Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00910/15.0BEBRG
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:06/04/2020
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Ana Patrocínio
Descritores:DESPACHO INTERLOCUTÓRIO, IMPUGNAÇÃO CONJUNTAMENTE COM A DECISÃO FINAL, INDEFERIMENTO DE PRODUÇÃO DE PROVA TESTEMUNHAL, FUNDAMENTAÇÃO, REVERSÃO, CULPA
Sumário:I – No processo de oposição judicial compete ao juiz examinar se é legalmente permitida a produção da prova testemunhal oferecida pelas partes em face das normas que disciplinam a admissibilidade desse meio de prova, e, no caso afirmativo, aferir da relevância da factualidade alegada perante as várias soluções plausíveis para as questões de direito colocadas, só podendo dispensar essa prova no caso de concluir que ela é manifestamente impertinente, inútil ou desnecessária.

II – O tribunal só não deve realizar uma diligência instrutória requerida se a considerar inútil ou dilatória em despacho devidamente fundamentado.

III - O tribunal só dá provimento à impugnação das decisões interlocutórias, impugnadas conjuntamente com a decisão final nos termos do n.º 3 do artigo 644.º do CPC, quando a infracção cometida possa modificar aquela decisão ou quando, independentemente dela, o provimento tenha interesse para o recorrente – cfr. artigo 660.º do CPC. *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:H.
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Votação:Unanimidade
Decisão:Conceder provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de dever ser concedido provimento ao recurso.
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. Relatório

H., NIF (...), residente na Rua (…), (...), (...), interpôs recurso jurisdicional do despacho interlocutório do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, proferido em 27/05/2019, que decidiu não proceder à produção de prova testemunhal, e, bem assim, da sentença proferida em 26/11/2019, pelo mesmo Tribunal, e que julgou improcedente a oposição deduzida à execução fiscal n.º 3590201301028707 e apenso, revertida contra si e inicialmente instaurada à sociedade R., LDA., NIPC (...), para cobrança coerciva de dívidas de IVA, referente ao mês de Outubro de 2012, e IRS (retenções na fonte), do exercício de 2013, no montante global de €2.960,67.

No recurso que visa o despacho interlocutório, o Recorrente concluiu as suas alegações da seguinte forma:
“Impugna-se pelo presente, o despacho em sindicância que indeferiu a produção de prova testemunhal.
1- Os autos contêm matéria factual alegada que importa para uma boa e justa decisão, a produção da prova testemunhal arrolada.
2- No caso, atento os factos descritos, é impossível uma decisão justa sem ser permitido ao oponente afastar a presunção de culpa que sobre si impende.
3- Ao gerente revertido ora oponente, deve ser permitido provar, através da prova testemunhal (analista financeira, outrora trabalhadora da devedora originária) que não agiu com culpa,
4- O douto tribunal recorrido ao notificar expressamente o oponente para indicar os factos sobre os quais a testemunha deporia, efectuou igualmente um juízo de ponderação sobre a necessidade da produção da prova.
5- Juízo esse favorável à produção da mesma quando o douto tribunal recorrido em 21.04.2016 despacha no sentido de não proceder no imediato à marcação de data para inquirição das testemunhas indicadas “por indisponibilidade de agenda e redistribuição dos processos prioritários vindos da equipa especial dos processos superiores a 1 milhão de euros “, ordenando “os autos aguardem na unidade orgânica até fevereiro de 2017.”
6- A confiança e coerência legal foi assim violada.
7- A decisão ora proferida para além de violar o art. 20 da C.R.P. na sua vertente de tutela jurisdicional efectiva e proibição da indefesa viola igualmente o art. 613, n.º 3 do CPC, e art. 13, n.º 1 do CPPT; porquanto para além de útil a prova testemunhal arrolada é essencial à descoberta da verdade e boa decisão da causa.
Nestes termos e noutros que os Venerandos Desembargadores julguem mais pertinentes, deverão Vossas Excelências anular o despacho recorrido substituindo-o por outro ordene a produção de prova.”

