Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:03081/15.9BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:03/30/2017
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Mário Rebelo
Descritores:CITAÇÃO PESSOAL POR TRANSMISSÃO ELETRÓNICA DE DADOS
PRESUNÇÃO DE CITAÇÃO
Sumário:1. A citação pessoal pode ser efectuada por transmissão eletrónica de dados;
2. Efectuada a citação nesta modalidade, ela considera-se realizada na data em que o destinatário acedeu à caixa postal eletrónica;
3. A citação presumida a que alude o n.º 6 do art. 191º do CPPT não corresponde à citação pessoal prevista no art. 192º/1 do mesmo diploma.
4. Nos termos do art. 203º/1-a) do CPPT, o prazo para deduzir oposição conta-se a partir da citação pessoal ou, não a tendo havido, da primeira penhora.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:F...
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Decisão:Concedido provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

F… inconformado com a decisão proferida pela MMª juiz do TAF do Porto que indeferiu liminarmente a petição inicial de oposição por verificação da exceção insuprível de caducidade do direito de ação, dela interpôs recurso rematando as alegações com as seguintes conclusões:

1ª. A citação constitui acto essencial da vida do processo executivo, destinada a, por um lado, dar conhecimento ao executado de que foi proposta contra ele uma execução, por quem, quais os seus fundamentos e o que nela se peticiona e, por outro lado, a convocar o executado para, entre o mais, exercer a sua defesa e opor os seus argumentos à investida que lhe foi dirigida – cfr., art. 35º, nº 2 e art. 189º do CPPT.

2ª. Constituindo os princípios do contraditório e da proibição da indefesa princípios fundamentais e estruturantes do direito processual.

3ª. A citação que, por transmissão electrónica de dados, foi remetida em 17 de Março de 2015 pela Administração Tribuária Via CTT para a caixa postal electrónica do recorrente, apenas foi por si recebida no dia 12 de Novembro de 2015, data em que acedeu à sua caixa postal electrónica e em que, pela primeira vez, acedeu ao documento de citação que lhe tinha sido remetido pela Administração Tributária, só então, tendo tomado conhecimento da citação operada, do seu teor, dos montantes que lhe eram reclamados e dos direitos de defesa que lhe assistiam;

4ª. Tendo o recorrente logrado demonstrar a data efectiva em que tomou conhecimento da citação - 12 de Novembro de 2015 – é nessa data que deve ser tido como citado para os presentes autos e, como tal, foi ilidida a presunção estabelecida no referido nº 6, do art. 191º do CPPT – cfr., art. 350º, nº 2, do Cód. Civil;

5ª. Conforme resulta expressamente do art. 191º, nº 4 do CPPT supra citado, o legislador equiparou a citação efectuada através da transmissão electrónica de dados à remessa por via postal simples ou registada ou por via postal registada com aviso de recepção, conforme os casos;

6ª. Sucede que do confronto entre o disposto no nº 6 do art. 191º e nos nºs 2 e 3 do art. 192º do CPPT, facilmente se constata que aqueles dois regimes são, afinal, distintos;

7ª. Sendo concedidas mais garantias de efectivo recebimento da citação, e assim maiores garantias de defesa, a quem seja citado por carta registada com aviso de recepção do que a quem seja citado por transmissão electrónica de dados;

8ª. Pois enquanto que na citação por transmissão electrónica de dados a presunção do recebimento da citação pelo citando se verifica logo no primeiro momento (25 dias após o envio da citação), ou seja logo que remetida a primeira citação e sem que a entidade exequente tenha que que desencadear qualquer outra diligência, já na citação por carta registada com aviso de recepção, a presunção de recebimento só tem lugar após ser enviada uma segunda citação na sequência da não recepção (aqui se incluindo a sua recusa) daquela inicialmente enviada;

9ª. O que, para lá de patentear uma desproporcionalidade injustificável entre os dois regimes, revela uma disfuncionalidade e uma incongruência sistémica, impossível de justificar quer à luz das regras da citação, quer, inclusive, em face das regras da notificação - cfr., art. 39º, nº 5, do CPPT;

