Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00731/09.0BEPNF
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:05/24/2012
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Irene Isabel Gomes das Neves
Descritores:FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO DO ACTO DE LIQUIDAÇÃO
Sumário:I - A decisão do procedimento tributário enquanto ato definidor da posição da administração tributária perante os particulares deve obedecer aos requisitos gerais do ato administrativo (art. 123.º do Código do Procedimento Administrativo (CPA)), no âmbito do direito tributário, tal exigência de fundamentação dimana diretamente da norma do art.º 77.º da LGT.
II - A fundamentação tem que ser expressa, clara, suficiente e congruente.
III - A fundamentação de um ato de liquidação de IVA deve ser o esteio, o suporte, por que foi efetuada aquela concreta liquidação e não qualquer uma outra, de molde a permitir ao contribuinte apreender os concretos factos donde ela emerge e poder determinar-se pela sua aceitação ou impugná-la
IV - Está suficientemente fundamentado o ato de liquidação adicional se as conclusões do relatório da fiscalização esclarecem, minimamente, o contribuinte, que dele foi notificado, das razões de facto e de direito que levaram a Administração Fiscal a liquidar o imposto em causa.*
* Sumário elaborado pelo Relator
Recorrente:P..., Lda.
Recorrido 1:Fazenda Pública
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
I - RELATÓRIO
P…, Ld.ª, pessoa coletiva n.º 5…, com sede na Rua…, Valongo, [doravante designada impugnante], deduziu impugnação judicial contra as liquidações adicionais de IVA do exercício de 2001 e respetivos juros compensatórios, no valor global de 7.286,88 €.
No Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel foi proferida sentença que julgou totalmente improcedente a impugnação, decisão com que a impugnante não se conformou, tendo interposto o presente recurso jurisdicional.
Alegou, tendo concluído da seguinte forma:
1. O Meritíssimo Juiz recorrido errou ao não considerar a fundamentação das liquidações impugnadas contraditória e obscura.
2. É contraditória e obscura a fundamentação de facto dos atos de liquidação que simultaneamente considera uma operação como simulada e real.
3. É contraditória e obscura a fundamentação de direito dos atos de liquidação que simultaneamente subsume a factualidade considerada no n.º 3 e no n,º 4 do art. 19º do CIVA.
4. Face à contradição e obscuridade, Meritíssimo Juiz recorrido deveria ter anulado os atos de liquidação impugnados, nos termos do disposto no art. 77º, n.º 1, do Código de Procedimento e Processo Tributário, no art. 123º, n.º 1, al. d), no art. 124º, no art. 125º, n.º 1 e n.º 2 e no art. 135º, do Código do Procedimento Administrativo.
5. A sentença recorrida fundamentou-se em factos, tendo-se servido dos mesmos, que deu como provados, que não foram alegados pelas partes;
6. Tais factos são os constantes das alíneas B), C), D), E), F), G), H), I), K), L), M), N), O), P), W), X), Y, AA), BB) e MM), dos factos provados;
7. Ao servir-se de tais factos sentença recorrida violou o disposto no art. 264º, n.º 1 e n.º 2 e no art. 664º, do Código de Processo Civil.
8. Sem prejuízo da sua falta de alegação, a matéria constante de K), L), N), O) e W) é matéria conclusiva;
9. As conclusões constantes destas alíneas foram tiradas no Relatório de Inspeção Tributária e os factos conducentes às mesmas não foram alegados nem sujeitos a contraditório e instrução nos autos;
10. A resposta do Tribunal sobre estas conclusões deve-se ter como não escrita por não versar sobre factos, por aplicação analógica do n.º 4, do art. 646º, do Código de Processo Civil;
11. O tribunal recorrido ao tomar em consideração as conclusões da AT sem discussão dos factos conducentes às mesmas violou o disposto no art. 3º do Código de Processo Civil.
12. A matéria constante da alínea CC) dos factos provados e dos pontos 5) a 9) e 11) a 12) dos factos não provados foi incorretamente julgada;
13. Na alínea CC), deveria ter sido dado como provado que a Impugnante comprou os artigos de ourivesaria descriminados nas faturas em causa nos autos, anexas ao Relatório de Inspeção Tributária, apesar dos mesmos não terem sido vendidos por quem figura como emitente das faturas;
14. A matéria constante dos pontos 5) a 9) e 11) a 12) dos factos não provados, deveria ter sido dada como provada;
15. Tal é o que resulta da prova produzida designadamente do Relatório de Inspeção Tributária, na pág. 12, 1º parágrafo; do Relatório de Inspeção Tributária, na pág. 13, 1º parágrafo; do Relatório de Inspeção Tributária, pág. 13, último parágrafo; da cópia do cheque do montante de 1.845.247$00, junto com o Relatório de Inspeção Tributária; do depoimento da testemunha C..., nas passagens gravadas de 1:13:35 a 1:13:45, de 1:18:20 a 1:19:10, 1:28:00 a 1:29:50 e de 1:36:00 a 1:37:40 que a própria sentença recorrida reconheceu, na pág. 12, 5º e 6º parágrafos, na pág. 16, penúltimo e último parágrafos e na pág. 17, penúltimo e último parágrafos.
Termos em que V. Exas. revogando a decisão recorrida farão Justiça.
Não houve contra-alegações.
Neste Tribunal, o Digno Magistrado do Ministério Público emitiu douto parecer onde analisou detalhadamente todos os fundamentos do recurso e concluiu que o recurso não merece provimento.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
II - Questões a decidir:
ü Saber se deve ser revogada a decisão da matéria de facto, por terem sido dados como provados factos que não foram alegados e por terem sido inseridas na matéria de facto meras conclusões;
ü Saber se o Tribunal “a quo” incorreu em erro de julgamento da matéria de facto, que quanto ao facto dado como provado na alínea “CC” quer quanto à matéria de facto não provada, inserida nos pontos “5)”, “6)”, “7)”, “8)”, “9)” , “11)” e “12)”;
ü Saber se o Tribunal “a quo” incorreu em erro de julgamento da matéria de direito ao não concluir que é contraditória e obscura a fundamentação de facto e de direito dos atos de liquidação, nomeadamente ao subsumirem a factualidade considerada no n.º 3 e no n,º 4 do art. 19º do CIVA simultaneamente.
III - FUNDAMENTAÇÃO
1. De facto
1.1. Matéria de facto dada como provada na 1ª instância:
A) Pela ordem de serviço n.º OI 200503956, a impugnante foi sujeita a um procedimento externo de inspeção parcial ao IRC e IVA do exercício de 2001, com início em 10/8/2005 e termo em 11/8/2005 (fls. 12 do apenso).
B) A impugnante está coletada desde 30/4/1996, data em que iniciou a atividade com o CAE 36222 – Fabricação de artigos de joalharia e de outros de ourivesaria (fls. 120 do apenso).
C) A impugnante está enquadrada no regime geral de tributação em IRC e no regime normal de periodicidade mensal de IVA e cumpriu as suas obrigações declarativas nos exercícios de 2001 a 2004 (fls. 12 e 13 do apenso).
D) A ação inspetiva enquadrou-se na ação especial a operadores do setor dos metais precisos, procedendo-se a uma análise dos movimentos, em termos de peso, dos metais preciosos efetuados pela impugnante no ano de 2001 (fls. 13 do apenso).
E) No ano de 2002 a impugnante vendeu 186.872,00 gramas de produtos em ouro toque 800 (fls. 14 do apenso).
F) Nesse ano a impugnante contrastou 177.210,00 gramas de ouro toque 800 (fls. 14 do apenso).
