Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00060/2001-Viseu
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:02/27/2014
Tribunal:TAF de Viseu
Relator:Pedro Marchão Marques
Descritores:OPOSIÇÃO; DÍVIDA CAE; ERRO FORMA PROCESSO; PRESCRIÇÃO.
Sumário:i) Apenas existe omissão de pronúncia quando o tribunal deixa de apreciar e decidir uma questão, isto é, um problema concreto que haja sido chamado a resolver, a menos que o seu conhecimento tenha ficado prejudicado em face da solução dada ao litígio, dado que lhe incumbe o conhecimento de todas as questões suscitadas pelas partes, e apenas destas, sem prejuízo de a lei impor ou permitir o conhecimento oficioso de outras (art. 660.º, n.º 2, do CPC na redacção então vigente, ex vi art. 2.º, al. f), do CPPT).
ii) Arguindo o oponente não a falsidade do título executivo, mas antes a falsidade da dívida exequenda – inexistência da dívida –, entrando na discussão da ilegalidade concreta da dívida exequenda, conforme o Tribunal a quo devidamente explicitou, só poderia discutir-se esta no meio processual em uso se a lei não facultasse outro meio para o efeito.
iii) Considerando que a dívida em causa, proveniente do Crédito Agrícola de Emergência, não é relativa a impostos ou receitas parafiscais, mas sim de outra dívida ao Estado, embora não fosse aplicável o processo de impugnação judicial, sempre o oponente tinha à sua disposição a acção administrativa especial como meio de contra aquela reagir.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:J...
Recorrido 1:Fazenda Pública
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. Relatório

J...(Recorrente), com os demais sinais nos autos, não se conformando com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu que julgou verificada a excepção de erro na forma de processo, insusceptível de convolação na forma processual adequada, tendo julgado improcedente a oposição por aquele deduzida à execução fiscal n.º 2658-00/100395.0 que lhe foi instaurada para cobrança de dívidas provenientes de empréstimo concedido ao abrigo do Decreto-Lei n.º 56/77, de 18 de Fevereiro (Crédito Agrícola de Emergência), no valor global de 2.458.640$00 (EUR 12.263,65), dela veio interpor o presente recurso, formulando, a final, as seguintes conclusões:

1ª - Em 13/10/2000 foi formulada a oposição e a pretensa dívida tem mais de 30 anos;

2ª - Assim, a questão que devia ser prévia consiste em apreciar se há ou não prescrição da dívida, uma vez que está em causa a subsistência da instância e é de conhecimento oficioso (artigo 175º do CPPT);

3ª - Esta questão é o fundamento de oposição a que alude a alínea d) do artigo 204º do CPPT, ou seja a prescrição da dívida exequenda, que até é do conhecimento oficioso (artigo 175 do CPPT) e que o Tribunal ao não se pronunciar fez com que se verifique omissão de pronúncia (artigo 668 n.º 1 alínea d. parte inicial do CPC).

4ª - O artigo 2º n.º 1 do Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de Dezembro, diploma que aprova a LGT revogou expressamente o artigo 34º, passando o regime prescricional a ser regido pelos artigos 48º e 49º da LGT, que reduziu o prazo prescricional para oito anos. Este novo regime entrou em vigor em 01/01/1999.

5ª - Assim, decorreram, até hoje mais 8 anos, e o oponente não efectuou o pagamento da pretensa dívida que tem hoje mais de 30 anos.

6ª - Verificada a prescrição da pretensa dívida, deve considerar-se extinta a instância, por inutilidade superveniente da lide (artigo 287º, alínea e) do CPC aplicável por força do artigo 2º, a alínea e) do CPPT).

7ª - Como se refere na petição de oposição e na resposta ao parecer de fls. 93 e ss., a fls. 22, aparece o valor de 1.096,486$10, e depois a fls. 61, aparece o valor de 2.564.299$50, este referente à data de 30/07/98, quando é certo que da certidão de dívida aparece como valor de capital 552.132$60, com juros de 1.906.507$30 e como resultado o valor de 2.458.640$00, referente a 01/07/2000.

8ª - Ou seja, o valor apresentado em 30 de Junho de 1998 acaba por ser superior ao valor apresentado cerca de dois anos depois, o que representa a falsidade do título que é o fundamento de oposição a que alude a alínea c) do artigo 204 do CPPT, com a consequente inexistência e inexigibilidade da pretensa dívida que dele consta;

9ª - E quando não se entenda haver falsidade do título, então com base na alínea i) do artigo 204 do CPPT sempre a oposição pode ser também deduzida com outros fundamentos a provar apenas por documento, como sejam os documentos referidos na 7ª conclusão;

10ª - O valor apresentado em 31 de Julho de 1998 acaba por ser superior ao valor apresentado cerca de dois anos depois, pelo que não pode tal contradição, que está documentada, servir para imputar ao oponente qualquer dívida.

