Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00454/15.0BEPNF
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:07/15/2021
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Ricardo de Oliveira e Sousa
Descritores:CONTRATAÇÃO INICIAL E RESERVA DE RECRUTAMENTO - BOLSA DE CONTRATAÇÃO DE ESCOLA
Sumário:I - A colocação do Autor no âmbito da bolsa de contratação de escola reclama[va] a denúncia prévia do contrato de docência por si anteriormente celebrado no domínio da contratação inicial e reserva de recrutamento.*
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO
Recorrido 1:D.
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Conceder provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
* *

I – RELATÓRIO

O MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, devidamente identificado nos autos, vem intentar o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença promanada nos autos, que julgou a presente ação administrativa especial procedente e, em consequência, anulou a (i) lista final de colocação da bolsa de contratação de escola do Agrupamento de Escolas n.º 1 de (...) do ano letivo de 2014/2015, quanto ao grupo de recrutamento 620; a (ii) lista final de colocação da bolsa de contratação de escola do Agrupamento de Escolas de (...) do ano letivo de 2014/2015, quanto ao grupo de recrutamento 620; e a (iii) lista final de colocação da bolsa de contratação de escola da Escola Secundária (...), (...), do ano letivo de 2014/2015, quanto ao grupo de recrutamento 620.

Alegando, o Recorrente formulou as seguintes conclusões:“(…)