O Recorrente terminou as suas alegações, concernentes ao recurso interposto da sentença, formulando as seguintes conclusões:
1- “Vem o presente recurso interposto da sentença proferida, não se conformando o recorrente com a matéria de facto provada, com a omissão de matéria que deveria constar dos factos provados e consequentemente com a conclusão de direito alcançada.
2- Bem assim não se pronuncia a sentença em crise sobre questões que devia conhecer.
3- Nos termos já invocados a rejeição da produção de prova testemunhal contamina a decisão proferida.
4- Da prova documental junta, devidamente analisada, deveriam ser julgados provados os ss. factos:
· O oponente sempre agiu diligentemente de forma a assegurar o cumprimento das obrigações.
· A empresa não tinha liquidez para pagar o valor em divida.
· A devedora originária sofreu forte redução de volume de negócios ao longo dos últimos anos.
· A redução do volume de negócios deveu-se a uma conjuntura económico-financeira adversa.
· Ocorreu baixa do volume de vendas e aumento dos custos de produção, apresentando-se difícil a manutenção doa valos pagos a nível de salários.
· O oponente tentou ajustar a sua estrutura de custos, nomeadamente ao nível de pessoal.
· Entre o ano de 2010 e 2012 o n.º de colaboradores passou de 12 para 9.
· O valor pago aos funcionários situava-se acima da média, cerca de 750,00€.
· Foram efetuadas tentativas de acordo com os funcionários, mormente para redução de salários.
· As mesmas não resultaram viáveis.
· O oponente tentou ainda diversificar os clientes da devedora originária.
· A devedora originária teve prejuízos em diversas encomendas.
· Vários clientes da devedora originária encerram portas.
· A executada tinha créditos sobre clientes seus em valor não inferior a 100.000,00€ euros.
· Créditos esses que após a insolvência das respectivas empresas resultaram incobráveis, entre outros: Insolvência n.º 3174/12.4TBVCT do 3.° Juízo Cível de Viana do Castelo; Insolvência n.º 415/12.1TBPVL da Secção Única do Tribunal Judicial de Póvoa de Lanhoso; Insolvência n.º 573/12.5TJVNF, do 3.° Juízo Cível de (...), PERE 2808/13.8TJVNF, do 1.° Juízo Cível de (...) e que veio a culminar na Insolvência n.º 1518/14.3TJVNF da 2.ª secção de comércio do Tribunal de (...); Proc. n.º 1345/13.5TBBCL do 1.° Juízo Cível do Tribunal de Barcelos; Insolvência proc. 2796/13.0TJVNF, do 4.° Juízo Cível de (...).
· Apenas sobre uma empresa a devedora originária ficou sem um crédito no valor de 86.401,64€ (oitenta e seis mil, quatrocentos e um euros e sessenta e quatro cêntimos).
· A empresa, devedora originária, não teve capacidade para suportar as perdas e deixou de ter liquidez para o cumprimento das suas obrigações, mormente a segurança social, fornecedores, trabalhadores e administração fiscal.
· Situação da qual, não obstante os esforços envidados, nunca viria a recuperar, atenta a resolução dos contratos de trabalho com fundamento em salários em atraso e que viria a culminar com insolvência da empresa.
· O oponente tudo fez para as pagar as dividas, todavia a empresa não tinha fundos para a sua liquidação.
· A insolvência da devedora originária foi fortuita.
5- A documentação junta deveria e impunha-se ser livremente apreciada pelo tribunal em conjugação com a prova testemunhal que houvesse de ser produzida.
6- A rejeição da produção de prova, com impossibilidade de o oponente afastar presunção de culpa é uma decisão injusta e inconstitucional.
7- Foram violados os art. 615, n.°1 c) e e) do C.P.C, art. 20 C.R.P. na sua vertente de tutela jurisdicional efectiva e proibição da indefesa viola igualmente o art. 613, n.º 3 do CPC, e art. 13, n.º 1 do CPPT;
Nestes termos e noutros que os Venerandos Desembargadores julguem mais pertinentes, apreciando o recurso anteriormente interposto contra a não admissão de prova testemunhal e do presente, deverão V. Excelências anular a sentença em crise, ordenando a produção de prova e, caso assim se entenda pelos poderes que agora se acham conferidos a esta Relação, desde já conjugando com os elementos e prova documental constante dos autos julgar o presente recurso procedente, imediatamente julgando procedente a oposição deduzida em 1.ª instância.
Assim se fazendo, Justiça!”
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A Recorrida não apresentou contra-alegações.
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O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de dever ser concedido provimento ao recurso.
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Com dispensa dos vistos legais, tendo-se obtido a concordância dos Meritíssimos Juízes-adjuntos, nos termos do artigo 657.º, n.º 4 do CPC; cumpre apreciar e decidir.
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II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa decidir se a decisão interlocutória errou sobre a não realização da diligência de inquirição de testemunhas; e, consequentemente, se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, quanto aos pressupostos da reversão, ao considerar responsável pelas dívidas exequendas o devedor subsidiário, averiguando se o Oponente se desincumbiu do ónus probatório em termos bastantes para afastar a sua responsabilidade subsidiária pelas dívidas exequendas.

III. Fundamentação
1. Matéria de facto

O despacho interlocutório ora em crise tem o teor que se reproduz:
“Notificado para o efeito veio o oponente indicar quais os factos a que pretendia que fosse inquirida a testemunha arrolada.
Sucede que, melhor compulsados os autos e atendendo à factualidade alegada, bem como à conformação da matéria de facto com as diversas soluções plausíveis de direito, verifica-se que a produção de prova testemunhal não se mostra relevante à boa decisão da causa.
Em consequência, decido não proceder à produção de prova testemunhal, porquanto tal constituiria diligência inútil e proibida [cfr. artigos 6.º, n.º 1, 130.º e 466.º, n.º1 todos do CPC, aplicável ex vi artigo 2.º, alínea e) do CPPT].
Notifique as partes deste despacho e para, querendo, apresentarem alegações no prazo de dez dias [cfr. artigo 120ºdo CPPT, aplicável ex vi artigo 211, n.º1 do CPPT].”