G) A diferença entre os produtos vendidos e os contrastados, 9.662,00 gramas de ouro toque 800, constavam na existência inicial de produtos (fls. 14 do apenso).
H) No exercício de 2001, a impugnante declarou vendas no valor de 2.012.777,00 €, um custo das mercadorias vendidas e matérias consumidas de 1.705.157,00 € e um lucro tributável de 16.531,00 € (fls. 14 do apenso).
I) No exercício de 2001, a impugnante teve uma margem bruta de 15,28%, a que corresponde uma rentabilidade fiscal de 0,82%, quando a média nacional foi de, respetivamente, 31,34% e 1,74%, o que representa um desvio de -16,06% e de -0,92% (fls. 14 do apenso).
J) A impugnante tinha contabilizado na sua contabilidade e deduzido o IVA das seguintes faturas de A..., contribuinte fiscal n.º 1… (fls. 16 do apenso):
Documento
Número
Data
Valor
IVA
Valor com IVA
Fatura1.034
17/1/2001
10.038,67 €
1.706.57 €
11.745,24 €
Fatura1.045
18/9/2001
7.866,71 €
1.337,34 €
9.204,05 €
Fatura1.048
1/10/2001
19.571,48 €
3.327,15 €
22.898,63 €
Fatura1.050
22/10/2001
8.461,37 €
1.438,43 €
9.899,80 €
Total
45.938,23 €
7.809,49 €
53.747,72 €
K) Na ação inspetiva realizada a coberto da ordem de serviço n.º OI200400006, concluída em 9/6/2004, conclui-se que A... seria um dos intervenientes numa fraude de IVA, pela não entrega dos montantes liquidados que eram posteriormente deduzidos pelos utilizadores das suas faturas (fls. 16 do apenso).
L) A administração tributária concluiu também que A... não exerceu a atividade, fundamentada nos seguintes factos: (1) A... não tinha instalações para a fabricação de artigos em ouro, já que apenas ocupou a oficina, que indicou aquando da sua inscrição na contrastaria, durante 3 ou 4 dias; (2) A... não tinha capacidade produtiva para a fabricação de artigos em ouro, já que não tinha nem máquinas nem empregados; (3) ele declarou ter contrastado 173 Kg de ouro em 2001 e 93 Kg em 2002, sendo que a fabricação de artigos com esses pesos, requer uma capacidade produtiva significativa, nomeadamente uma oficina, máquinas e empregados, o que A... não tinha; (4) apesar de ter declarado que contrastou 266 Kg apenas se apuraram compras de 36 Kg de ouro (fls. 16 e 17 do apenso).
M) Em todo esse processo as intervenções A... foram muito raras: ao longo dos dois anos em que contrastou artigos nunca se deslocou à contrastaria, tendo sempre sido outra pessoa a fazê-lo; o fornecedor de ouro de A..., referiu que este apenas se deslocou à sua empresa aquando da primeira compra de ouro, tendo posteriormente sido outras pessoas a levantar o ouro; o gerente da impugnante afirmou não conhecer A..., tendo negociado com F...; a mãe de A... afirma que à data destas operações comerciais, o seu filho encontrava-se no estrangeiro e que a letra que consta das faturas não é a dele; e também referiu que o seu filho nunca foi fabricante de ourivesaria, mas apenas um mero cravador de pedras em artigos de ourivesaria (fls. 17 do apenso).
N) A administração tributária concluiu que A... não exerceu qualquer atividade de fabricação de artigos de ourivesaria, apenas tendo permitido que o seu nome fosse utilizado por terceiros para obtenção de benefícios uma vez que sabiam que este não cumpriria as suas obrigações fiscais; permitiu também que o seu nome fosse utilizado para adquirir ouro que depois de transformado terá sido vendido sem emissão da respetiva fatura ou com faturas de A... fugindo assim ao pagamento do IVA; e permitiu ainda que na contrastaria o seu nome fosse utilizado para contrastar artigos fabricados por outras pessoas, evitando assim contrastar em seu nome, o que possibilita a sua posterior venda sem liquidação do respetivo lVA (fls. 17 do apenso).
O) A impugnante não possui comprovativos do pagamento das faturas de A..., já que apenas emitiu um cheque de 1.845.247$00 (9.204,05 €), ou seja, cerca de 20% do valor total das faturas (fls. 18 do apenso).
P) Esse cheque no montante de 1.845.247$00, não foi levantado nem depositado por A... (fls. 18 do apenso).
Q) A administração tributária considerou não dedutível o IVA constante das faturas emitidas em nome de A..., por não titularem negócios reais, constando da fundamentação que “Assim, ao abrigo dos n.°s 3 e 4 do artigo 19° do Código do Imposto sobre o valor acrescentado (CIVA), não é dedutível o IVA constante das faturas de A..., já que as faturas não titulam negócios reais, já que ficou demonstrado que A... nunca realizou estas transações, tratando-se, por isso, de negócios simulados e porque este também não dispunha de adequada estrutura empresarial para exercer a atividade de ourives. ” (fls. 18 do apenso).
R) E procedeu às correções aritméticas e apurou um IVA em falta, indevidamente deduzido, no ano de 2001 no valor de 7.809,49 €, sendo 1.706,57 € no mês de janeiro, 1.337,34 € no mês de setembro e 4.765,58 € no mês de outubro (fls. 9, 10 e 18 do apenso).
S) Em consequência procedeu à liquidação adicional do IVA e respetivos juros moratórios documentados de fls. 45 a 50 dos autos que aqui se dão por reproduzidas.
T) As liquidações adicionais de fls. 45 e 46 foram anuladas pela decisão da reclamação graciosa (fls. 101 a 104, 118 e 119 do apenso).
U) Por aqueles motivos a administração tributária também considerou que o valor dessas faturas não pode ser considerado custo para a impugnante, para efeitos do apuramento do lucro tributável do exercício de 2001 (fls. 18 do apenso).
V) Em consequência foi determinada a seguinte correção da conta 61 – Custo das Mercadorias Vendidas e Matérias Consumidas (CMVMC), do ano de 2001 (fls. 19 do apenso):
Apuramento do Custo das Mercadorias Vendidas
MercadoriasDeclaradoCorreçãoCorrigido
Existência inicial1948.020,31 €0,00 €948.020,31 €
Compras21.687.4087,90 €-45.938,23 €1.641.470,67 €
Regularizações30,00 €0,00 €0,00 €
Existência final4884.334,30 €0,00 €884.334,30 €
CMVMC5=1+2+3-41.751.094,91 €-45.938,23 €1.705.156,68 €
W) O custo das mercadorias vendidas de 2001, encontrava-se sobrevalorizado no montante de 45.938,23 €, devido à consideração, no apuramento do lucro tributável, dos valores respeitantes às faturas emitidas em nome de A... (fls. 19 do apenso).
X) A impugnante nos anos de 2001 e 2002, com 8 funcionários produziu 145 Kg de artigos em ouro (fls. 22 do apenso).
Y) A caligrafia das faturas n.ºs 1034 e 1045 emitidas em nome de A... é diferente da caligrafia das faturas n.ºs 1048 e 1050 (fls. 36 a 39 do apenso).
Z) A impugnante dispõe apenas de recibos das faturas n.ºs 1045, 1048 e 1050 (fls. 40 e 41 do apenso).
AA) M..., gerente da impugnante, declarou que as faturas em causa nestes autos e os respetivos artefactos foram entregues por F..., sócio gerente da Ourivesaria T..., no Marco de Canavezes (fls. 42 do apenso).