I. Vem o presente recurso interposto da sentença proferida em 11 de abril de 2019 pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel na qual o Ministério da Educação foi condenado a, no âmbito do concurso de bolsa de contratação de escola, (BCE), a anular as listas finais de colocação do Agrupamento de Escolas n.° 1 de (...), Agrupamento de Escolas de (...) e Escola Secundária (...).
II. A sentença em crise não tem em conta que a Bolsa de Contratação de Escola (BCE) é um dos concursos implementados pelo Recorrente, e não o único concurso para satisfação de necessidades docentes de caráter temporário.
III. Não tendo, igualmente, a douta sentença recorrida em conta que a BCE é um procedimento que se desdobra em vários procedimentos concursais a decorrer em simultâneo, tantos quanto o número de horários necessários à satisfação das necessidades temporárias de serviço docente das escolas a quem o mesmo se destina.
IV. O artigo 40.° do Decreto-Lei n.° 83-A/2014, de 23 de maio, que alterou o Decreto-Lei n.° 132/2012, introduziu de forma inovatória, uma bolsa de contratação de escola de duração anual destinada à satisfação das necessidades temporárias dos agrupamentos de escolas ou escolas não agrupadas com contrato de autonomia e das escolas portuguesas no estrangeiro.
V. Sendo que, como bem se refere na sentença a quo nenhuma disposição legal impede os docentes de se candidatarem aos diversos procedimentos concursais, previsto no referido diploma legal.
VI. Revelando-se, no entanto, necessário conjugar as diversas disposições legais aplicáveis a todos à BCE e restantes procedimentos concursais previstos no referido diploma, de modo a evitar que o procedimento de colocação de docentes se transforme no que o Acórdão do TCA Norte, de 27.04.2012, proferido no Processo 00138/11.9BECBR, denomina como “ (...) sucessiva celebração e denúncia de contratos de trabalho, na procura de melhores condições pelos docentes contratados, seja de localização, seja de maior amplitude de horário, (...) susceptível de entorpecer a ação das escolas no recrutamento de professores, principalmente as mais periféricas, e principalmente quanto aos horários mais reduzidos. (...)”
VII. Não podendo ser descurado pelo julgador que, o concurso de contratação inicial e reserva de recrutamento, previsto no Decreto-Lei n.° 132/2012, de 27 de junho, se desenvolve num único momento, no qual os candidatos manifestam preferências.
VIII. Nem tão pouco que, de acordo com a intenção agilizadora do legislador, a BCE se desdobra em vários procedimentos concursais a decorrer em simultâneo e num único momento nos quais os agrupamentos de escola e escolas não agrupadas lançam ofertas de horários.
IX. Atenta a cronologia concursal as colocações do concurso de contratação inicial e reserva de recrutamento, são conhecidas em primeiro lugar e só, depois, são conhecidas as colocações da BCE.
X. Uma vez que os candidatos à BCE nunca podem prever antecipadamente a data em que irão obter a respetiva colocação, com toda a probabilidade poderá suceder que existam candidatos que vão obtendo colocação nos primeiros concursos e que, posteriormente, possam obter colocação no concurso da BCE.
XI. Ora, o Recorrido obteve colocações em horários incompletos de 11 e 6 horas, declarados pelo Agrupamento de Escolas (…), de acordo com as preferências que manifestou, tendo procedido à aceitação das mesmas.
XII. Tendo o Recorrido também sido opositor ao concurso de BCE, para o qual manifestou preferências para horários completos de 22 horas, a declarar pelo Agrupamento de Escolas n.° 1 de (...), no Agrupamento de Escolas de (...) e na Escola Secundária (...).
XIII. Atentos os contratos que o Recorrido tinha já celebrado, perfazerem no seu total, 17 das 22 horas que integram a componente letiva prevista no n.° 2 do artigo 77.° do ECD, o mesmo não se encontrava impedido de integrar a BCE mas, tão só, impedido de poder aceitar uma colocação em horário completo no mesmo concurso.
XIV. Com efeito, a possibilidade de o Recorrido lecionar em regime de acumulação de funções, em todos os horários nos quais já tinha sido colocado e horário a aceitar em BCE, esbarrava com que se encontra expressamente regulamentado na Portaria n.° 814/2005, de 13 de setembro, já que,
XV. segundo o disposto no n.° 2 do art.° 3.° da referida Portaria, ressalvadas as exceções legalmente previstas, a acumulação de funções docentes não poderia ser autorizada quando excedesse por semana e por dia seis horas letivas.
XVI. Sendo certo, que ao contrário do que se disse na douta sentença recorrida, não resultava em concreto na situação em apreço nenhuma impossibilidade colocada pelo Recorrente ou em resultado da sua omissão, de aceitação pelo Recorrido das colocações que, eventualmente, pudessem ser obtidas por aquele em concurso de BCE.
