a contar da apresentação de meio de reacção previsto no artigo anterior.
2 - Caso o fundamento da dispensa da garantia seja superveniente ao termo daquele prazo, deve a dispensa ser requerida no prazo de 30 dias após a sua ocorrência.
3 - O pedido a dirigir ao órgão da execução fiscal deve ser fundamentado de facto e de direito e instruído com a prova documental necessária.
4 - O pedido de dispensa de garantia será resolvido no prazo de 10 dias após a sua apresentação.

Estas normas, de especiais que são, proscrevem a pretensão da Recorrente, de que seria dever da AT notificá-la para a aperfeiçoar o requerimento com mais factos e respectivas provas, no quadro de um geral dever de inquisitório ou de prossecução da justiça material.

É certo que, tratando-se do nº 4 do artigo 52º da LGT, julgamos que não pode ser do requerente ónus de alegar e provar factos demonstrativos da inexistência de fortes indícios de que a insuficiência de bens se deveu a dolo seu. Na verdade, isso equivaleria a onerar o requerente com a prova de um não facto, da inocorrência de um ou vários factos, enfim, com o ónus antijurídico de uma diabólica probatio, pelo que a norma, nesta parte, só pode ser interpretada como conferindo à AT, em ordem ao indeferimento da dispensa, o dever da investigação e o ónus da demonstração dessa “excepção” ao direito à dispensa.

Já quanto a insuficiência económica ou quanto a prejuízo irreparável, o ónus de alegação e de prova só pode ser do Requerente, aliás, nos sobreditos estritos e exigentes termos.

A dispensa de prestação de garantia para que a oposição à execução suspenda a mesma é claramente excepcional; e o legislador pretende que o “incidente” se resolva celeremente e com objectividade, daí que apenas admita a prova documental. Pois bem, são esses mesmos desígnios que levam o Legislador a colocar, sobre os ombros do Requerente da dispensa, o ónus de alegar e oferecer, uno actu, respectivamente, todos os factos e todas as provas, fazendo seguir-se logo, sem mais diligências, em regra, a apreciação das provas oferecidas e a consequente decisão.

A própria limitação, a 10 dias, do prazo para o fim do procedimento, mediante a decisão administrativa, já revela que o Legislador não se representa a prática de quaisquer diligências de investigação ou de colaboração com o contribuinte, a cargo da Administração, que, a ser assim teria de as realizar em 10 dez dias e decidir dentro desse mesmo prazo, o que seria as mais das vezes impossível.

Assim, concluímos que tão pouco a AT violou qualquer dever procedimental, ao abster-se de notificar a Recorrente para alegar mais factos e apresentar mais provas, antes tendo ajuizado do mérito do requerimento de dispensa tão só com base nos factos alegados e nas provas oferecidas com o requerimento.

Julgamos, portanto, que o recurso não merece provimento.

Dispositivo

Pelo exposto, acordam os juízes que compõe este colectivo em julgar improcedente o Recurso.
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Custas pela Recorrente: artigo 527º do CPC.
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Porto, 16/09/2021

Tiago Afonso Lopes de Miranda
Cristina Maria Santos da Nova
Cristina Bento Duarte