BB) A fatura n.º 1045, no valor de 1.845.247$00 está datada de 18/9/2001, o recibo dessa fatura está datado de 6/11/2001 e o cheque no mesmo valor, emitido pela impugnante à ordem de A... está datado de 9/11/2001 (fls. 37, 41 e 44 do apenso).
CC) No decurso do ano de 2001, a impugnante comprou artigos de ourivesaria de valor equivalente aos artigos discriminados nas faturas supra referidas, anexas ao Relatório de Inspeção Tributária (fls. 15 e testemunha C...).
DD) E destinou-os à sua atividade económica, designadamente, à revenda (testemunha H...).
EE) A impugnante, no exercício da sua atividade económica, vendeu a maior parte dos artigos em causa, realizando ganhos e proveitos, os quais foram sujeitos a imposto (testemunha H...).
FF) Alguns desses artigos não foram vendidos (testemunha H...).
GG) A impugnante ainda guarda na sua posse alguns dos artefactos constantes das faturas emitidas em nome de A... (testemunha H...).
HH) Esses artigos encontram-se marcados com o punção de A... (testemunha H...).
II) A utilização de um punção é obrigatória e a sua marca é colocada nos objetos pelo fabricante dos mesmos identificando-o como tal (fls. 54 e testemunha H...).
JJ) Foi a Contrastaria do Porto, entidade pública com esta competência, quem conferiu ao A... o direito a utilizar uma marca identificativa (fls. 54).
KK) A atribuição do punção, pela Contrastaria, é feita após esta se certificar da existência de uma oficina capaz para a produção de artefactos de ourivesaria (fls. 55).
LL) Em 2001 era usual fazer pagamentos em dinheiro e por endosso de cheques (testemunhas H... e C...).
MM) F... não recebeu remunerações ou comissões de A... (testemunha C...).
NN) O cheque emitido pela impugnante à ordem de A..., no valor de 1.845.247$00, foi endossado (fls. 44 do apenso).
OO) A fundamentação das liquidações adicionais do IVA consta das alíneas J) a Q).
PP) A impugnante foi notificada do relatório final da inspeção tributária em 30/9/2005 (fls. 91 a 93 do apenso).
QQ) A impugnante foi notificada das liquidações impugnadas em 28/11/2005, por carta registada (fls. artigo 98.º da petição inicial – fls. 17).
Matéria de facto não provada:
1) As operações em causa não foram simuladas, foram reais, sendo reais os preços constantes das faturas.
2) No decurso do ano de 2001, a impugnante foi visitada, nas suas instalações, por um indivíduo de nome F....
3) F... apresentou-se como vendedor de artigos de ourivesaria produzidos pela firma A..., agindo em nome e por conta desta firma.
4) E exibiu à impugnante, na pessoa do seu sócio-gerente, e de um trabalhador os artigos de ourivesaria da firma que representava, propondo à impugnante que os comprasse.
5) A impugnante, como faz em todos os casos, após observação dos produtos exibidos, escolheu aqueles que lhe interessavam e procedeu à sua compra.
6) Esta situação ocorreu por quatro vezes, designadamente em 17/01/2001, 18/09/2001, 10/10/2001 e 22/10/2001.
7) Nestas datas, a impugnante procedeu à compra dos artigos de ourivesaria descritos nas faturas n.ºs 1034, 1045, 1048 e 1050 de “A...”, as quais se encontram anexadas ao Relatório de Inspeção Tributária.
8) Os artigos adquiridos pela Impugnante ao “A...’ destinavam-se a ser revendidos por aquela no âmbito da sua atividade.
9) A impugnante recebeu esses artigos e pagou o preço devido pelos mesmos.
10) O vendedor de A... emitiu e entregou as faturas correspondentes às compras efetuadas pela impugnante e contra o pagamento de cada uma das faturas entregou os competentes recibos.
11) A fatura n.º 1.045, de 18/09/2001, no valor total de 1.845.247$00 (9.204,056) foi paga através de cheque sacado conta bancária de que a impugnante era titular, emitido à ordem A..., com o valor, igual ao da fatura, de 1.845.247$00.
12) As restantes faturas foram pagas, parte em dinheiro, e parte através do endosso de cheques de que a impugnante era legítima portadora, por lhe haverem sido entregues por clientes em pagamento do preço de produtos adquiridos.
13) A fatura n.º 1.045 foi paga pela Impugnante em 06/11/2001, conforme recibo do “A...”, com o n.º 1035, junto ao Relatório de Inspeção Tributária.
14) A fatura n.º 1.048 foi paga pela Impugnante em 15/12/2001, conforme recibo do “A...”, com o n.º 1038, junto ao Relatório de Inspeção Tributária.
15) A fatura n.º 1.050 foi paga pela impugnante em 20/12/2001, conforme recibo do “A...”, com o n.º 1039, junto ao Relatório de Inspeção Tributária.
“ (…) 3.1.1 – Motivação.
O tribunal considerou provada a matéria de facto relevante para a decisão da causa com base na análise critica e conjugada dos documentos juntos aos autos e ao processo administrativo que não foram impugnados e bem assim na parte dos factos alegados pelas partes que não tendo sido impugnados (art. 74.º da Lei Geral Tributária (LGT)), também são corroborados pelos documentos juntos aos autos (arts. 76.º, n.º 1, da LGT e 362.º e seguintes do Código Civil (CC)) e dos depoimentos das testemunhas inquiridas, identificados em cada um dos factos provados.
O depoimento da testemunha P... não relevou para a matéria de facto provada, porquanto prestou um depoimento genérico, sem a assertividade necessária à formação da convicção do tribunal.
Com efeito, respondeu às perguntas feitas de uma forma genérica, esclarecendo que à data dos factos não trabalhava na impugnante, apenas ajudava nos escritórios, nos tempos livres da escola.
Esta circunstância associada à forma genérica como foi respondendo às perguntas feitas (declarando que ajudava desde os 14, 15, 16 anos, não precisando a época a partir da qual pode considerar-se que colaborava nos escritórios da impugnante e à forma como disse que ajudava, nos tempos livres da escola, não permitindo apurar com a certeza necessária a qualquer decisão judicial o período de tempo que permanecia nas instalações da impugnante), à declaração que não se recordava da época em que se passaram os factos em apreço, ao contacto indireto com os vendedores e não conseguindo esclarecer se no caso do fornecedor em causa os artefactos adquiridos eram entregues de imediato ou se eram encomendados, levaram o tribunal a não atribuir relevância ao seu depoimento, sobretudo por não ter revelado, de forma inequívoca, um conhecimento direto dos factos, indispensável à demonstração da realidade dos factos (arts. 341.º e 396.º do Código Civil (CC)).
O depoimento da testemunha H... revela já alguma maior coerência, porém, conjugada com a restante prova não se revelou integralmente coerente e convincente para o tribunal, sobretudo por uma ou outra incoerência que abalaram o seu depoimento quando confrontado com a restante prova carreada para os autos.
Aqui a incoerência do depoimento da testemunha ressalta do facto de ter declarado que as faturas foram todas emitidas (preenchidas) à sua frente por F..., aquando do fornecimento dos respetivos artefactos, mas se analisarmos as faturas emitidas constatamos que existe uma divergência na caligrafia das faturas, o que objetivamente abala a credibilidade do seu depoimento.
Outro facto que abala a credibilidade do seu depoimento é a circunstância em que terá ocorrido, pelo menos o primeiro fornecimento de material.
Quer do seu depoimento, quer do depoimento de C... ressalta que os contactos e os negócios deste tipo de material pressupõem um grande nível de confiança entre os intervenientes, sobretudo para garantia do pagamento do valor do ouro.