Na sentença prolatada em primeira instância foi proferida decisão da matéria de facto com o seguinte teor:
FACTOS PROVADOS
Julgo provados os seguintes factos relevantes para a decisão da causa:
1. Na Conservatória do Registo Comercial encontra-se registada a constituição da sociedade comercial R., LDA, NIPC (...), com o capital social de 249.400,00 €, da qual, desde 27/03/2006 constam registados como sócios, H., com uma quota de 211.990,00 € e J., com uma quota de 37.410,00 €, sendo a forma de obrigar com a intervenção do gerente H. - cfr. inscrição – Ap. 8/20060327 constante da certidão do registo comercial de fls. 13-16 do PEF apenso;
2. Em 17/04/2013 foi instaurado pelo Serviço de Finanças de (...)-2 o PEF nº 3590201301028707, contra a sociedade R., LDA, para cobrança coerciva de dívida provenientes de IVA referente ao mês de Outubro de 2012, com data limite de pagamento até 16/04/2013, no valor de 1.794,79 € - cfr. fls. 1 a 2, verso do PEF apenso;
3. Em 26/11/2013 foi instaurado pelo Serviço de Finanças de (...)-2 o PEF nº 3590201301100190, contra a sociedade R., LDA, para cobrança coerciva de dívida provenientes de IRS (retenções na fonte) referente ao exercício de 2013, com data limite de pagamento até 22/10/2013, no valor de 1.165,88 € - cfr. fls. 17 a 19 do PEF apenso;
4. Por sentença de 17/02/2014 proferida no processo nº 3077/13.5TJVNF, que correu termos no 1º Juízo dos Juízos de Competência Cível de (...), foi declarada a insolvência da sociedade R., LDA, a qual foi requerida por R. e M. - cfr. certidão do registo comercial de fls. 13-16 do PEF apenso e certidão judicial de fls. 69-123;
5. Do Relatório elaborado pelo administrado de insolvência ao abrigo do disposto no artigo 153º do CIRE, no âmbito do processo mencionado no ponto antecedente, consta entre o mais, o seguinte – cfr. documento nº 1 junto com a petição inicial:
“(…) A situação de insolvência da sociedade decorre essencialmente da manutenção de uma actividade deficitária, consequência da forte redução do seu volume de negócios ao longo dos últimos anos (…)
Como se pode constatar pelos números do quadro anterior, a sociedade insolvente desde pelo menos o exercício de 2010 que vem constantemente acumulando prejuízos, evidenciado uma actividade deficitária, onde o seu volume de negócios fica bastante aquém do necessário para suportar os custos fixo de funcionamento.
Verifica-se igualmente que o volume de negócios da sociedade tem vindo, desde pelo menos o exercício de 2010, a reduzir-se substancialmente, sendo que para o período compreendido entre 2010 e 2012 a redução é superior a 45% (mais de Euros 320.000,00).
A sociedade ao longo deste período não conseguiu adequar a sua estrutura de custos (…)”;
6. Por sentença de 20/08/2014 foi declarado o encerramento do processo de insolvência referida no ponto anterior, por insuficiência da massa insolvente para satisfazer as custas do processo e as demais dívidas da massa insolvente, o qual foi registado na Conservatória do Registo Comercial pela inscrição nº 8 – Ap. 3/20140825 - cfr. certidão do registo comercial de fls. 13-16 do PEF apenso;
7. Em 15/09/2014 foi declarado o encerramento da liquidação da sociedade R., LDA e cancelada a matrícula – cfr. inscrições 10 e 11, constantes da certidão do registo comercial de fls. 13-16 do PEF apenso;
8. O ora oponente foi notificado para exercer o direito de audição prévia sobre o projecto de reversão no âmbito dos PEF nº 3590201301028707 e apensos – facto não controvertido; cfr. fls. 3-7 do PEF apenso;
9. O oponente exerceu o direito de audição, através de requerimento remetido em 25/08/2014 ao órgão de execução fiscal, no qual alegou, em síntese a total ausência de culpa na eventual diminuição das garantias patrimoniais da devedora originária – cfr. fls. 3-7 do PEF apenso;
10. Em 23/09/2014, foi proferido pelo Chefe do Serviço de Finanças de (...)-2 “INFORMAÇÃO/FUNDAMENTO DE REVERSÃO”, no âmbito do PEF nº 3590201301028707 e apensos, do qual, entre o mais, o seguinte – cfr. fls. 8-10 do PEF apenso:
“(…) Para efeitos da instrução dos presentes autos, cumpre-me informar V. Ex.a com respeito à executada no âmbito da reversão acima referida, que:
1- Foi notificado H., NIF: (...), na qualidade de responsável subsidiário, para exercer o direito de audição prévia para efeitos de avaliação da prossecução ou não da reversão, esta decorrente do não pagamento voluntário dos impostos pelo devedor originário em sede de processo de execução fiscal e ainda por se ter constatado que o executado possui insuficientes bens para garantir o pagamento da dívida fiscal (art. 23º da LGT e nº 2 do art. 153º do CPPT).
2- Os agora revertidos exerceram o direito de audição, expondo fundamentos para a não efectivação da reversão e cujos teores resumidamente se reproduzem:
a) Que o projecto de reversão não observa ou respeita a figura do benefício da excussão prévia do património do devedor originário, considerando que não nos encontramos perante uma situação de insuficiência de bens do devedor originário;
b) Que, não foi por culpa dos gerentes que o património do devedor originário se tomou insuficiente;
3- Da análise da matéria de facto fundamentada no projecto de reversão, verifica-se que a executada é devedora, entre outros, dos impostos constantes dos documentos anexo, e cujas datas limite de pagamento ocorreram em:
PEFORIGEM DAQUANTIAANO DADATA DE
DÍVIDAEXEQUENDADÍVIDA/FACTOVENCIMENTO
CONSTITUTIVO
3590201301028707IVA1.794,79 €201316/04/2013
3590201301100190IRS1.165.88 €201322/10/2013
4- A sociedade foi declarada insolvente, no âmbito do Processo de Insolvência nº 3077/13.5TJVNF, em 21/02/2014, tendo a decisão transitado em julgado em 23/07/2014, face ao Despacho de qualificação;