11ª – A falsidade do título executivo, como fundamento da oposição à execução, é a que resulta de desconformidade entre o título executivo e a base fáctico-documental cuja atestação nele se exprime, as divergências entre o teor do título e os conhecimentos ou outros instrumentos de cobrança que nele se referem lhe estarem subjacentes. Veja-se Ac. STA, 2ª Secção de 2001/05/30 proc n.º 026001 e Ac. STA 2ª Secção de 25/10/2000, proc. n.º 25212

12ª – Acresce que pede juros superiores a 5 anos, quando é certo que os juros prescrevem em tal prazo (Cod. Civil, artigo 310 alínea d.);

13ª – E chega-se ao ponto de em tal título se afirmar que à soma do capital e juros (incluindo, pois, os prescritos) 2.458.640 “A esse montante acrescem juros à taxa legal”, o que é anatocismo e portanto não permitido ao abrigo do disposto no artigo 560 do Cod. Civil;

14ª – Finalmente, sempre se dirá que o recorrente foi oportunamente citado para deduzir oposição e foi o que fez, pelo que não pode ser prejudicado por erro da secretaria (Cod. Proc. Civil, artigo 161 n.º 6);

15ª – A decisão recorrida violou o disposto nos artigos 161 n.º 6, 287º al. e) e 668 n.º 1 al. d) parte inicial do CPC, 2º alínea e), 175, 204 als. C), d) e i) do CPPT, 48 e 49 da LGT e 310 al. d) e 560 do C.C. C.P.C., e 369 e 365 do C. Civil.

Termos em que, deve dar-se provimento ao recurso, revogando-se a decisão recorrida e substituindo-a por outra que julgue prescrita a pretensa quantia exequenda ou, quando assim não se entenda, a falsidade do título executivo com a inexistência e inexigibilidade da pretensa dívida que dele consta.




A Recorrida, Fazenda Pública, não apresentou contra-alegações.


Neste Tribunal, a Exma. Magistrada do Ministério Público emitiu parecer, defendendo ser este TCAN hierarquicamente incompetente para conhecer do presente recurso.

Conhecendo de imediato da excepção suscitada, temos que, tal como já referido no despacho de fls. 168, nas conclusões de recurso é expressamente referido que a sentença errou no julgamento da matéria de facto porquanto errou na valoração dos factos que considerou como provados e no juízo feito sobre os mesmos, sendo que o Recorrente pretende extrair uma consequência jurídica por si alegada como relevante dessa mesma factualidade impugnada (conclusões 7.ª a 11.ª).

Assim, atento o disposto nos art.s 26.º, al. b) e 38.º, al. a), do ETAF e 280.º, n.º 1, do CPPT, a competência para conhecer do recurso é do TCAN e não do STA, com o que improcede a


Colhidos os vistos legais, importa apreciar e decidir.


I. 1. Questões a apreciar e decidir:

As questões suscitadas pelo Recorrente, delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões (art.s 660.º, n.º 2, 664.º e 684.º, n.º s 3 e 4 todos do CPC na redacção aplicável, ex vi art. 2.º, al. e), e art. 281.º do CPPT), traduzem-se em apreciar:

- Se a sentença recorrida é nula por omissão de pronúncia ao não ter conhecido da prescrição; e

- Se o Tribunal a quo errou ao ter concluído pela existência de erro na forma do processo.



II. Fundamentação

II.1. De facto

É a seguinte a decisão sobre a matéria de facto proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu:

1) O oponente foi notificado pela Direcção-Geral do Tesouro, por ofício número 07810, de 20.03.2000, para a regularização do crédito contraído no âmbito do programa designado “Crédito Agrícola de Emergência” (CAE), por intermédio da Cooperativa Agrícola de Lafões – cfr. documento não impugnado de fls. 25 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, o mesmo se dizendo para os demais elementos infra referidos.

2) O oponente foi citado de que contra ele corria o processo de execução fiscal que originou a presente acção, para deduzir oposição, requerer o pagamento em prestações ou a dação em pagamento, por carta registada no dia 25.09.2000 – vide documento de fls. 9 e 10 dos autos.

