Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00723/17.5BEAVR
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:05/25/2018
Tribunal:TAF de Aveiro
Relator:Pedro Vergueiro
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL
INDEFERIMENTO LIMINAR
CADUCIDADE DO DIREITO DE DEDUZIR OPOSIÇÃO
Sumário:I) O indeferimento liminar só deve ser proferido quando for de todo impossível o aproveitamento da petição inicial, uma vez que o princípio da pronúncia sobre o mérito se sobrepõe a questões formais que não interfiram e ponham em causa o mesmo, o que significa que o despacho de indeferimento liminar, que encontra a sua justificação em motivos de economia processual, só admissível quando a improcedência da pretensão do autor for tão evidente e, razoavelmente, indiscutível, que torne dispensável assegurar o contraditório e inútil qualquer instrução e discussão posterior, isto é, quando o seguimento do processo não tenha razão alguma de ser, seja desperdício manifesto de actividade judicial, o que quer dizer também que tem de ser cautelosamente decretado e apenas quando for manifesto em face da petição inicial a inviabilidade da pretensão deduzida em juízo.
II) Considerando a situação inicial relacionada com a apresentação de uma oposição para um conjunto de processos de execução fiscal, o ora Recorrente viu a sua pretensão rejeitada pelo Tribunal, embora, nos termos do art. 279º nºs 1 e 2 do C. Proc. Civil, lhe tenha sido reconhecida a faculdade de, no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado da aludida decisão, apresentar novas oposições, considerando-se as respectivas petições apresentadas na data da entrada da oposição subjacente ao Proc. nº 13/17.3BEAVR.
III) Sendo assim, então importa reter que o ora Recorrente foi notificado da decisão do processo agora apontado através de notificação com data de 06-04-2017, o que significa que a presente oposição foi seguramente apresentada (17-05-2017) no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado da sentença ditada no Proc. nº 13/17.3BEAVR.
IV) Logo, a petição em apreço tem ser considerada como intentada em 26-09-2016, data em que foi apresentada a petição que deu origem ao Proc. nº 13/17.3BEAVR, o que significa que, tendo o Oponente sido citado pessoalmente em 31-08-2016, o prazo para apresentar a oposição terminaria em 06-10-2016, de modo que, tem de entender-se que a petição com data de 17-05-2017 (mas que tem de reportar-se à data (26-09-2016) em que foi apresentada a petição que deu origem ao Proc. nº 13/17.3BEAVR) foi entregue numa altura em que o prazo para o efeito ainda não se encontrava esgotado. *
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:M...
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Decisão:Concedido provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
1. RELATÓRIO
M..., devidamente identificado nos autos, inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, datada de 29-11-2017, que rejeitou liminarmente a p.i. de oposição à execução fiscal n.º 4170201601001744 e aps., instaurada contra a sociedade M…, Unipessoal, Lda. para pagamento da quantia global de € 367.891,63, proveniente de dívidas de IVA e IRC de 2011.

Formulou nas respectivas alegações (cfr. fls. 113-114), as seguintes conclusões que se reproduzem:
“(…)
1) A Meritíssima Juíza “a quo”, rejeitou liminarmente a presente Oposição à Execução por considerar, ao tempo, a oposição intempestiva.
2) Contudo, a oposição não é intempestiva.
3) Pois, a presente Oposição deu entrada para todos os efeitos legais em 26 de Setembro de 2016 no Serviço de Finanças de Feira - 4, conforme documentos já juntos aos autos, pelo que a mesma não é intempestiva.
4) Pois, a Oposição foi apresentada nos termos do artigo 279°, nº 2 do CPC.
5) E uma vez que da Decisão proferida de Indeferimento liminar por intempestividade cabe sempre recurso para o Tribunal superior, vem o recorrente deduzir o presente recurso, pois a Meritíssima Juíza do Tribunal “a quo” entende que não pode reformar a mesma nos termos do artigo 616°, nº2, b) do CPC
Termos em que, nos melhores de direito e com o sempre douto suprimento de V. Exas., entende o recorrente que deverá o presente Recurso ser julgado totalmente procedente e, em consequência, se revogue a DOUTA SENTENÇA recorrida, declarando-se tempestiva a Oposição, a bem da JUSTIÇA.”

A Recorrida Autoridade Tributária e Aduaneira não apresentou contra-alegações.

O Ministério Público junto deste Tribunal teve vista nos autos.

Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o processo submetido à Conferência para julgamento.


2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que a questão suscitada resume-se, em suma, em apreciar a matéria da caducidade do direito de deduzir oposição.