5 - Foi proferida decisão de encerramento do processo de insolvência, em 20/08/2014, por insuficiência da massa, razão pela qual foi iniciado o Processo Administrativo de Liquidação nº 52/2014 o qual veio em 15/09/2014 a ser encerrado, tendo por consequência o Cancelamento da matrícula da sociedade desde a mesma data (conforme registo na certidão permanente da Conservatória do Registo Comercial);
Procedendo à análise dos factos e do direito aplicável, enquadrado na matéria de facto descrita:
(…)
7- Na presença desta estatuição legal, e no que respeita ao ónus da prova, verifica-se a sua distribuição entre e a Fazenda Pública e os responsáveis subsidiários tributários;
8- A responsabilidade prevista na alínea a) do nº 1 do artigo 24º ocorre quando, em qualquer dos casos, por culpa das pessoas com funções de administração ou gestão o património do devedor se tomou insuficiente para pagamento da dívida. A prova deste pressuposto da responsabilidade compete à administração fiscal.
9- A responsabilidade prevista na alínea b) do nº 1 do artigo 24º, ocorre quando a falta de pagamento é imputável às pessoas com funções de administração ou gestão. Compete a estas pessoas a prova de que essa falta de pagamento não lhes foi imputável.
10- Chamando à colação os fundamentos do projecto de reversão, esta verifica-se nos termos da alínea b) do nº 1 do artigo 24º, ou seja, nesta situação em que o prazo legal de pagamento ou entrega das dívidas tributárias terminou no período de exercício do cargo dos administradores, e porque se opera a inversão do ónus da prova, cabe-lhes demonstrar não terem tido culpa no incumprimento da obrigação tributária, e deste modo fica a Administração Tributária dispensada de efectuar a referida prova.
11- Ora, quanto à gerência de direito, conforme certidão da conservatória do registo comercial, importa dizer que desde Março de 2006 o gerente nomeado era H., (…) com a menção de que a forma de obrigar a sociedade: “com a intervenção do gerente H.”
12- O prazo limite de pagamento das dívidas do executado, agora objecto de reversão, ocorreu no ano de 2013, períodos de gerência dos sócios gerentes supra identificados; 13- Isto porque, e nos termos legais apresentados, importa verificar quem era o titular, de direito e de facto, da gerência no decurso do prazo de pagamento dos impostos.
(…)
15 – Assim, não apresentaram factos que possibilitem afastar a gerência de facto, ou provar não terem tido culpa no incumprimento da obrigação tributária, no período de pagamento dos impostos, objecto agora de reversão.
16 – Atendendo a que foram apreciados os factos fornecidos pelo reclamante, com recurso apenas às normas legais aplicáveis, não se verificando factos novos sujeitos a apreciação factual, susceptíveis de enquadramento legal diverso, deve ser dispensada a audiência dos interessados, nos termos instruídos pela Circular 13, de 08/07/1999, da Direcção de Serviços de Justiça Tributária.
Face ao exposto, reverte-se a execução fiscal contra os sócios gerentes H. (…), nos termos dos artigos 23º e 24º, nº 1, alínea b), ambos da Lei Geral Tributária. (…)”;
11. Em 26/09/2014 o oponente foi citado para a execução, através do ofício datado de 23/09/2014, denominado “CITAÇÃO (Reversão)”, do qual consta, designadamente, o seguinte – facto não controvertido; cfr. ofício e aviso de recepção a fls. 21-23 do PEF apenso:
“(…) OBJECTO E FUNÇÃO DO MANDADO DE CITAÇÃO
Pelo presente fica citado(a) de que é EXECUTADO(A) POR REVERSÃO, nos termos do artigo 160º do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT), na qualidade de Responsável Subsidiário para, no prazo de 30 (trinta) dias a contar desta citação, PAGAR a quantia exequenda de 2.960,67 EUR de que era devedor(a) o(a) executado(a) infra indicado(a), ficando ciente de que nos termos do nº 5 do artigo 23º da Lei Geral Tributária (LGT), se o pagamento se verificar no prazo acima referido não lhe serão exigidos juros de mora nem custas.
Mais, fica CITADO de que, no mesmo prazo, poderá requerer o PAGAMENTO EM PRESTAÇÕES, nos termos do artigo 196º do CPPT, e/ou a DAÇÃO EM PAGAMENTO, nos termos do artigo 201º do mesmo código, ou então deduzir OPOSIÇÃO JUDICIAL com base nos fundamentos prescritos no artigo 204º do CPPT.
Informa-se ainda que, nos termos do nº 4 do artigo 22º da LGT, a contar da data da citação, poderá apresentar RECLAMAÇÃO GRACIOSA ou deduzir IMPUGNAÇÃO JUDICIAL, com base nos fundamentos previstos no artigo 99º do CPPT, e os prazos estabelecidos nos artigos 70º e 102º do CPPT.
(…)
FUNDAMENTOS DA REVERSÃO
Inexistência ou insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal e responsáveis solidários, sem prejuízo do benefício da excussão (artº 23º/nº 2 da LGT):
1) Insuficiência de bens da devedora originária (artº 23/1 a 3 e 7 da LGT e 153º/1/2/b do CPPT), decorrente de situação líquida negativa (SLN) declarada pela devedora originária na última declaração referente à Informação Empresarial Simplificada (IES) e/ou em face de insolvência declarada pelo Tribunal. (…)”;
12. A presente oposição foi remetida via correio registado em 27/10/2014 ao Serviço de Finanças de (...)-2 – cfr. envelope a fls. 24.
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FACTOS NÃO PROVADOS
Os demais factos alegados pelo oponente constituem meras asserções e considerações pessoais ou conclusões de facto e/ou direito, pelo que, inexistem factos não provados com relevância para a decisão da causa.
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MOTIVAÇÃO
A convicção do Tribunal fundou-se no posicionamento das partes, assumido nos respectivos articulados e, na análise crítica dos documentos e informações oficiais juntos aos autos não impugnados, bem como no processo de execução fiscal, conforme indicado em cada um dos pontos do probatório.