10ª. A presunção de recebimento estabelecida no nº 6 do art 191º, do CPPT contende com as garantias de defesa do citado pois não fica assegurado o conhecimento pelo destinatário do acto que se pretendeu levar ao seu conhecimento e, traduzindo uma diminuição global das garantias de defesa do executado, atenta, desde logo, a gravidade decorrente da perda do direito de deduzir oposição à execução fiscal mercê do facto de o prazo legal para o efeito começar a correr com base numa mera presunção de recebimento da citação, deverá ter carácter excepcional e ser apenas e tão só uma válvula de escape do sistema para obviar às tentativas do destinatário de uma citação se furtar à sua efectivação;

11ª. Sendo manifestamente excessivo e desproporcionado que aquela presunção de recebimento se dê por verificada logo com a primeira diligência de citação sem que se cuide de efectuar um segundo envio da mesma citação, atentos os efeitos preclusivos e cominatórios decorrentes do decurso do prazo para a apresentação da oposição (e demais direitos de defesa);

12ª. Sendo mister ter presente que o envio da citação por transmissão electrónica de dados para a caixa postal electrónica do contribuinte não se reveste de uma maior garantia da sua recepção pelo contribuinte do que aquela que oferece o envio de uma carta registada com aviso de recepção para a morada daquele que figure no cadastro como seu domicílio fiscal, sendo que a caixa postal electrónica também integra o domicílio fiscal do contribuinte – cfr., art. 19º, nº 2, da LGT;

13ª. Gravidade e violência da presunção constante do nº 6, do art. 191º do CPPT acentuada pelo facto de a mesma, nos termos do disposto no nº 7 do mesmo normativo, apenas poder ser ilidida se a citação ocorrer em data posterior à presumida por facto que não seja imputável ao citando, o que tudo passa por ser irrazoável e desproporcionado;

14ª. O direito de acesso aos tribunais ou a uma tutela jurisdicional, condensado no artigo 20º, nº 1 e nº 4, da Lei Fundamental, implica a garantia de uma protecção jurisdicional eficaz ou de uma tutela judicial efectiva - cfr., Ac. Trib. Const. de 20.11.91, Proc. nº 90-0184;

15ª. Através do postulado constitucional do direito de acesso à justiça importa assegurar que seja colocado à disposição de todos aqueles que possam ser afectados por uma diligência judicial um meio processual que lhes permita reagir contra a mesma e contra os actos praticados em seu prejuízo;

16ª. Por força do princípio do contraditório, que passa por ser um dos princípios estruturantes do processo civil, as partes têm a faculdade de intervir processualmente, fazendo ouvir a sua voz, na esteira do decantado brocardo latino audiatur et alter pars - cfr., Miguel Teixeira de Sousa, Introdução ao Processo Civil, Lisboa, 1993, pgs. 38 e 39; Manuel Andrade, NEPC, 1976, pgs. 377e 378; João de Castro Mendes, Direito Processual Civil, vol. I, 1986, pgs. 195 e ss. e Fernando Luso Soares, Processo Civil de Declaração, 1985, pg. 478;

17ª. Sendo que apesar de não depararmos, no texto da lei fundamental, com uma alusão expressa ao princípio do contraditório processual civil, a Ciência do Direito Constitucional afirma a relevância e dignidade jusconstitucional desse princípio – cfr., art. 2º e 20º da CRP, Sérvulo Correia e Jorge Bacelar Gouveia ROA, ano 57 (1997), Tomo 1, pg. 326, Gomes Canotilho e Vital Moreira, Fundamentos da Constituição, Carlos Lopes do Rego, Acesso ao Direito e aos Tribunais, in Estudos Sobre a Jurisprudência do Tribunal Constitucional, Lisboa, 1993, pg. 57, Parecer da Comissão Constitucional nº 18/81 (Pareceres da Comissão Constitucional, vol. 17º, pgs. 14 e ss.); Ac. Trib. Const. nº 434/87, de 4.11.87, BMJ 371-160);