XVII. Com efeito, o que o Recorrente vislumbra como certo é o não exercício de um direito potestativo por parte do Recorrido que lhe permitiria aceitar as colocações e celebrar contratos com qualquer uma das escolas cujas listas finais de colocação foram anuladas.
XVIII. Ou seja, a douta sentença recorrida não distinguiu entre a possibilidade de ser opositor ao concurso de BCE e de integrar aquela bolsa, com a possibilidade de aceitar a colocação obtida em concurso de BCE, e celebrar contrato em resultado da mesma.
XIX. E, se a primeira possibilidade não se encontrava dependente de denúncia do contrato, já a segunda possibilidade se encontrava dependente dessa denúncia.
XX. Denúncia do contrato que pelo disposto no n.° 3 do artigo 44.° do Decreto - Lei n.° 132/2012, de 27 de junho que apenas impediria o regresso do Recorrido à reserva de recrutamento, bem como outra colocação no mesmo agrupamento de escolas onde aquele se encontrava já colocado, não resultando por tal facto e para aquele, qualquer prejuízo.
XXI. Ora, o Recorrido, embora ainda no período experimental, nunca exerceu o direito potestativo de denúncia dos contratos celebrados com o Agrupamento de Escolas Joaquim de Araújo, de como outra colocação no mesmo agrupamento de escolas onde aquele se encontrava já colocado, não resultando por tal facto e para aquele, qualquer prejuízo.
XXII. E se essa era a condição legal permitiria celebrar contrato com qualquer agrupamento de escolas e escola não agrupada no qual fosse colocado em concurso de BCE certo é que o Recorrido não exerceu o direito de denúncia preenchendo aquela condição legal.
XXIII. E se não o fez, tal facto não pode ser imputado ao Recorrente, não tendo sido este que sonegou, ao Recorrido, o exercício dessa faculdade, conforme se sustenta na sentença a quo mas, tão só, aquele que pura e simplesmente não exerceu aquela faculdade quando o podia fazer.
XXIV. A possibilidade de denúncia de um contrato decorre de um preceito legal, não carece de qualquer comunicação para que o putativo “utilizador” dessa norma exerça tal direito, conforme decorre da fundamentação da sentença recorrida.
XXV. Por outro lado a admitir-se o entendimento sustentado na douta sentença recorrida o mesmo constituiria, colocaria o procedimento de colocação de docentes num autêntico caos colocando em causa a prossecução do interesse público subjacente ao sistema educativo.
XXVI. As regras concursais para satisfação das necessidades temporárias de docentes devem salvaguardar a prossecução do interesse público, não podendo esse interesse e in casu de ser apreciado face à interdependência entre os diferentes procedimentos concursais para satisfação de tais necessidades.
XXVII. Dessa aferição resultaria incongruente que um docente que se encontrasse já colocado em concurso de contratação inicial e reserva de recrutamento pudesse sem mais obter colocações em concurso de BCE sem que tivesse previamente denunciado os contratos anteriormente celebrados nos termos do n.° 3 do artigo 44.° do Decreto - Lei n.° 132/2012, de 27 de junho.
XXVIII. Sendo a BCE uma bolsa que integra candidatos que são, em simultâneo, opositores não a um mas a centenas de procedimentos concursais, podendo ser selecionados por mais de um agrupamento de escolas ou escola não agrupada torna-se indispensável em nome da celeridade e eficiência que, tais candidatos, de modo a serem selecionados não tenham uma colocação ativa obtida anteriormente.
XXIX. O que significa que o justo e equilibrado balanceamento entre as expectativas dos docentes e o interesse público, depende em concreto do exercício, por parte dos candidatos à BCE, da legal opção de denúncia do (s) contrato (s) que, anteriormente, tenham sido pelos mesmos celebrado (s).
XXX. A sufragar-se o entendimento vertido na sentença a quo a Administração, encontrar-se-ia na colocação de professores enredada numa “ teia” procedimental, atentos os preceitos legais aplicáveis, nomeadamente os relativos à comunicação da colocação (n.° 7, do artigo 40.°), denuncia do(s) contrato(s) (n.° 3 do artigo 44.°), aceitação da colocação (n.° 17 do artigo 39.°) e de apresentação (n.° 18 do artigo 39.°).
XXXI. E exponenciada que fosse a demora na colocação de professores não se prefiguraria qual a vantagem gizada pelo legislador que decorreria da introdução de um novo mecanismo de recrutamento de docentes.
XXXII. Pelo que, ao decidir como decidiu, a douta sentença a quo incorreu em erro de julgamento (…)”.
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Notificado que foi para o efeito, o Recorrido produziu contra-alegações, que rematou com o seguinte quadro conclusivo: “(…)