2. O Direito

O Recorrente interpôs recurso da sentença que julgou improcedente a oposição por si intentada, enquanto responsável subsidiário, na execução fiscal movida a R., Lda., para cobrança coerciva de dívidas de IVA, referente a Outubro de 2012, e de IRS, relativo ao exercício de 2013; bem como da decisão interlocutória que considerou a requerida diligência de inquirição de testemunha inútil.
Alegou que a sentença recorrida enferma de nulidade, por omissão de pronúncia, e incorre em erro de julgamento, mormente quanto à decisão da matéria de facto, por omitir factualidade no elenco dos factos provados, matéria essa visada na requerida prova testemunhal, cuja produção lhe foi negada por despacho judicial de 27/05/2019, do qual recorreu oportunamente, impossibilitando o Recorrente de afastar a presunção de culpa na falta de pagamento das dívidas.
Comecemos pelo recurso interposto do despacho judicial interlocutório, que negou a produção de prova testemunhal.
Sustenta o Recorrente que o referido despacho enferma de erro de julgamento, nomeadamente, por ter dispensado a inquirição de testemunha que arrolou e que essa inquirição, sendo essencial à descoberta da verdade e boa decisão da causa, violou o previsto no artigo 13.º do CPPT.
Na verdade, neste despacho interlocutório, entendeu-se indeferir a produção de prova testemunhal, invocando-se, para tanto, a inutilidade de tal diligência para a boa decisão da causa.
Nesta conformidade, impõe-se sindicar a fundamentação do despacho recorrido, por forma a apurar se o indeferimento da produção de prova foi legal.
De harmonia com o disposto no artigo 13.º CPPT, aos juízes dos tribunais tributários incumbe a direcção e julgamento dos processos da sua jurisdição, devendo realizar ou ordenar as diligências que considerem úteis ao apuramento da verdade relativamente aos factos que lhes seja lícito conhecer.
Por sua parte, o artigo 114.º ex vi artigo 211.º, n.º 1 do mesmo diploma prevê que, não conhecendo logo do pedido, o juiz ordena as diligências de prova necessárias.
Porém, desses preceitos não decorre que o juiz esteja obrigado à realização de todas as provas que sejam requeridas pelas partes, antes o dever de realizar e ordenar as correspondentes diligências se deve limitar àquelas que o tribunal considere, no seu livre juízo de apreciação, como úteis ao apuramento da verdade.
Como entende Jorge Lopes de Sousa, no seu CPPT, anotado e comentado, 5.ª edição, na anotação 9 ao artigo 13.º, é o critério do juiz que prevalece no que concerne a determinar quais as diligências que são úteis para o apuramento da verdade, sendo inevitável em tal determinação uma componente subjectiva, ligada à convicção do juiz; o que não significa que a necessidade da realização das diligências não possa ser controlada objectivamente, em face da sua real necessidade para o apuramento da verdade, em sede de recurso (v. Jorge de Sousa, in CPPT anotado e comentado, páginas 168 e 169).
Mantém pertinência o decidido no Acórdão do STA, de 05/04/2000, no âmbito do processo n.º 024713:
“No processo judicial tributário vigora o princípio do inquisitório, o que significa que o Sr. Juiz não só pode, como também deve, realizar todas as diligências que considere úteis ao apuramento da verdade.
Deste modo, tendo sido sugerida a realização de uma diligência, o Sr. Juiz só não deve fazer se a considerar inútil ou dilatória em despacho devidamente fundamentado.”
Ora, analisando o pedido do Recorrente e o teor do despacho recorrido, ressalta que o tribunal recorrido dispensou a prova testemunhal por ser seu entendimento, se bem entendemos a motivação da decisão recorrida, que, mesmo atendendo às diversas soluções plausíveis de direito, considerando a factualidade alegada, a produção de prova testemunhal não se mostra relevante para a boa decisão da causa.
Nos termos do disposto no argo 115.º e seguintes do CPPT ex vi artigo 211.º, n.º 1 deste diploma, são admissíveis no processo tributário os meios gerais de prova, nomeadamente, a testemunhal, permitindo o artigo 113.º, n.º 1 do mesmo diploma que o juiz conheça de imediato o pedido se a questão for apenas de direito ou, sendo também de facto, o processo fornecer os elementos necessários.
Ora, in casu, é inequívoco que as principais questões que se colocam são essencialmente de facto, dado caber ao Oponente ilidir a presunção de culpa na insuficiência do património da devedora originária, bem como na falta de pagamento das dívidas em apreço, atendendo a que a reversão operou nos termos do disposto no artigo 204.º, n.º 1, alínea b) do CPPT, competindo-lhe invocar factos simples e concretos de onde, depois, o tribunal possa retirar ilações e concluir pela sua não responsabilidade, mobilizando toda a prova permitida legalmente com esse fito de ilisão da presunção de culpa – cfr. artigo 211.º, n.º 2 do CPPT.
Efectivamente, o Recorrente, na petição inicial, enunciou factualidade que, em seu entender, permite concluir pela ausência de culpa pelo não pagamento das dívidas da sociedade, juntando prova documental, além de ter arrolado uma testemunha.
“(…) O processo judicial tributário é, pelo menos desde a Lei Geral tributária, um processo de partes, pautado pelo princípio da legalidade, do contraditório e da igualdade de partes, devendo o tribunal decidir conforme os factos e as provas que lhe são apresentados dentro das regras processuais. E, por isso, o juiz só pode dispensar a fase de instrução dos autos " se a questão for apenas de direito ou, sendo também de facto, o processo fornecer os elementos necessários" (artigo 113° do CPPT), devendo, caso contrário, ordenar as diligências de prova necessárias, nomeadamente a testemunhal, em conformidade com o disposto nos artigos 114°, 115° n°1 e 119° do CPPT.
