Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00784/09.0BEBRG
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:03/25/2021
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Rosário Pais
Descritores:IMT; OBRAS; AVALIAÇÃO; LIQUIDAÇÃO ADICIONAL; INQUISITÓRIO
Sumário:I - Embora não seja possível invocar, na impugnação deduzida contra o ato de liquidação de IMT, vícios inerentes ao ato de avaliação e fixação do valor patrimonial tributário do imóvel transmitido, tal não impede que nela seja invocada e decidida a questão de saber se a administração tributária podia ter atendido - para efeitos de liquidação adicional deste imposto - a um valor patrimonial tributário que resultou de uma avaliação posterior à transmissão, efetuada na sequência da apresentação de declaração mod. 1 para efeitos de IMI, realizada numa altura em que o prédio já tinha sofrido alterações concretizadas após a transmissão, e na qual se atendeu apenas ao estado em que o prédio se encontrava no momento da avaliação.

II - Tal liquidação de IMT pode ser sindicada com base nessa eventual ilegalidade, porquanto o que verdadeiramente está em causa é a questão jurídica da produção de efeitos, em sede de outros impostos que não o IMI, das avaliações efetuadas no âmbito da avaliação imposta pelo Dec. Lei n.º 287/2003, de 12.11, e traduz-se em saber se pode atender-se, para efeitos de liquidação adicional de IMT, a um valor patrimonial fixado numa avaliação posterior à transmissão e que, tendo sido realizada para efeitos de IMI, atendeu a uma realidade que não existia à data da transmissão.

III - A liquidação de IMT referente a primeira transmissão após a vigência do CIMI era sempre provisória, porque sujeita a retificação, pois, na determinação do valor patrimonial dos imóveis para efeitos de IMT, permitia o legislador que a liquidação de imposto fosse corrigida, sendo caso disso, logo que a avaliação do imóvel em causa se tornasse definitiva, nos termos do CIMI, no que diz respeito aos prédios cujo valor patrimonial tivesse sido determinado ainda nos termos do Código da Contribuição Predial e do Imposto sobre a Indústria Agrícola, conforme dispõe o artigo 27.º, n.º 1, al. a), do DL n.º 287/2003, de 12/11.

IV - O IMT incide sobre a riqueza, enquanto indicador de capacidade tributária dos contribuintes, sujeitando a imposto a aquisição onerosa de bens imóveis, independentemente do título ou da forma jurídica utilizada nessa aquisição; daí que, para efeito de liquidação adicional de IMT (em que releva o valor da propriedade adquirida), a avaliação deva reportar-se ao momento da aquisição, considerando o valor do imóvel no estado em que se encontrava a essa data, por ser este o que traduz a riqueza/capacidade contributiva manifestada no momento da aquisição.

V - Se o imóvel foi objeto de obras, entre as datas das respetivas aquisição e avaliação, e os autos não reúnem elementos que permitam fundadamente afirmar que aquelas não tiveram qualquer reflexo na avaliação, devem os autos baixar à 1.ª instância para ampliação da matéria de facto..*
* Sumário elaborado pela relatora
Recorrente:R.
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Votação:Unanimidade
Objecto:Conceder provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
*

1. RELATÓRIO

1.1. R., devidamente identificado nos autos, vem recorrer da sentença proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, em 04.05.2010, pela qual foi julgada improcedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação adicional de IMT, emitida na sequência de avaliação do imóvel transmitido, despoletada pela apresentação da declaração mod. 1 de IMI, após a primeira transmissão do prédio na vigência do CIMI.