1 - O recorrido foi opositor ao concurso nacional de professores para o grupo 620 tendo sido o 396° candidato graduado a nível nacional.
2- Ficou colocado com 11 horas em Penafiel e depois mais 6 horas em Paredes.
3- Concorreu também ao concurso de Bolsa de Contratação de Escola a horários completos.
4 - Das escolas a que concorreu no âmbito da Bolsa de Contratação de Escola, 2014/2015, o recorrido ficou graduado à frente dos candidatos selecionados em várias escolas, sendo que os respetivos horários eram anuais e completos, ou seja, mais vantajosos do que aquele que logrou obter em sede da contratação inicial.
5 - Ou seja, no Agrupamento de Escolas n° 1 de (...), com seis horários completos de 22h a concurso, o recorrente ficou ordenado em 1º lugar e entraram os professores: C., 3o da lista graduada; R., 11° graduado; J., 15° graduado; A., 22° graduado; S., 27° graduado; J., 37° graduado.
6 - No Agrupamento de Escolas de (...), o A. era n° 21 na lista de ordenação e o n°43 (R.) foi chamado, não tendo aceite porque aceitou em (...). Entraram em 2 horários completos: M. e V., graduadas, respetivamente, em 33° e 50°, lugares.
7 - Na Escola Secundária/3 (...) (...), o recorrido era o n° 8 na lista de ordenação e a professora selecionada foi M., posicionada na lista em 18° lugar.
8 - Tal facto verificou-se porquanto o recorrido não foi oportunamente notificado dos resultados do concurso da Bolsa de Contratação de Escola para 2014/2015, isto é, porque o MEC não publicitou as listas de colocação final em tempo útil, conforme demonstraremos ao diante.
9 - Desse modo, o Recorrido viu-se impossibilitado de aceitar uma colocação que seria sua por direito e mais vantajosa quer em termos salariais quer, no que à contagem do tempo de serviço diz respeito pois, passe a repetição, os horários, em que ficou melhor graduado do que os candidatos que foram chamados a aceitar essas colocações eram completos (22 horas letivas) e anuais (efeitos reportados a 1 de setembro de, 2014).
10 - Tendo sido colocado no concurso de contratação Inicial, o recorrido tem a faculdade, conferida pelo n.° 3 do artigo 44º do DL 132/2012, de denunciar o contrato de 11 horas em que foi colocado no âmbito da contratação inicial, desde que dentro do período experimental (no caso concreto de 30 dias a contar do inicio da laboração pelo recorrido) e com a consequência legal de o recorrido, no mesmo ano letivo, não poder ser colocado na mesma Escola ou Agrupamento.
11 - Ora, na data em que foram colocados os docentes da BCE, o recorrido estava ainda dentro do período experimental do seu contrato de 11 horas, pelo que poderia ter denunciado livremente esse horário incompleto para aceitar um dos vários horários completos nos quais seria preferencialmente colocado.
12 - Sendo que o recorrido foi colocado no âmbito da Reserva de Recrutamento em 26/09/2014, constatamos que no momento do preenchimento das vagas da BCE, o recorrido estava dentro do período experimental do seu contrato incompleto, pelo que em perfeitas condições legais de proceder à sua denúncia livre e de proceder à aceitação de uma das colocações da BCE com horário completo.
13 - Na sequência da mesma RR2, houve candidatos com horário incompleto, que puderam exercer o seu direito de preferência, denunciando um contrato e aceitando nova colocação em BCE. A "plataforma" permitiu a seleção de candidatos já colocados, dentro do período experimental, tal como aconteceu com outro professor, do grupo 43Q, colocado a 29 de setembro com 18 horas em Ponte de Lima e que viu o seu nome selecionado para um horário de 22 horas em Lordelo - Paredes. Rejeitou na plataforma a 1ª colocação e no minuto seguinte, na mesma plataforma, aceitou o horário completo.
14 - Tal facto só não foi possível porquanto, na sequência de inúmeras irregularidades nas colocações, o MEC retirou as primeiras listas de BCE e apenas publicou as novas listas em 20/10/2014 (BCE 13), com alterações na "plataforma" que impediam (segundo informações da DGRHE) a seleção dos candidatos com horários já atribuídos mesmo que em período experimental, já depois de colocar os docentes que entendeu contactar individualmente, como tal, impossibilitando que o mesmo pudesse aceitar uma colocação duplamente mais favorável: melhor salário e melhor contagem de tempo de serviço por se tratar de horários completos (o docente tem vindo a realizar um sacrifício assinalável, ficando longe da família há já alguns anos, para ficar em horários completos).
15 - Tal facto, grosseiramente lesivo dos interesses e direitos legalmente protegidos do recorrido, é igualmente violado; da lei e dos mais elementares princípios da contratação pública, pois o Réu no publicou ou notificou oportunamente a todos os candidatos os resultados de um concurso público.
16- O recorrido entende que tendo ficado melhor ordenado, os horários de 22 horas já referidos teriam que ser disponibilizados a si, que estava melhor ordenado, e não aos contrainteressados, sentindo-se, portanto, ultrapassado por docentes ordenados depois dele; por sua vez a entidade demandada entende que o recorrido não podia aceitar o lugar no âmbito da bolsa de contratação de escola porque já tinha aceite, e não denunciado, contrato de 11 horas letivas na Escola Secundária (…).
17- Ora, esta oportunidade de o recorrido denunciar ao contrato com horário de 11 horas está expressamente prevista e regulada no artigo 44.°, n.° 3 do Decreto-Lei n.° 132/2012, de 27 de junho, apenas definindo o legislador como momento oportuno para aproveitar esta possibilidade, o termo do período experimental, que, no caso do recorrido, não se tinha ainda esgotado.
18- Assim, face ao exposto é de Concluir que assiste razão ao recorrido, já que a entidade demandada impossibilitou que este pudesse denunciar ao contrato que efetivamente havia celebrado, mas que se encontrava ainda no âmbito do período experimental, e optar por uma das colocações a que tinha direito como membro integrante da bolsa de contratação de escola em que tinha fica ordenado em 1º lugar.
19 - Com esse comportamento, coatou e lesou decisivamente os interesses e direitos legalmente protegidos do recorrido, pois se assim não tivesse sucedido, o recorrido poderia ter denunciado o contrato de 11 horas no qual foi inicialmente colocado e teria procedido à consequente aceitação de um dos vários horários completos em que foi melhor graduado do que os candidatos colocados, conforme resulta documentalmente provado (…)”.
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O Tribunal a quo proferiu despacho de admissão do recurso interposto, fixando os seus efeitos e o modo de subida.
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O/A Digno[a] Magistrado[a] do Ministério Público junto deste Tribunal Superior silenciou quanto ao propósito a que se alude no nº.1 do artigo 146º do C.P.T.A.
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Com dispensa de vistos prévios, cumpre, pois, apreciar e decidir, já que nada a tal obsta.
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II - DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A DECIDIR