Assim, embora o tribunal tenha, em princípio, de admitir todos os meios de prova que as partes ofereçam - posto que em processo tributário de impugnação são, em regra, admitidos todos os meios de prova (artigo 115° do CPPT) - pode recusar a sua produção caso exista norma legal que limite ou proíba determinado meio de prova ou julgue que as provas oferecidas são manifestamente impertinentes, inúteis ou desnecessárias (…)” – cfr. Acórdão do STA, de 14/09/2011, proferido no âmbito do processo n.º 0215/11.
Em suma, compete ao juiz examinar, em cada processo judicial, se é legalmente permitida a produção dos meios de prova oferecidos pelas partes e, no caso afirmativo, aferir da necessidade da sua produção em face das questões colocadas, sabido que a instrução tem por objecto os factos invocados controvertidos ou de que oficiosamente o tribunal pode conhecer e relevantes para o exame e decisão, tendo em conta as várias soluções plausíveis da questão de direito – cfr. artigo 99.º, n.º 1 da LGT.
Como já adiantámos, a fim de se poder sindicar da bondade da decisão de não produzir prova testemunhal, haverá que analisar a fundamentação do despacho interlocutório em causa e se o mesmo convenceu as partes.
Ora, podemos ler na decisão recorrida que a diligência é inútil porque a produção de prova testemunhal não é relevante à boa decisão da causa. Porém, não se concretiza o motivo por que os específicos factos alegados não relevam para a decisão da causa, principalmente quando todos parecem ir no sentido da tentativa de demonstração da ausência de culpa do responsável subsidiário. A verdade é que tal motivação vaga e conclusiva poderia ser utilizada em qualquer outro processo, impossibilitando a percepção da razão concreta quando apresentada às partes. E julgamos que terá sido por este motivo que o Recorrente não ficou convencido e se insurgiu contra a decisão através do recurso em análise.
A verdade é que apenas na sentença recorrida se alude a uma invocação genérica de factos, considerando-os “conclusivos, vagos e não concretizados”. Todavia, a alegação constante da petição de oposição é analisada, concluindo-se na sentença recorrida que “(…) o oponente não criou a convicção da realidade dos factos que permita concluir que a sua gerência não teve qualquer relação causal com a insuficiência do património social para a satisfação dos créditos”.
Não considerou, porém, nesse seu juízo toda a prova arrolada pelo oponente, aqui Recorrente, dispensando a audição da testemunha, apesar de ter sido indicada ao Tribunal “a quo” a matéria sobre a qual deveria depor e manifestado o propósito de não prescindir da diligência.
Em algumas passagens a sentença recorrida é inequívoca esclarecendo que o oponente não delimitou em concreto as acções, medidas e diligências, no tempo e no espaço e, por esse motivo, os factos alegados não são idóneos para efectivar a prova que lhe competia por força da presunção. Impunha-se que demonstrasse que medidas concretas foram por si tomadas no sentido de viabilizar a empresa e de cumprir com as obrigações tributárias. Acrescentando que em nenhum momento o oponente alega que tais valores de imposto não lhe foram entregues. Mas, noutras passagens, o acento tónico aponta para a falta de demonstração e prova – não provou o oponente factos demonstrativos de que o desaparecimento do património social não se ficou a dever à sua gestão, nem tendo sequer provado que haja desenvolvido esforços e empregue o melhor do seu saber para acautelar o pagamento das dívidas em apreço; o esforço probatório desenvolvido não foi suficiente para ilidir a presunção de culpa.
Ora, recaindo sobre o oponente o ónus da prova, parece precipitado o juízo formulado na sentença quanto à culpa, por se lhe ter cerceado a possibilidade de esgotar toda a prova oferecida.
No caso vertente, o julgador, no despacho interlocutório, parece ter apreciado a desnecessidade da produção de prova testemunhal, antecipando um juízo que só após aquela produção de prova podia e devia ter realizado, ao entender que os autos já continham os elementos necessários à decisão.
Acontece que veio a exarar-se na sentença recorrida que o oponente "não apresentou qualquer prova que corrobore a falta de legitimidade por si alegada".
Esta afirmação permite que o Recorrente sustente que lhe foi negado o direito à produção de prova e que o resultado final poderia ser diferente se o Tribunal a conhecesse.
Na medida em que o despacho interlocutório não fundamenta devidamente a razão para rejeitar o requerimento de produção de prova testemunhal formulado pelo oponente, aqui Recorrente, não se reportando a qualquer circunstância ou vicissitude do caso concreto, é forçoso concluir pela sua ilegalidade, na medida em que não é compreensível a inutilidade dessa produção de prova. Deveria o tribunal a quo ter-se pronunciado especificamente sobre a pertinência e utilidade da inquirição da testemunha, e, na eventualidade de prescindir desta inquirição, explicar a motivação subjacente, ao abrigo do disposto no artigo 13.º do CPPT e 99.º da LGT. O que não foi efectuado com a amplitude necessária.
Face ao exposto, o recurso interlocutório merece provimento, e, por conseguinte, fica prejudicada a decisão dos demais fundamentos desse recurso, nos termos do disposto no artigo 608.º, n.º 2 ex vi artigo 663.º, n.º 2, ambos do CPC.