3) A presente oposição foi apresentada no dia 13.10.2000 – cfr. documento de fls. 2 e sgs. dos autos.

Não foram consignados factos não provados.



II.2. De direito

Nas primeiras conclusões das alegações do recurso, o Recorrente invoca a existência da nulidade por omissão de pronúncia, com fundamento em o Mmo. Juiz a quo não ter apreciado a prescrição da dívida tributária.

Vejamos então, e independentemente da apreciação que infra se fará acerca da propriedade do meio processual em uso, se estamos em face de uma omissão de pronúncia geradora da nulidade da sentença, nos termos plasmados no artigo 125.º, n.º 1, do CPPT.

Dispõe o artigo 125.º, n.º 1, do CPPT que: “Constituem causas de nulidade da sentença a falta de assinatura do juiz, a não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, a oposição dos fundamentos com a decisão, a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar ou a pronúncia sobre questões que não deva conhecer”.

A nulidade por omissão de pronúncia tem lugar apenas quando se verifica uma violação dos deveres de pronúncia do tribunal sobre questões que deveria conhecer, o que, de acordo com o disposto no artigo 660.º, n.º 2 do CPC (aplicável ex vi art. 2.º, al. e), do CPPT e na redacção então vigente), significa que o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.

Por outro lado, constitui jurisprudência pacífica e reiterada que a omissão de pronúncia existe quando o tribunal deixa, em absoluto, de apreciar e decidir as questões que lhe são colocadas, (cfr., i.a. o acórdão deste TCAN de 26.09.2013, proc. n.º 1903/12.5BEBRG). Vejamos então.

Para o Recorrente, o facto de o Tribunal a quo não ter conhecido da eventual prescrição da divida exequenda constitui omissão de pronúncia geradora de nulidade da sentença que a este Tribunal Central cumpre declarar. Porém, não lhe assiste razão.

No que se reporta à alegada omissão de pronúncia por ausência de apreciação na sentença recorrida da questão da prescrição, importa começar por deixar explicito que se está perante situação em que se verificou a prejudicialidade do conhecimento pelo Tribunal a quo da questão jurídica da prescrição. Com efeito, essa apreciação ficou prejudicada, como o Mmo. Juiz a quo refere no despacho de sustentação, pela solução dada à questão da apreciação e decisão sobre o erro na forma do processo.

E sem embargo do acabado de concluir, não poderia de qualquer modo proceder a suscitada nulidade uma vez que, contrariamente ao afirmado no recurso interposto, na p.i. da presente oposição judicial (composta por onze artigos) o Oponente, ora Recorrente, invocou como fundamentos a inexistência da dívida e a ilegalidade do título executivo. Ou seja, embora a prescrição possa constituir fundamento de oposição nos termos do disposto no art. 204.º, al. d), do CPPT, a mesma não foi directamente convocada, não tendo sido sequer mencionada na petição como integrante, imediata ou mediatamente, da causa de pedir. Consequentemente, não foi posta como questão a apreciar pelo Tribunal.

Em situação similar afirmou-se no acórdão deste TCAN de 14.04.2013, processo n.º 351/04.5BEVIS (idem, no ac. de 11.06.2013, proc. n.º 352/04.3BEVIS, por nós relatado):

Como a jurisprudência tem vindo reiteradamente a afirmar, «a actividade de conhecimento do juiz está limitada pelas duas regras ditadas pelo nº 2 do artigo 660º do CPC: o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras. Não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras» sendo «manifesto o paralelismo existente entre essas regras e as duas nulidades da sentença estabelecidas no artigo 125º do CPPT ou na alínea d) do artigo 668º do CPC: é a nula a sentença «quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento».

Para o Recorrente, como vimos, apesar da prescrição da obrigação tributária não ter sido expressamente submetida à apreciação do Tribunal, não pode deixar de entender-se que estamos perante violação daquela primeira regra já que, sendo a questão de conhecimento oficioso por força do preceituado no artigo 175º do CPPT, o Tribunal estava obrigado a apreciar e decidir a mesma.

Efectivamente, a prescrição é, nos processos de execução fiscal, de conhecimento oficioso pelo que, não sendo apreciada pelo órgão de execução fiscal (entidade que o legislador atribui desde logo competência para esse efeito) o Tribunal pode, invocada ou não pelo sujeito passivo e em qualquer momento, apreciar e decidir da sua verificação.