O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, de acordo com o disposto nos artigos 144.º n.º 2 e 146.º n.º 4 do C.P.T.A. e dos artigos 5.º, 608.º n.º 2, 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º do novo CPC ex vi dos artigos 1.º e 140.º do CPTA.
Neste pressuposto, a questão essencial a dirimir é a de saber se a sentença recorrida, ao julgar nos termos e com o alcance descritos no ponto I) do presente Acórdão, incorreu em erro de julgamento de direito.
Assim sendo, esta será a questão a apreciar e decidir.
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III – FUNDAMENTAÇÃO
III.1 – DE FACTO

O quadro fáctico apurado na decisão judicial recorrida foi o seguinte:“(…)
1) O autor é professor contratado, estando atualmente a exercer funções na Escola Secundária (…);
P.A., fls. 44
2) Para o ano escolar 2014/2015 o autor foi opositor ao concurso de contratação inicial e reserva de recrutamento para o grupo de recrutamento 620 (Educação Física);
P.A., fls. 13 e ss.
3) No âmbito desse concurso manifestou preferência por vários estabelecimentos com vários intervalos de horário, horário completo, horário entre 15 e 21 horas e horário entre 8 e 14 horas;
P.A. fls. 13 e ss.
4) Tendo sido colocado na RR2, de 26.09.2014, num horário incompleto de 11 horas letivas na Escola Secundária (…), tendo conseguido em oferta de escola mais 6 horas em Agrupamento de Escolas da (…) a 24.10.2014;
P.A., fls. 44 e 45
5) O Autor aceitou a colocação na Escola Secundária (…) a 29.09.2014 e a oferta no Agrupamento de Escolas da (…) a 24.10.2014;
P.A., fls. 44 e 45
6) Ainda para o mesmo ano letivo, o autor foi igualmente opositor ao concurso de Bolsa de Contratação de Escola;
PA., fls. 24 e ss.
7) De entre outros estabelecimentos, o autor candidatou-se, apenas a horário completo, nos seguintes estabelecimentos: Escola Secundária (…), na (...); no Agrupamento de Escolas de (...);
P.A., fls. 24 e ss.
Candidatou-se ainda no âmbito da Bolsa de contratação de Escola de 13.10.2014, para o ano escolar de outros, aos seguintes estabelecimentos: Agrupamento de Escolas n.° 1 de (...); e Agrupamento de Escolas de (…), Lisboa;
P.A., fls. 38 e ss.
9) A lista de ordenação da bolsa de contratação de escola no Agrupamento de Escolas n.° 1 de (...), para o ano letivo de 2014/2015, contém a seguinte ordenação:
Doc. 2 junto com a p.i.
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

10) Para o ano letivo de 2014/2015, no Agrupamento de Escolas n.° 1 de (...) ficaram colocados os seguintes docentes na Bolsa de contratação de escola:
Doc. 1 junto com a p.i.
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