Relembra-se que o tribunal só dá provimento à impugnação das decisões interlocutórias, impugnadas conjuntamente com a decisão final nos termos do n.º 3 do artigo 644.º do CPC, quando a infracção cometida possa modificar aquela decisão ou quando, independentemente dela, o provimento tenha interesse para o recorrente – cfr. artigo 660.º do CPC.
Vejamos.
Não se apresenta evidente que a realização da inquirição da testemunha possa modificar a sentença recorrida.
No recurso da decisão final o Recorrente aponta vinte factos que deveriam ter sido julgados provados e sobre os quais o tribunal recorrido não tomou posição. Ou melhor, os mesmos não constam dos factos apurados, esclarecendo a decisão da matéria de facto que os demais factos alegados pelo oponente constituem meras asserções e considerações pessoais ou conclusões de facto e/ou direito, concluindo inexistirem factos não provados com relevância para a decisão da causa.
É verdade que a grande maioria dos factos invocados na petição de oposição são genéricos, faltando a necessária concretização das situações alegadas. Noutros casos, estamos perante juízos de valor e conclusões (que se retirariam de factos simples, cuja ausência é notória). O facto de a devedora originária ter sofrido uma forte redução de volume de negócios ao longo dos últimos anos, tal conclusão já resultará da matéria vertida no ponto 5 do probatório.
Ainda assim, observamos factos que não constam do probatório nem foram levados aos factos não provados, como por exemplo, entre o ano de 2010 e 2012 o n.º de colaboradores passou de 12 para 9, o valor pago aos funcionários situava-se em cerca de €750,00, foram efectuadas tentativas de acordo com os funcionários, mormente para redução de salários, as mesmas não resultaram viáveis, a executada tinha créditos sobre clientes seus em valor não inferior a 100.000,00€ euros, créditos esses que após a insolvência das respectivas empresas resultaram incobráveis, entre outros: Insolvência n.º 3174/12.4TBVCT do 3.° Juízo Cível de Viana do Castelo; Insolvência n.º 415/12.1TBPVL da Secção Única do Tribunal Judicial de Póvoa de Lanhoso; Insolvência n.º 573/12.5TJVNF, do 3.° Juízo Cível de (...), PERE 2808/13.8TJVNF, do 1.° Juízo Cível de (...) e que veio a culminar na Insolvência n.º 1518/14.3TJVNF da 2.ª secção de comércio do Tribunal de (...); Proc. n.º 1345/13.5TBBCL do 1.° Juízo Cível do Tribunal de Barcelos; Insolvência proc. 2796/13.0TJVNF, do 4.° Juízo Cível de (...).
O enquadramento jurídico que foi realizado na sentença recorrida parece afigurar-se correcto e legal, pois, no domínio da vigência da LGT, para afastar a responsabilidade subsidiária pelas dívidas de impostos cujo termo do prazo para pagamento ou entrega terminou durante o período da sua administração, é necessária a demonstração de que não é imputável aos gerentes ou administradores das sociedades a falta de pagamento ou de entrega do imposto (artigo 24.º, n.º 1, alínea b), da LGT).
Assim, sendo as dívidas provenientes de IVA e de IRS (retenções na fonte), ao gerente que exercia funções na data em que deveria ter sido entregue o imposto não basta, em sede de oposição à execução fiscal, alegar que a empresa atravessava dificuldades económicas provocadas por motivos exógenos, que ele se esforçou por ultrapassar, e que foi um gestor diligente. Haverá, isso sim, que demonstrar que a falta desse pagamento não lhe foi imputável, o que passa pela demonstração da falta de fundos da sociedade originária devedora para efectuar o pagamento e que tal falta se não deve a qualquer omissão ou comportamento censuráveis do gestor.
O oponente alegou tudo ter feito para pagar as dívidas, mas que a empresa não tinha fundos para a sua liquidação. Contudo, em nenhum momento o oponente invocou que os valores de imposto, designadamente do IVA, não lhe foram entregues.
Tudo isto para concluir que as deficiências no processo se encontram, essencialmente, ao nível da alegação e que, por esse motivo, a produção da prova testemunhal desempenhará um papel menos relevante na modificação da decisão final, não obstante a importância da articulação de todos os meios probatórios.
No entanto, é evidente que o provimento deste despacho interlocutório tem interesse para o Recorrente, já que, na sua óptica, a inquirição da testemunha é essencial para alcançar o cabal esclarecimento das circunstâncias em que exerceu a gerência da devedora originária e de toda a sua actuação diligente.
Este tribunal de recurso poderá aferir, no contexto dos autos, como já foi adiantando, a sugestão de inquirição de testemunhas, ponderar se a diligência solicitada pelo oponente é útil para o apuramento dos factos e se os mesmos poderão ter influência na decisão do mérito da causa, de acordo com as várias soluções plausíveis de direito.
Não há dúvida que a prova testemunhal poderá ser produzida relativamente aos factos que destacámos supra, principalmente em concatenação com a restante prova documental ínsita nos autos e, considerando as várias soluções plausíveis de direito, possivelmente influenciará a decisão do mérito da causa.
Na verdade, independentemente do eventual apuramento da verdade material poder vir a revelar-se favorável ou não ao Recorrente, em primeira linha, estando em causa uma decisão que lhe é desfavorável, sempre o provimento do recurso interlocutório lhe interessa ostensivamente; podendo ou não, em segunda linha, reflectir-se em modificação da sentença recorrida.
E encontramos este interesse também na circunstância de o despacho interlocutório ser revogado, implicando a anulação de todo o processado posterior à instrução, o que inclui a sentença recorrida. Isto é, compulsada a petição de oposição, que tem subjacente não estarem reunidos os pressupostos para a reversão, por ilegitimidade do Oponente, ressalta a importância da hipótese de a devedora originária não ter sido devidamente citada nas duas execuções fiscais em apreço para pagar a dívida exequenda antes da decisão de reversão.
Efectivamente, o Oponente alerta para o facto de a sede da devedora originária nunca ter sido na Av. (…), em (…), mas sim em (…). Afirma desconhecer se contra a devedora originária correu processo executivo e se foram efectuadas citações/notificações na referida morada – cfr. artigo 3.º e 4.º da petição de oposição.
O certo é que a maioria dos factos constantes do processo de execução fiscal são de conhecimento oficioso, mas a certidão do mesmo, emitida e apensa aos autos, revela grande incompletude. Verifica-se que uma das certidões de dívida identifica a devedora originária com sede em (…), (...), mas a outra certidão de dívida indica a sede em (…), na mencionada Av. (...). Não existe qualquer cópia da citação da devedora originária, nem de outros actos que não a audição prévia à reversão do revertido, a respectiva notificação, o despacho de reversão e a respectiva citação do revertido.
Em face da invocação na petição inicial, importará apurar se o procedimento adoptado pelo órgão de execução fiscal viola o disposto no n.º 2 do artigo 23.º da LGT e no artigo 153.º, n.º 2, alínea b) do CPPT, porquanto apenas se permite o início do procedimento de reversão depois de a executada originária ser chamada à execução fiscal, de lhe ser dada a possibilidade de pagamento da dívida exequenda e, na sua falta, realizar-se-á a penhora dos seus bens – cfr. artigo 215.º, n.º 1 do CPPT. Se em 23/09/2014, data da decisão de reversão, nenhum destes actos tiver ocorrido (que não constam da certidão do processo de execução fiscal apensa), o acto de reversão será ilegal.
Nesta conformidade, a retoma da fase de instrução dos autos apresenta-se do total interesse do Recorrente, pois, além da inquirição da testemunha (que também está indicada para responder a esta matéria – cfr. fls. 153 dos autos), impor-se-á carrear para os autos o processo de execução fiscal integral (ou sua cópia autenticada completa), para dilucidar se a devedora originária foi chamada ao processo executivo para pagar a dívida exequenda antes da prolação do despacho de reversão.
Não se podendo, pois, afirmar, como se afirmou no despacho impugnado, que a produção da prova testemunhal é inútil, nem se podendo afiançar que a inquirição da testemunha não tem interesse para a boa decisão da causa, impõe-se revogar esse despacho, o qual terá de ser substituído por outro que admita a produção da prova testemunhal oferecida, com a consequente anulação de todo o processado posterior à fase de instrução (que cumpre completar também com a remessa dos elementos em falta no processo de execução fiscal), seguindo-se, depois, os posteriores trâmites processuais e a prolação de sentença.
Termos em que se reitera conceder provimento ao recurso do despacho interlocutório, ficando, assim, prejudicado o conhecimento do recurso interposto da sentença.