18ª. O direito ao contraditório assume relevância jusconstitucional através dos princípios do estado de direito e da tutela jurisdicional efectiva que implicam a proibição da “indefesa”, assentando o seu núcleo essencial na inadmissibilidade de prolacção de qualquer decisão – mesmo interlocutória – sem que seja previamente conferido ao sujeito processual contra quem é dirigida a efectiva possibilidade de a discutir e contestar – arts. 2º e 20º da CRP;

19ª. O direito a um processo equitativo e a prossecução de uma tutela jurisdicional efectiva, para lá de constituir um ditame constitucional e um princípio fundamental do Estado de Direito democrático é também um eixo estruturante do direito processual, por ele se reclamando uma prevalência das decisões de fundo sobre as meras decisões de forma - cfr., arts. 1º, 2.º, 20º, nº 1, 2 e 4 da CRP, art. 265.º, 2, 265º-A, 266º do Cód. Proc. Civil, Gomes Canotilho e Vital Moreira, CRP Anotada, vol. I, 4.ª ed. revista, pg. 415), Cardona Ferreira, A reforma do regime legal dos recursos cíveis, de 2007. Algumas notas, O Direito, 140, II, pg. 325 Lebre de Freitas, Introdução, pg. 39 e Remédio Marques, Curso de Processo Executivo Comum, pgs. 39 e ss, Pessoa Vaz, Direito Processual Civil, Do Antigo ao Novo Código, pgs. 337;

20ª. À luz do princípio da proporcionalidade, toda e qualquer medida de restrição de direitos deve revelar-se:
a. Adequada para a prossecução dos fins visados pela lei;
b. Necessária, no sentido de os fins visados pela lei não poderem ser obtidos por outros meios menos gravosos para o exercício do direito em causa;
c. Os meios legais restritivos e os fins obtidos devem situar-se numa “justa medida”, impedindo-se a adopção de medidas restritivas desproporcionadas, excessivas, em relação aos fins obtidos;

21ª. Sendo que “o princípio da proporcionalidade, enquanto princípio geral de limitação do poder público, pode ancorar-se no princípio geral do Estado de direito, impondo limites resultantes da avaliação da relação entre os fins e as medidas públicas”, não se bastando como um princípio director em matéria de restrição de direitos, liberdades e garantias - Ac. TC n.º 200/01, arts. 1º, 2º e 18º, nº 3 da CRP;

22ª. À luz do que antecede, são inconstitucionais os nºs 6 e 7, do art. 191º do CPPT, por violação do disposto nos arts. 2º, 13º, nº 1 e nº 2, 18º, nº 2 e 20º, nº 1 e nº 4 da CRP e dos princípios da proibição da indefesa, do processo equitativo, da proporcionalidade e da igualdade aí consagrados;

23ª. Sempre e em qualquer caso, à luz do que antecede, é inconstitucional a interpretação normativa dos nºs 6 e 7, do art. 191º do CPPT constante da douta decisão recorrida, por violação do disposto nos arts. 2º, 13º, nº 1 e nº 2, 18º, nº 2 e 20º, nº 1 e nº 4 da CRP e dos princípios da proibição da indefesa, do processo equitativo, da proporcionalidade e da igualdade aí consagrados, ao presumir a citação do executado no 25º dia posterior ao envio da citação por transmissão electrónica de dados e ao considerar que a ilisão daquela presunção apenas pode ocorrer se o citando demonstrar que não foi por culpa sua que a citação ocorreu em data posterior à presumida;

24ª. Assim sendo, por força da sua inconstitucionalidade, devem ser desaplicados os nºs 6 e 7 do art. 191º do CPPT, daí se seguindo que a oposição apresentada pelo recorrente deverá ser tida como tempestiva;

25ª. Na decisão recorrida violaram-se as disposições legais supracitadas;

Termos em que, pelos fundamentos expostos e pelos que V. Exas doutamente suprirão, deverá revogar-se a douta sentença recorrida com todas as legais consequências.
Assim far-se-á Justiça!

CONTRA ALEGAÇÕES.
Não houve.

PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO.
O Exmo. Procurador-Geral Adjunto neste TCA emitiu esclarecido parecer concluindo pela improcedência e confirmação da decisão recorrida.

II QUESTÕES A APRECIAR.
O objecto do presente recurso, delimitado pelas conclusões formuladas (artigos 635º/3-4 e 639º/1-3, ambos do Código de Processo Civil, «ex vi» do artº 281º CPPT), salvo questões do conhecimento oficioso (artigo 608º/ 2, in fine), consiste em saber se o despacho errou ao rejeitar liminarmente a petição inicial de oposição por apresentação extemporânea, considerando a data presumida de citação por transmissão eletrónica de dados.

Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o processo submetido à Conferência para julgamento.


III FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.
O despacho recorrido tem o seguinte teor:
F…, contribuinte fiscal n.º 1…, melhor identificado nos autos, instaurou a presente Oposição ao Processo de Execução Fiscal (PEF) n.º 1783201501057073.
Do teor de fls. 71, resulta que a acção é intempestiva.
Notificado para o efeito o Oponente respondeu nos termos de fls. 84, alegando, em síntese, que apenas em 12.11.2015 acedeu à sua caixa postal.
Cumpre apreciar desde já da admissibilidade da presente oposição.
*
Os factos relevantes são os seguintes:
 Em 14.03.2015, no Finanças (SF) de Gondomar foi instaurada a Execução Fiscal n.º 1783201501057073, contra o Oponente – fls. 38;
 Em 17.03.2015 foi entregue documento de citação na caixa postal electrónica via CTT do Oponente – fls. 39;
 O Oponente acedeu à caixa postal electrónica em 12.11.2015 – fls. 39.
 Em 15.12.2015 foi apresentada a presente oposição – fls. 58.
*
Vejamos.
O prazo para interposição da Oposição é um prazo processual, de natureza peremptória.
Assim, dispõe o art. 203, n.º 1, do C.P.P.T. que o executado pode deduzir oposição à execução fiscal, no prazo de 30 dias contados da citação pessoal, sempre que esta ocorra.
A este propósito rege o art. 191, do CPPT, segundo o qual:
1 - Nos processos de execução fiscal cuja quantia exequenda não exceda 500 unidades de conta, a citação efectua-se, mediante via postal simples, aplicando-se-lhe as regras do artigo anterior, com as necessárias adaptações.
2 - A citação referida no número anterior é feita por via postal registada quando a dívida exequenda for superior a 50 vezes a unidade de conta.
3 - A citação é pessoal:
a) Nos casos não referidos nos números anteriores;
b) Na efectivação da responsabilidade solidária ou subsidiária;
c) Quando houver necessidade de proceder à venda de bens;
d) Quando o órgão de execução fiscal a considerar mais eficaz para a cobrança da dívida.
4 - As citações referidas no presente artigo podem ser efectuadas por transmissão electrónica de dados, valendo como citação pessoal.
5 - As citações efectuadas nos termos do número anterior consideram-se feitas no momento em que o destinatário aceda à caixa postal electrónica.
6 - A citação considera-se efectuada no 25.º dia posterior ao seu envio caso o contribuinte não aceda à caixa postal electrónica em data anterior.
7 - A presunção do número anterior só pode ser ilidida pelo citado quando, por facto que não lhe seja imputável, a citação ocorrer em data posterior à presumida e nos casos em que se comprove que o contribuinte comunicou a alteração daquela nos termos do artigo 43.º.
8 - As citações efectuadas por transmissão electrónica de dados são sempre autenticadas com a assinatura electrónica avançada certificada nos termos previstos pelo Sistema de Certificação Electrónica do Estado - Infra-Estrutura de Chaves Públicas, da entidade competente.
Portanto, as citações podem ser efectuadas por via postal electrónica e consideram-se feitas na data em que o citado acede à caixa postal, se esta ocorrer até ao 25.º dia após a sua realização.
No caso em que o citado acede à caixa postal após 25 dias contados da sua realização, a mesma presume-se feita no 25.º dia após a sua realização.
Ora, no caso em apreço temos que a citação foi efectuada em 17.03.2015 e que o Oponente a ela acedeu em 12.11.2015, ou seja, mais de 25 dias depois, razão pela qual a mesma se considera efectuada no 25.º dia após a sua realização, nos termos do transcrito art. 191, n.º 6.
Acresce que competia ao Oponente ilidir a presunção, nos termos previstos no n.º 7, da norma referida, ou seja, demostrando que foi por facto que não lhe é imputável que a citação ocorreu em data posterior à presumida ou comprovar que comunicou a alteração daquela nos termos do artigo 43.º.
Conforme resulta do teor do requerimento de fls. 84 o Oponente limitou-se a dizer que foi naquela data que acedeu à caixa postal.
Assim sendo, funciona plenamente a presunção estipulada no art. 191, n.º 6, do CPPT, pelo que a presente acção deduzida em 15.12.2015 é intempestiva, verificando-se a caducidade do Direito de acção.
*
Decisão.
Por todo o exposto, indefere-se liminarmente a petição inicial, atenta a verificação da excepção insuprível de caducidade do direito de acção.
*
Condeno o Oponente nas custas do incidente, sem prejuízo da decisão que vier a ser proferida no âmbito do PAJ.