11) Os docentes C., J. e R. foram colocados no referido agrupamento a 21.10.2014, a docente A. foi colocada nesse agrupamento a 23.10.2014, e os docentes J. e S., foram colocados no mesmo agrupamento a 24.10.2014;
P.A., fls. 5 a 10
12) Na lista de ordenação da bolsa de contratação de escola no Agrupamento de Escolas de (...), para o ano letivo de 2014/2015, o autor ficou graduado em 21° lugar, sendo que em 33° ficou ordenada M. e em 50° lugar V.;
Doc. 2 junto com a p.i.
13) Para o ano letivo de 2014/2015, no Agrupamento de Escolas de (...) ficaram colocadas no grupo de recrutamento 620, com horário de 22 horas M. e V.:
Doc. 1 junto com a p.i.
14) A docente M. foi colocada a 21.10.2014;
P.A., fls. 12
15) Na Escola Secundária/3 (...) (...), o autor era o n° 8 na lista de ordenação e a professora selecionada foi M., posicionada na lista em 18° lugar;
Doc. 1 junto com a p.i.; valorou-se a não impugnação da entidade demandada
16) A referida Maria Beirão foi colocada a 20.10.2014.
P.A., fls. 11
IV.1.2 - Factos não provados
Inexistem factos com interesse para a decisão da causa, que importe dar como não provados.
IV.1.3 - Fundamentação da matéria de facto
A convicção do Tribunal baseou-se na análise dos documentos juntos aos autos, bem como junto ao P.A.. Os documentos em causa não foram impugnados e são especificados em cada um dos pontos (…)”.
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III.2 - DO DIREITO
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Está em causa a decisão judicial que anulou a (i) lista final de colocação da bolsa de contratação de escola do Agrupamento de Escolas n.º 1 de (...) do ano letivo de 2014/2015, quanto ao grupo de recrutamento 620; a (ii) lista final de colocação da bolsa de contratação de escola do Agrupamento de Escolas de (...) do ano letivo de 2014/2015, quanto ao grupo de recrutamento 620; e a (iii) lista final de colocação da bolsa de contratação de escola da Escola Secundária (...), (...), do ano letivo de 2014/2015, quanto ao grupo de recrutamento 620.

A resenha processual relevante é a seguinte:
O Autor, aqui Recorrente, foi opositor ao concurso de contratação inicial e reserva de recrutamento para o ano letivo de 2014/2015, no âmbito do grupo de recrutamento 620 - Educação Física, no qual obteve colocação na Escola Secundária (…), num horário incompleto de 11 horas, e que aceitou a 29.09.2014, tendo ainda obtido colocação no Agrupamento de Escolas da (…), num horário incompleto de 6 horas, perfazendo um total de 17 horas.
Foi também opositor à bolsa de contratação de escola [BCE] para o mesmo ano escolar e no mesmo grupo de recrutamento, no âmbito do qual ficou graduado em 1º lugar, não tendo, todavia, obtido colocação no âmbito deste procedimento concursal.
Realmente, e com reporte à bolsa de contratação de escola, ao invés do Autor, foram colocados determinados docentes ordenados em posição inferior ao Autor [cfr. pontos 9 e seguintes do probatório coligido nos autos], o que o Réu justificou com base no entendimento de que o Autor não podia aceitar o lugar no âmbito da bolsa de contratação de escola, visto que já tinha aceite, e não denunciado, contrato de 11 horas letivas na Escola Secundária (…).

Pois bem, escrutinado o teor da fundamentação de direito da decisão judicial recorrida, verifica-se que o juízo de procedência da presente ação vem esteado no entendimento, no mais essencial, de que a regulamentação aplicável aos concursos em causa, mormente o Decreto-Lei n.° 132/2012, de 27 de junho, não proíbe que um docente seja opositor ao concurso de contratação inicial e reserva de recrutamento e, simultaneamente, ao concurso da bolsa de contratação de escola, nem sequer prevê que a aceitação de um contrato dentro o período experimental determine a exclusão ou quaisquer impeditivos de aceitação de um contrato no âmbito de outro concurso, pelo que não é de aceitar a atuação da Administração descrita nos autos.