Conclusões/Sumário

I – No processo de oposição judicial compete ao juiz examinar se é legalmente permitida a produção da prova testemunhal oferecida pelas partes em face das normas que disciplinam a admissibilidade desse meio de prova, e, no caso afirmativo, aferir da relevância da factualidade alegada perante as várias soluções plausíveis para as questões de direito colocadas, só podendo dispensar essa prova no caso de concluir que ela é manifestamente impertinente, inútil ou desnecessária.
II – O tribunal só não deve realizar uma diligência instrutória requerida se a considerar inútil ou dilatória em despacho devidamente fundamentado.
III - O tribunal só dá provimento à impugnação das decisões interlocutórias, impugnadas conjuntamente com a decisão final nos termos do n.º 3 do artigo 644.º do CPC, quando a infracção cometida possa modificar aquela decisão ou quando, independentemente dela, o provimento tenha interesse para o recorrente – cfr. artigo 660.º do CPC.

IV. Decisão

Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte:
conceder provimento ao recurso interposto do despacho interlocutório, revogando-o e anulando todos os actos subsequentes com ele incompatíveis;
● julgar prejudicado o conhecimento do recurso interposto relativamente à decisão final;
● ordenar a remessa do processo ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, a fim de se proceder à diligência instrutória requerida (inquirição de testemunha) e outras consideradas adequadas conforme indicado supra, e, após, prosseguirem os ulteriores termos se a isso nada mais obstar.

Custas a cargo da Recorrida, que não incluem a taxa de justiça, uma vez que não contra-alegou.

Porto, 04 de Junho de 2020



Ana Patrocínio
Cristina Travassos Bento
Paulo Ferreira de Magalhães