IV FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.
O processo de execução fiscal é um processo direccionado à cobrança dos créditos tributários de qualquer natureza, estruturado em termos mais simples do que o processo de execução comum, com o objectivo de conseguir uma maior celeridade na cobrança dos créditos, recomendada pelas finalidades de interesse público das receitas que através dele são cobradas (cfr.Jorge Lopes de Sousa, Código do Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, 5ª. edição, II Volume, Áreas Editora, 2007, pág. 20 e seg.).

Instaurada a execução nos termos do art.º 188º do CPPT, procede-se à citação pessoal do executado (cfr. art.º 188º/1 CPPT) a efetuar nos termos do Código de Processo Civil, por força do disposto no art. 192º do CPPT sem prejuízo, no que respeita à citação por tansmissão eletrónica de dados, do disposto nos n.ºs 4 e 5 do artigo 191º do CPPT (art. 192º/1 do CPPT).

A citação é o acto pelo qual se chama a juízo o réu numa dada acção, dando-lhe conhecimento dos termos da mesma e concedendo-lhe prazo para se defender (cfr. artº. 228º do NCPC e artºs.35/2, e 189º do CPPT).
A citação de pessoa singular pode ser pessoal, ou edital.

Nos termos do art.º 225º do CPC, a citação pessoal (de pessoa singular) é feita mediante (i) transmissão eletrónica de dados, nos termos definidos na portaria prevista no n.º 1 do art. 132º (ii) entrega ao citando de carta registada com aviso de receção, seu depósito nos termos do n.º 5 do artigo 229º, ou certificação da recusa de recebimento, nos termos do n.º 3 do mesmo diploma.

A citação por transmissão eletrónica de dados prevista referida na alínea a) do n.º 2 do artº 225º do CPPT está regulada no art. 191º do CPPT, em especial nos seus n.ºs 4 e segs.

A citação pessoal pode ser efectuada por transmissão eletrónica de dados. Esta forma de citação, diz a lei, equivale à remessa por via postal simples ou registada, ou por via postal registada com aviso de receção (art. 191º/4 na redação dada pela Lei n.º 82º-B/2014, de 31/12).
Sendo empregue este modo de citação, ela considera-se feita no momento em que o destinatário aceda à caixa postal eletrónica (art. 191º/5 do CPPT).

O caso é que não tendo acedido antes, a MMª juiz considerou que a citação se presume efectuada no 25º dia posterior ao do envio da comunicação por força da aplicação do disposto no n.º 6 do art.º 191º do CPPT que expressamente refere “A citação considera-se efectuada no 25º dia posterior ao seu envio caso o contribuinte não aceda à caixa postal eletrónica em data anterior”.