E no que respeita ao primeiro contacto, a testemunha foi perentória em declarar que não conhecia F... e quando lhe foi perguntado se sabia se o gerente da impugnante, seu tio, já o conhecia, a testemunha declarou que não sabia. Declarou também que não se recordava se pela forma e circunstâncias em que ocorreu esse contacto, se era percetível que ele já o conhecesse.
Esta alegada falta de conhecimento e de confiança em F..., conjugada com a falta de prova objetiva do pagamento do valor da primeira fatura, não é compreensível.
Com efeito, a alegada confiança entre as partes indispensável para este tipo de negócio, não está demonstrada neste primeiro contacto, o que abala a convicção do tribunal para julgar como provado que F... se apresentou à impugnante como vendedor da firma constante das faturas.
Apesar da testemunha ter declarado que F... se apresentou nas instalações da impugnante como vendedor da firma A..., esse depoimento só por si não é bastante para convencer o tribunal, designadamente se conjugarmos esse depoimento com a restante prova junta aos autos, em particular com a falta de prova (objetiva – por documento – e subjetiva – por testemunhas) do pagamento do primeiro fornecimento.
Para formar a sua convicção, o tribunal não pode aceitar o mero depoimento da testemunha, sobretudo quando foi abalado pela discrepância entre o seu depoimento e os documentos juntos aos autos (é incompreensível a discrepância entre as caligrafias das faturas, quando alegadamente terão sido preenchidas pela mesma pessoa). Estas discrepâncias, associadas à dependência familiar e laboral entre a testemunha e a impugnante e os seus sócios gerentes, abalam a credibilidade a atribuir ao seu depoimento.
Daí que apesar de ter declarado que F... se apresentou nas instalações da impugnante como vendedor da empresa A... e forneceu todos os artefactos constantes das faturas emitidas com aquele nome e por aquele preço, emitindo e entregando as respetivas faturas, o tribunal não julgou provada tal matéria de facto.
Esta falta de verosimilhança do depoimento de H... ressalta ainda do facto, incompreensível para o tribunal, da impugnante ser uma empresa familiar e a testemunha presenciar todas as compras e nunca ter presenciado os pagamentos.
Tudo isto, abalou a credibilidade atribuída pelo tribunal a este depoimento, que relevou apenas na parte em que o seu depoimento foi corroborado por outros meios de prova ou pelas regras da experiência.
O depoimento da testemunha C... explicou a forma de realização da inspeção efetuada à impugnante e a sua origem, corroborando os factos descritos no relatório final.
Esta testemunha depôs de forma coerente e credível, revelando um conhecimento direto dos factos.
A matéria de facto julgada não provada resulta da ausência de prova.
O ónus da prova de tais factos era da impugnante. Na falta de produção de prova bastante, tais factos têm de ser julgados contra si (arts. 74.º, n.º 1, da LGT e 516.º do CPC).
A prova documental e testemunhal produzida não foi bastante para convencer o tribunal a julgar como provada a matéria de facto que julgou não provada.
Apesar da impugnante ter junto aos autos quatro faturas, três recibos das três últimas faturas e um cheque no valor equivalente ao da segunda fatura, ainda assim, essa prova não se revelou suficientemente coerente para formar a convicção do tribunal para julgar como provada a matéria de facto que foi julgada não provada.
Os números 1) a 10) pela incoerência do depoimento das testemunhas arroladas pela impugnante, que não lograram convencer o tribunal da correlação existente entre esses documentos e os alegados contactos e fornecimentos realizados por F... em representação de A....
Com efeito, ou o gerente da impugnante não conhecia F... e não se compreende como foram efetuadas as referidas transações (sobretudo as duas primeiras em que não há qualquer prova do pagamento da primeira e em que para pagamento da segunda existe um cheque que apesar da coincidência do valor não demonstra que foi efetivamente usado para pagamento à fornecedora, o que associado à discrepância entre as datas da fatura, do recibo e do cheque, abalam a credibilidade a atribuir a esses documentos e à correlação entre a empresa alegadamente fornecedora, o alegado vendedor e a impugnante) ou então já o conhecia e sabia, ou tinha motivos para presumir, que a empresa emitente das faturas não podia ser a fornecedora daqueles artefactos, uma vez que resulta da prova carreada para os autos pela administração tributária, que a empresa A..., apesar de ter punção com a sua marca, não tinha comprovadamente capacidade para produzir artefactos em quantidade equivalente à alegadamente vendida à impugnante.
E estes factos não contrariam a matéria de facto provada nas alíneas CC) a HH). Aí julgou-se provado que a impugnante adquiriu em 2001 artefactos em montante equivalente ao constante das faturas emitidas em nome de A... que vendeu parte na sua atividade comercial, tendo ainda em seu poder uma parte a qual tem aposta o punção de A....
Porém, este facto não contradiz a matéria de facto não provada nesses números, porque aí apenas se consignou que a aquisição daquele ouro corresponde exatamente ao que consta das faturas desconsideradas pela administração tributária. Só não se provou que esse ouro foi fornecido por Fernando Correia, como vendedor de A....
Uma coisa, não exclui a outra.
Os números 12) a 15) e a segunda parte do número 10) resultam da total ausência de prova. Nenhuma das testemunhas assistiu aos alegados pagamentos e a junção dos recibos, não é bastante para os comprovar, uma vez que se não há prova da autenticidade das faturas emitidas em nome de A..., também não há prova da autenticidade dos recibos, isto é, que aqueles recibos correspondem ao pagamento das respetivas faturas.
O mesmo vale para o número 11), que associado ainda às discrepâncias entre as datas da fatura, do recibo e do cheque e à falta de prova do pagamento a A..., abalam a credibilidade do documento, não sendo bastante para comprovar que a fatura foi paga.
A prova de tais factos além dos documentos juntos exige ainda uma correspondência entre esses documentos e os meios de pagamento efetivamente utilizados, sobretudo quando está em causa a autenticidade dos factos neles narrados.
E esta correspondência entre os meios efetivamente utilizados para o seu alegado pagamento (dinheiro ou cheque emitido, entregue e pago ao respetivo fornecedor) não foi feita.
Atente-se que a impugnante não tinha conta-corrente de fornecedores, movimentando apenas a conta de caixa o que inviabilizava a comprovação dos pagamentos titulados por recibos (conforme resultou do depoimento da testemunha C...).
Nestes casos, apesar dos factos poderem ser comprovados por prova testemunhal (art. 393.º do CC), os depoimentos devem revelar-se coerentes, assertivos e credíveis ao ponto corroborarem os factos que podiam e deviam ser comprovados documentalmente. O nível de exigibilidade da verosimilhança dos depoimentos das testemunhas nestes casos tem de ser mais exigente, porque têm de substituir a força probatória dum documento.
Ora, não podemos esquecer-nos que «as provas têm por função a demonstração da realidade dos factos» (art. 341.º do CC).
No caso em apreço, a coerência e assertividade dos depoimentos não foi suficiente para o tribunal poder julgar provada a matéria de facto alegada pela impugnante, designadamente o fornecimento efetivo dos artefactos em ouro pela empresa emitente das faturas.
Conjugada toda a prova, o tribunal não ficou convencido que a A... forneceu efetivamente à impugnante os artefactos em ouro constantes das faturas registadas na sua contabilidade emitidas com o nome dele.
Motivo pelo qual julgou não provados os factos constantes da matéria de facto não provada.