1.2. O Recorrente R., terminou as respetivas alegações formulando as seguintes conclusões:

«I- O recorrente impugnou a liquidação adicional de IMT.
II- A Impugnação tem como fundamento a nulidade da Liquidação adicional de IMT, com base na falta de fundamento da mesma, ao abrigo do art.º 99º, al. c), do C. P.P.T..
III- O recorrente não omitiu valores sujeitos a tributação nem praticou ou celebrou actos ou contractos com o objectivo de diminuir a divida de imposto e daí resultar prejuízo para o Estado.
IV- No momento da liquidação de IMT devido pela aquisição o prédio não tinha as características que foram, muito posteriormente, avaliadas pelo serviço de Finanças.
V- O prédio foi sujeito as avultadas obras de remodelação e melhoramento, obras esses posteriores à aquisição e custeadas pelo recorrente e comproprietários, comprovadas pelo documento emitido pela Câmara Municipal de Braga.
VI- As testemunhas indicadas pelo recorrente deveriam ter prestado depoimento em audiência contraditória, nos termos do art.º 118º, do C.P. P.T., no entanto não o foram.
VII- O recorrente foi impedido de produzir toda a sua prova.
VIII- A não produção da prova testemunhal requerida pelo recorrente influiu directamente na decisão da causa.
Neste[s] termos requer-se a V.as Ex.as, Venerandos Juízes Desembargadores, que seja dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta decisão recorrida e proferindo outra que julgue procedente o pedido do recorrente;
Ou, se assim não se entender, revogando a douta sentença recorrida, anulando toda a tramitação e determinando a baixa dos autos à 1ª instância para aí se proceder à inquirição das testemunhas indicadas pelo recorrente, fazendo assim V.as Ex.as a habitual JUSTIÇA.»
*
1.3. A Recorrida Fazenda Pública não apresentou contra-alegações.
*
1.4. O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu o parecer no sentido da improcedência do recurso interposto.
*
Dispensados os vistos legais, nos termos do artigo 657.º, n.º 4, do CPC, cumpre apreciar e decidir, pois que a tanto nada obsta.
*

2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR

Uma vez que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações da Recorrente, cumpre apreciar e decidir se os autos enfermam de défice instrutório, por não ter sido produzida a prova testemunhal requerida pelo Recorrente e se a sentença enferma de erro de julgamento.

3. FUNDAMENTAÇÃO
3.1. DE FACTO

3.1.1. Factualidade apurada em 1.ª instância
A decisão recorrida contém a seguinte fundamentação de facto:
«Pelos documentos juntos aos autos com relevância para o caso, considero provados os seguintes factos:
1. O impugnante foi notificado da liquidação adicional de IMT, cujo prazo de pagamento voluntário terminou em 13.02.2008, tendo deduzido reclamação graciosa, em 20.02.2008, à qual foi dada o nº 0361200804001625 (fls. 2 a 5 do PA);
2. Em 08.04.2009, a impugnante foi notificada do indeferimento do procedimento de reclamação graciosa; (fls. 74 e 78 do PA);
3. A presente impugnação foi enviada, por correio registado, em 23.04.2009 (fls. 60 dos autos);
4. A Administração Fiscal procedeu à liquidação adicional de IMT, no valor de 9 781.41 resultante de avaliação, no valor de 557 450.00 , tendo data limite de pagamento em 31.12.2005;
5. O Impugnante por escritura pública, de 22.04.2005, comprou em compropriedade, o prédio urbano inscrito no art. 2779º, da freguesia se S. Victor, Braga, pelo preço de 105 999.09 (fls. 11 a 14 dos autos);
6. Em 21.06.2005 o Impugnante, apresentou no Serviço de Finanças o modelo I do IMI;
7. Em 04.10.2005 foi efectuada a 1º avaliação do prédio tendo sido atribuído o valor de 557 450.00 (fls. 44 do PA);
8. O Impugnante foi notificado, ficha de 1 a Avaliação efectuada, e requereu a 2ª Avaliação do prédio;
9. Em 29.05.2005 foi notificado do resultado da 2.ª avaliação, a qual manteve o valor da primeira (fls. 55 a 56 do PA).
Formou-se a convicção do Tribunal na consideração dos factos provados no teor dos documentos constantes dos autos e do processo administrativo apenso por linha.
Nada mais resulta provado com interesse para a presente decisão.».