No entendimento perfilhado pela MMª juiz uma vez que a transmissão eletrónica de dados foi expedida em 17/3/2015 a sua receção presumida ocorreu em 11 de abril de 2015 pelo que nesta data se encontra citado.
Logo, a oposição apresentada em 15/12/2015 é manifestamente extemporânea à face do disposto no art. 203º/1-a) do CPPT.
Mas será mesmo assim?

Afigura-se-nos que não. Devemos notar que nos termos do n.º 1 do art. 192º do CPPT (sob epígrafe “Citações pessoal e Edital):
As citaçoÞes pessoais saÞo efectuadas nos termos do Coìdigo de Processo Civil, sem prejuiìzo, no que respeita aÌ citaçaÞo por transmissaÞo electroìnica de dados, do disposto nos nos 4 e 5 do artigo anterior.

Portanto, a citação pessoal pode ser efectuada (também) por transmissão eletrónica de dados com aplicação do disposto nos n.ºs 4 e 5 do art. 191º CPPT (exclui-se o n.º 6).

Vejamos agora o que dizem os n.ºs 4 e 5 do art. 191º (na redacção vigente em 2014).
N.º 4:
As citaçoÞes referidas no presente artigo podem ser efetuadas por transmissaÞo eletroìnica de dados, que equivalem, consoante os casos, aÌ remessa por via postal simples ou registada ou por via postal registada com aviso de receçaÞo, valendo como citaçaÞo pessoal.
N.º 5:
As citaçoÞes efectuadas nos termos do nuìmero anterior consideram -se feitas no momento em que o destinataìrio aceda aÌ caixa postal electroìnica.

Ou seja, o n.º 1 do art. 192º do CPPT, referente à citação pessoal, exclui da remissão para o art. 191º o n.º 6 deste preceito que é precisamente onde o legislador considera a citação efetuada no 25º dia posterior ao seu envio caso o contribuinte não aceda à caixa postal eletrónica em data anterior.

Portanto, não podemos considerar que a citação pessoal ocorreu em data presumida (25º dia posterior ao do envio) porque esse segmento normativo foi excluído da regra sobre a citação pessoal a que alude o art.º 192º/1 CPPT.

É certo que a presunção estabelecida no n.º 6 do art. 191º também fala em “citação”. Só que a citação aqui referida (presumida) não é uma citação pessoal. Ela permite que se proceda à penhora (art. 193º/1 do CPPT), mas não autoriza a venda sem que haja citação pessoal (art. 193º/2 CPPT).

Ou seja, a citação presumida é (apenas) uma citação provisória O Ac. do STA n.º 01049/16 de 3/11/2016 citado pelo Exmo. Procurador-Geral Adjunto não versa sobre idêntica factualidade que aqui apreciamos. No caso do acórdão do STA o contribuinte acedeu à caixa postal eletrónica no mesmo dia em que foi enviado o documento, como resulta dos factos provados nas alíneas C) e D) daquele douto aresto:
C) O documento mencionado na alínea anterior foi enviado e integrado no via CTT e entregue na caixa postal electrónica do ora reclamante em 18-04-2016 [cf. fls. 35 dos autos].
D) O ora reclamante acedeu à caixa postal electrónica na mesma data de 18-04-2016 [cf. fls. 35 dos autos]..

A questão tem contornos idênticos à que foi objecto de decisão no acórdão deste TCA n.º 2865/15.2BEPRT de 17/6/2016 Relator: Cristina Travassos Bento, ainda inédito, ao que sabemos.
que subscrevemos como segundo adjunto e que, com a devida vénia, reproduzimos:
“O chamamento dos responsáveis subsidiários, que ao caso interessa, será feita nos termos do nº 3 do artigo 191º por citação pessoal. Pois só a citação pessoal garante para o processo que a citação chegou ao conhecimento do citando. E por sua vez só esse conhecimento garante que se está perante uma verdadeira citação definitiva. Daí que o prazo para a dedução de oposição à execução apenas se conta a partir da citação pessoal., ou quando ela não tenha ocorrido da primeira penhora- cfr. artigo 203, nº 1, alínea a).
Como decorre do acórdão do STA de 21.03.2012, no processo 081/12, a outra modalidade de citação prevista no artigo 191º do CPPT, a efectuada por via postal, constitui uma “ citação provisória, pela falta de segurança de que se reveste, não é susceptível de abrir o prazo para a defesa do executado, designadamente o prazo de oposição à execução fiscal ou o prazo para o exercício de outros direitos que hajam de ser exercidos dentro daquele prazo, como resulta inequivocamente do disposto no artigo 203.º, n.º 1, alínea, a), do CPPT.”