Aqui não está em causa a aquisição pelo impugnante de ouro em montante equivalente ao das faturas emitidas com o nome de A.... Está em causa é quem vendeu esse ouro.
E o tribunal não ficou convencido que esse ouro foi efetivamente vendido pelo emitente das faturas, A..., através do referido Fernando Correia.
Os restantes factos alegados não foram julgados provados ou não provados, por constituírem considerações pessoais ou conclusões de facto ou de direito ou por não terem relevância para a decisão da causa.”
III.2. De Direito
P…, ld.ª veio nos termos do disposto no art. 99º e seguintes do CPPT deduzir impugnação judicial contra as liquidações adicionais de IVA do exercício de 2001 e respetivos juros compensatórios, peticionando anulação daquelas liquidações. Invoca, em síntese, em sede de petição, a errónea quantificação do IVA, o vício de falta de fundamentação das liquidações impugnadas, por contraditória e obscura, e a caducidade do direito à liquidação.
O Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel julgou improcedente a Impugnação deduzida, considerando que:
- Tendo a impugnante sido validamente notificada por carta registada em 28.11.2005, não ocorreu a caducidade do direito às liquidações;
- A fundamentação dos atos de liquidação é minimamente percetível ao homem médio e como tal não pode dizer-se que seja contraditória ou obscura, até porque não impediu a impugnante de defender-se invocando tratar-se de operações económicas reais, julgando improcedente o invocado vício de falta de fundamentação das liquidações impugnadas;
- E, no mais, considerando que AT logrou fazer prova que as faturas por si desconsideradas não corresponderam a operações reais e que a impugnante não logrou comprovar que as mesmas corresponderam a operações reais, julgou improcedente a impugnação.
Conforme deixamos indiciado no ponto II deste Acórdão – aquando da enunciação das questões a decidir, cumpre saber se o Tribunal recorrido incorreu em erro de julgamento da matéria de facto e errou o julgamento de direito ao considerar que o ato das liquidações se encontra devidamente fundamentado de facto e de direito.

Sobre a questão do erro de julgamento da matéria de facto, debruçou-se o Acórdão deste TCA Norte de 3 de maio de 2012 [processo n.º607/08.8BEPNF], em que a Recorrente igualmente assumia a qualidade de Impugnante e em causa estava o IRC de 2001, liquidado na sequência da mesma inspeção tributária (mesmos factos). Iremos, pois, em parte, limitar-nos a transcrever a fundamentação da decisão proferida naquele acórdão, no tocante ao erro de julgamento da matéria de facto, à qual se adere (cfr. artigo 8º, nº 3 do CC), sem prejuízo das especialidades decorrentes da factualidade apurada nestes autos e da apreciação concreta da relevância dos mesmos, do seguinte teor:
2.4. A Recorrente não se conforma com o decidido em primeira instância, desde logo, porque o M.mº Juiz a quo levou aos factos provados matéria que, a ser matéria de facto, não foi alegada por nenhuma das partes e de que, por isso, não podia conhecer. Conclui dizendo que foram assim violados os artigos 264.º, nºs 1 e 2 e 664.º, ambos do Código de Processo Civil.
Está em causa o que foi inserido na douta sentença recorrida sob as alíneas “B)” a “I)”, “K)” a “R)”, “T)” a “Y)” e “II)” dos factos provados.”
Abre-se aqui um parêntesis, para enunciar as alíneas de correspondência nos presentes autos, quais sejam, alíneas B), C), D), E), F), G), H), I), K), L), M), N), O), P), W),, X), Y), AA), BB), e MM) dos factos provados.
“Analisado o respetivo teor, verifica-se que [salvo no caso da alínea “II)”, que adiante analisaremos] foi extraído do relatório de fiscalização de que se junta cópia no processo administrativo em apenso e para que remete expressamente a Senhora Representante da Fazenda Pública no artigo 4.º da douta contestação.” (nos presentes autos alínea “II)” corresponde a alínea MM)).
“Sucede que as informações oficiais, em que se integra o relatório de fiscalização tributária, não são meio de alegação de factos, mas meio de prova de factos alegados – cfr. artigo 115.º, n.º 2, do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
Por outro lado, resulta do artigo 13.º, n.º 1, parte final, do Código de Procedimento e de Processo Tributário que a atividade inquisitória do juiz se deve circunscrever aos factos alegados pelas partes e àqueles que forem do conhecimento oficioso. Sendo que os factos relatados no relatório também não são do conhecimento oficioso do juiz, salvo nos casos a que alude o artigo 264.º, nºs 2 e 3, do Código de Processo Civil.
Não estando alegados determinados factos mencionados no relatório e não sendo estes do conhecimento oficioso, não pode o juiz sobre eles pronunciar-se sem violar o princípio do dispositivo e incorrer em excesso de pronúncia.
Ora, no relatório foram apurados alguns factos a que o M.mº Juiz a quo alude dando como assente, algumas vezes, que a Administração Tributária os apurou e dando como assente, outras vezes o que a Administração Tributária apurou.
Pelas razões sobreditas, entendemos que o Mmº Juiz só podia dar como assente que a Administração Tributária apurou esses factos.
Pelo que, ao abrigo do disposto no artigo 712.º, n.º 1, alínea a) do Código de Processo Civil, decidimo-nos aditar(…)” a todos aquelas alíneas B), C), D), E), F), G), H), I), K), L), M), N), O), P), W),, X), Y), AA), BB) referenciadas pela recorrente e que expressamente remetem para o relatório de inspeção a menção de que:
- Tais factos foram apurados pelos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças do Porto na sequência da ação inspetiva a que alude na alínea A) - (relatório de fiscalização elaborado a 20 de setembro de 2005 cuja cópia consta de fls. 11 a fls. 45 do processo administrativo em apenso, que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos.
É diverso o caso da alínea MM). “O que ali se dá como provado, não só não foi alegado por nenhuma das partes como também não consta do relatório de fiscalização e não se encontra sequer nas decisões graciosas posteriormente proferidas. Este facto foi ventilado pela primeira vez pela testemunha da Fazenda Pública em audiência do tribunal, sem que a Fazenda Pública (a parte que nisso poderia estar interessada) tivesse manifestado a vontade de dele se aproveitar nos termos e para os efeitos do artigo 264.º, n.º 3, do Código de Processo Civil.
E mesmo que o tivesse feito, jamais poderia aproveitar à legalidade do ato porque a fundamentação a posteriori dos atos da administração tributária não é admissível (neste sentido DIOGO LEITE DE CAMPOS, BENJAMIM SILVA RODRIGUES e JORGE LOPES DE SOUSA, in «Lei Geral Tributária Comentada e Anotada», 2.ª edição Revista e Aumentada, Vislis 2000, pág. 327 e jurisprudência aí citada). Pelo que a sua inserção nos factos provados também seria inútil e, por esta via, ilegal – artigo 137.º do Código de Processo Civil.”
Assim sendo, o Recorrente tem razão nesta parte. Pelo que se acorda em eliminar esta alínea dos factos provados.
No que tange aos factos assentes no probatório sob as alíneas K), L), N), O), R) e W), sustenta a recorrente que as mesmas contém matéria conclusiva e não foram objeto de contraditório.
Tais factos, mais não são do que facto concretos apurados pela AT em sede de inspeção e careados por ela para o respetivo relatório, atenta a concretização estabelecida supra de que os mesmos são transcrição pura e simples do conteúdo daquele.
Dispõe o art. 646º, nº 4, do CPC, que “4. Têm-se por não escritas as respostas do tribunal coletivo sobre questões de direito e bem assim as dadas sobre factos que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo ou confissão das partes.”.