3. FUNDAMENTOS
3.1. DE FACTO
Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:
“…
1. O Oponente foi citado por reversão no processo de execução fiscal n.º 4170201601001744 e aps., instaurado contra a sociedade M… Unipessoal, Lda., contribuinte n.º 5…, através de carta registada com AR, em 31-08-2016 (fls. 48 e 48 v.º dos autos);

2. O AR a que se refere o ponto anterior foi assinado por pessoa diversa do citando, tendo, pelo Órgão de Execução Fiscal, sido dado cumprimento ao disposto no art. 233.º (anterior 241.º) do CPC e enviado carta registada para o domicílio do ora Oponente (fls. 53 e 53 v.º dos autos);

3. A presente oposição foi apresentada no Serviço de Finanças em 17-05-2017 (fls. 5 e 83 dos autos).
A decisão sobre a matéria de facto assentou na análise dos documentos constantes dos autos, conforme indicado a propósito de cada alínea do probatório.”
Ao abrigo do disposto no art. 662º nº 1 do C. Proc. Civil, adita-se ao probatório o seguinte:
4. Em 26-09-2016, o ora Recorrente deduziu uma única Oposição com referência a 9 (nove) processos de execução fiscal (PEF 4170201501079590, 4170201501079603, 4170201501079611, 4170201501079620, 4170201501079980, 4170201601001744 e aps, 4170201601003402 e aps, 4170201601004719 e aps e 4170201601005227 e aps (fls. 104 do processo físico).
5. Tal deu origem ao processo de oposição que correu termos no TAF de Aveiro sob o nº 13/17.3BEAVR, onde foi proferida decisão em 30-03-2017 de rejeição liminar da oposição, sem prejuízo da faculdade concedida ao Oponente de apresentar novas petições iniciais nos termos previstos no art. 279º nºs 1 e 3 do CPC (fls. 99-103 e 104 do processo físico e consulta do processo via SITAF).
6. A decisão referida em 5. foi notificada às partes em 06-04-2017 (fls. 98 do processo físico e consulta do processo via SITAF).
7. A oposição referida em 3. foi apresentada apenas para o processo de execução fiscal 4170201501001744 e aps.

«»
3.2. DE DIREITO

Assente a factualidade apurada cumpre, então, antes de mais, entrar na análise da realidade em equação nos autos e que se prende com a questão da caducidade do direito de deduzir oposição.

Na sentença recorrida foi ponderado que:

“…
Fixados os factos relevantes para a apreciação da questão da tempestividade, vejamos, então, se a mesma se verifica.
Quanto ao prazo para deduzir a oposição, dispõe o art. 203.º n.º 1 a) do CPPT que “A oposição deverá ser deduzida no prazo de 30 dias a contar da citação pessoal ou, não a tendo havido, da primeira penhora;
No caso concreto, como resulta do probatório – ponto 1. –, o Oponente foi citado pessoalmente em 31-08-2016.
De notar que, apesar da notificação a que se refere o art. 233.º do CPC, a citação considera-se sempre feita no dia em que foi assinado o AR e tem-se por efectuada na própria pessoa do citando, mesmo quando tal AR tenha sido assinado por terceiro (art. 230.º n.º 1 do CPC).
Assim, atendendo às férias judiciais e à dilação de 5 dias (art. 245.º n.º 1 a) do CPC), o prazo para apresentar a oposição terminava em 06-10-2016.
Tendo o ora Oponente apresentado a petição, como resulta do probatório (ponto 3.), em 17-05-2017, fê-lo quando há muito tinha precludido o prazo de que dispunha.
Desta forma, a presente oposição é, claramente, intempestiva. …”.

Nas suas alegações, a Recorrente refere que a presente Oposição deu entrada para todos os efeitos legais em 26 de Setembro de 2016 no Serviço de Finanças de Feira - 4, conforme documentos já juntos aos autos, pelo que a mesma não é intempestiva, pois, a Oposição foi apresentada nos termos do artigo 279°, nº 2 do CPC e uma vez que da Decisão proferida de Indeferimento liminar por intempestividade cabe sempre recurso para o Tribunal superior, vem o recorrente deduzir o presente recurso, pois a Meritíssima Juíza do Tribunal “a quo” entende que não pode reformar a mesma nos termos do artigo 616°, nº2, b) do CPC.
Que dizer?