É o nº 1 do artigo 192º do CPPT que regula a efectivação das citações pessoais.
Rege este normativo, na redacção aplicável, que “As citações pessoais são efectuadas nos termos do Código de Processo Civil, sem prejuízo, no que respeita à citação por transmissão electrónica de dados, de acordo com o disposto nos nºs 4 e 5 do artigo anterior” (cfr. redacção dada pela Lei 67-A/2007, de 31.12).

A citação pessoal será assim feita, vulgarmente por carta registada com aviso de recepção (nos termos do Código de Processo Civil) e ainda por transmissão electrónica de dados, nos termos do nº 4 e 5 do artigo 191º.
Estes últimos normativos, na redacção aplicável ao caso, leia-se Lei nº 3-B/2010, de 28.04, referiam que:

“4. As citações referidas no presente artigo podem ser efectuadas por transmissões electrónicas de dados, que equivalem, consoante os casos, à remessa por via postal simples ou registada ou por via postal registada com aviso de recepção.

5. As citações efectuadas nos termos do número anterior consideram-se feitas no momento em que o destinatário aceda à caixa postal electrónica.”

Importante para a apreciação da questão, que se nos coloca, como veremos adiante, é a redacção do nº 6 do referido artigo 191º.

O nº 6 do artigo 191º, com a Lei nº 3-A/2010, tinha a seguinte redacção:
“6. Se a citação for efectuada através de transmissão electrónica de dados e esta for equivalente à efectuada através de carta registada com aviso de recepção, o seu destinatário considera-se citado caso se confirme o acesso à caixa postal electrónica.”

Com a Lei nº 66-B/ 2012, de 31.12, a redacção deste nº 6, do art.191, retrocedeu na sua amplitude e passou a ter a redacção aplicável ao caso sub judice:
“6. A citação considera-se efetuada no 25.º dia posterior ao seu envio caso o contribuinte não aceda à caixa postal eletrónica em data anterior.”
Ainda com a Lei agora citada, foi aditado um nº 7, ao artigo 191º, do seguinte teor:
“7. A presunção do número anterior só pode ser ilidida pelo citado quando, por facto que não lhe seja imputável, a citação ocorrer em data posterior à presumida e nos casos em que se comprove que o contribuinte comunicou a alteração daquela nos termos do artigo 43.º “

Antes de prosseguirmos, diga-se que dúvidas não há, nem o recorrente coloca em causa, de que tendo aderido ao serviço público de Caixa Postal Electrónica, nos termos do artigo 4º, nº 2 do Decreto-Lei nº 112/2006, de 9 de Junho, podia ser citado na execução fiscal através de meios electrónicos, como referido na sentença recorrida.

A questão a decidir é, em síntese, determinar se a citação pessoal do revertido se efectua apenas no momento em que o revertido, nos termos do artigo 191º, nº 5, acede à caixa electrónica. Ou se, como entendeu a sentença, e o despacho reclamado, a citação pessoal se deve considerar efectuada nos termos do nº 6 do 191º, que presume a citação efectuada no 25º dia posterior ao seu envio, caso o revertido (no caso) não aceda á caixa postal electrónica em data anterior.