Citando o douto Acórdão do STJ de 21.10.09, in www.dgsi.pt (Processo nº 272/09.5YFLSB), nele se diz que «(…) É assim, como se observou no Acórdão desde Supremo de 23 de setembro de 2009, publicado em www.dgsi.pt (Processo n.º 238/06.7TTBGR. S1), «[n]ão porque tal preceito, expressamente, contemple a situação de sancionar como não escrito um facto conclusivo, mas, como tem sido sustentado pela jurisprudência, porque, analogicamente, aquela disposição é de aplicar a situações em que em causa esteja um facto conclusivo, as quais, em retas contas, se reconduzem à formulação de um juízo de valor que se deve extrair de factos concretos objeto de alegação e prova, e desde que a matéria se integre no thema decidendum.»
Só os factos concretos — não os juízos de valor que sejam resultado de operações de raciocínio conducentes ao preenchimento de conceitos, que, de algum modo, possam representar, diretamente, o sentido da decisão final do litígio — podem ser objeto de prova.
Assim, ainda que a formulação de tais juízos não envolva a interpretação e aplicação de normas jurídicas, devem as afirmações de natureza conclusiva ser excluídas da base instrutória e, quando isso não suceda e o tribunal sobre elas emita veredicto, deve este ter-se por não escrito.
(…)».
Ora, sendo na presente ação a falta de fundamentação de facto e de direito dos atos de liquidação, tal apreciação só será desde logo possível através da ilação que se venha a extrair das “conclusões” factuais ou não, que AT tenha chegado por via das diligências operadas em sede de relatório de inspeção.
Aliás, dizer-se que na ação inspetiva AT conclui que “….” é transcrever a factualidade relevante para efeito da sindicância da decisão impugnada, sem entrar em qualquer apreciação do mérito da causa, isso sim vedado por lei.
Sendo controvertida a decisão de liquidação do IVA pela AT, quer em sede de fundamentação do ato quer da sua errónea quantificação, é suficientemente percetível a referência e transcrição realizada em sede de julgamento de facto das conclusões em que AT adveio em sede de conclusões da inspeção levada a efeito. Não nos parece, pois, que esse ponto induza no sentido da admissão de tais elementos como conclusivos em sede de apreciação do mérito das questões controvertidas, sendo certo que não pode abstrair da referência expressa estabelecida em sede de remissão para o Relatório de Inspeção.
E, no mais alegado pela Recorrente, da falta de exercício do contraditório no que concerne a tais factos, é patente a sua improcedência. Olvida a Recorrente que tal factualidade foi recolhida no âmbito de um procedimento administrativo tributário, mais concretamente de fiscalização, que obedece a princípios, entre os quais os da audiência prévia do sujeito passivo. Mais no âmbito dos presentes autos de impugnação judicial foi a Recorrente notificada da contestação e da junção aos autos do Processo Administrativos apenso, cuja notificação é obrigatória por lei - art. 111º n.º 3 do CPPT.
Assim, afigura-se-nos ser de manter tal ponto dos factos provados.
Prossegue a Recorrente impugnando o julgamento da matéria de facto no segmento contido na alínea “CC)” dos factos provados e no ponto “5)” dos factos não provados. “Entende a Recorrente que, em vez de se dar como provado que «no decurso do ano de 2001, a impugnante comprou artigos de ourivesaria de valor equivalente aos artigos discriminados nas faturas», se deveria ter dado como provado que «a impugnante comprou os artigos discriminados nas faturas» em causa no relatório de fiscalização e que «a impugnante, após observação dos produtos exibidos, escolheu aqueles que lhes interessavam e procedeu à sua compra».
São, com efeito, coisas distintas a compra dos artigos mencionados nas faturas emitidas em nome de “A...” e a compra de artigos de valor equivalente aos mencionados nessas faturas. Porque, no primeiro caso, se dá como assente que existiu um negócio que teve aquele objeto (e, por conseguinte, que as faturas documentam um negócio jurídico que, objetivamente, se realizou), enquanto no segundo caso se dá apenas como assente que existiu um outro negócio jurídico com objeto semelhante.
Na detalhada fundamentação da resposta à matéria de facto, o M.mº Juiz a quo explicou que não se convenceu «da correlação existente entre esses documentos e os alegados contactos e fornecimentos realizados por F... em representação de A...» pelas seguintes razões fundamentais: 1.ª) ambas as testemunhas apresentadas eram familiares e empregadas da ora Recorrente; 2.ª) o depoimento da segunda testemunha é demasiado genérico e pouco assertivo; 3.ª) a primeira testemunha declarou que todas as faturas foram preenchidas à sua frente por F..., mas esse depoimento não se concilia com a diferente caligrafia das faturas; 4.ª) também não se compreende que, sendo a confiança entre as partes essencial para este tipo de negócio e tendo esta testemunha afirmado que não conhecia F..., não exista prova do pagamento da primeira fatura.
Temos como certo que a proximidade familiar aos sócios gerentes da Recorrente e a relação de dependência laboral justificam maior cautela na livre apreciação da credibilidade dos depoimentos destas testemunhas. É também patente que a caligrafia da fatura n.º 1045 é muito diferente da das outras três faturas, o que indica que não foi preenchida pela mesma pessoa. O que não se concilia com o depoimento da primeira testemunha quando diz que todas as faturas foram preenchidas à sua frente pelo Sr. F... (0:14:20 do cd). Também não está convenientemente explicado como é que – assentando este negócio em relações de confiança e não sendo o Sr. F... uma pessoa conhecida – os pagamentos não tivessem sido efetuados na altura (especialmente na primeira transação). Compreendem-se, por isso, as reservas do tribunal quando confrontado com essas incongruências e que revertesse essas dúvidas contra a parte que se propôs efetuar a prova respetiva.
Por outro lado, não é verdade que as passagens do relatório de fiscalização transcritas nas doutas alegações de recurso ou o depoimento da testemunha C..., imponham resposta diversa. Como o próprio ilustre mandatário da Recorrente assentiu em audiência, essa questão não estava completamente esclarecida no relatório e suportava quer a possibilidade de as transações não terem ocorrido, quer a possibilidade de terem ocorrido, mas entre sujeitos diferentes. E o que a referida testemunha diz não é que as transações ocorreram, mas que «essas mercadorias podem efetivamente ter sido compradas… essas peças ou outras, já agora… no controlo quantitativo em termos de peso do ouro, a matéria-prima, essas mercadorias cabem lá» (01:28:50).
Ora, é precisamente isto que na douta sentença se deu como provado: que entraram mercadorias com o valor – em peso do ouro – das que se mencionam nas faturas, e não necessariamente que entraram as mercadorias mencionadas nas faturas.
Pelo que nenhuma censura merece a sentença recorrida nesta parte.” (in acórdão deste TCA citado).
E na sequência do referenciado, Consequentemente, também não se concede em erro de julgamento na parte respeitante aos pontos “6)” a “9)”, “11”) e “12”) dos factos não provados. É que estes factos são sequenciais em relação ao mencionado no ponto “5)” e, não se concedendo na sua prova, também não se poderia conceder na prova dos factos seguintes.
Pelo que o recurso não merece provimento na parte integrada pelas conclusões 12ª a 15.ª.