Todavia, dessa imposição de conhecer oficiosamente da questão da prescrição não pode extrair-se a conclusão (aparentemente subjacente à posição assumida pelo Recorrente neste recurso) de que o Tribunal possa e deva obrigatoriamente daquela conhecer em todo e qualquer processo judicial.

(…)

Nem todas as questões submetidas por lei ao conhecimento oficioso do tribunal podem ser questões atendíveis para se decidir a pretensão deduzida em juízo. O conhecimento oficioso, a que se refere a segunda regra do nº 2 do artigo 660º, deve respeitar apenas às questões que constituem premissas indispensáveis para a solução a dar ao litígio. Só nessa medida é que se poderá falar em omissão de pronúncia por falta de apreciação de uma questão que a lei impõe o conhecimento oficioso. Ora, para se decidir se o acto tributário padece de ilegalidades que afectam a sua produtividade, considerando os fundamentos de facto e de direito em que ele se baseou, não é necessário conhecer se a obrigação tributária titulada pelo acto está ou não prescrita. Tratando-se de um processo de impugnação, que incide sobre a questão da validade do acto impugnado, o tribunal deve apreciar e resolver essa questão por referência aos factos existentes e às normas vigentes no momento em que o acto foi praticado. Por isso, de acordo com este princípio de direito substantivo, o tribunal não atende às superveniências que surjam na pendência do processo, por não influírem sobre a questão da validade do acto impugnado, especialmente nos actos de execução instantânea (cfr. Vieira de Andrade, A justiça Administrativa, 6 ed. pág. 438). E a jurisprudência deste Tribunal assim tem entendido, considerando que a prescrição da dívida resultante do acto tributário de liquidação não constitui vício invalidante desse acto e que, por isso, não serve de fundamento à respectiva impugnação, nem, consequentemente, é, nela, de conhecimento oficioso.».

Todavia, do facto de nos processos de Oposição Judicial, a doutrina transcrita não ser inteiramente aplicável porque, como se disse ab initio, nesta forma processual se colocar precisamente a própria exigibilidade da obrigação que poderá ser aniquilada pela verificação da prescrição e de por esta razão essa questão da prescrição dever ser sempre colocada (porque de conhecimento oficioso), não significa que em todo e qualquer processo com esta natureza se haja de exigir que o Juiz exteriorize na sentença a apreciação e o julgamento realizado sobre a questão da prescrição não lhe sendo esta expressamente suscitada. O que resulta da lei é que sendo expressamente colocada, o Tribunal enuncie, analise e decida tal questão, sob pena de nulidade (por omissão de pronúncia), da sentença que venha a proferir. Porém, não constituindo a questão da prescrição fundamento da Oposição, causa de pedir desta, apenas é exigível que exteriorize esse julgamento, se efectuado. [sublinhado nosso]

(…).”

Donde, não há no caso concreto nulidade da sentença por omissão de pronúncia, com o que improcede este fundamento do recurso.

A segunda questão que importa resolver é a de saber se o Tribunal a quo errou ao ter concluído pela existência de erro na forma do processo.

Neste ponto, foi o seguinte o discurso fundamentador da sentença recorrida:

Os fundamentos para se deduzir uma oposição fiscal estão previstos no artigo 204º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, que são taxativos, e dispõe o seguinte:

«1 - A oposição só poderá ter algum dos seguintes fundamentos:

a) Inexistência do imposto, taxa ou contribuição nas leis em vigor à data dos factos a que respeita a obrigação ou, se for o caso, não estar autorizada a sua cobrança à data em que tiver ocorrido a respectiva liquidação;

b) Ilegitimidade da pessoa citada por esta não ser o próprio devedor que figura no título ou seu sucessor ou, sendo o que nele figura, não ter sido, durante o período a que respeita a dívida exequenda, o possuidor dos bens que a originaram, ou por não figurar no título e não ser responsável pelo pagamento da dívida;

c) Falsidade do título executivo, quando possa influir nos termos da execução;

d) Prescrição da dívida exequenda;

e) Falta da notificação da liquidação do tributo no prazo de caducidade;

f) Pagamento ou anulação da dívida exequenda;

g) Duplicação de colecta;

h) Ilegalidade da liquidação da dívida exequenda, sempre que a lei não assegure meio judicial de impugnação ou recurso contra o acto de liquidação;

i) Quaisquer fundamentos não referidos nas alíneas anteriores, a provar apenas por documento, desde que não envolvam apreciação da legalidade da liquidação da dívida exequenda, nem representem interferência em matéria de exclusiva competência da entidade que houver extraído o título.