3.1.2. Aditamento à matéria de facto
Uma vez que constam dos autos os elementos de prova necessários para o efeito, ao abrigo da faculdade que nos é conferida pelo artigo 662, n.º 1, do CPC, vamos proceder ao seguinte aditamento ao elenco dos factos provados:

10. Do Termo de Avaliação datado de 29.05.2007 (2.ª avaliação) consta que os peritos viram o examinaram, por inspeção direta, o prédio a avaliar – cfr. fls. 58 do PA.

11. Na ficha da 2.ª avaliação, para além das áreas (total do terreno, de implantação do edifício, bruta de construção, bruta dependente e bruta privativa) do prédio, bem como as respetivas coordenadas, tipo de coeficiente de localização e coeficiente de localização, também constam os elementos de qualidade e conforto de Qualidade construtiva (0,08), Ventilação – sistemas de aquecimento e arrefecimento (0,02 BOM), Conforto acústico (0,02 BOM) e Nível de qualidade dos revestimentos/acabamentos (0,04 MÉDIO MAIS) – cfr. ficha de avaliação de fls. 55 a 57 do PA.

12. Relativamente ao imóvel transmitido pela escritura identificada no ponto 5 do probatório, em 02.02.2005 foi emitido Alvará de obras de Adaptação n.º 287/05, aprovadas por Despacho de 28.01.2005, da Câmara Municipal de Braga, para “transformação, adaptação e alteração do uso do pavilhão de uma unidade industrial para a instalação de um estabel. de bebidas c/ espaço destinado a dança” – cfr. doc. 3 junto com a p.i., fls. 27 do suporte físico dos autos.

13. De acordo com o Livro de Obra que também integra o doc. 3 da p.i., as obras aludidas no ponto antecedente decorreram entre 02.05.2005 e 02.06.2005 e consistiram em: desmantelamento da cobertura existente e montagem de estrutura e cobertura; execução de paredes divisórias em tijolo, abertura de rasgos no pavimento para rede de esgotos e eletricidade; colocação de lage sobre os WC, abertura de saídas nas paredes para ventilação, abertura e colocação de portas de emergência; elevação do pavimento e colocação de escadas; abertura de rasgos e colocação de redes elétrica e águas nas paredes; rebocos e colocação de revestimento nas paredes e pavimentos dos WC´s; colocação de isolante de lã de rocha e pladur nos tetos e paredes; colocação de carpintarias e de louças sanitárias; pinturas, reabilitação da entrada; aplicação de auto nivelante no pavimento e pintura do mesmo – cfr. fls. 24 a 26 do suporte físico dos autos.