Do erro de julgamento de direito
Imputa a Recorrente à sentença sob escrutínio (onde, se decidiu, expressamente, entender-se “inexistir vício de forma por falta de fundamentação”), errado julgamento da questão relativa ao apontado vício de forma por contraditória e obscura fundamentação das correções propostas pelos serviços de inspeção tributária e que vieram a desembocar na efetivação da liquidação, de IVA do exercício de 2001 e juros compensatórios, impugnados. Esse erro decorre, na perspetiva da Recorrente, do facto de aquela não haver valorado, correta e legalmente, as circunstâncias de a visada fundamentação ser contraditória e obscura ao considerar simultaneamente uma operação como simulada e real e ao subsumir a factualidade considerada simultaneamente ao abrigo do n.º 3 e n.º 4 do art. 19º do CIVA.
A decisão recorrida julgou improcedente o invocado vício de falta de fundamentação das liquidações impugnadas, nos seguintes termos:
“A impugnante alega que a fundamentação de facto e de direito do relatório da inspeção tributária é contraditória e obscura, porque invoca simultaneamente factos contraditórios – ora diz que A... não tinha instalações para fabricar artefactos em ouro e não exerceu a atividade de ourives, como diz que ele comprou 36 kg de ouro e contrastou 266 kg – ficando-se sem saber se o IVA constante das faturas de A... não é dedutível por não terem existido as operações constantes das mesmas; por, tendo existido, não terem sido realizadas pelo A...; ou tendo existido e tendo sido realizadas por A..., este não dispor de adequada estrutura empresarial ao exercício da atividade declarada.
O mesmo sucede com a fundamentação legal quando se invoca como fundamentação das liquidações adicionais o art. 19.º, n.ºs 3 e 4, do CIVA, porquanto o n.º 3 pressupõe operações simuladas e o n.º 4 operações reais mas em que o transmitente dos bens ou prestador dos serviços, com a intenção de não entregar nos cofres do Estado o imposto liquidado, declarou o exercício de uma atividade, não dispondo de adequada estrutura empresarial suscetível de a exercer, com o conhecimento do sujeito passivo, ficando a impugnante sem saber como poder defender-se.
A impugnante não tem razão.
O direito à fundamentação expressa e acessível de todos os atos que afetem direitos ou interesses legalmente protegidos, está consagrado e constitucionalmente garantido aos cidadãos (art. 268.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa (CRP)).
A decisão do procedimento tributário enquanto ato definidor da posição da administração tributária perante os particulares deve obedecer aos requisitos gerais do ato administrativo (art. 123.º do Código do Procedimento Administrativo (CPA)).
Em matéria tributária o dever de fundamentação das decisões do procedimento tributário está previsto no art. 77.º da LGT, que dispõe:
«1 – A decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária.
2 – A fundamentação dos atos tributários pode ser efetuada de forma sumária, devendo sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo».
Em termos jurisprudenciais tem sido pacificamente entendido que «a fundamentação pode variar conforme o tipo de ato e as circunstâncias do caso concreto, mas que a fundamentação só é suficiente quando permite a um destinatário normal aperceber-se do itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo autor do ato para proferir a decisão, isto é, quando aquele possa conhecer as razões por que o autor do ato decidiu como decidiu e não de forma diferente, de forma a poder desencadear dos mecanismos administrativos ou contenciosos de impugnação» (Acórdão de 19/11/2008, da 2.ª Secção do STA, processo n.º 194/08, in www.dgsi.pt.).
«A fundamentação tem que ser expressa, clara, suficiente e congruente.
Está suficientemente fundamentado o ato de liquidação adicional se as conclusões do relatório da fiscalização esclarecem, minimamente, o contribuinte, que dele foi notificado, das razões de facto e de direito que levaram a Administração Fiscal a liquidar o imposto em causa» (Acórdão de 07/03/2007, da 2.ª Secção do STA, processo n.º 587/06, in www.dgsi.pt.).
No caso em apreço, basta atentar na matéria de facto provada nas alíneas J) a Q) e OO) para se constatar que o relatório da administração tributária notificado à impugnante está cabalmente fundamentado de facto e de direito e que não padece de contradições ou obscuridade.
Pese embora na fundamentação legal do relatório constem os n.ºs 3 e 4 do art. 19.º, esse facto não é bastante para julgar-se a fundamentação contraditória ou obscura.
A fundamentação tem de ser tida como um todo e analisada a fundamentação constante do relatório da inspeção tributária (alíneas J) a Q) e OO) da matéria de facto provada) verificamos que ele esclarece de forma minimamente percetível que estão em causa operações económicas simuladas porquanto “as faturas não titulam negócios reais, já que ficou demonstrado que A... nunca realizou estas transações, tratando-se, por isso, de negócios simulados”.
Apesar da referência ao n.º 4 do art. 19.º, a fundamentação revela de forma percetível que estão em causa operações simuladas subsumíveis ao art. 19.º, n.º 3, do CIVA, porquanto são operações económicas tituladas ou alegadamente realizadas por conta de A... quando na realidade não foram realizadas por ele, nem por conta dele e como tal as faturas em causa não titulam operações económicas reais.
A referência à falta de estrutura e de exercício de atividade de ourivesaria de A... também serve para fundamentar a simulação das operações económicas subjacentes às faturas, porque revelam que ele não podia ser o fornecedor dos artefactos que delas constam, quer por si, quer por interposta pessoa.
Embora a fundamentação possa não considerar-se exemplar, não deixa de ser minimamente percetível ao homem médio e como tal não pode dizer-se que seja contraditória ou obscura, até porque não impediu a impugnante de defender-se invocando tratar-se de operações económicas reais.
Nesta parte, julga-se improcedente o invocado vício de falta de fundamentação das liquidações impugnadas. “
Diga-se, desde já, que concordamos integralmente com a fundamentação acabada de transcrever contida na decisão sob recurso, pelo que nos limitaremos aderir a mesma, reforçando argumentação nela expendida.
Quanto à falta de fundamentação (formal) dos atos de liquidação de IVA e juros compensatórios impugnados, diremos, que a fundamentação dos atos administrativos em geral, constitui um imperativo constitucional, expressamente previsto no art.º 268.º n.º3 da CRP (vejam-se a abundante jurisprudência do STA atinente a esta matéria, bem como Gomes Canotilho e Vital Moreira, «Constituição da República Portuguesa Anotada», 1993, pp. 936 e Vieira de Andrade, «O Dever de Fundamentação Expressa dos Atos Administrativos», 1990, pp. 53 e ss), cujo escopo imediato é esclarecer concretamente a motivação do ato, permitindo a reconstituição do iter cognoscitivo e valorativo que determinou a adoção do ato, com determinado conteúdo (na esteira das lições de Diogo Freitas do Amaral, "Curso de Direito Administrativo", Almedina, 2001, Vol. II, pp.351 e ss.).
E no âmbito do direito tributário, tal exigência de fundamentação dimana diretamente da norma do art.º 77.º da LGT, a qual deve ser remetida ao contribuinte por força do disposto no art.º 36.º n.º2 do CPPT, e a fundamentação externada pela AT deve satisfazer o requisito de fundamentação exigível, do ponto de vista formal, sendo suficiente quando permite a reconstituição do iter cognoscitivo que determinou a decisão da Administração, sendo clara quando é inteligível e sem ambiguidades ou obscuridades e é congruente quando exprime concordância entre os pressupostos normativos do ato e os motivos do mesmo.
E, como se salienta no ac. do STA, de 02.02.2006, in rec. nº 1114/05, «este dever legal da fundamentação tem, a par de uma função exógena - dar conhecimento ao administrado das razões da decisão, permitindo-lhe optar pela aceitação do ato ou pela sua impugnação -, uma função endógena consistente na própria ponderação do ente administrador, de forma cuidada, séria e isenta.»