2 - A oposição nos termos da alínea h), que não seja baseada em mera questão de direito, reger-se-á pelas disposições relativas ao processo de impugnação.”

Ora, da leitura do teor do artigo transcrito e comparando com os fundamentos alegados pelo oponente, conforme acima enunciados, verifica-se que os mesmos não são objecto de conhecimento numa oposição à execução fiscal.

O oponente quer atacar a veracidade da concessão do crédito agrícola de emergência, que ocorreu num procedimento administrativo. Alega que é inexistente e inexigível. Nenhum destes fundamentos, cabem no normativo acima descrito.

Vejamos, se porventura, os factos alegados pelo oponente poderiam ser objecto de apreciação noutra forma de processo, pois, caso seja possível, convola-se na forma do processo adequada, nos termos da lei – artigos 97º, nº 3, da Lei Geral Tributária e 98º, nº 4, do Código de Procedimento e de Processo Tributário).

Em primeiro lugar, analisemos se a impugnação judicial é o meio adequado in casu.

A impugnação judicial é o meio processual adequado para reagir contra as liquidações de tributos, invocando vícios próprios dessas liquidações ou outros praticados, que afectam a sua legalidade – artigos 97º e 99º, ambos do Código de Procedimento e de Processo Tributário.

A impugnação judicial só é o meio processual adequado quando o acto a impugnar “contiver efectivamente a apreciação da legalidade de um acto de liquidação. Se no acto praticado em processo (…) não se chegou a apreciar a legalidade do acto de liquidação, por haver qualquer obstáculo a tal conhecimento (como a intempestividade ou a ilegitimidade do requerente ou recorrente), o meio de impugnação adequado será a acção administrativa especial, (…) pois se tratará de um acto que não aprecia a legalidade de um acto de liquidação” – Jorge Lopes de Sousa, CPPT Anotado e Comentado, 5ª Edição, Volume I, páginas 676 e 677.

O oponente alega vícios que ocorreram no âmbito de um procedimento administrativo, ou seja, um procedimento que visava um crédito contraído no âmbito do programa designado “crédito agrícola de emergência”, por intermédio da Cooperativa Agrícola de Lafões. Não está em causa, qualquer acto de liquidação.

Logo, a forma de processo, impugnação judicial, também não é a própria.

Assim, tendo em conta o referido, o meio processual adequado para reagir contra um qualquer acto administrativo no procedimento atrás referido, é a acção administrativa especial – artigo 46º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos – pois, não existe qualquer acto de liquidação.

Há, por isso, erro na forma de processo empregue, que conduz à sua nulidade, caso não se possa convolar para a forma processual estabelecida na lei, (artigos 199º e 202º, ambos do Código de Processo Civil).

Empregou-se a oposição à execução fiscal quando se deveria ter empregue a acção administrativa especial.

E o assim decidido é de manter.

Com efeito, é manifesto que o oponente, ora Recorrente, arguiu a falsidade intelectual traduzida na alegada desconformidade entre a realidade e o teor do título executivo; mas a falsidade do título executivo que pode servir de fundamento à oposição a execução fiscal não é a intelectual, consistente em certificar uma obrigação alegadamente inexistente por o oponente nada dever (cfr. o ac. do TCAS de 31.10.2006, proc. n.º 1385/06). É incontestável que quando afirmou na p.i. de oposição que as alegadas dívidas que a certidão em que se fundou a presente execução certifica não existem, aquilo a que se reporta é à falsidade da dívida exequenda, maxime, à inexistência de facto tributário. Ou seja, a oposição deduzida não se fundou, de nenhum passo, na falsidade do título executivo, o que só agora, em sede de recurso, se esforçou o Recorrente por tentar fazer e por apelo, aliás, a elementos de facto não constantes do probatório fixado, o qual não foi porém sujeito a impugnação. Deste modo, tem o esforço argumentativo desenvolvido a este propósito pelo Recorrente que soçobrar, desde logo por consubstanciar questão nova da qual está este tribunal de recurso impedido de conhecer.

Dúvida não há, pois, em como o que o oponente alega não é a falsidade do título executivo, mas antes a falsidade da dívida exequenda, assim entrando na discussão da ilegalidade concreta da dívida exequenda, discussão esta que, conforme o Tribunal a quo deixou devidamente explicitado, só poderia ser encetada nesta sede se a lei não facultasse outro meio para o efeito, o que não é o caso.

E quando o ora Recorrente refere que a dívida é inexigível, sendo que a inexigibilidade é matéria que pode enquadrar-se em sede de oposição, certo é que a dita “inexigibilidade” tem por referência a alegada, e já discutida, falsidade da dívida exequenda (inexistência de facto tributário).