De facto, na ótica do Tribunal a quo, a contratação no âmbito do Agrupamento de Escolas n.º 1 de (...) deveria ter sido disponibilizada para aceitação antes de mais ninguém ao Autor, como aliás resulta da remissão do artigo 40.º, n.º 10 para os números 15 a 19 do artigo 39, não exigindo o bloco legal aplicável a denúncia do contrato celebrado no domínio da contratação inicial e reserva de recrutamento aquando das listas de graduação da bolsa de contratação de escola, com ressalva da impossibilidade de regresso à reserva de recrutamento na situação de ultrapassagem do período do contrato experimental entretanto celebrado, o que não se verifica nos autos.
O Recorrente insurge-se contra o assim considerado e decidido, insistindo na tese de impossibilidade de colocação do Recorrido na bolsa de contratação de escola sem a prévia denúncia do contrato celebrado em sede de contratação inicial e reserva de recrutamento, sob pena de incongruência e demora na colocação dos professores nos procedimentos concursais.
E, efectivamente, insurge-se bem, pois que os termos em que o Recorrente desenvolve a sua argumentação são absolutamente capazes de fulminar a sentença recorrida com imputado erro de julgamento de direito.
Na verdade, a admitir-se a tese perfilhada pelo Tribunal a quo, sempre seria possível ao Autor celebrar um [novo] contrato de docência de 22 horas em bolsa de contratação de escola na plena vigência de um contrato de docência de 17 horas anteriormente celebrado no domínio da contratação inicial e reserva de recrutamento.
De facto, permitindo-se ao Autor a possibilidade de denunciar o contrato celebrado no domínio da contratação inicial e reserva de recrutamento até ao termo do período experimental deste, sempre estaria encontrada uma solução não querida pelo legislador de permitir a titularidade por parte do Autor, durante a duração do período experimental, de duas relações jurídicas de emprego com uma carga horária total de 39 horas.
O que não é de aceitar de todo, pela simples razão de ser ilegal e contrário às regras de contratação docente.

Realmente, a possibilidade de vigência de dois contratos pelo mesmo docente com o mesmo objeto para o mesmo período letivo com a carga horária de 39 horas representa uma clara subvertimento das regras de contratação docente, que pressupõem, de entre outros elementos que (i) cada docente ocupa apenas uma vaga [contrato] e (ii) que a carga horária máxima a atribuir seja de 22 horas.

Naturalmente, e quanto a este último elemento, não se ignora a possibilidade de acumulação de exercício de funções docentes por parte de educadores de infância e de professores dos ensinos básico e secundário pode ser autorizada até ao limite global de seis horas letivas semanais [cfr. nº. 2 do artigo 3º da Portaria nº. 814/2005, de 13.09].

Neste domínio, todavia, cabe notar que não resulta processualmente adquirida a autorização de acumulação do exercício de funções docentes por parte do Autor, o que, por si só, importa a inverificação desta hipótese.

Desta feita, e sopesando que a idealização do procedimento de contratação docente nos termos admitidos pelo Tribunal a quo não serve o propósito de celeridade e eficiência que devem presidir a atuação da Administração, ademais e especialmente, em matéria de contratação pública, podendo mesmo desembocar no caos deste procedimento, o que se apresenta manifestamente contrário à salvaguarda do interesse público, trave mestra de toda a atuação administrativa e do próprio Estado de Direito, impera concluir que, in casu, a colocação do Autor no âmbito da bolsa de contratação de escola reclama[va] a denúncia prévia do contrato de docência por si anteriormente celebrado no domínio da contratação inicial e reserva de recrutamento.

Deste modo, não tendo sido este o entendimento perfilhado na sentença recorrida, é mandatório concluir que esta é merecedora da censura que o Recorrente lhe dirige.
O presente recurso jurisdicional merece, pois, provimento, pelo que se impõe revogar a decisão judicial recorrida e julgar-se totalmente improcedente a presente ação.
Assim se decidirá.
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IV – DISPOSITIVO

Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Administrativa deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202º da CRP, em CONCEDER PROVIMENTO ao presente recurso jurisdicional, revogar a decisão judicial recorrida e julgar improcedente a presente ação.
Custas a cargo do Recorrido.
Registe e Notifique-se.
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Porto, 15 de julho de 2021,

Ricardo de Oliveira e Sousa
João Beato
Helena Ribeiro