3.2. DE DIREITO

O Recorrente deduziu impugnação judicial contra o ato de liquidação adicional de IMT, respeitante à aquisição do prédio inscrito na matriz urbana da freguesia de Braga (S. Victor) sob o artigo 2779, pela qual, no dia anterior à escritura, foi pago IMT no valor de €35.333,33. Alega que, após tal aquisição, ele e os restantes comproprietários, realizaram “avultadas obras” naquele prédio, pelo que, quando o mesmo foi avaliado, as características que apresentava eram distintas das que existiam à data da respetiva aquisição – do que entende ser elucidativo o doc. 3 junto com a p.i., emitido pela Câmara Municipal de Braga, respeitante às obras de remodelação e alteração efetuadas. Mais alega que, no momento da aquisição, o prédio tinha o valor pelo qual foi adquirido, concluindo que a liquidação agora em crise é nula por falta de fundamento. A final, arrolou testemunhas.
Sem ter sido emitida qualquer pronúncia sobre a prova testemunhal requerida pelo Impugnante, foi proferida a sentença agora recorrida que, na parte que aqui importa apreciar, contém a seguinte fundamentação de direito:
«O Impugnante, nos presentes autos alega que a avaliação do imóvel foi atribuído valor excessivo, pois teria considerado as obras realizadas posteriormente à referida transmissão.
Alega que o valor da transmissão foi de 105 999.99 , sendo um valor correcto e justo.
Que em data posterior à transmissão, os comproprietários do imóvel fizera-lhe avultadas obras de remodelação e melhoramentos e tal circunstância não foi ponderada naquela avaliação.
O Impugnante, no seu articulado discorda do valor patrimonial fixado ao prédio, na avaliação.
Determina o nº1 do artº 76º do CIMI que: Quando o sujeito passivo ou o chefe de finanças não concordarem com o resultado da avaliação directa de prédios urbanos, podem, respectivamente, requerer ou promover uma segunda avaliação, no prazo de 30 dias contados da data em que o primeiro tenha sido notificado.
Por sua vez, prescreve o art. 134º n.º 1 e 7 do CPPT, 1 - Os actos de fixação dos valores patrimoniais podem ser impugnados, no prazo de 90 dias após a sua notificação ao contribuinte, com fundamento em qualquer ilegalidade.
7 - A impugnação referida neste artigo não tem efeito suspensivo e só poderá ter lugar depois de esgotados os meios graciosos previstos no procedimento de avaliação.
Resulta da matéria assente que o Impugnante foi notificado, da ficha de 1ª Avaliação efectuada, e requereu a 2ª Avaliação do prédio.
Em 29.05.2005 foi notificado do resultado da 2.ª avaliação, a qual manteve o valor da primeira.
Ora era em sede de avaliação que o Impugnante poderia questionar o valor atribuído nomeadamente a consideração das obras e só depois de esgotados os meios administrativos poderia recorrer à impugnação judicial.
Não tendo impugnado a avaliação o valor patrimonial fixado n[a] 2ª avaliação tornou-se definitivo e insusceptível de ser questionado.
Face à liquidação adicional do IMT, não pode o Impugnante agora contestar com base no acto de avaliação, mas somente com base na ilegalidade ou outro motivo previsto no art. 99º do CPTT.
Não tendo o Impugnante assacado ao acto de liquidação qualquer ilegalidade, a presente impugnação não tem fundamento pelo que improcede.».
Afigura-se-nos, porém, que a sentença recorrida enferma de erro pois como em situação similar decidiu o STA, no seu acórdão de 13.07.2016, rec. 0173/16, disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/-/feedb753b6a64cc6802580110050f8bf?OpenDocument&ExpandSection=1:
«(…)

A ilegalidade que o impugnante invoca resulta, essencialmente, do facto de a administração tributária ter atendido, para efeitos de liquidação adicional de IMT (imposto cuja função é tributar a riqueza mobilizada pelo adquirente), ao valor patrimonial tributário fixado numa avaliação realizada muito depois da transmissão dos prédios adquiridos e numa altura em que estes já tinham sofrido profundas alterações e grandes melhoramentos. Na óptica do impugnante, e que, aliás, obteve acolhimento pelo julgador, tais liquidações adicionais de IMT podem ser sindicadas com base na sua eventual ilegalidade por se terem alicerçado num valor patrimonial tributário fixado em avaliação que se deteve sobre uma realidade substancialmente diferente daquela que existia à data da transmissão (momento em que se constitui a obrigação tributária de IMT).

Não está, assim, em discussão, a avaliação em si, realizada em Junho de 2007 na sequência da apresentação de declaração modelo 1 para efeitos de IMI e que incidiu sobre a estrutura física dos prédios nesse momento (avaliação com a qual o proprietário pode até concordar para efeitos de IMI, tendo em conta as condições do prédio nessa data), nem está em discussão o valor patrimonial tributário que dela resultou, mas, antes, a questão de saber se, para efeitos de liquidação de outro imposto (IMT) se pode atender, como se atendeu, ao valor patrimonial fixado na avaliação efectuada na sequência de apresentação de declaração mod. 1 de IMI e que não considerou o estado em que se encontravam os prédios à data da sua transmissão onerosa.