Sublinhe-se que é manifesto o artigo 192º, nº 1 do CPPT permitir que as citações pessoais sejam efectuadas por transmissão electrónica de dados. Todavia, haverá que determinar qual o momento em que se considera efectuada a citação pessoal, por transmissão electrónica de dados.
Entendemos, salvo melhor opinião, que tal citação pessoal apenas se efectua quando o revertido acede à caixa electrónica.
Expliquemos porquê.
Desde logo, é necessário não olvidar que a citação pessoal tem carácter definitivo e não provisório, como outros tipos de citação, como referido supra, o que pressupõe que o citando, teve efectivamente conhecimento do acto de citação, ou que lhe foram criadas todas as condições para que pudesse ter conhecimento do acto de citação. Daí que o nº 2 e 3 do artigo 192º do CPPT, imponha a repetição da citação. E no caso do nº 4 do mesmo artigo, se efectue uma citação por éditos.
E é com base neste princípio que se percebe, salvo melhor opinião, o disposto no artigo 192º, nº1, quando, relativamente à citação pessoal por transmissão electrónica de dados, remete, apenas, para o nº 4 e 5 do artigo 191º. E já não para os nºs 6 e 7 daquele 191º.
É que a aplicação do nº 6 e 7º do artigo 191º, implica a utilização de uma presunção, que pela falta de segurança de que se reveste, não se afigura susceptível de abrir o prazo para a defesa do executado, designadamente o prazo de oposição à execução fiscal ou o prazo para o exercício de outros direitos que hajam de ser exercidos dentro daquele prazo, como resulta inequivocamente do disposto no artigo 203.º, n.º 1, alínea, a), do CPPT.

Acresce ainda referir, para reforço da ideia agora explanada, que o artigo 193º do CPPT dispõe que se a citação for efectuada por transmissão electrónica de dados e em caso de não acesso à Caixa Postal Electrónica se procede à penhora (nº1) e que a realização da venda depende de prévia citação pessoal (nº 2) [que terá de ser efectuada por outros meios que não os de transmissão por meios electrónicos de dados, acrescentamos nós] e se não for conhecida a morada do executado, proceder-se-á a citação edital (nº 3).
Retira-se, assim, de tal normativo que, o não acesso à Caixa Postal Electrónica, implica a não efectivação de citação pessoal do executado/revertido. O que por maioria de razão demonstra que o legislador não pretendeu na redacção do artigo 192º, nº 1, abarcar na remissão para o nº 4 e 5 do 191º, o disposto no artigo 6º e 7º do mesmo artigo.
Sempre com respeito por melhor opinião, a interpretação agora feita dos dispositivos legais em questão demonstra que a citação por transmissão electrónica de dados não viola o disposto nos artigos 13º e 20º da Constituição da República Portuguesa, respeitando-se dessa forma o direito de defesa e o princípio do contraditório.

Regressando ao caso dos autos, temos que foi remetido ao revertido citação por transmissão electrónica de dados, via CTT e que foi entregue na caixa postal na caixa postal electrónica do revertido em 10.10.2004. – cfr. ponto 4 do probatório. E que apenas em 19.03.2015 o revertido acedeu à sua caixa de correio electrónico – cfr. ponto 12 do probatório.
Fazendo a aplicação do direito aos factos, se conclui que mal andou a sentença ao considerar que o revertido se tinha por citado pessoalmente em 4.11.2014, nos termos do nº 6 do artigo 191º do CPPT. Apenas em 19.03.2015, o citado/revertido se poderá considerar citado pessoalmente, através de transmissão electrónica de dados, em face da lei em vigor à data”.

A situação apreciada no acórdão transcrito respeita à citação de um responsável subsidiário, o que não sucede no caso que ora nos ocupa.

Mas a solução não pode deixar de ser idêntica porque, nos termos do art. 203º/1 do CPPT o prazo para deduzir oposição é de 30 dias a contar da citação pessoal ou, não a tendo havido, da primeira penhora.

Nestas circunstâncias, o despacho recorrido não pode manter-se.

V DECISÃO.

Termos em que acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso Tributário deste TCAN em conceder provimento ao recurso e anular o despacho recorrido que deve ser substituído por outro que não rejeite liminarmente a petição inicial por extemporaneidade com fundamento na data da citação presumida do oponente.
Sem custas.
Porto, 30 de março de 2017.
Ass. Mário Rebelo
Ass. Cristina Travassos Bento
Ass. Paula Maria Dias de Moura Teixeira