Na situação presente, considerando que a dívida em causa não é relativa a impostos ou receitas parafiscais, mas sim de outra dívida ao Estado – trata-se de dívida não tributária imposta ao administrado através de acto administrativo e susceptível de ser cobrada coercivamente através do processo de execução fiscal Sobre a natureza desta dívida, vide, para citar o mais recente, o acórdão do STA de 3.12.2013, proc. n.º 1279/03. –, embora não fosse aplicável o processo de impugnação judicial, sempre o ora oponente tinha à sua disposição o recurso contencioso – rectius, a acção administrativa especial – como meio de impugnar a dívida pelo que, não o tendo feito, não é possível discutir a legalidade da mesma neste processo. Nada há, pois, a censurar ao decidido pela Mma. juiz a quo, sendo que não vem questionado neste recurso o acerto da decisão quando julgou não se mostrar possível, por intempestiva, a convolação do processo em acção administrativa especial.

Pretende ainda o Recorrente extrair da citação que lhe efectuada para o processo executivo que “sempre se dirá que o recorrente foi oportunamente citado para deduzir oposição e foi o que fez, pelo que não pode ser prejudicado por erro da secretaria” (cfr. conclusão 14.ª do recurso). Mas também aqui não lhe assiste razão.

Com efeito, a citação efectuada, nos termos em que o foi, foi-o correctamente e o ora Recorrente, chamado ao processo executivo, detém – detinha – todos os direitos de defesa legalmente previstos no âmbito do processo de execução fiscal. Efectivamente, poderia opor-se à execução fiscal nos termos do citado art. 204.º do CPPT, o que não fez. O que não pode é, sendo esta fase executiva precedida de uma fase administrativa prévia em que é determinada a dívida exequenda, tendo-lhe sido este acto devidamente notificado (cfr. o provado em 1. supra), utilizar a oposição à execução fiscal como uma segunda oportunidade para fazer valer os seus direitos na sequência de ter deixado passar o respectivo prazo de reacção contenciosa (neste sentido, Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário - Anotado e Comentado, vol. II, 2007, p. 322).

Por fim, uma última nota quanto à questão dos juros e sua contagem. Também neste ponto o Recorrente produz alegação que põe em causa o método utilizado para quantificar o montante em dívida, o que se reconduz à ilegalidade concreta da liquidação, a qual só pode erigir-se em fundamento de oposição à execução fiscal nas situações em que “a lei não assegure meio judicial de impugnação ou recurso contra o acto de liquidação” (cfr. a referida alínea h) do art. 204.º, n.º 1, do CPPT), ou seja, quando a dívida exequenda não tenha origem em acto tributário ou administrativo prévio. Donde, também aqui colhem aplicação as conclusões anteriormente alcançadas.

Por tudo o que ficou dito, prejudicado que fica o demais alegado, o recurso não pode ser provido, devendo ser mantida a sentença recorrida.



III. Conclusões

Sumariando:

i) Apenas existe omissão de pronúncia quando o tribunal deixa de apreciar e decidir uma questão, isto é, um problema concreto que haja sido chamado a resolver, a menos que o seu conhecimento tenha ficado prejudicado em face da solução dada ao litígio, dado que lhe incumbe o conhecimento de todas as questões suscitadas pelas partes, e apenas destas, sem prejuízo de a lei impor ou permitir o conhecimento oficioso de outras (art. 660.º, n.º 2, do CPC na redacção então vigente, ex vi art. 2.º, al. f), do CPPT).

ii) Arguindo o oponente não a falsidade do título executivo, mas antes a falsidade da dívida exequenda – inexistência da dívida –, entrando na discussão da ilegalidade concreta da dívida exequenda, conforme o Tribunal a quo devidamente explicitou, só poderia discutir-se esta no meio processual em uso se a lei não facultasse outro meio para o efeito.

iii) Considerando que a dívida em causa, proveniente do Crédito Agrícola de Emergência, não é relativa a impostos ou receitas parafiscais, mas sim de outra dívida ao Estado, embora não fosse aplicável o processo de impugnação judicial, sempre o oponente tinha à sua disposição a acção administrativa especial como meio de contra aquela reagir.



IV. Decisão

Pelo exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

Custas pelo Recorrente.

Porto, 27 de Fevereiro de 2014

Ass. Pedro Marques

Ass. Pedro Vergueiro

Ass. Nuno Bastos