No fundo, o que está em discussão é a questão jurídica da produção de efeitos, em sede de outros impostos que não o IMI, das avaliações de prédios efectuadas no âmbito da avaliação imposta pelo Dec. Lei nº 287/2003, de 12.11, e que se traduz em saber se pode ou não atender-se, para efeitos de liquidação adicional de IMT, ao valor patrimonial fixado em avaliação posterior à transmissão, efectuada na sequência da apresentação de declaração mod. 1 de IMI, nas situações, como a dos autos, em que o prédio sofreu profundas alterações e grandes melhoramentos entre a data da transmissão e o momento da avaliação.

Independentemente da viabilidade de êxito ou procedência desta questão jurídica, não podemos deixar de concluir que ela pode ser invocada e deve ser apreciada e decidida na impugnação deduzida contra o acto de liquidação de IMT.».
Portanto, ao contrário do que se considerou na sentença recorrida, o Impugnante não se limitou a discutir a legalidade do ato de 2.º avaliação, antes invocou vícios próprios do ato de liquidação adicional de IMT, que importava apreciar.

Por outra banda, é sabido que o IMT incide sobre a riqueza, enquanto indicador de capacidade tributária dos contribuintes, sujeitando a imposto a aquisição onerosa de bens imóveis, independentemente do título ou da forma jurídica utilizada nessa aquisição.
O objeto da sujeição do imposto não é propriamente o ato ou contrato que titulam a aquisição, mas sim o efeito desses atos ou contratos, ou seja, a aquisição da propriedade ou dos direitos correspondentes sobre esses imóveis.

A aquisição do direito de propriedade de bens imóveis, prevista no artigo 2.º, n.º 1, do CIMT, consubstancia o mais importante facto tributário deste tributo, embora esta norma sujeite a imposto tanto a aquisição da propriedade do imóvel, como de figuras parcelares deste.

O valor tributável sujeito a imposto segue a regra geral, do maior dos valores, ou o declarado ou o valor patrimonial do imóvel, tal como resulta do artigo 12.º, n.º 1, do CIMT (cfr. José Maria Fernandes Pires, Lições de Impostos sobre o Património e do Selo, Almedina, 3ª. Edição, 2016, pág.233 e seg.; António Santos Rocha e Outro, Tributação do Património, 2ª. Edição, Almedina, 2018, pág.433 e seg.).

A liquidação deve ser efetuada por iniciativa dos interessados (artigo 19.º do CIMT) e, em regra, deve anteceder o ato ou facto translativo dos bens (artigo 22.º do CIMT).
De notar, porém, que esta liquidação era provisória, porque sujeita a retificação, nos casos em que o imóvel ainda não tivesse sido objeto de avaliação nos termos do CIMI. Com efeito, na determinação do valor patrimonial dos imóveis para efeitos de IMT, permitia o legislador que a liquidação de imposto fosse corrigida, sendo caso disso, logo que a avaliação do imóvel em causa se tornasse definitiva, nos termos do CIMI, no que diz respeito aos prédios cujo valor patrimonial tivesse sido determinado ainda nos termos do Código da Contribuição Predial e do Imposto sobre a Indústria Agrícola, tudo conforme dispõe o artigo 27.º, n.º 1, al. a), do DL n.º 287/2003, de 12/11 (cfr. José Maria Fernandes Pires, ob.cit., pág.134), segundo o qual:
«1- O IMT relativo aos prédios cujo valor patrimonial tributário tenha sido determinado nos termos do Código da Contribuição Predial e do Imposto sobre a Indústria Agrícola, e enquanto não for efectuada a avaliação geral da propriedade imobiliária, nos termos previstos no Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), é liquidado, sem prejuízo das regras especiais previstas no CIMT, nos termos seguintes:
a) O imposto relativo aos prédios urbanos é provisoriamente liquidado pelo valor constante do acto ou do contrato ou pelo valor patrimonial tributário inscrito na matriz à data da liquidação, consoante o que for maior, sendo a liquidação corrigida oficiosamente, sendo caso disso, logo que se torne definitivo o valor da avaliação a levar a efeito nos termos previstos no n.º 1 do artigo 15.º do presente diploma, relativamente a todas as primeiras transmissões que ocorrerem após a entrada em vigor do CIMT; […]».