Como tal, a fundamentação deve ser contextual e integrada no próprio ato (ainda que o possa ser de forma remissiva), expressa e acessível (através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão), clara (de modo a permitir que, através dos seus termos, se apreendam com precisão os factos e o direito com base nos quais se decide), suficiente (permitindo ao destinatário do ato um conhecimento concreto da motivação deste) e congruente (a decisão deverá constituir a conclusão lógica e necessária dos motivos invocados como sua justificação), equivalendo à falta de fundamentação a adoção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do ato.
Utilizando a linguagem da jurisprudência, o ato só está fundamentado se um destinatário normalmente diligente ou razoável - uma pessoa normal - colocado na situação concreta expressada pela declaração fundamentadora e perante o concreto ato administrativo (que determinará consoante a sua diversa natureza ou tipo uma maior ou menor exigência da densidade dos elementos de fundamentação) fica em condições de conhecer o itinerário funcional (não psicológico) cognoscitivo e valorativo do autor do ato, sendo, portanto, essencial que o discurso contextual lhe dê a conhecer todo o percurso da apreensão e valoração dos pressupostos de facto e de direito que suportam a decisão ou os motivos por que se decidiu num determinado sentido e não em qualquer outro. Ela visa «esclarecer concretamente as razões que determinaram a decisão tomada e não encontrar a base substancial que porventura a legitime, já que o dever formal de fundamentação se cumpre “pela apresentação de pressupostos possíveis ou de motivos coerentes e credíveis, enquanto a fundamentação substancial exige a existência de pressupostos reais e de motivos corretos suscetíveis de suportarem uma decisão legítima quanto ao fundo”. O discurso fundamentador tem de ser capaz de esclarecer as razões determinantes do ato, para o que há de ser um discurso claro e racional; mas, na medida em que a sua falta ou insuficiência acarreta um vício formal, não está em causa, para avaliar da correção formal do ato, a valia substancial dos fundamentos aduzidos, mas só a sua existência, suficiência e coerência, em termos de dar a conhecer as razões da decisão.» (cfr. Vieira de Andrade - O Dever de Fundamentação Expressa de Atos Administrativos, pag. 239, na citação do ac. do STA, de 11/12/2002, rec. 01486/02).
Como é sabido, a fundamentação de um ato de liquidação, situação em apreço, deve ser o esteio, o suporte, por que foi efetuada aquela concreta liquidação e não qualquer uma outra, de molde a permitir ao contribuinte apreender os concretos factos donde ela emerge e poder determinar-se pela sua aceitação ou impugná-la, se entender que a mesma se encontra eivada de qualquer um vício que a inquine de ilegal, variando assim, a densidade fundamentadora, consoante o tipo de ato em causa e a participação ou não do mesmo no procedimento da sua formação.
No caso, sabido que o mecanismo das deduções regulado nos art.s. 19º a 25º do CIVA, a dedução do imposto suportado a montante faz parte da própria essência do IVA pois este assenta num sistema de pagamentos fracionados do imposto visando a tributação do consumo final, determina que a dedução do imposto pago nas operações intermédias do circuito económico, seja indispensável ao funcionamento do sistema e ao estabelecimento da cadeia da importação e/ou produção até ao consumo final ou exportação. Na dedução do IVA é utilizado o chamado método indireto subtrativo no qual não há que determinar o valor acrescentado pela empresa, operando-se a dedução de imposto a imposto, ou seja, através das faturas relativas a determinado período, deduz-se ao imposto liquidado nos «outputs» o imposto suportado nos «inputs» no mesmo período, independentemente da venda dos bens a que respeita o imposto deduzido. Todavia e por força do disposto no nº 3 do art. 19º do CIVA, não poderá deduzir-se imposto que resulte de operação simulada ou em que seja simulado o preço constante da fatura ou documento equivalente.
Cabe à AT proceder a essa liquidação, desde que a atividade instrutória desenvolvida lhe permita concluir com segurança que às faturas em causa não corresponde a efetiva prestação de bens, motivo por que a Contribuinte não tinha direito a dedução do IVA nelas mencionado, pelo que o esteio, a base dessa liquidação do imposto, assenta precisamente, no IVA deduzido indevidamente, apurado pela fiscalização tributária mediante as diligências encetadas e levadas a cabo no âmbito do procedimento de fiscalização, as quais foram discriminadas no relatório, conduziram ao apuramento do IVA em falta, relatório esse, cujo conteúdo foi notificado a ora recorrente.
Assim, a liquidação do imposto, emerge, diretamente, do IVA indevidamente deduzido no exercício de 2001 pela Impugnante, decorrente do apuramento pela AT por via da atividade instrutória desenvolvida que lhe permitiu concluir com segurança que às faturas em causa não corresponde a efetiva prestação de bens, motivo por que sujeito passivo não tinha direito a dedução do IVA nelas mencionado, fechando o silogismo judiciário, num raciocínio suficiente, claro e congruente, constituindo estas liquidações a emanação normal, típica, daqueles pressupostos e das normas jurídicas apontadas, não padecendo a mesma de falta de fundamentação (formal), desta forma facilmente se apreendendo porque teve lugar esta liquidação e não qualquer uma outra, sendo este o resultado normal, típico, das premissas consideradas.
Se isto corresponde ao não à realidade e se, mais do que isso, é ou não adequado á prática do ato tributário impugnado ou seja se constitui, ou não, esteio bastante à conduta da AF enquanto realidade ontológica intra decisória (cfr. David Duarte, in Procedimentalização, Participação e Fundamentação: Para uma Concretização do Princípio da Imparcialidade Administrativa como Parâmetro Decisório), é questão que tem a ver com o mérito e não com a forma e que, portanto, se coloca numa outra dimensão que não cumpre conhecer em sede de recurso, sendo que no aqui releva importa apenas dizer que, nos termos acima referidos, nomeadamente na fundamentação constante da decisão sob recurso, se entende que a decisão da AT, no caso vertente, não padece de falta de fundamentação formal, seja por obscuridade ou contradição.
Por outro lado, no que concerne às liquidações dos juros compensatórios, sobre as quais impende, igualmente o dever de fundamentação, na esteira do que vem sendo o entendimento jurisprudencial, ela carece, no entanto, de um rigor extensivo bastante diminuído, em virtude de se tratar de atos, desde logo, consequentes do atraso no apuramento e entrega, a quem de direito, da prestação tributária.
Pelo exposto não podemos aderir ao antagónico entendimento da Recorrente, sendo incontestável que a decisão de qualquer procedimento tributário tem de ser sempre fundamentada através da sucinta menção das razões de facto e de direito que a motivam, ao que acresce a, subjacente e intransponível, exigência de a indicação dos pertinentes fundamentos ser contemporânea da respetiva prolação, julgamos inconsequentes as críticas dirigidas, pela Recorrente, à decisão sob recurso para cuja casuística fundamentação transcrita supra remetemos a ela aderindo.
Em suma, os atos de liquidação do imposto e respetivos juros compensatórios, encontram-se devidamente fundamentados sob o ponto de vista formal, inexistindo qualquer contradição ou obscuridade que não tenha permitido ao contribuinte sopesar se com tais liquidações se deveria conformar, ou, ao invés, se deveria vir impugná-las como veio, demonstrando ter apreendido o seu conteúdo.
Por tudo o que ficou dito, a sentença recorrida não merece, pois, censura, devendo ser negado provimento ao recurso.
IV. DECISÃO
Face ao exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso.
Custas pela Recorrente.
Porto, 24 de maio de 2012
Ass. Irene Neves
Ass. Pedro Marques
Ass. Álvaro Dantas