Antes de mais, cumpre notar que o indeferimento liminar só deve ser proferido quando for de todo impossível o aproveitamento da petição inicial, uma vez que o princípio da pronúncia sobre o mérito se sobrepõe a questões formais que não interfiram e ponham em causa o mesmo, o que significa que o despacho de indeferimento liminar, que encontra a sua justificação em motivos de economia processual, só admissível quando a improcedência da pretensão do autor for tão evidente e, razoavelmente, indiscutível, que torne dispensável assegurar o contraditório e inútil qualquer instrução e discussão posterior, isto é, quando o seguimento do processo não tenha razão alguma de ser, seja desperdício manifesto de actividade judicial, o que quer dizer também que tem de ser cautelosamente decretado e apenas quando for manifesto em face da petição inicial a inviabilidade da pretensão deduzida em juízo.

Nesta sequência, e numa primeira linha de análise, a decisão recorrida parece inatacável, na medida em que tendo o Oponente sido citado pessoalmente em 31-08-2016, o prazo para apresentar a oposição terminaria em 06-10-2016, de modo que, a petição com data de 17-05-2017 teria sido entregue numa altura em que o prazo para o efeito já estaria esgotado.
Isto porque, como é sabido, o art. 203º nº 1 alínea a) do CPPT dispõe que a oposição deve ser deduzida no prazo de 30 dias a contar da citação pessoal.

No entanto, o Recorrente veio juntar aos autos um conjunto de elementos que, naturalmente, determinam uma outra leitura da realidade em apreço.

Assim, ficamos a saber que em 26-09-2016, o ora Recorrente deduziu uma única Oposição com referência a 9 (nove) processos de execução fiscal (PEF 4170201501079590, 4170201501079603, 4170201501079611, 4170201501079620, 4170201501079980, 4170201601001744 e aps, 4170201601003402 e aps, 4170201601004719 e aps e 4170201601005227 e aps, o que deu origem ao processo de oposição que correu termos no TAF de Aveiro sob o nº 13/17.3BEAVR, onde foi proferida decisão em 30-03-2017 de rejeição liminar da oposição, sem prejuízo da faculdade concedida ao Oponente de apresentar novas petições iniciais nos termos previstos no art. 279º nºs 1 e 3 do CPC, verificando-se que a decisão referida foi notificada às partes em 06-04-2017, surgindo então a presente oposição apenas para o processo de execução fiscal 4170201501001744 e aps e que foi apresentada no Serviço de Finanças em 17-05-2017.

A partir daqui, está aberto um novo caminho para abordar a matéria em discussão nos autos, dado que, considerando a situação inicial relacionada com a apresentação de uma oposição para um conjunto de processos de execução fiscal, o ora Recorrente viu a sua pretensão rejeitada pelo Tribunal, embora, nos termos do art. 279º nºs 1 e 2 do C. Proc. Civil, lhe tenha sido reconhecida a faculdade de, no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado da aludida decisão, apresentar novas oposições, considerando-se as respectivas petições apresentadas na data da entrada da oposição subjacente ao Proc. nº 13/17.3BEAVR.

Sendo assim, então importa reter que o ora Recorrente foi notificado da decisão do processo agora apontado através de notificação com data de 06-04-2017, o que significa que a presente oposição foi seguramente apresentada (17-05-2017) no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado da sentença ditada no Proc. nº 13/17.3BEAVR.
Logo, a petição em apreço tem ser considerada como intentada em 26-09-2016, data em que foi apresentada a petição que deu origem ao Proc. nº 13/17.3BEAVR.

Deste modo, e retomando o percurso da decisão recorrida, tendo o Oponente sido citado pessoalmente em 31-08-2016, o prazo para apresentar a oposição terminaria em 06-10-2016, de modo que, tem de entender-se que a petição com data de 17-05-2017 (mas que tem de reportar-se à data (26-09-2016) em que foi apresentada a petição que deu origem ao Proc. nº 13/17.3BEAVR) foi entregue numa altura em que o prazo para o efeito ainda não se encontrava esgotado.
Em suma, como já afirmado pelo Tribunal recorrido, em função da nova realidade emergente dos elementos agora presentes nos autos, tem de concluir-se no sentido de que o despacho recorrido procedeu a uma incorrecta aplicação do direito à factualidade apurada, pelo que incorreu em erro de julgamento devendo ser revogado por via da procedência do presente recurso.

4. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, conceder provimento ao recurso, revogar a decisão recorrida, ordenando-se a devolução do processo ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro para prosseguimento da lide, proferindo-se outro despacho que não seja de rejeição liminar da oposição com fundamento na sua intempestividade.
Sem custas.
Notifique-se. D.N..
Porto, 25 de Maio de 2018
Ass. Pedro Vergueiro
Ass. Ana Patrocínio
Ass. Ana Paula Santos