Aliás, no mesmo sentido, o artigo 31.º, n.º 2, do CIMT impõe a liquidação adicional nos casos em que haja lugar a avaliação.
Por força do n.º 4, do artigo 35.º do CIMI «A avaliação reporta-se à data do pedido de inscrição do prédio na matriz.», afigurando-se-nos claro que esta estatuição apenas respeita aos prédios avaliados após a respetiva inscrição matricial. Porém, num caso como o dos presentes autos e para efeito de liquidação adicional de IMT (em que releva o valor da propriedade adquirida), a avaliação deve reportar-se ao momento da aquisição, considerando o valor do imóvel no estado em que se encontrava a essa data, por ser este o que traduz a riqueza/capacidade contributiva manifestada no momento da aquisição.

Revertendo ao caso em análise, temos que a transmissão do direito de propriedade do “Prédio urbano composto por PAVILHÃO NÚMERO CINCO, de rés do chão, destinado a indústria, situado no lugar do (…), da cidade de BRAGA (…) inscrito na matriz urbana sob o artigo 2.779, com o valor patrimonial de 15.945,57 €”se operou por força da escritura de compra e venda celebrada em 22.04.2005, nesta data ficando preenchida a previsão da norma de incidência objetiva do IMT (artigo 2.º, n.º 1, do CIMT), pelo preço de €105.999,09.

Resulta da factualidade por nós aditada que, logo após a aquisição do imóvel, foram nele realizadas algumas obras de transformação e adaptação visando a alteração do seu uso para estabelecimento de bebidas e dança, as quais foram consideradas na avaliação posteriormente realizada (designadamente, a ventilação e o conforto acústico) e que serviu de base à liquidação adicional de IMT.

Tais obras decorreram durante o período de 1 mês e consistiram em algumas remodelações e adaptações (desmantelamento da cobertura existente e montagem de estrutura e cobertura; execução de paredes divisórias em tijolo, abertura de rasgos no pavimento para rede de esgotos e eletricidade; colocação de lage sobre os WC, abertura de saídas nas paredes para ventilação, abertura e colocação de portas de emergência; elevação do pavimento e colocação de escadas; abertura de rasgos e colocação de redes elétrica e águas nas paredes; rebocos e colocação de revestimento nas paredes e pavimentos dos WC´s; colocação de isolante de lã de rocha e pladur nos tetos e paredes; colocação de carpintarias e de louças sanitárias; pinturas, reabilitação da entrada; aplicação de auto nivelante no pavimento e pintura do mesmo) que, à luz das regras da experiência comum, não eram aptas a valorizar o prédio em €451.450,91 (correspondente à diferença entre o valor da avaliação - €559.450,00 - e o da transmissão - €105.999,09). Mas também não temos elementos factuais que nos permitam fundadamente afirmar que tais obras não acrescentaram qualquer valor ao prédio, com reflexos na subsequente avaliação.

Assim sendo, é mister concluir pela necessidade de produzir mais prova tendente a apurar se as obras realizadas no imóvel em questão lhe acrescentaram valor, com reflexos na respetiva avaliação nos termos do CIMI.

Revela-se, portanto, essencial para a busca da verdade material a realização de mais prova, com a consequente ampliação da matéria de facto, para o que devem os autos ser devolvidos à 1.ª instância para ampliação da matéria de facto, designadamente através da inquirição das testemunhas arroladas, e posterior prolação de nova decisão se a tanto nada mais obstar.

4. DECISÃO

Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em revogar a sentença recorrida e ordenar a baixa dos autos à 1.ª instância para ampliação da matéria de facto, nos termos supra referidos, e prolação de nova decisão, se a tanto nada obstar.
*
Custas a cargo da Fazenda Pública, nos termos do artigo 527.º, n.º 1 e 2, do CPC, que sai vencida neste recurso.
*
Porto, 25 de março de 2021

Maria do Rosário Pais - Relatora
Tiago Afonso Lopes de Miranda - 1.º Adjunto
Cristina da Nova - 2.ª Adjunta